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Entrevista: Paulo Nobre e Edu Paula PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Friday, 30 April 2010 08:44

 

 

 

A estrutura da equipe de Paulo Nobre e Edu Paula. Torcedor do Palmeiras, a equipe tem as cores do time e um porco de mascote!

 

Durante a etapa do IRC no Brasil, no início de março, tivemos a oportunidade de conversar com a dupla brasileira que está disputando o campeonato mundial de rally com carros de produção, o PWRC, Paulo Nobre e Edu Paula.  

 

Paulo Nobre, o Palmeirinha como é mais conhecido, é natural de São Paulo. Pilota no Rally desde 2003 e cross country desde 2001 (Rally é velocidade e regularidade. Paris Dakar / Sertões, etc é cross country, ele fez questão de frizar).  

 

Edu Paula, um veterano das trilhas, correndo desde 1981 e que fez uma das melhores duplas do país ao lado de Tino Viana, é um experiente navegador. Juntos desde 2006, Paulo Nobre e Edu Paula concederam esta entrevista ao final do ultimo dia dos levantamentos para a etapa curitibana.  

 

NdG: A experiência de Brasil que ambos tem é vasta, e fora do Brasil, no que vocês já correram? 

 

Edu Paula: Apesar de ter começado antes, eu tenho menos experiência de corridas no exterior que o Palmeirinha.

Paulo Nobre: Na verdade o Edu já correu muita etapa de sulamericano em uma época que eu nem sonhava que rally existia. Em Rally eu estreei em 2003. No Cross Country eu comecei em 2001 aqui no Brasil e, de mundial, eu corri os mundiais de 2006 e 2007, tendo feito dois Dakar. Agora, em rally, a minha primeira experiência em rally foi em 2005, correndo com a Patty Romanatti, onde nós vencemos o sulamericano na categoria N2. Agora, fora da América do Sul, a primeira experiência foi no ano passado, no país de Gales, correndo no PWRC e este ano, começamos com o Rally da Suécia. 

 

NdG: A gente, o leigo, o leitor que gosta, consegue ler hoje alguma coisa de rally fora do Brasil mais voltado para o WRC. Pouco se fala das outras categorias, infelizmente. Agora estamos vendo o IRC novamente aqui em Curitiba, lendo sobre vocês no PWRC... Como funciona esta divisão? É categoria de acesso, como divisões, é um sistema de transição como já lemos algo? Por favor, ajudem-nos... 

 

 

Edu Paula explicou as diferenças entre as categorias no mundial e os planos da FIA para baratear os custos e segurar as fábricas.

 

Edu Paula: É assim: o WRC tem os carros mais potentes. Depois existem 3 outras categorias, dentro do campeonato mundial: o PWRC, que é o campeonato mundial dos carros de produção, ou seja, aqueles carros que não tem muita preparação. Depois tem o Super 2000 ou SWRC, que é um campeonato iniciado este ano, onde os carros tem tração integral, motores 2.0 e que serão a base dos carros que serão usados no WRC no ano que vem, visando baixar os custos da categoria. O terceiro é o JWRC, que tem carros com motor de 1600cc, tração 4x2 e que os pilotos tem a idade limitada a 23 anos. Esta seria a categoria de acesso ao mundial. As outras dias, correm em paralelo com os carros do mundial, com carros menos potentes, menos preparados e mais baratos. 

 

NdG: E o IRC entra aonde? 

 

Edu Paula: O IRC é na verdade o “International Rally Challange”. Essa é uma categoria diferente, onde os carros que correm são os carros dentro das especificações do SWRC, mas que também tem carros 4x2 disputando as provas, numa disputa paralela. Trata-se de um campeonato mundial por ir a todos os continentes, mas que não tem o status de ser o mundial da categoria, este, no caso é o WRC. Se formos fazer um parâmetro com o futebol, o WRC é o campeonato e o IRC é a copa, mas ambos a nível mundial. 

