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Entrevista: Victor Franzoni PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Monday, 22 January 2018 23:28

As categorias de acesso do automobilismo brasileiro desde o final dos anos 90 vem passando por um esvaziamento e por projetos que não duraram muito tempo. A Fórmula Chevrolet – iniciada em 1992 – encerrou suas atividades em 2001. Como sua sucessora tivemos a Fórmula Renault, que foi disputada entre 2002 e 2006.

 

Foram três temporadas se mua categoria de Fórmula para iniciantes até que, em 2010, Felipe Massa, com apoio da Fiat, trouxesse para o Brasil a Fórmula Futuro. A categoria só teve duas temporadas, mas no campeonato de 2011 surgiu um piloto que além de talento parecia ter “aquele algo mais” que costumamos esperar. Victor Franzoni, com apenas 15 anos na época, tornou-se o mais jovem a vencer em uma categoria profissional no Brasil ao completar na frente a segunda prova da etapa de Interlagos daquele ano.

 

Sem ser filhos de pais ricos (seu pai, Fabio Franzoni é um apaixonado por corridas É Engenheiro Eletrônico e era “kartista de final de semana” antes de ver o potencial do filho, que conquistou títulos paulistas e nacionais em seus anos de kart, a família apostou no talento do menino que não mede esforços para levar seu sonho adiante. Depois de uma passagem pela Europa com muitas dificuldades, mudou seu foco para o automobilismo norte americano e em 2017 venceu o primeiro degrau, do programa “Road to Indy”, sagrando-se campeão da Pró-Mazda, o que deu a Victor uma temporada com tudo pago na Indy Lights para 2018.

 

Para se manter nos Estados Unidos Victor faz de tudo. Trabalha como mecânico, dá treinamento para pilotos, o chamado “coaching”, literalmente corre atrás de seu sustento e, no ano passado, precisava colocar dinheiro no esquema da equipe para continuar correndo, coisa que desde a ida de Nelson Piquet para a Europa não se tem relatos.

 

Foi com esse guerreiro paulistano de 22 anos, filho único, focado em tempo integral, que está conquistando a América que nós conversamos no final do mês passado em Interlagos, quando ele foi correr m dupla com seu pai, participante da Old Stock Racing.

 

NdG: Seu pai corria de kart, por prazer. Até onde isso te influenciou para querer ser piloto?

 

Victor Franzoni: Eu ganhei um kart quando tinha 4 anos de idade. Meu pai corria e eu ia nos finais de semana ver as corridas. Não entendia nada, claro, mas aquilo mexia muito comigo e meus pais viram isso. Eu fiquei muito feliz e nas primeiras idas ao kartódromo eles viram que eu estava feliz ali e eu estava feliz. Foi uma paixão imediata e dali em diante era o que eu queria fazer. Nossa “equipe” éramos nós três. Eu, meu pai e minha mãe. Não tinha mecânico, preparador, éramos nós e aquilo nos uniu ainda mais. Era nosso evento de família. Tem famílias que vão ao cinema, ao parque e a nossa ia pra pista.

 

NdG: A gente sabe que automobilismo não é barato e mesmo desde o kart, pra andar na frente tem que ter equipamento. Como vocês bancavam isso?

 

O meu pai era kartista de final de semana e quando eu comecei ele parou. Eu, ele e minha mãe eramos a equipe.

 

Victor Franzoni: Quando eu comecei a correr meu pai parou, ele viu que ficava melhor como mecânico (risos) e a gente corria atrás de quem pudesse ajudar. Eu sempre treinei muito para ter certeza de que me sairia bem e que teria bons resultados e muita gente ajudou nessa caminhada. Lá no kartódromo acho difícil lembrar de alguém que não ajudou a gente com alguma coisa. As vezes eu ganhava a inscrição, as vezes era um jogo de pneus... e isso ajudou muito. Quando cheguei na categoria Cadete eu corria pela equipe da Techspeed, então não precisava pagar pelo equipamento. Quando foi pra Júnior Menor fui chamado pela Birel e com isso continuei ganhando um bom equipamento para correr. Era meu pai quem fazia os motores e nisso a gente já economizava bastante na mão de obra e ele também trabalhava no chassi junto com minha mãe. Isso reduziu muito os custos pra poder competir. Foi assim que consegui bancar minha carreira e isso acabou sendo um exemplo que uso até hoje. No ano passado, por exemplo, trabalhei 200 dias de graça para custear meus pneus e minha inscrição na temporada da Pró-Mazda.

