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50 anos do bicampeonato - 1º Capítulo: O GP do Brasil PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Saturday, 01 February 2014 23:17

O GP do Brasil era a segunda corrida da temporada de 1974. Emerson havia deixado a competitiva e vencedora Lotus para juntar-se à McLaren. Uma equipe que vencia corridas eventualmente, mas que desde a sua fundação, em 1963, nunca havia conquistado um título na Fórmula 1.

 

Os testes de inverno mostraram uma Ferrari muito forte, rápida e que começou a ser apontada pelos jornalistas que cobriam as corridas como a favorita para a conquista do título naquele ano. A equipe contaria com o tarimbado piloto suíço Clay Regazzoni e com o jovem e promissor Niki Lauda.

 

Durante os testes de inverno, antes da temporada de 1974, a Ferrari destacou-se e era apontada como força do ano.

 

A Lotus teria Ronnie Peterson, que usaria o número 1 no carro devido à ausência do campeão do mundo no ano anterior – Jackie Stewart – e ao fato da Lotus ter sido a campeã de construtores em 1973. Como companheiro de equipe, o rápido e técnico belga Jacky Ickx.

 

A Tyrrell, que perdeu sua dupla de pilotos (Jackie Stewart por aposentadoria e François Cevert por sua morte trágica nos Estados Unidos no ano anterior) apostava em um francês, vindo do programa de formação de pilotos de sua patrocinadora – a ELF: Patrick Depailler e numa promessa sul africana: Jody Schekter. Muito rápido, mas de ‘sanidade mental’ questionável.

 

Entre os brasileiros, além de Emerson Fittipaldi, seu irmão, Wilsinho, depois de um ano como piloto pagante na Brabham, ao lado do Argentino Carlos Reutemann, parecia ter desistido de ser piloto, mas continuava de olho na F1, enquanto José Carlos Pace começaria a temporada correndo pela Surtees, do campeão do mundo de 1964, Johnny Surtees.

 

Um problema inusitado acabou por tirar a vitória de Carlos Reutemann no GP da Argentina, abertura do campeonato.

 

A corrida de abertura da temporada, o GP da Argentina. Ronnie Peterson marcou a pole, mas tinha uma Ferrari – Reggazoni – ao seu lado. A corrida foi dominada por Carlos Reutemann, que acabou sem combustível. Se Carlos Gardel e Alfredo Le Pera fossem vivos, seria mais um tango com uma letra daquelas de fazer chorar.

 

Denny Hulme venceu a corrida, mostrando que o carro era bom e que o problema elétrico que fez Emerson parasse nos boxes na 4ª volta. As duas Ferraris completaram o pódio. Destaque para Clay Regazzoni, que se envolveu num acidente na entrada do miolo e passou a primeira volta apenas em 20º lugar. Era um nome forte pra vencer aquela corrida.

 

Se Emerson teve problema, Denny Hulme (o campeão de 1967) mostrou que o carro era bom e que ele estava bem.

 

A corrida em Interlagos, realizada no final de janeiro seria sob forte calor, como é usual nesta época do ano e os pilotos se viram surpreendidos com os tempos mais lentos do que no ano anterior, apesar da evolução dos carros ao longo do ano anterior. A pista se mostrou mais ondulada.

 

Na quinta-feira, nos treinos livres, ninguém baixou de 2m33s, sendo pelo menos dois segundos e meio mais lentos do que a pole marcada por Ronnie Peterson. Emerson sentiu a pista mais ondulada e o acerto do carro teria que ser algo diferente do ajuste inicial que a equipe colocou, baseada nas informações do ano passado. Seria preciso usar daquela sensibilidade que o “bunda de veludo” que o caracterizou nos tempos da Inglaterra.

 

Nos treinos, Emerson sentiu que a pista estava pior do que no ano anterior. Era preciso ajustar o carro.

 

Na sexta-feira, a busca constante do melhor acerto levou Emerson a entrar diversas vezes nos boxes para fazer alterações nos aerofólios. Diante da condição da pista qual seria a melhor solução: mais asa para manter o carro mais estável, mesmo perdendo velocidade nas retas ou menos asa, para ser mais rápido nos trechos de alta, mas comprometer a estabilidade? Apesar das dúvidas e das experiências, Emerson conseguiu um tempo razoável, na casa de 2m35s, mas ele e a equipe sabiam que precisariam fazer mais do que isso para largar bem e ter chances de vitória.