Paulo Nobre: Se formos usar um parâmetro no automobilismo, o WRC estaria para a Fórmula 1 e o PWRC, que mesmo sendo carros de produção, são carros que tem uma potência na faixa dos 300cv, tanto o Mitsubishi Lancer como o Subaru Impreza, estariam como para uma GP2 ou uma Indy. Estes carros, ambos, quando a pessoa os compra numa concessionária, estão comprando um carro que está mais para um carro de rally mesmo do que para um carro de rua. São carros muito fortes, de suspensão bem dura, quase como se tivessem sido concebidos para o rally. Os carros do SWRC tem carros que não possuem originalmente a tração integral. Estes carros (Citroen, Skoda, Fiesta, etc) são transformados em protótipos, com tração integral, mas sem o motor turbo. No ano passado o PWRC incluíam os carros do Grupo N (Subaru e Mitsubishi) e os SWRC. Só que o desenvolvimento das fábricas é tão grande que logo passou a não ter mais competição entre os dois tipos de carro e aí o SWRC foi desmembrado. 

 

NdG: No ano passado a Subaru e a Mitsubishi deixaram o WRC alegando questões de custo. Nesta nova categoria, mais barata, quem corre tem apoio de fábrica? Existe equipe oficial? Semi oficial? Ou é tudo equipe privada? 

 

Paulo Nobre: No PWRC, onde elas correm, são todos privados. No SWRC, que tem uma estrutura mais em conta, com meios de restringir os gastos e que os dirigentes estão tratando como o futuro do WRC e é nessa categoria que as fábricas estão apostando como continuidade para o rally. Vai ser um processo de transição, onde serão usados no ano que vem, motores 1.6 turbo, que mesmo sendo menores, serão mais potentes que os motores de hoje, os 2.0, e... bom, eu prefiro deixar o Edu falar sobre isso porque ele segue estas coisas do regulamento quase como uma religião (risos)... fala aí... 

Edu Paula: (risos) é, como o Paulo falou, e os caras estão realmente voltados para o futuro porque a escalada de custos estava muito alta. Com isso eles querem manter as montadoras apoiando a categoria, seja de forma direta ou de forma indireta. 

 

NdG: Já que entramos no “universo FIA”, como é o esquema em que vocês correm o PWRC? 

 

Paulo: "Meu companheiro de equipe, o Patrik Sandell é um piloto 'top de linha'. Tem sido um aprendiado poder andar com ele". 

 

Paulo Nobre: A equipe é uma equipe austríaca chamada BRR, a Baushlanger Rally Racing, que tem o nosso carro no PWRC (um Mitsubishi Lancer Evolution X), e o carro do Patrik Sandell e do Emil Axelsson, no SWRC, um Skoda. Muitos de nossos mecânicos são Tchecos, pois a Skoda dá um bom apoio, tem um bom corpo técnico, tanto de mecânicos, como de pessoal da eletrônica... eles são muito profissionais, estão sempre em cima do carro. Tudo que a gente pede eles não deixam pra depois, caem dentro mesmo. Tudo que o navegador pede para ficar mais à vontade eles fazem, nem questionam, com os pilotos é a mesma coisa, esmo que seja apenas uma mania, por que piloto é cheio de mania (Edu Paula começou a rir, discretamente), eu tenho as minhas e todo mundo tem também e eu fiz com que eles colocassem uma bandeira do Palmeiras no carro e eles tiveram entender isso e que colocar (Tino Viana, parceiro de Edu Paula por vários anos e que estava acompanhando a entrevista, além do próprio Edu não seguraram mais o riso) a minha bandeira do Palmeiras no carro (Nota dos NdG: A equipe de Paulo Nobre no IRC chama-se “Palmerinha” e tem como símbolo um simpático porquinho verde). É bacana a preocupação com o psicológico, com o bem estar que se dá na equipe e o próprio dono, que foi sete vezes campeão austríaco como piloto sabe como é importante o piloto se sentir bem no carro. Nós vimos o quanto a equipe trabalhou no nosso carro e no do Sandell, principalmente no dele que desgasta muito mais o carro, pois ele anda muito mais forte que eu e quando ele pede alguma coisa para o apoio é algo muito sério e eles resolvem. Além disso, tem as reuniões onde a gente tem momentos de discussão, mas também momentos de apoio e que são muito importantes para o funcionamento da equipe. Está sendo fantástico correr com eles e eu estou muito satisfeito, muito feliz. 

