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A questão da formação PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Wednesday, 29 November 2017 22:10

Caros Amigos, duas semanas atrás o assunto da minha coluna foi o fato de que, no ano de 2018, o Brasil não terá pilotos disputando (até agora, ao menos, como titulares) o campeonato mundial de Fórmula 1, levando-se em conta a saída de Felipe Massa da categoria.

 

Desde antes do GP Brasil, quando o piloto brasileiro anunciou a sua “aposentadoria”, tenho lido e ouvido falar por todos os meios de imprensa críticas por todos os lados e de todas as formas quanto ao problema da não formação de pilotos aqui no Brasil, apontando todos os “responsáveis” possíveis e imagináveis. Meu questionamento passa por todos estes caminhos, mas aborda um outro que as pessoas parecem estar esquecendo.

 

Emerson Fittipaidi foi para a Europa em 1969 sem ter passado por nenhuma categoria de formação com apoio de nenhuma fábrica, com plano de carreira, pacotes de investimento e treinamento. Com seu talento nato, em menos de um ano e meio foi da Fórmula Ford para a Fórmula 1 e sagrou-se campeão do mundo com um número de corridas (25) que hoje são pouco mais do que uma temporada completa.

 

Nelson Piquet não teve nenhum programa especial de formação como kartista. Era um aventureiro das pistas, estradas, circuitos de rua e oficinas mecânicas. Rebocava seu carro na Fórmula Super Vê com uma Kombi e uma carretinha, esquema prosaico que também utilizou na Europa, correndo na Fórmula 3 europeia no primeiro ano e na Fórmula 3 inglesa no segundo. Antes do final deste segundo ano estava com contrato assinado com a Brabham.

 

Ayrton Senna foi um piloto basicamente “paitrocinado” em seus tempos de kartista. Não correu no Brasil, saindo do kart para a Fórmula Ford Inglesa 1600. No ano seguinte, foi para a Fórmula Ford 2000 e no terceiro ano foi a vez da Fórmula 3, vencendo os três campeonatos e sendo cobiçado pelas equipes de Fórmula 1, com uma condição melhor do que as dos campeões mundiais, mas sem nenhum esquema a dar suporte.

 

Nos anos 70 e 80 já existiam programas de investimento e formação de pilotos. O mais famoso deles era o da petrolífera francesa ELF, que fez com que a França tivesse uma grande quantidade de pilotos no grid. A Renault também tinha um programa de formação de pilotos, mas mesmo assim, pilotos de outros países conseguiam se sobressair.

 

É evidente que desde aqueles anos para o que temos visto há pelo menos 10 anos, muita coisa mudou. Os programas de formação de pilotos, os investimentos por parte de algumas montadoras e empresas tem interferido nas possibilidades daqueles que não tem acesso a esquemas vencedores. Seja por falta de recursos ou de conseguir entrar em um destes programas de jovens pilotos ou seja por, talvez, não ter o mesmo talento que pilotos de outros países... e talvez por isso eu venha a ser linchado em praça pública.

 

No início dos anos 2000 – mais precisamente em 2002 – a Fórmula Renault era uma das categorias de base com apoio de fábrica no Brasil e correram nela diversos pilotos que mostravam-se muito talentosos. Lucas Di Grassi, Allam Khodair, Sergio Jimenez, Marcos Gomes, Daniel Serra, Julio Campos, Renato Russo... na teoria, uma geração que seria, talvez, a melhor em anos. Dali sairia um campeão mundial de Fórmula 1... bem, Lucas Di Grassi foi campeão da Fórmula E e uma das estrelas do WEC, mostrando que talento não faltava naquela geração.

 

Contudo, na última corrida do ano, a organização da categoria trouxe o campeão europeu da categoria para participar da corrida de encerramento. Era um polonês chamado Robert Kubica. Onde já se viu polonês piloto de corridas? Não havia nenhum na história que tivesse uma participação minimamente relevante... não havia. Kubica nunca tinha corrido em Interlagos. Aprendeu a pista rapidamente, foi o mais rápido nos treinos classificatórios, cravou a pole position e, dada a largada, despachou o pelotão brasileiro, vencendo com enorme vantagem.

