Nos dias que correm na categoria mais alta do automobilismo, parece que a juventude é tudo. Isto não é nada de novo: mesmo há mais de 50 anos, tivemos exemplos de precocidade como Ricardo Rodriguez e Chris Amon. Ambos chegaram à Formula 1 com cerca de vinte anos, e no caso do piloto mexicano, irmão mais novo de Pedro Rodriguez, a sua carreira ficou trágicamente encurtada com o seu acidente fatal no GP do Mexico de 1962. Contudo, hoje em dia, esses meninos prodígios aproveitam o facto de terem dinheiro ou uma equipa para os levar ao estrelato. Quando em 2001, Fernando Alonso, e Kimi Raikkonen se estrearam na Formula 1, houve mais criticas ao finlandês que experimentava uma máquina de 800 cavalos… após apenas 23 corridas em monolugares. Muitos foram os que criticaram fortemente a escolha de um piloto com tão pouca experiencia, sem passar pela Formula 3, por exemplo. Contudo, o finlandês calou os críticos logo na sua primeira corrida na Formula 1, ao ser sexto classificado com o Sauber. No ano anterior, já tinha havido polémica semelhante com o britânico Jenson Button, mas ele tinha experiência na Formula 3 britânica e fez um teste do género “shot-off” com o brasileiro Bruno Junqueira, mais velho do que ele, onde superou-o por muito pouco. Contudo, foi apenas na parte final desta década que se viu a chegada de adolescentes ao cockpit, e quase todos eles vindos da “cantera” da Red Bull. Primeiro, Sebastian Vettel, que se estreara na Formula 1 em 2007, ainda não tinha vinte anos de idade, na BMW, em substituição do acidentado Roibert Kubica, e depois quando apareceram pilotos como Jaime Alguersuari e mais recentemente, o holandês Max Verstappen, que aos 17 anos, e apenas uma temporada nos monolugares, na Formula 3 europeia, estreou-se na categoria máxima do automobilismo, impressionando tudo e todos, ao ponto de já ser o vencedor mais novo de sempre, com 18 anos de idade. Em 2001, Fernando Alonso e, principalmente, Kimi Raikkonen criaram questionamentos sobre juventure e experiência. Por causa disso, a FIA decidiu implementar um sistema de pontos, onde daria a Superlicença apenas a pilotos que tenham sido bem sucedidos nas suas categorias, como a Formula 3 europeia, e de futuro, a Formula 2. E ninguém a pode ter com menos de 18 anos, ou seja, os recordes de precocidade do filho de Jos Verstappen arriscam a ficar para sempre. Mas mesmo com esses critérios, outros adolescentes estão a caminho, como o canadiano Lance Stroll e o francês Esteban Ocon. Ocon ainda mal chegou aos vinte anos, mas já se estreou na formula 1 ao serviço da Manor, depois de ter andado na Formula 3 e no DTM, mas é o canadiano que muitos estão de olho. Filho de Lawrence Stroll, um dos homens mais ricos do Canadá, Lance está a ser treinado para ser piloto… desde criança. Aos 17 anos de idade (nasceu a 29 de outubro de 1998), Stroll corre desde os dez anos de idade, nos karts, e em 2014, aos 15 anos de idade, estreou-se nos monolugares. Ganhou a Formula 4 italiana nesse ano, e a Toyota Racing Series no ano seguinte, enquanto que era quinto no campeonato europeu de Formula 3. Este ano, ele lidera o campeonato com mais de 70 pontos de diferença sobre o alemão Maximilian Gunther. Anos depois, Sebastian Vettel já não criou tantas perguntas. Em comum: os três ganharam campeonatos mundiais de F1. Comentando sobre a categoria onde está, Stroll disse: “Penso que a Formula 3 já tem um nível muito alto e está apenas um passo abaixo da GP2 Series. No entanto estou preparado para ingressar na Formula 1. Os nossos monolugares têm muita carga aerodinâmica, mas muito menos potência do que um Formula 1. Porém o nível de competitividade é muito alto.” Stroll está a caminho da vitória num campeonato importante como o da Formula 3, e o passo seguinte poderá ser… a Formula 1. E já tem lugar assegurado na Williams, a substituir o retirado Felipe Massa. Em alguns casos, o combustível da precocidade é o dinheiro, independente da competência. Lance Stroll tem muito dinheiro Stroll é piloto de desenvolvimento da equipa este ano, e a equipa segue os seus feitos ao serviço da Prema Powerteam. Altamente experimentado, já se fala que tem tudo feito para ser o piloto titular, com estreia na próxima temporada, graças ao seu pai. Os rumores indicam que Lawrence já comprou um interesse na equipa, e que um carro de 2014 já esta a ser modificado para que ele faça um programa extensivo de testes em circuitos onde ele não tem muita experiência em monolugares, pelo menos na Europa. Com a Super-Licença meramente um “pró-forma” (recorde-se, ele fará 18 anos dentro de um mês), ele tem o caminho aberto para esse lugar. Mas toda essa obsessão pela prodigalidade tem um preço. Ninguém poderá acreditar que Jaime Alguersuari tenha agora 26 anos e já se retirou do automobilismo, mas isso é real. Tendo estreado na Formula 1 no GP da Hungria de 2009, batendo o recorde de precocidade de Chris Amon, pela Toro Rosso, não deslumbrou na sua estreia, nem na temporada seguinte, onde foi 19º, com apenas cinco pontos. Ele melhorou em 2011, onde conseguiu 26 pontos e o 14º posto, com dois sétimos lugares em Itália e na Coreia do Sul como melhores resultados. Contudo, no final dessa temporada, e de modo surpreendente, quer ele, quer o seu companheiro