Edu Paula: Realmente, eles são muito bons, muito bem estruturados, mas a gente aqui no Brasil, com a nossa equipe não devemos muito lá pra eles, não. A única diferença grande que eles tem em relação a nossa aqui no Brasil é que eles tem mais facilidade de conseguir peças e sobressalentes que não temos aqui, que são importadas, que leva meses para vir, pra liberar na Receita Federal... 

Paulo Nobre: E a equipe é revendedora da Mitsubishi na Europa... imagina a facilidade que eles tem para conseguir as coisas. Agora, uma curiosidade: Aqui nosso carro é um Evo IX, lá, um Evo X. Com resistores de 33mm eu não sei ainda como está o nosso carro, que vou usar agora pela primeira vez. No ano passado, com o de 32mm, o Evo IX era muito mais forte! A preparação do nosso carro aqui é simplesmente top! 

 

NdG: Correr no exterior é caro, todo mundo sabe... como foi o processo de viabilização deste projeto? 

 

Paulo Nobre: No cross country eu corria na equipe oficial da BMW e, graças a isso, consegui fazer muitos contatos no meio automobilístico fora do Brasil, assim, de uma maneira geral. A gente estava com intenção de montar um Lancer Evo X, mas as taxas aqui no Brasil são tão elevadas que deixavam o projeto quase inviável. Assim, a idéia era alguém montar este carro com uma preparação top e depois a gente conseguir trazer este carro para o Brasil por importação temporária pra correr o campeonato aqui. Nisso ele faria as revisões fora, voltaria no ano seguinte... foi assim que nós conhecemos o pessoal da BRR, indicação do pessoal da BMW, o nosso manager fez a ponte, o contato e nisso conversamos sobre a montagem do carro lá. Neste ínterim, fomos conhecer a equipe, eu fui fazer uns dias de teste com o carro e com o dono da equipe e ele começou a me convencer de fazer umas provas por lá. Eu achava loucura, apesar de ser um sonho. No fundo, eu pensava que isso “não era pra gente”. Eu sei que ele me atiçou e quando voltei para o Brasil, fui conversar com o Edu para a gente correr a etapa do País de Gales. Ele, que é fanático por rally, topou na hora, aí fomos correr a etapa e este ano, como conseguimos viabilizar um patrocínio novo, de uma corretora de valores, a Link Investimentos, feita por gente jovem, de perfil agressivo, e que gostou do projeto que apresentamos. Na verdade, eles adoraram... depois é que foram ver como é que iriam viabilizar o negócio. Um dos sócios fez o ‘Sertões’ de moto então já tinha o ‘espírito’.  Assim, foi viabilizado este projeto de ser a primeira equipe brasileira a correr regularmente no mundial de rally, correndo na neve, no deserto... aquelas coisa que a gente via em revista, na TV e que nós agora fazemos parte. 

 

NdG: Nesta “descoberta” do mundial de rally, como foi deparar-se com a maneira deles de fazer rally? Como é o nível das especiais, as exigências, os deslocamentos? E os adversários? 

 

Paulo: "A estrutura do rally na Europa é toda profissionalizada, inclusive os pilotos. Aqui anida não chegamos neste nível" 

 

Paulo Nobre: Os adversários é algo bem diferente do que se tem aqui no Brasil. Eles são profissionais do rally, ou semi profissionais, que conhecer aqueles trajetos todos, pois é comum haver repetições de trajetos, ou seja, é completamente inviável querer disputar com eles, no mesmo nível, na primeira temporada. Posso até dizer que, se a gente ganhar uma prova, foi porque os caras bateram ou quebraram. No momento ainda não dá pra competir de igual para igual. Isso leva tempo e o nível deles é altíssimo. Da parte de prova, as especiais, aqui no Brasil a gente tem algumas com um nível de exigência tão grande quanto as de lá, quando o rally é bem organizado. A diferença é que lá é muito maior. Aquilo é uma maratona. A gente chaga a fazer 700 / 800 Km num dia. Na Suécia nós fizemos 1800 Km em 3 dias. Era levantar às cinco e meia da manhã e ir dormir depois das dez e meia da noite. É muito extenuante e totalmente diferente do que nós já fizemos aqui no Brasil.

Edu Paula: Essa é a grande diferença numa etapa de mundial. Da terça-feira quando começam os levantamentos até  domingo, você come, dorme e respira rally.  