 

O campeão brasileiro, Sergio Jimenez, foi correr em 2003 na Inglaterra, na mesma categoria. Seu companheiro de equipe era um piloto “diferente”. Afinal, não era muito comum termos negros ou mulatos nos grids das corridas. Aquele jovem inglês era considerado um “tesouro”... e valeu cada libra investida em sua formação: Lewis Hamilton. Talvez ele tenha sido o grande ponto de mudança de rumo, junto com o que aconteceu, na mesma época, com Sebastian Vettel na Alemanha.

 

Jimenez, Hamilton e Vettel tinham talento para estar onde estavam. É verdade que os europeus tiveram uma estrutura diferenciada, que os levaram à Fórmula 1, mas a imagem do que aconteceu em Interlagos no ano anterior não podia calar a pergunta: será que os nossos pilotos não eram mais tão bons assim?

 

A pequena Nova Zelândia produziu três grandes pilotos nos anos 60: Bruce McLaren, Denny Hulme e Chris Amon. Hulme sagrou-se campeão mundial de Fórmula 1 pela Brabham em 1967, mas depois deles, o grande neozelandês que veio a conseguir algum destaque foi Scott Dixon na Fórmula Indy, mas este não conseguiu uma chance para chegar à F1, indo dos campeonatos da Oceania direto para os Estados Unidos. Nos últimos anos conhecemos Brandon Hartley, que sagrou-se bicampeão pela Porsche no WEC e agora está tendo uma chance na F1, na Toro Rosso. Hei de lembrar aos menos atentos que Hartley foi piloto do programa da Red Bull e foi dispensado alguns anos atrás.

 

Estes programas são particularmente verdadeiras universidades para que o piloto chegue à elite do mercado de trabalho e a cobrança é tremenda. Tivemos dois brasileiros que fizeram parte do programa da Red Bull desde seu início, nas primeiras categorias e que não tiveram seguimento: Pedro Bianchini e Felipe Fraga. Não vou julgar os dois ou tecer comentários sobre os métodos de Helmut Marko e sua equipe, mas o tratamento, a princípio, é o mesmo para todos.

 

Quando se fala em se fazer um programa de formação de pilotos nos padrões que vemos na Europa, na França, Alemanha, Itália e Inglaterra as pessoas se esquecem que estamos falando de países ricos, de economias sólidas, sem os nossos políticos e sem estarem atravessando a situação econômica que passamos desde 2008, agravada depois de 2014. Se a condição não fosse esta, já deveríamos ter estabelecida no Brasil uma Fórmula 4 com as mesmas especificações técnicas que a categoria FIA tem na Europa.

 

Se olharmos para as categorias de formação de pilotos, o kartismo brasileiro requer um investimento que a sociedade de uma forma geral não tem condições de arcar. Os melhores equipamentos são importados, os impostos são extorsivos, fazendo o custo de uma temporada com um equipamento de ponta podendo atingir algumas centenas de milhares de reais. As categorias de fórmula no Brasil tem carros defasados tecnologicamente, pneus “econômicos” e uma série de “idealistas” que querem correr com pneu radial e carros feitos nas garagens de casa. Infelizmente as coisas mudaram, e muito!

 

Enquanto não tivermos uma economia sólida, empresas nacionais apostando em um projeto que vá da base ao topo, fazendo uma escada técnica e meritológica, sem cabides de emprego e desvio de dinheiro e que, enquanto não tivermos uma estrutura no país, consiga levar os melhores kartistas para as categorias de base na Europa. Conseguir expor e conquistar este apoio brasileiro é fundamental.

 

A complexidade desta questão da formação exige muito mais trabalho do que um simples discurso de teclado ou da boa vontade daqueles que tentam fazer automobilismo no país aos trancos e barrancos.

 

Um abraço e até a próxima,

 

Fernando Paiva