Aqui em Minas Gerais a gente fala que muitas vezes só se coloca uma tranca decente na porta depois dela ter sido arrombada. A história da Fórmula 1 é uma repetição deste ditado ao longo da história com uma frequência enorme. Basta ver as medidas de segurança tomadas após as mortes de Gilles Villeneuve e posteriormente, Ayrton Senna. Passam-se mais de 20 anos após aquele 1º de mais de 1994 para que algo terrivelmente trágico voltasse a ocorrer com o acidente de Jules Bianchi que o mantém em um hospital na cidade de Nice, sob vigília e orações da família... e a espera de um milagre que o traga de volta do coma de mais de três meses. Mas não é apenas no campo dos acidentes que a FIA demora a tomar medidas ou quando as toma, tem o conteúdo destas medidas questionadas por seus conteúdos confusos, incoerentes, parciais ou capazes de ela mesma gerar diretamente a polêmica, como no caso da “brecha” para as atualizações das unidades de força (nome chique que a junção dos motores com os sistemas híbridos) que os fabricantes não conseguiam chegar a uma ação negociada. A polêmica da vez surgiu em consequência do anúncio do adolescente Max Verstappen (porque ele é um adolescente de 17 anos), no meio de sua primeira temporada como piloto de carros – uma vez que antes ele só tinha pilotado karts – como piloto da Toro Rosso para a temporada de 2015. Alguns dos dirigentes da categoria começaram a questionar se este excesso de precocidade não estaria sendo um exagero – e um risco – para a categoria tida como a mais importante do mundo. Daí, finalmente, a Federação Internacional de Automobilismo resolveu colocar o bedelho na conversa e estabelecer normas para o acesso. Uma outra coisa que também se fala aqui para os lados de Minas Gerais é que “de boas intenções o inferno está cheio”. A FIA fez algo que já deveria ter sido feito há pelo menos 15 anos, quando Peter Sauber contratou o Kimi ‘Tomatodas’ para ser piloto de sua equipe quando este ainda corria na F. Renault. Talvez Peter Sauber fosse mesmo um visionário. Afinal, 10 anos antes, quando sua equipe era parceira da Mercedes Benz no mundial de protótipos, ele tinha em um dos seus carros o trio formado por Michael Schumacher, Heinz-Harald Frentzen e Karl Wendlinger. A partir deste ano, qualquer piloto precisará ter 18 anos completos e uma carteira de motorista para poder solicitar a superlicença. Além disso, foi criada uma “tabela”, na qual os pilotos marcarão pontos conforme as categorias que disputarem e a colocação que obtiverem nas mesmas. Os pilotos terão que disputar, obrigatoriamente, pelo menos duas temporadas completas em categorias de base e, além disso, precisará acumular pelo menos 40 pontos, ou conseguir atingir este número de pontos em tres anos. Além disso, o piloto também deverá percorrer pelo menos 300 km de testes em um período máximo de dois dias, desde que com um carro “representativo, consistentemente em velocidade de corrida” completados até 180 dias antes da requisição da superlicença. É quase o mesmo texto que vigorava até o ano passado. A diferença está no detalhe do “carro representativo”. Uma vez que está mais difícil usar um carro “atual”, devido às restrições do regulamento da Fórmula 1 para o uso de carros fora dos finais de semana de corrida, será permitido usar carros de anos anteriores. E assim como a nossa Carteira Nacional de Habilitação, a “superlicença” terá que ser renovada periodicamente. Para isso, será mandatório que o piloto tenha disputado cinco GPs na temporada anterior ou 15 nos três últimos anos. Aqueles pilotos que eventualmente participam dos treinos livres nas sextas-feiras dos GPs de Fórmula 1 precisarão já possuir uma carteira internacional A, uma carteira de motorista e – claro – ter mais de 18 anos. Antes tarde do que nunca. Do jeito que a coisa estava indo, não demoraria a vermos meninos de 15 anos dentro de carros de fórmula 1, desvirtuando completamente o caráter de “categoria maior” do automobilismo mundial (em termos de monopostos, pelo menos). Contudo, alguns dos critérios para a tal da pontuação podem ser questionados. A começar pelo peso ridículo que foi dado para a World Series by Renault, categoria de onde tem vindo mais pilotos para a Fórmula 1 do que a GP2 do “pacote da FOM”. São apenas 30 pontos para o vencedor contra 50 da categoria onde há tempos o campeão, quando muito, consegue uma vaguinha como piloto – pagante – de testes. A FIA ao menos considerou que, mesmo não sendo categorias de formação, mas sim o topo de suas classes, a categoria de Protótipos 1 e