 

NdG: Edu, essa parte que é vital para o rally que é a sinalização, a planilha, como é que é uma planilha de rally de um mundial? Difere muito da que se faz aqui? Existe um padrão internacional determinado pela FIA ou algo do gênero? 

 

Edu: "Fazer levantamento em um rally como o do País de Gales é muito fácil. Nem precisa do livro de bordo. Dá até raiva(risos)".

 

Edu Paula: Fora estas duas provas do PWRC, nós já fizemos algumas provas aqui no continente, em sulamericano, e tem diferença sim. Varia de país para país, até mesmo aqui, no Brasil se encontra variação, dependendo da organização. A grande diferença está na organização. Eles tem um esquema muito mais profissional, são muitos anos e é nos detalhes que eles fazem coisas que realmente funcional e faz a coisa fluir mais fácil.

Paulo Nobre: Mesmo lá, não existe um “padrão”... nós vimos diferenças entre a organização dos britânicos e a dos suecos. A fama dos britânicos é algo que existe e é sério. É tudo tão sinalizado, tudo tão arrumado que dá até raiva (risos).

Edu Paula: A gente tem um livro de bordo pra fazer levantamento... nem precisa abrir. Pode deixar de lado que, saindo do ponto de partida, você vai saber exatamente o que fazer, por onde seguir... é impressionante. 

 

NdG: Na abertura do mundial este ano vocês enfrentaram um tipo de piso que não se encontra aqui no Brasil: gelo e neve. Como foi encarar este desafio? Vocês já tinham passado por esta experiência antes? 

 

Paulo Nobre: Na semana anterior ao rally eu foi para a cidade onde vive o Patrik Sandell, que é sueco de Östersund, e aí eu fiz dois dias de testes na neve para “perder a virgindade” e sentir como a coisa funcionava. Durante a prova eu fui um pouco mais conservador do que no treino, contudo, eu percebi que existem dois tipos de rally distintos quando se corre na neve: um é quando a gente está com as rodas dentro dos trilhos, feito pelos carros que passaram antes. Ali o “grip” é muito maior do que o que se tem correndo na terra, por exemplo. Se o carro está a 200 por hora e o piloto ‘chegar’ no freio, o carro vai parar. O outro caso é quando se coloca as rodas fora do trilho. Quando se pega aquela neve fofa, que foi jogada pra fora do trilho, a aderência e menor do que quando se anda na lama, por exemplo. Então é assim: se sair um pouquinho do trilho, você vira passageiro e vai parar onde Deus quiser! Esta foi a diferença que eu senti e posso até dizer que todo piloto que é “bom de neve”, é “bom de terra”... mas a recíproca não é verdadeira. Ele pode vir a ser ou não. Uma outra coisa que foi interessante nesse rally foi o conselho do Patrik para a gente comprar uns óculos amarelos, tipo daqueles do pessoal do snowboard. Quando a gente coloca os óculos parece que acendeu a luz. Todos os contornos ficam mais nítidos, se consegue ver as imperfeições da trilha... é uma coisa incrível. Para o Edu, que precisa ver detalhes e falar pra mim foi de uma valia enorme. A gente pensou até que era brincadeira, mas na prática viu o quanto ajuda.

Edu Paula: As definições que você tem usando os óculos é incrível. Se consegue ver as diferenças naquele lugar todo branco... porque é tudo branco mesmo! Dos lados se vê as árvores que tem o troco e a parte verde dos pinheiros e o resto é branco. Com os óculos ficam nítidos os contornos e se vê onde tem mais ou menos neve. A noite então é impressionante... e a gente usava aqueles óculos da manhã até a noite. 

 

NdG: Os outros pilotos usavam estes óculos também? 

 

Paulo Nobre: Os locais sim.

Edu Paula: Alguns sim, outros não.  

 

NdG: Estar hoje no PWRC permite a vocês sonharem, no sentido almejar, estarem um dia na categoria principal, correndo contra o Loeb, o Hirvonen... dá pra chegar lá? 

 

Paulo Nobre: Bom, não tem como não sonhar... é quase como perguntar para um garoto que está no kart e perguntar se ele sonha em um dia estar na Fórmula 1... 