 

No sábado, todos foram para pista com uma preocupação extra: chovera muito na noite anterior e a pista estava “lavada”, sem borracha, com lama acumulada em alguns pontos e muitos pedriscos. Os tempos pioraram muito até que a pista limpasse... ao menos um “trilho” se formasse.

 

Nos boxes, muita conversa com Teddy Meyer eos mecânicos para ajustar o carro.

 

Pela manhã, Emerson continuou com os testes com asas e tomou um susto enorme. Andando com muita asa, perdeu a frente entre as curvas 1 e 2, dando um 360º, com uma correção de volante feita pelo campeão e que já apontou o carro para a saída da curva 2... mas o susto foi tamanho (uma rodada a 240 por hora) que Emerson confessou estar com as pernas trêmulas na volta aos boxes.

 

Emerson só voltou para pista na parte da tarde quando os tempos começaram a baixar. As Ferraris começaram a virar rápido e Niki Lauda virou abaixo de 2m34s, superando Ronnie Peterson que fizera o mesmo, era hora de ir para a pista. Emerson colocou os pneus mais macios que a Goodyear tinha levado para Interlagos e com um ajuste de asa que privilegiava andar mais rápido em reta. Na terceira passagem ele cravou 2m32.97s, sendo o único piloto a baixar da casa de 2m33s.

 

Um outro fator que estava pesando era o calor: Mike Hailwood estava derretendo dentro do carro.

 

Carlos Reutemann, mostrando que a Brabham começara bem o ano, marcou 2m33.21s, conseguindo assim o segundo tempo e empurrando Niki Lauda para a segunda fila, ao lado de Ronnie Peterson e sua Lotus. Denny Hulme, que venceu na Argentina, ficou apenas com o 11º tempo e Clay Regazzoni, com a outra Ferrari, em 8º. José Carlos Pace marcou o 12º tempo, com o carro andando melhor do que na estreia.

 

A preocupação de Emerson e da equipe passava a ser outra: qual o tipo de pneu para ser usado durante a corrida. A previsão era de sol e calor, com possibilidades de chuva no final da tarde, como costumamos ver atualmente. Ao final da reunião após o treino, eles estavam decididos a usar um pneu intermediário em termos de dureza, que poderia comprometer a aderência no início da prova, com o tanque mais cheio, mas que seria mais resistente e que teria melhor performance do meio para o final da corrida.

 

No final dos treinos, Emerson conseguiu conquistar mais uma pole position.

 

No domingo, depois de mais uma noite com chuva e também pela manhã, antes do treino, bem como entre o “warm up” e a corrida, fez com que a pista ficasse suja novamente. Para tentar limpá-la, foram trazidos caminhões com água para lavar a pista. O problema é que não haviam vassouras e rodos para ajudar e os mesmos demoraram muito a chegar, atrasando o treino e a largada.

 

A torcida que lotava o autódromo cometeu uma verdadeira atrocidade, que nos dias de hoje poderia custar a realização do GP nos anos seguintes: latas e garrafas – de vidro – foram jogadas na pista. Um perigo para carros e pilotos. Um pneu cortado na entrada da curva 1 poderia ser fatal. Emerson Fittipaldi foi pessoalmente pedir aos torcedores que parassem com aquela atitude e juntou-se aos fiscais no recolhimento dos cacos de vidro espalhados pela pista.

 

A torcida brasileira deu vexame, jogando vidros e latas na pista. Emerson foi lá, pessoalmente, catar cacos com os fiscais.

 

Fazendo o que dele se esperava, Emerson foi para a pista com os pneus intermediários e não gostou do resultado. O carro estava instável e em um dos retornos para os boxes, optou por colocar pneus duros, mantendo os intermediários na frente. O carro melhorou e ficou muito estável nas curvas. Contudo, um problema que perseguiu Emerson na Argentina voltou a acontecer.

 

Em uma das voltas, ele esbarrou na chave geral, cortando a eletricidade para o motor. Isso custou algumas posições em Buenos Aires e a chave, mesmo sendo mudada de posição, continuava “sujeira à esbarrões”. A solução foi cortar o pino da chave pela metade para que um “acidente” não colocasse a corrida a perder.

 

A largada atrasou quase uma hora. O autódromo estava lotado e o calor escaldante. Típico GP do Brasil.

