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Entrevista: Bruno Corano PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Monday, 27 November 2017 12:49

Se vemos o automobilismo brasileiro passando por uma crise generalizada há anos, o motociclismo tem vivido momentos ainda mais complicados. Tendo menos exposição do que ainda tem o automobilismo, o motociclismo sobrevive da abnegação e da engenhosidade daqueles que não ousam desistir de promover e disputar competições no nosso país.

 

Ver mais de 100 motocicletas em diversas categorias participando do que se trata ser o verdadeiro campeonato brasileiro de motociclismo, que tem o nome Superbike Brasil, o empresário e piloto Bruno Corano tem feito um louvável trabalho para que não apenas o esporte sobreviva no Brasil, mas que faça um processo de formação de novos talentos, atraia fabricantes de motocicletas e permita que pilotos de todas as idades acelerem nos autódromos pelo país.

 

Durante a etapa realizada em Curitiba, tivemos a oportunidade de conversar com Bruno Corano e conhecer um pouco mais sobre sua vida, seus projetos e o que podemos esperar do futuro do motociclismo no Brasil.

 

NdG: Como foi que o Bruno conheceu o motociclismo?

 

Bruno Corano: Eu sempre fui um esportista. Jogava tênis. Mas devido a um problema de saúde tive que abandonar e acabei indo para o motociclismo. Desde criança eu sempre gostei muito de bicicleta. Depois eu tive uma mobilette, mas ninguém na minha família anda de moto e foi algo que, para mim veio com muita naturalidade, mas de uma forma diferente do que se vê muito, onde um pai ou um tio anda de moto e aí você anda de moto por influência e eu não tive essa referência.

 

NdG: Além de piloto você é o promotor do evento Superbike Brasil. O que foi que empurrou, motivou você a abraçar o desafio de promover um evento do porte que é este?

 

Bruno Corano: Desde o início dos anos 2000 eu já tinha uma escola de pilotagem e o campeonato brasileiro era organizado pela CBM. Só que eles tiveram alguns problemas políticos e perderam todos os seus patrocínios. As empresas privadas não queriam mais apostar no evento. Isso fez com que o campeonato fosse paralisado e a gente recebeu o convite destes patrocinadores, empresas que patrocinavam o campeonato, para que organizássemos um evento totalmente privado. Então a iniciativa foi mais deles do que minha.

 

NdG: Mas você aceitou o desafio...

 

Eu sempre fui um esportista. Joguei tenis por muitos anos. Tive que parar e escolhi o motociclismo.

 

Bruno Corano: Sim. Com a forma como foi exposto eu achei que era viável e que reunindo a equipe certa a gente conseguiria fazer o que eles pensaram, o que nós desejávamos e estando fazendo. Aunda tem muito para ser feito, podemos fazer um campeonato melhor, um evento melhor, atrair mais retorno e mais envolvidos. Espero que consigamos isso.

 

NdG: No automobilismo, os campeonatos nacionais são basicamente promovidos por empresas privadas. No motociclismo não se fazia isso. Você teria como explicar, talvez, o porquê disso?

 

Bruno Corano: Até o rompimento dos patrocinadores sempre foi a Confederação que fazia tudo. Talvez o automobilismo como meio de competição fosse mais estruturado, mais maduro. No motociclismo isso nunca tinha acontecido. O campeonato nacional de motovelocidade sempre foi da CBM e os estaduais das respectivas federações. Nós fomo uma quebra de paradigma. Depois da estruturação do Superbike Brasil começaram a surgir promotores regionais para organizar os campeonatos nos estados.

 

NdG: Na sua opinião, este modelo de promotor privado é melhor ou pior do que o evento promovido por uma federação ou pela CBM?

 

Bruno Corano: Fora do Brasil o esporte só evoluiu e se tornou mais organizado quando surgiram as ligas independentes os eventos passaram a ser privados e este é o caminho natural e inevitável. A Moto GP é assim, a Superbike mundial é assim, nos Estados Unidos não só o automobilismo, mas todos os esportes são assim e por lá as confederações praticamente morreram por conta do surgimento das ligas.

 

NdG: Aqui no Brasil a CBM e as federações estaduais ainda existem. Como é a relação de vocês com eles?

 

Bruno Corano: Embora eles não nos homologuem por termos esta independência legal e um vínculo direto com a FIM, nossa relação com a CBM é muito boa e é assim com as federações nos estados também. Eles não atrapalham, não tentam criar dificuldades para a realização dos eventos e nós tentamos buscar uma união de esforços para termos eventos ainda melhores, mas a gente ainda não conseguiu ver um modelo.

 

NdG: A gestão passada da CBA – e nisso nós trabalhamos junto aos interesses dos pilotos – incentivou a criação de uma associação de pilotos e esta tem direito a voto na eleição para presidente da entidade. Vocês já pensaram em se articular para vir a dirigir vocês a CBM?

 

Acho que estamos no caminho certo. No mundo todo o esporte evoluiu com as ligas e sem a política.