 

NdG: Depois do kart, por seus resultados, você foi correr na Fórmula Futuro e com desconto. Como você viu aquele projeto? A escolha foi pelo desconto ou houve outro tipo de consideração?

 

Victor Franzoni: A gente não tinha planos definidos, mas como eu ganhei o brasileiro de kart na categoria graduados em 2010 e o prêmio era 80% de desconto na temporada de 2011 da Fórmula Futuro. Era a melhor opção a ser tomada. A categoria tinha carros novos, era tecnicamente boa e tinha tudo para ser uma categoria de sucesso. Infelizmente, por outros aspectos, não teve o sucesso esperado, mas era uma oportunidade muito boa para quem saia do kart. Eu não entendo porque a categoria não teve continuidade, mas eu lembro de muita gente falando mal e sem conhecer a categoria, que para mim era muito boa. Foi meu primeiro passo como piloto após o kart. Eu era muito rápido, mas era “muito louco” (risos). Cometi muitos erros durante a  temporada e com isso desperdicei a chance de ser campeão, perdi o título para o Guilherme Silva, mas foi o suficiente para me animar para dar outros passos, especialmente porque eu chamei atenção e consegui o patrocínio que me levou para a Europa.

 

NdG: Até algum tempo atrás a grande maioria dos meninos e meninas que sentavam em um kart tinham o sonho da F1 na cabeça. Você também tinha esse sonho?

 

Victor Franzoni: Claro que tinha sonhos de chegar numa categoria top como é a Fórmula 1! Eu sempre tive este sonho e não tem como entrar neste meio sem um sonho, um objetivo. Só que as vezes a gente não consegue levar o sonho adiante. Veja o caso de alguém que entra numa empresa, num ramo fora do automobilismo. Ele quer crescer, se ele não sonhar em crescer, em vir até mesmo ser o presidente ele nunca vai dar o máximo de si. O “sonho Fórmula 1” sempre existiu, mas ele não era algo do tipo “tudo ou nada”. Meu sonho era poder viver do automobilismo. Ser um piloto profissional, remunerado, bem pago, ser um dos tops do mundo. Se for na Indy ou na Fórmula 1, quero ser um dos 50 melhores pilotos do mundo. Isso é mais que um sonho, hoje. É um objetivo e é uma luta dia a dia.

 

NdG: Seu primeiro caminho para o exterior foi a Europa. O que você encontrou por lá? Como foi a adaptação às coisas do automobilismo por lá?

 

A gente teve muita ajuda de muita gente. Ganhei inscrição, jogo de pneus e consegui correr por algumas equipes de kart.

 

Victor Franzoni: Como disse eu consegui este patrocinador que apostou em mim e investiu para que eu fosse correr fora do país. Chegando lá eu vi que havia uma diferença bem grande. Era um outro mundo e ir para outro país, outro continente aos 15 anos sem a família, estando lá sozinho foi uma situação que eu nunca tinha vivido. Acho que isso tudo pesou para eu não ter conseguido resultados melhores. Além disso, quando se é muito novo nem sempre a gente foca nas coisas certas, reconhece os erros que comete e isso acaba cobrando um preço. Foi uma experiência de vida, aprendi com o que vivi, mas eu me adaptei melhor aos Estados Unidos.

 

NdG: Você quando foi para os EUA já era um pouco mais velho. O que você percebeu de diferença no ambiente de trabalho entre o que encontrou na Europa e nos EUA?

 

Victor Franzoni: A maneira que eles trabalham é bem diferente. Na Europa a forma como eles trabalham é um pouco estranha, tinha coisas que ficavam escondidas dos próprios pilotos e eles falavam aquilo que consideravam importante pra ser falado. Pra mim era muita frescura. Eu gosto de sentar no carro, ir pra pista, sentir o carro, voltar para os boxes conversar com o engenheiro, com os mecânicos e encontrar o melhor acerto do carro para andarmos o mais rápido possível. Lá tinha um monte de engenheiros, um monte de mecânicos, um escondia coisa do outro pra ficar no carro do teu companheiro de equipe. Lá nos Estados Unidos, não. É tudo igual pra todo mundo na equipe, a telemetria é mostrada para os dois pilotos da equipe e o trabalho é aberto. Quem chegar na frente, chegou.