 

Com 55 minutos de atraso por conta de todos os problemas, os carros alinharam para a largada, mas não sem antes, aparecer mais um problema: Denny Hulme teve um pneu furado durante a volta de apresentação, possivelmente por conta de algum detrito jogado na pista.

 

Mario Patti, o diretor de prova, não demorou muito para baixar a bandeira e Emerson, largando na pole, acabou surpreendido pelas excelentes largadas de Carlos Reutemann e Ronnie Peterson, que assumiram as duas primeiras posições e contornaram a curva 1 na frente de Emerson Fittipaldi, que precisou frear mais forte para não tocar a Lotus.

 

Reutemann pulou na ponta, Peterson saiu da segunda fila para a segunda posição, deixando Emerson em terceiro.

 

Pelo retão, depois da curva 2, as posições e a “fila” ia se arrumando, com Reutemann na ponta, Peterson em 2º, Emerso em 3º. Clay Regazzoni largou muito bem, pulando de 8º para a 4ª posição, à frente da segunda Lotus, de Jacky Ickx. Peter Revson completava os seis primeiros. Quem saiu no prejuízo foi Niki Lauda, que caiu para o 10º lugar. José Carlos Pace ganhou três posições e era o 9º no contorno da curva 3.

 

Ronnie Peterson parecia possuído. Depois do problema que teve na Argentina, onde largou na Pole, mas depois de perder a ponta na 3ª volta para Carlos Reutemann e depois, ir caindo até abandonar a corrida perto de seu final, o sueco estava disposto a tudo para escrever a história do GP do Brasil com cores inversas.

 

Durante todo o final de semana, Ronnie Peterson foi o "show man". Sempre indo além do limite.

 

Já na segunda volta, depois de contornar espetacularmente as curvas 3 e 4, saiu com tudo par cima do argentino na pequena reta que antecedia a curva da Ferradura. Chegou a colocar a Lotus ao lado da Brabham, mas a tomada para a Ferradura era de Reutemann, que conseguiu manter a ponta.

 

Emerson tinha o carro bastante estável e não tinha dificuldades em acompanhar os dois primeiros. Na volta seguinte, foi a vez de Emerson tentar a mesma manobra em cima de Ronnie Peterson, que deu uma escapadinha na saída da curva 4 e colocou duas rodas na grama, nas o sueco defendeu-se com tudo pra cima do ex-companheiro de Lotus, manteve a posição e voltou a carga contra Carlos Reutemann, conseguindo a ultrapassagem na entrada da Ferradura, tomando a ponta na quarta volta.

 

No início da prova, Ronnie Peterson foi com tudo para cima da Brabham de Carlos Reutemann.

 

Peterson abriu uma boa distância em poucos metros e Emerson não podia perder tempo atrás da Brabham, que dava sinais de perda de rendimento. Com arrojo, Emerson usou de seu conhecimento de cada centímetro de Interlagos para superar o argentino ainda na mesma volta, antes da entrada da curva do Sol, e assumir a segunda posição. Quem também avançava era José Carlos Pace, ganhando uma posição a cada volta e já ocupando a 7ª colocação, atrás de Peter Revson.

 

Não demorou muito para o sueco da Lotus tomar a ponta do GP do Brasil.

 

Começava então a disputa pela liderança, com Emerson perseguindo a Lotus num duelo onde Ronnie Peterson parecia disposto a tudo – tudo mesmo – para se manter na liderança. Ele atravessava nas curvas, freava “pra lá do limite” e por conta dos pneus mais macios e do ‘setup’ de pouca asa, o sueco vinha conseguindo se manter na frente da McLaren.

 

Emerson também passou logo e foi pra cima do antigo companheiro de equipe em busca da liderança.

 

A briga pela terceira posição ficou animada, com Reutemann, Regazzoni e Ickx.  Entre a nona e a décima volta, Regazzoni e Ickx conseguiram superar o piloto argentino. Pace vinha voando, pulou para sexto depois do problema de Peter Revson e, uma volta depois, também superou a Brabham de Carlos Reutemann, passando para 5º.

 

Livre da Brabham, Clay Regazzoni acelerava forte e começava a tirar um segundo por volta, conforme as placas de Box avisavam.  Com Ronnie Peterson atravessando nas curvas mais lentas e sem dar chances de aproximação nas curvas de alta exigiam uma estratégia perfeita: entrar colado no retão, depois de contornar a 1 e a 2 para tentar, na curva 3 ou na saída da 4 a ultrapassagem.