de equipa, o suíço Sebastien Buemi, foram dispensados. E nenhum dos dois conseguiu depois carreira na Formula 1. As vezes a precocidade não dá o resultado esperado e as consequências são perversas. Que o diga Jaime Alguersuari. Depois disto, Alguersuari tentou a sua sorte na Formula E, onde apesar de não ter deslumbrado, não fez feio, conseguindo uma volta mais rápida e um quarto lugar em Buenos Aires como melhor resultado. Mas um incidente na corrida de Moscovo fez com que decidisse pendurar o capacete, anunciando-o a 1 de outubro de 2015, afirmando que “tinha deixado de amar o automobilismo”. E outro piloto da “cantera” Red Bull parece ir a caminho de Alguersuari. O russo Daniil Kvyat tem 22 anos, mas parece que está mais perto de pendurar o capacete do que de explodir no automobilismo. Chegado à Formula 1 em 2013, surpreendendo tudo e todos – toda a gente esperava que o lugar na Toro Rosso fosse para o português António Félix da Costa – ele tinha sido campeão da GP3 em 2013 e tinha impressionado muita gente durante as suas corridas na Formula 3. Outro que um dia foi o "menino dos olhos" e agora anda correndo sérios riscos é Daniil Kvyat, que pode não ter carro em 2017. Após uma temporada sem deslumbrar em 2014, pela Toro Rosso, em 2015 passou para a Red Bull, conseguindo dois pódios, o melhor dos quais um segundo posto na Hungria e um terceiro lugar no GP da China deste ano. Contudo, depois de um incidente no GP da Rússia, e em contraste com os desempenhos meteóricos de Max Verstappen, foi despromovido para a Toro Rosso antes do GP de Espanha, em Barcelona. E nessa corrida, o russo fez a volta mais rápida, enquanto que o holandês… venceu. Desde então, os resultados do piloto russo têm sido péssimos, ao qual não ajuda o facto de ter o motor Ferrari de 2015, que não é desenvolvido, e em muitas vezes, perde no duelo particular com o espanhol Carlos Sainz Jr. Até Singapura, tinha conseguido apenas conseguiu dois décimos lugares, e já tinha deixado passar a ideia de que estava desmotivado com a equipa e com a Formula 1. Correm rumores de que os seus dias na Toro Rosso estão contados, mas o resultado que teve nas ruas da cidade-estado, onde bateu o pé a Max Verstappen e alcançou um nono lugar, ficando na frente de Carlos Sainz Jr. poderá ter conseguido uma espécie de “time extension”, pelo menos até ao final da temporada. O outro "prodígio da vez" está em alta. Max Verstappen poderá ser o novo jovem de sucesso? Ainda precisa Mais do que ter uma equipa que “mastiga e cospe” jovens pilotos, como é a máquina da Red Bull Junior Team, colocar pilotos tão cedo num carro de quase mil cavalos, com um V6 Turbo pelas costas, poderá ser uma profissão de desgaste rápido, sobretudo mental. Mas ali, a Red Bull deseja resultado imediatos, colocando esses jovens pilotos sob elevada pressão por longos períodos de tempo. E como já viram, alguns vão-se abaixo. Mas mesmo noutros lados, sem a pressão que Helmut Marko e outros fazem, a velocidade e a pressa que outros querem que esse adolescente seja um piloto de Formula 1 o mais depressa possível, de forma mais precoce possivel, faz lembrar da mesma forma que muitos pais desejam que o seu filho seja um jogador de futebol. E isso poderá fazer com que muitos desses rapazes passem ao lado… da vida. De serem pessoas. Alguma vez esses pais lhe perguntaram se queriam divertir-se com os seus amigos, ou se importaram com os seus deveres de escola? Se calhar poucos. Pilotos precoces já surgiram no passado, como os irmãos Rodriguez no México. Contudo, agora eles parecem ser regra. É muito engraçado fazer dos garotos atletas-mirins de alta competição, seja que modalidade for... mas e o ser humano que é, que gostaria de viver a vida como todos os outros? Ou será que isso é um fator secundário? É esse o meu grande temor: o que é que todos estes rapazes não andam a esconder, a reprimir, em nome de uma carreira bem-sucedida no automobilismo? Faço todas estas perguntas por causa da autobiografia de Damon Hill, que foi lançada no passado dia 8 de setembro. Damon, filho de Graham, não foi um piloto prodígio – bem pelo contrário, chegou à Formula 1 com 33 anos – mas durante anos, sentiu que tinha de complementar o legado do seu pai, morto num acidente de aviação em novembro de 1975. E mesmo quando chegou à categoria máxima do automobilismo, vencendo o título mundial em 1996, sendo o primeiro (e até agora único) filho de campeão a alcançar o título mundial, Hill sempre pensou que com o título mundial, as coisas comporiam-se. Acabou por não ser assim: seguiu-se um episódio de depressão que quase o fez detestar a modalidade que tinha escolhido, quando pendurou o capacete, no final de 1999, ao serviço da Jordan. Depois de alguns negócios mal sucedidos, e de ter sido o presidente da BRDC, Hill contou na sua autobiografia que somente quando tirou uma licenciatura em Lingua Inglesa na Open University que se sentiu realizado em termos humanos, que tinha entendido o legado da sua família e compreendeu todas as suas realizações automobilísticas. Mas Damon Hill tem 55 anos e nem todos poderão encarar esses problemas da melhor forma. E é esse o meu receio. Saudações D’além Mar, Paulo Alexandre Teixeira
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