 

NdG: Bom, veja bem... do Kart para a F1 é uma estrada... do PWRC até o WRC a “especial” é um pouco mais curta, não (risos)? 

 

 

Paulo: "A gente pode até sonhar em vir a disputar o WRC... mas este é um sonho ainda distante. Distante, mas não impossível".

 

Paulo Nobre: Risos... é, realmente o caminho é mais curto. Mas tem essa coisa do sonho... eu era uma pessoa do meio do futebol e em 2001 eu sentei do lado deste grande piloto que está aqui conosco, o Tino Viana, que foi parceiro do Edu por anos e anos, e a gente fez um treino. Eu andei do lado dele e vendo o que ele fazia, só pensava: PQP, como é que ele faz isso? Ele chagava numas curvas de um jeito que eu só pensava: “xi, a casa caiu”... e ele fazia a curva numa boa. E usava o “puntataco”, o “pêndulo” e eu ali pensando: não dá pra fazer isso e ser normal. O cara é um predestinado. E hoje eu, que era um “café com leite” no rally, estou aqui correndo numa prova internacional e aí não tem como não sonhar em correr num WRC. E digo mais, a gente tem que sonhar e sonhar alto, pensar grande, senão, você nunca se desenvolve. Agora, mesmo estando mais próximo agora do que estava em 2001, correr no WRC é uma coisa ainda muito distante... mas o sonho existe.

Edu Paula: Eu digo o seguinte e já falei isso para o Paulo: a gente vai correr no WRC, sim. Pode nem dar pra fazer um campeonato inteiro, mas a gente vai chegar lá.  

 

NdG: Bem, para chegar lá, no WRC, e andar bem, é preciso “suporte”. Quanto é que se precisa para se conseguir atingir este padrão de “ter com o que competir para realmente poder competir”? Dá para falar em cifras? 

 

Edu Paula: Como eu sou copiloto, eu não sei absolutamente nada sobre este assunto (risos gerais)... Paulo, descasca essa! 

Paulo Nobre: (risos) Bom, o Patrik Sandell, que é um piloto de nível top no mundial, com um milhão e meio de euros, conseguiria andar numa equipe boa, não nas “top – top”, que seria onde corre o Raikkonen hoje, este seria o valor para ele, o Sandell. Quem não é o Patrik Sandell vai certamente precisar de mais “suporte” para poder andar.  

 

NdG: Vindo para a nossa realidade, Brasil, como foi atravessar a crise de 2008 para 2009, com a queda das bolsas, as fábricas fugindo do automobilismo... e vocês ainda assim conseguiram ir para a Europa nesta época. O que vocês fizeram para encarar este problema que foi de todos em todos os lugares? 

 

Paulo Nobre: Olha, 2008 foi uma tragédia. Uma carnificina e uma luta insana para conseguir ter como correr em 2009. Já em 2009, a coisa mudou, pelo menos do âmbito do tipo de patrocinador que patrocina rally, e deu pra conseguir “colocar a cabeça para fora da água”. Mas, é preciso que se diga a verdade: patrocínio no Brasil é algo tipo Papai Noel, Saci Pererê... a gente escuta falar, mas não vê, de fato. Quando aparece uma oportunidade a gente até se emociona, porque é muito raro se conseguir um patrocínio relevante aqui no Brasil. Poucos pilotos conseguiram isso até hoje. Tem que ter a sorte de estar no lugar certo na hora certa, do interessado gostar do esporte que você pratica... 

 

NdG: Edu, você que já “gramou” um pouquinho mais e nessa sua trajetória teve como adversário o Toninho da Matta, que foi nosso entrevistado. Ele falou uma coisa interessante sobre patrocínio e crise financeira... ele disse que nos anos 80 as montadoras bancavam as competições para promover os seus produtos. Aquela época foi mais fácil do que está sendo hoje? 

 

 

Edu: "No início, eu e o Tino ficamos um tempo fora das competições por falta de grana. Hoje ainda não está bom, mas já foi pior". 