 

NdG: Você foi para os EUA com 18 anos, um pouco mais velho, com uma bagagem maior. Como foi a adaptação da vida do dia a dia por lá?

 

Victor Franzoni: Quando eu fui para lá já não tinha essa de patrocinador bancando tudo, eu tive que buscar meio de sobreviver por lá e era corrida todo final de semana, correndo ou trabalhando. Não sobrava muito tempo e eu fui fazendo meu caminho trabalhando de mecânico, fazendo ‘coaching’, mexendo com kart, com fórmula, com carros de turismo e ainda hoje a vida é assim. Vim passar uns dias com a família no final do ano e em janeiro já volto para essa rotina.

 

NdG: O trabalho de ‘coaching’ não é um trabalho fácil e o ‘coach’ precisa ter um currículo, um nome. Como você conseguiu conquistar este espaço nos EUA?

 

Victor Franzoni: Os resultados que você consegue na pista são a melhor propaganda. Se você anda bem outras pessoas vendo isso acabam te chamando para ser o treinador e se você tem habilidade para transmitir ensinamento e teu aluno começa a andar bem você começa a ficar conhecido. Se você já é um piloto de nome, fica mais fácil ainda. Eu gosto muito de trabalhar com ‘coach’, pra mim é muito bom poder ajudar alguém, ensinar alguém a melhorar e ver a pessoa que você tá ensinando andar mais e mais rápido é muito bom. Hoje eu posso ensinar coisas que eu não tive quem me ensinasse e eu aprendi da forma mais difícil.

 

NdG: Você faz ‘coaching’ para kartistas nos EUA. Você correu alguns bons anos aqui no Brasil. Como você vê o nível do kartismo nos EUA em termos de estrutura, organização comparado com o que você viu aqui em São Paulo, nosso grande centro?

 

Na Europa o jeito de trabalhar deles é meio estranho. Nos Estados Unidos as coisas são mais as claras.

 

Victor Franzoni: Não tem muita diferença... os motores lá são diferentes dos daqui. A estrutura das equipes é um pouco melhor que as nossas, mas lá tudo é muito mais barato. Uma boa barraca custa 20 mil dólares, aqui uma parecida custa 100, 120, 150 mil reais. Então fica mais fácil ter uma estrutura melhor. Em termos de nível técnico não tem diferença, tem pilotos muito bons, outros nem tanto, como em qualquer lugar que você for. Qualquer categoria vai ter uns 5 pilotos que são os top e vai ser difícil andar como eles.

 

NdG: Enquanto correu na Fórmula Futuro você correu em alguns autódromos aqui no Brasil. Na Europa você correu em autódromos que não eram de F1 também como é Interlagos e nos EUA, em outros autódromos e nos ovais... Como foi vero muro crescer na tua frente?

 

Victor Franzoni: Assusta bastante! Nas primeiras voltas dá um certo medo, mas eu fui me adaptando e hoje eu me sinto melhor, gosto mais, andando em ovais do que em circuitos normais. É uma pilotagem difícil e tem que ter muita coragem. Quem hesita não consegue virar tempo. A classificação é um carro por vez e você tem que sair dos boxes já acelerando, tendo que aquecer o pneu e dar uma volta lançada, sem direito a erro e isso eu vi ser mais desafiador do que classificar e correr num autódromo normal.

 

NdG: Como é que os americanos recebem os pilotos que vão buscar fazer uma carreira por lá?

 

Victor Franzoni: Acho que depende da categoria. Na NASCAR eu acho que eles não parecem receber bem, de forma muito aberta, quem vem de fora. É uma categoria bem americana, com um público bem americano. Eu fui assistir algumas corridas e é um ambiente diferente, um público diferente, o grid é todo americano, os patrocinadores são bem direcionados... eu não vi nenhuma discriminação, mas é diferente e não acho isso ruim. Eles gostam do que fazem, do jeito deles e se tivesse isso no Brasil não ia ser ruim. Já na Indy não é assim. Este ano de 2018 eu sou piloto oficial da Mazda por ter ganho o campeonato de 2017 e eles gostam de pilotos de outras nacionalidades. Na equipe tem eu, um americano e um irlandês.