 

Bruno Corano: Eu sou um cara que tenho aversão a política. Não tenho muita paciência ou interesse. O que me parece é que os outros pilotos não tem este interesse. Hoje nós temos uma situação muito estável. Tudo que um piloto quer é um ambiente tranquilo e organizado para poder competir e ter prazer naquilo que faz e isso ele tem aqui. Acho que por isso que nunca surgiu um movimento neste sentido ou tenha sido articulado algo pelos pilotos.

 

NdG:  Quando surgiu o Superbike Brasil, quase na mesma época surgiu um outro evento nacional de motovelocidade, o Moto 1000GP. A existência de dois eventos relativamente similares ajudou ou atrapalhou o desenvolvimento do esporte?

 

Bruno Corano: Acho que o Superbike Brasil já tinha dois anos de existência quando foi criado o Moto 1000GP. A minha visão pessoal é a de que não caberiam dois eventos concorrentes no Brasil. No meu entender um deles teria que encerrar as atividades. Sendo comprado, falindo, fundindo-se, de alguma forma. Não importa. Na minha humilde visão só atrapalhou por desagregar e desunir os pilotos e dividisse grids, embora o nosso grid fosse muito maior, cerca de 2/3 maior, era uma divisão e se estivessem todos num evento apenas, teríamos mais força, grids maiores, mais representatividade. Havia também a divisão da mídia e dos patrocinadores, embora nunca tivéssemos deixado de ter o apoio dos nossos patrocinadores, as fábricas de motos sempre estiveram conosco Honda, Ducati Yamaha e Kawasaki nunca deixaram de patrocinar exclusivamente o Superbike. Eu vejo que esta divisão que houve por alguns anos não agregou, não amadureceu o mercado. Diferente de outros setores, onde a concorrência é saudável, promovendo ganhos e avanços, eu não vi isso acontecer enquanto tínhamos dois eventos concorrentes.

 

NdG: Você falou das montadoras de motos estarem envolvidas diretamente com o Superbike. Como vocês fizeram para conquistar e manter este apoio?

 

Bruno Corano: É um trabalho muito difícil, especialmente em momentos de crise econômica como o que estamos vivendo. O que nós observamos é que as empresas querem visibilidade, vender seus produtos. Seja o capacete, a moto, o pneu, tudo que é relativo aos usuários de motocicletas. A Superbike Brasil é uma grande vitrine para mostrar estes produtos. Se não tivermos visibilidade vai haver uma perda de valor da categoria para estes fabricantes. Felizmente nós temos conseguido visibilidade, nosso evento tem sido bem apresentado e é um evento de qualidade. Isso é fundamental.

 

NdG: Vocês tem uma exposição ao vivo na televisão? Já tiveram? Como expor a categoria e seus patrocinadores numa mídia que dá tão pouca exposição para o esporte a motor?

 

Desde o início, em 2009, sempre tivemos o apoio das fabricantes de motocicletas que vendem aqui no Brasil.

 

Bruno Corano: A gente teve a transmissão ao vivo do Superbike Brasil pela ESPN, ao vivo, desde 2009, quando começamos. Em 2014 nós mudamos para a FOX, mas continuamos ao vivo. Temos um canal no youtube que transmite todas as provas ao vivo. Nõs tivemos transmissão na Rede TV por 2 anos, era um canal aberto e este ano nós tivemos a temporada mostrada no Sportv. Por enquanto não é ao vivo, mas é o maior canal de esportes por assinatura e isso aumentou nossa exposição. Além disso temos uma exposição no programa Autoesporte na TV Globo, que é a emissora de maior audiência na TV aberta, com 4 a 5 minutos no programa. Acho que mais exposição que a nossa só a da Stock Car.

 

NdG: O regulamento do evento, tendo tantas categorias, foi pensado por vocês, promotores do evento, ou foi algo que segue estritamente regulamentos vindos de fora aprovados pela FIM?

 

Bruno Corano: O regulamento técnico foi criado por mim, o regulamento desportivo se assemelha ao regulamento do mundial de velocidade. No caso do regulamento técnico, é bem simples: categorias monomarca, equipamentos originais. Categorias multimarcas, o regulamento é livre, sem vistorias, cada preparador trabalha sua moto como quiser.

 

NdG: Você é promotor e é também piloto. Isso não gera conflito de interesses ou protestos dos concorrentes?

 

Bruno Corano: No inicio, sim, mas depois de dois ou três anos as pessoas perceberam que existe um sistema organizacional independente, onde diretor de provam comissários e administradores cuidam do evento independente de quem é o dono e os fabricantes, apoiadores, patrocinadores sempre perceberam que existe lisura então isso nunca foi um problema. Alguns pilotos no passado chegaram a comentar, mas isso foi superado e já há muito tempo não há questionamentos em torno disso.

 

NdG: Nos temos entre as categorias uma que tem crianças correndo. Como fazer uma categoria de formação de pilotos? Como vem sendo trabalhado isso?

