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O campeão do Carisma PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Friday, 29 August 2014 21:44

Olá fãs do automobilismo,

 

Quando vocês, queridos leitores, estiverem lendo esta coluna, o resultado da corrida do meu paciente com quem decidi partilhar sua sessão já terá acontecido e o título do campeonato decidido. Contudo, o momento de um piloto não pode se restringir à apenas uma temporada ou uma bandeirada.

 

Quem acompanha o automobilismo há mais de uma década acostumou-se com certos estereótipos ou “marcas registradas”, seja em relação a pilotos – brasileiros ou estrangeiros – seja em relação a dirigentes ou mesmo figuras da mídia que frequentam os autódromos.

 

Uma das mais marcantes é, sem dúvidas, o sorriso contagiante deste jovem de 40 anos que mais parece um menino. Helinho, como me acostumei a vê-lo ser chamado desde que comecei a ver suas corridas. Um estado de espírito natural e que ultrapassava o limite das pistas. Sua performance na “dança dos famosos” nos Estados Unidos foi um espetáculo à parte.

 

Helinho é meu paciente há alguns anos e a suas sessões costumam ser bem dinâmicas e a sua maneira extrovertida de ser costuma fazer o tempo simplesmente voar. Contudo, a sessão da semana passada mostrou-se diferente. Na verdade, vivemos um momento semelhante no ano passado e eu não esperava que isto se repetisse este ano.

 

Ao longo de sua trajetória de mais de 15 anos no automobilismo norte americano, apesar de ser um grande vencedor de corridas, entre elas três edições das 500 Milhas de Indianápolis, Helinho possui uma incômoda coleção de vice-campeonatos, que começou na Indy Lights no final da década de 90 e repetiu-se por três vezes na categoria principal, sendo a última delas no ano passado, depois de ter liderado a pontuação do campeonato por boa parte do mesmo.

 

Um momento raro de introspecção e a falta do carismático sorriso.

 

Quando Helinho chegou ao consultório, percebi algo estranho na voz da minha assistente quando ela me informou que ele já estava na sala de espera. Meu consultório tem entrada e saída independentes, ou seja, os pacientes não se cruzam na sala de espera, algo que algumas pessoas podem achar constrangedor.

 

A minha estranheza é que em tanto tempo de trabalho em conjunto com ele, ele sempre chegava “em cima da hora” e quando minha assistente falou que ele estava ali havia trinta minutos isso poderia mostrar uma alteração de comportamento. Mas o profissional não está ali para supor e sim analisar.

 

Quando abri a porta do consultório e convidei-o para entrar, percebi que a minha sensação de estranheza havia coincidido com a minha percepção inicial de analise... e não foi difícil fazer isso. O sorriso com que sempre fui recebida em nossos encontros foi quase uma deformação entre os lábios e amarelo como uma folha seca ao sol.

 

Um sorriso amarelo e os parabéns por mais uma pole do companheiro de equipe e rival na luta pelo título.

 

Nestas horas, o paciente pode expor a sua condição psicológica, o seu estado de espírito... o terapeuta, não. Ele tem que ser impassível, para procurar receber seu paciente transmitindo a ele que está na hora de entrar em um porto seguro, e rápido para adaptar a sua segunda reação – após o “bom dia” ou “boa tarde” – ao estado de espírito transmitido pelo paciente.

 

Acabamos voltando no tempo diversas vezes ao longo da sessão, quando Helinho falou dos vice-campeonatos anteriores, inclusive o da Indy Ligths. Em todos eles ele chegou na última prova ainda em condições de conquistar o título, mas o que aconteceu no ano passado foi particularmente marcante, uma vez que ele liderara a tabela de pontos por boa parte do campeonato.

 

Neste ano a situação veio a se repetir. Depois de um começo onde altos e baixos se alternaram, depois das 500 Milhas de Indianápolis, seu desempenho de constância entre as primeiras posições colocou-o numa liderança que, em certos momentos, parecia tranquila. Era só “administrar a vantagem”. “Controlar os adversários”.

 

Uma das piores partes: explicar o que não tem explicação.

 

Contudo, este expediente talvez funcione nas categorias europeias, que fizeram parte da formação de Helinho como piloto, mas que nas corridas da Fórmula Indy, onde uma folha de papel no asfalto, mesmo num circuito misto (exagero meu, ok?) é capaz de provocar uma bandeira amarela e bagunçar o planejamento estratégico das equipes e seus pilotos, alguns bem estabanados e capazes de criar paralisações por acidentes tolos, este método tem a sua eficiência comprometida.

 

Ao longo da temporada, os outros dois pilotos da equipe, Will e Juan Pablo, pareciam estar “sob controle”. Contudo, o primeiro deles e que desde que entrou na equipe Penske sempre rondou – quando não conquistou – o título, cresceu neste final de temporada, enquanto Helinho oscilou e fez algumas corridas aquém do que poderia fazer.

 

A angustia do meu paciente era visível, especialmente por conta das últimas duas provas, uma em oval e outra em circuito misto onde as coisas só não ficaram piores porque em Sonoma, Will – que largou na pole – teve problemas durante a corrida e terminou apenas em nono lugar. Caso contrário, o campeonato poderia estar praticamente decidido antes das 500 milhas de Fontana.

 

Por mais difícil que esteja sendo, é preciso continuar sendo positivo.

 

A pressão está sobre seus ombros e Helinho tem consciência disso. Mais que isso, ele tem a consciência de que em trinta anos de automobilismo, se considerarmos desde os tempos de kart, a pressão sobre os ombros é uma constante. Ele sabe que não basta chegar na frente do companheiro de equipe. Ele sabe que uma vitória será fundamental!

 

Caso Helinho vença, ainda terá que torcer para que Will não chegue entre os sete primeiros colocados – sem levar em consideração os pontos extras por pole ou voltas na liderança – e, depois daí, as contas ficam cada vez mais difícil. Naquele que seria “o melhor dos cenários” para Helinho (Will abandonando a prova sem marcar ponto algum), ainda assim seria necessário um quarto lugar.

 

Se tem uma coisa que um piloto de corridas tem com ele é que não se perde corrida ou título de véspera e Helinho sabe bem disso. Seu trabalho depende muito de como seu psicológico irá atuar nas mais de três horas de corrida na Califórnia e manter uma postura altiva diante de todos, especialmente diante de Will é fundamental.

 

É assim gostamos de ver você, Helinho. Vencendo e comemorando na grade!

 

Como disse no início da coluna, quando vocês, queridos leitores, estiverem lendo esta coluna, a corrida já terá terminado e o título decidido. Como terapeuta, continuarei vendo Helinho por muito tempo e meu maior desejo – além da conquista do título – é poder ser recebida com aquele sorriso que cativa a todos que o veem e vê-lo escalando grades de costa a costa na América do Norte.

 

Beijos do meu Divã,

 

Catarina Soares