a Fórmula Indy tiveram sua importância considerada, com uma pontuação que dá, ao campeão, a pontuação necessária para almejar à Fórmula 1. Em compensação, a categoria de acesso norte americana, a Indy Lights não foi sequer mencionada! Por outro lado, ignorou o DTM, categoria onde o carro de turismo é quase um monoposto/protótipo carenado, com o piloto no meio do carro, pit stops de 3 segundos (ou menos) e com uns 6 a 8 pilotos que poderiam perfeitamente estar habilitados para a categoria máxima. Algo que pode ter parecido estranho para muitos foi a pontuação máxima da “Tabela” ter sido dada para uma categoria que não existe mais, há muito tempo, que tentou ser recriada alguns anos atrás naquele “pacote de baixo custo” do Max ‘chicotinho’ Mosley do qual fizeram parte as falecidas “nanicas” da Fórmula 1, mas que acabou nunca conseguido reeditar os seus tempos áureos, findos nos anos 70: a Fórmula 2. Para quem é esperto, informado, leitor do site dos Nobres do Grid, este plano para uma volta da Fórmula 2 é “notícia velha”. Esta nos foi dada em primeira mão pelo sorridente presidente da CBA em uma exclusiva com a chefia no final de 2013 (Podem conferir aqui). Agora, se, quando e como ela vai sair do papel é um exercício de adivinhação. É claro que não demorou muito para os “entendidos”, “gatos-mestres” e “rabugentos” de plantão (e como tem disso... valha-me Deus) aparecer com aquelas comparações de pilotos de outros tempos, neste caso até recentes, pelo fato de muitos ainda estarem correndo. Foi dito que, caso os critério já vigorassem como 15 anos atrás, não teriam entrado como entraram na Fórmula 1, como é o caso de Fernando Alonso (que estreou aos 19 anos vindo de um título da Euro Open e um quarto lugar na F-3000), Kimi Raikkonen (campeão da F-2000 UK), Jenson Button (campeão da F-Ford e terceiro na F-3 Britânica). Mas é lógico que teve gente que foi mais longe. O engraçado é que “pararam” quando a coisa chegou em um certo piloto nacional... e nestas horas eu morro de dar risada. Porque, neste caso, não só o dito cujo, mas nenhum dos nossos campeões mundiais teria conseguido pontos suficientes para poder chegar na Fórmula 1. Emerson Fittipaldi, como campeão da Fvee (que seria como uma Fórmula Renault nacional) faria 5 pontos, aos quais somaria 10 pontos do campeonato inglês de Fórmula 3. Nelson Piquet chegaria mais perto, com 5 pontos da Fórmula Super-Vê, 20 pontos do 3º lugar no europeu de Fórmula 3 em 1977 e 10 do título inglês de 1978 teria 5 pontos a menos que o necessário. Até o finado Ayrton Senna teria que fazer mais, uma vez que seus dois tíulos na F. Ford renderiam 5 pontos cada e com os 10 do título na Fórmula 3 inglesa, somaria 20 pontos. Logicamente que o critério não se aplica à épocas passadas. Os pilotos que chegavam na Fórmula 1 já tinham uma rodagem considerável, numa época em que não havia limitações para testes em qualquer categoria, sem falar no fato de que os pilotos já chegavam adultos e não adolescentes à Fórmula 1. Ainda assim, dando uma de Catarina Soares e atacando na psicologia, considerando que os moleques de hoje são mais maduros que os dos anos 70/80, o que seria ou poderia vir a ser da vida de um menino como Max Verstappen se ele fosse ou viesse a ser acusado de provocar um acidente de proporções “apocalípticas” como o ocorrido no GP da Inglaterra de 1973, onde o sul africano Jody Sheckter foi o epicentro de um ‘strike’ que tirou metade do grid da corrida? No ano seguinte Scheckter terminou a temporada brigando pelo título e, alguns anos depois, foi campeão do mundo. Ricardo Patrese, que disputou 15 temporadas na Fórmula 1 e que, por anos, foi o recordista de largadas em corridas oficiais, durante os primeiros anos de sua carreira “carregou a cruz” de ter sido apontado culpado pelo trágico acidente na largada do GP da Itália em 1978, que vitimou Ronnie Peterson... onde nem a FIA, nem a FOCA (Associação dos Construtores) assumiram a responsabilidade pelo “starter” ter dado a largada antes de todos os carros estarem parados no grid. Agora imaginem que o responsável por um grave acidente naquela pista cheia de muros da Austrália venha a ser o Max Verstappen... e se alguém morre? E se ele morre, batendo num “inocente tratorzinho”... quem vai ser o responsável? Como vai ficar a cabeça deste menino? E se a vítima for ele? A FIA vai tirar o corpo fora como fez com o acidente de Jules Bianchi? A ideia da “tabela” foi boa... mas a FIA ainda tem muito o que fazer. Abraços, Mauricio Paiva
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