 

NdG: 2018 é um ano de mais um grande desafio: categoria nova, equipe nova, como estão as tuas expectativas?

 

A primeira vez que eu vi o muro deu medo, mas hoje eu me sinto mais à vontade correndo nos ovais que nos mistos.

 

Victor Franzoni: A equipe é a mesma – a Juncos – uma vez que eles fazem um caminho para você ir subindo de categoria e agora eu vou para a Indy Lights. Eles são da Argentina e eles trabalham de uma forma bem parecida com a gente no Brasil. Isso é muito bom, fica mais fácil e o ambiente é bem legal. Eu já fiz alguns testes no carro e é o carro mais rápido que eu já andei até hoje, é muito rápido e potente. Eu não tenho como e não posso pensar em não ganhar. Preciso ganhar corridas e vencer o campeonato para poder chegar na Fórmula Indy. Em 2017 era minha última chance. Eu precisava ganhar o campeonato para subir de categoria e continuar correndo e este ano vai ser a mesma coisa: eu preciso ganhar o campeonato para continuar correndo. Se eu não ganhar vou ter que arranjar mais pilotos pra fazer ‘coaching’ ...

 

NdG: Você vê o caminho para se tornar um piloto internacional nos EUA mais simples do que o caminho na Europa?

 

Victor Franzoni: Não posso dizer que seja mais simples, mas é mais receptivo. Na Europa é preciso mais dinheiro e as vezes, mesmo com dinheiro eles te passam para trás, parecem não dar valou para o piloto e nos EUA eles dão valor ao piloto. Mas é preciso saber que nos EUA é preciso trabalhar muito. Lá não adianta chegar com um monte de dinheiro e não mostrar resultado na pista. Mesmo que você tenha o dinheiro eles vão dar mais atenção ao piloto que trabalhar mais e mostrar mais capacidade. Se a gente ver o que andou acontecendo na Europa, quantos pilotos chegaram lá com um caminhão de dinheiro e tiveram tudo nas mãos. Veja como são as equipes na Indy. A Andretti, a Penske, a Ganassi. Eles tem muito dinheiro e não precisam do teu dinheiro. Eles querem que você vença.

 

NdG: Pelo que você viu, em termos de custo, entre a Pro-Mazda e uma categoria como uma F. Renault ou uma F3 na Europa, qual tem o custo mais alto por temporada?

 

Victor Franzoni: Já foi mais barato correr nos Estados Unidos, mas com a mudança dos carros o valor ficou bem parecido e o nível técnico de equipamento é semelhante. A diferença é ter menos categorias nos Estados Unidos do que na Europa. Se o piloto quiser chegar na Fórmula Indy são três categorias. F2000, a Pro-Mazda e a Indy Lights. Na Europa tem mais de um caminho e se o piloto for pelo caminho errado pode ficar num beco sem saída além de só conseguir ir correr onde o dinheiro que ele tem der para fazer a temporada.

 

NdG: O grid da Indy Lights no ano passado era um grid relativamente pequeno, com 13 carros em média. Em 2018 vão ter mais carros no grid? O que você tem visto de movimentação de bastidores?

 

Victor Franzoni: É uma categoria complicada, ela não é barata e os organizadores tem trabalhado para manter a categoria ativa e forte. O carro é um Dallara, um carro tecnologicamente de ponta, com um motor forte e que exige que o piloto seja muito bom. É uma categoria cara e o americano tem uma coisa deles que se for para correr sem chances de vencer, eles não vão. Eu espero que o grid tenha algo entre 15 e 20 carros e, se tiver, serão 15 ou 20 com chances de vencer.

 

NdG: Em chegando na F. Indy, quem você gostaria de enfrentar no “mano a mano?

 

Eu gostaria muito de um dia correr contra o Alonso. Ele é meu ídolo e foi o melhor piloto que eu vi correr.

 

Victor Franzoni: Eu gostaria muito de enfrentar o [Fernando] Alonso. Ele sempre foi meu ídolo e se eu chegar na Indy ele voltar a correr lá vai ser um grande desafio. Para mim ele é o melhor que eu vi correr e ter a chance de correr contra ele seria demais.