 

A Brabham de Carlos Reutemann perdia rendimento e logo Clay Regazzoni e Jacky Ickx chegaram no argentino.

 

A chance perfeita apareceu na 16ª volta, quando Arturo Merzario – retardatário – surgiu. Emerson fez a sua parte, contornando as curvas 1 e 2 colado na Lotus e entrando no Retão praticamente embaixo do câmbio. Peterson abriu para passar Merzario na altura da placa dos 300 metros. Emerson ameaçou ir ainda mais por dentro e, quando o sueco fechou a porta, ele mudou a trajetória e passou POR FORA na entrada da curva 3!

 

Uma boa parte dos leitores que seguem o site dos Nobres do Grid talvez não tenha a noção do que foi este feito. Um carro chegava na curva 3 a 300Km/h e a “área de escape” tinha 1,5 metros antes do muro. Como a topografia de Interlagos permitia uma visão quase completa de que estava em volta do circuito, foi uma explosão da torcida.

 

Depois de uma manobra espetacular, Emerson Fittipaldi assumiu a ponta e despachou a Lotus do complicado Peterson.

 

Emerson saiu forte da curva 4, sem dar chances para o atordoado Peterson – que certamente não acreditara no tamanho do “passão” que acabara de tomar – e foi abrindo distância rapidamente. O problema passava a ser de Clay Regazzoni, que teria que enfrentar um ‘touro bravo’ para tentar continuar sua aproximação. As posições só mudaram depois que Ronnie Peterson entrou nos boxes com um pneu furado no início da vigésima volta.

 

Nesta altura da corrida, Emerson Fittipaldi tinha mais de 10 segundos de vantagem e, com pista livre, estava andando mais rápido do que a Ferrari. A briga que parecia se aproximar era pelo terceiro lugar, onde José Carlos Pace vinha tirando a diferença para Jacky Ickx. Ronnie Peterson, depois de retornar à pista, voava baixo e em 10 voltas já era o 6º colocado... e aí veio a chuva.

 

Depois de largar em 12º lugar com o modesto carro da Surtees, José Carlos Pace saiu passando todo mundo, até a 4ª posição.

 

Chuva em Interlagos sempre foi complicado. Por vezes chovia em um lado do circuito, no outro não. Em alguns pontos chovendo forte, em outros chovendo fraco. Na trigésima volta, nas curvas 1 e 2, no sol e no Sargento, o asfalto já estava muito molhado. Com mais de 2/3 da prova disputados, o diretor de prova já poderia encerrar a corrida sem comprometer a pontuação total. Emerson tinha 16 segundos de vantagem para Regazzoni e na passagem da 32ª volta Mario Patti interrompeu a corrida com o aumento da chuva dando a vitória a Emerson Fittipaldi.

 

Na trigésima volta, a chuva chegou e duas voltas depois, Mario Patti, o diretor da prova, encerrou a corrida.

 

O campeonato tinha Clay Regazzoni como líder, com 10 pontos, com os dois pilotos da McLaren – Emerson Fittipaldi e Denny Hulme – logo em seguida com 9. Niki Lauda, que abandonara no início da corrida ficava com os 6 pontos conquistados na Argentina e assim, o equilíbrio de forças que nos anos anteriores estava nas mãos da Tyrrell e da Lotus parecia ter mudado de donos. Por falar em Lotus, depois do esforço sob forte calor, Ronnie Peterson foi parar no hospital, com princípio de desidratação. No pódio, Emerson sorri, tremula a bandeira brasileira e Clay Regazzoni sorri, comemorando a liderança no mundial de pilotos.

 

No pódio, Emerson Fittipaldi sorria pela vitória. Clay Regazzoni, pela liderança no campeonato e Ickx, pela chuva providencial.

 

A Fórmula 1 deixava a América do Sul e Emerson Fittipaldi mostrava que, com a nova equipe, poderia sim, conquistar seu segundo campeonato mundial.

 

 

 

Fontes e Fotos: Revista Quatro Rodas; Revista Isto É; Revista Fatos e Fotos; Agência Estado; Folha de São Paulo.

 

Last Updated ( Wednesday, 24 January 2024 11:01 )