 

Bruno Corano: Desde que eu comecei a correr, eu sempre ouvi que não existia categoria de base para formação de pilotos no Brasil e eu sempre tive vontade de criar uma. Depois que começamos com o Superbike Brasil, depois de passar alguns anos para o evento se estabilizar, começamos a trabalhar um meio de criar esta categoria, algo que eu acho importantíssimo porque se a gente não começar um trabalho de formação desde cedo, desde o início, vamos sempre viver de atletas que não vão ter tido uma boa formação e não terão como ter uma carreira profissional sólida, seja no Brasil ou no exterior. Daí surgiu a Junior Cup, que passou a chamar-se Honda Junior Cup quando a Honda decidiu patrociná-la junto com a Mobil e a Pirelli. Essa categoria tem gerado muitos frutos, com todos os pilotos que correm nas categorias ligo acima saíram de lá. Tem pilotos que saíram da Junior Cup e que hoje estão no mundial de motos como o Renzo Ferreira. O Lucas Torres que correu na Espanha e depois que voltou está aqui como um dos líderes da sua categoria.

 

NdG: Logicamente que todo jovem, todo menino ou menina que começa lá na Junior Cup sonha em correr um mundial, ficar famoso, vencer campeonatos, mas se ele ficar aqui na realidade de Brasil, é possível ele se tornar um profissional de motociclismo, e viver de motociclismo aqui no Brasil?

 

Precisamos investir na formação dos pilotos desde cedo. Fazemos como é feito nos principais centros do mundo.

 

Bruno Corano: Hoje os dez primeiros pilotos do grid já vivem só de motociclismo. A ideia é que os talentos que estão surgindo possam trilhar o mesmo caminho. Acredito que este número pode dobrar em quatro ou cinco anos.

 

NdG: Como você vê a condição dos autódromos brasileiros para a prática do motociclismo?

 

Bruno Corano: De um modo geral eles são bem ruins. Eles não estão estruturados para ter áreas de escape apropriadas para o motociclismo, o que os torna inseguros. Uns mais, outros menos, mas no geral, nenhum oferece condições 100% adequadas à prática do motociclismo. Este problema não é uma exclusividade do Brasil, outros também tem este problema. A Argentina e mesmo os Estados Unidos são exemplo disso. Aos poucos, e isso é um processo que eu acho que leva décadas, podem surgir pistas mais adequadas.

 

NdG: Havia uma grande expectativa com relação ao autódromo de Curvelo. Seus construtores diziam que a intenção era levar até a Moto GP para lá e homologá-lo junto a FIM, o que não aconteceu. A Superbike vai para Curvelo?

 

Bruno Corano: Por enquanto a gente não vê possibilidade de correr lá por vários motivos. Como temos poucas etapas durante o ano, variando entre oito e doze, dependendo da temporada, a gente sempre prioriza São Paulo porque o poder econômico e nossos patrocinadores estão lá. Fica difícil fazer muitas provas fora de Interlagos. Saindo de São Paulo, as empresas não estão presentes, os CEOs não vão, não temos os HCs. Assim, a maioria das etapas é em São Paulo. As poucas datas que usamos fora de São Paulo, usamos uma série de critérios, Proximidade, estrutura da cidade, aeroporto, hospitais, hotelaria, restaurantes. Olhando tudo isso, Curitiba, Londrina, Goiânia tem pistas melhores, cidades mais estruturadas e assim acabamos escolhendo estas cidades e não temos como ir para outros locais. Se fossemos, teríamos ainda Campo Grande, Santa Cruz do Sul e o Velopark. Locais que não temos ido, mas que já estivemos. Até onde sei, a FIM emitiu um caderno de adequações para eles lá em Curvelo. Acredito que eles farão o que foi pedido, mas neste momento o que mais pesa no caso de Curvelo é a falta de um aeroporto, de uma estrutura urbana melhor em termos de hotelaria e, evidentemente, o fato do autódromo ser ainda um pouco perigoso. Não que outros também não sejam, mas é um ponto que eu espero que eles consigam melhorar e se adequar o quanto antes.

 

NdG: Em termos de Superbike, o que vocês pensam ser preciso fazer para que o evento seja ainda melhor?

 

De uma forma geral os nossos autódromos no Brasil não são seguros para a prática do motociclismo.

 

Bruno Corano: Acho que todo evento tem as mesmas metas, que é gerar mais visibilidade, conseguir mais patrocinadores e retorno para poder investir mais e com isso ter mais público. São os pilares que a gente sempre trabalhou e vai continuar trabalhando.

 

NdG: Olhando para fora, vendo o mercado dos nossos países vizinhos, como está o evento Superbike para atrair pilotos de outros países, mostrar o evento para fora, e em termos técnicos?

 

Bruno Corano: Comparado ao que acontece na América do Sul, não há nada que se aproxime do que é feito aqui. A diferença de estrutura e organização é enorme. Nas Américas, o evento mais próximo seria o campeonato norte americano, mas eles são muito menores do que a gente em todos os sentidos. Público, visibilidade na mídia, número de equipes e pilotos. Nossa referência são os campeonatos britânico, italiano e espanhol. Estamos em um nível próximo a eles em termos de número de pilotos e equipes.