 

Edu Paula: Pelo menos prá mim foi mais difícil... eu estava começando e foi com o Tino, que é meu primo, dois novatos, dois garotos e a gente tinha que se virar. Nosso primeiro carro de rally foi um fusca que meu pai emprestou e a gente montou a gaiola, a suspensão o motor e fomos a luta. Quer dizer, Fomos com o que dava e como dava. Fizemos 4 ou 5 anos e tivemos que parar. Só conseguimos voltar nos anos 90! Podia até existir esquema de fábrica, mas isso estava longe da nossa realidade. Eram poucos os beneficiados. 

 

NdG: Do pouco que a gente consegue ver e ler sobre rally no Brasil, a gente vê que tem um nível de disputa acirrado nas categorias. A questão é: este nível de disputa, de formação do piloto Brasileiro, dá para servir como uma boa base para ele tentar correr no exterior ou ele tem que aprender muita coisa ou até reaprender coisas para poder ser competitivo lá fora, na Europa, por exemplo? 

 

Edu Paula: Condição de disputar a gente tem. A escola de rally aqui no Brasil é boa. A diferença para se disputar algo contra eles é de equipamento. A gente aqui não tem acesso ao nível de equipamento que eles tem. Até aqui do lado, na Argentina, eles tem mais condições, mais equipamento do que a gente... e aí, não tem como andar igual a eles. Quando temos um equipamento no mesmo nível, andamos tão forte quanto eles, já vencemos os argentinos diversas vezes, mas sem equipamento não tem como.

Paulo Nobre: mas tem outra coisa também: não adianta só jogar o equipamento nas mãos de um brasileiro e achar que ele vai sair andando na frente. É preciso ter um tempo de adaptação ao equipamento, tem que treinar e conhecer os limites do carro, expandir seus limites como piloto... isso leva um tempinho. Como bem lembrou o Tino, uma vez que o Brasil atingiu um nível top nas corridas de pista, mais definidamente na F1, o pouco que existe de patrocínio, normalmente tem uma tendência maior a ir para esta área. O grande público não conhece quase nada de rally e, com um país deste tamanho, com tanto terreno para se crescer e disputar provas, é meio triste não ver o rally crescer. A gente até pode, um dia, vir a ter um apoio maior, uma divulgação maior, e aí poderemos formar mais gente e mandar mais gente pra Europa. 

 

NdG: Como está o calendário de vocês para este ano? Correr o que e aonde? Vai dar para conciliar datas? 

 

Edu Paula: Este ano nós vamos fazer as provas do PWRC, que serão nove, mas o regulamento nos dá a liberdade de “descartar” três etapas. O regulamento é interessantíssimo, pois ele nos obriga a escolher seis provas, das quais duas tem que ser fora da Europa. Esta escolha é feita com a equipe, uma vez que temos que atender os interesses de toda a equipe. Aí nos vamos fazer, além da Suécia, Jordânia, Nova Zelândia, depois (exultantes, quase aos gritos – risos) O RALLY MAIS MARAVILHOSO DE TODOS: MIL LAGOS, NA FINLÂNDIA, que é um sonho para qualquer piloto de rally poder participar, depois faremos Japão e finalizamos com o País de Gales, no encerramento da temporada. Aí, dentro das janelas do mundial, faremos cinco ou seis etapas do sulamericano, que tem um nível de exigência maior do que se corressemos aqui, no brasileiro.  

 

NdG: Por falar em sulamericano, vocês sabem porque que o rally da Argentina saiu do calendário? Eles que tem uma tradição tão grande... particularmente isso pode ser considerado uma “perda para o continente”? 

 

 

Edu: "A FIA precisou dar uma 'enxugada' no campeonato para segurar as montadoras. Diminuiu o número de provas e vem mais aí".

 

Edu Paula: O que aconteceu foi o seguinte: por conta da crise a FIA deu uma enxugada no campeonato (Agora serão 13 etapas do WRC), mas muita gente, muitos países queriam fazer suas etapas e assim, a FIA decidiu por promover um revezamento. Por exemplo, no ano passado, o “rally na neve” foi na Noruega. Este ano, foi na Suécia. Ano que vem, volta prá Noruega. Assim será em outros lugares, como Austrália e Nova Zelândia. A Argentina ficou fora este ano, volta no ano que vem. Agora, tem alguns rally que eles não tiram de jeito nenhum: Finlândia, Grã Bretanha... 

 

NdG: Será que o Brasil pode sonhar em vir a fazer parte deste rodízio também? A gente tem condição técnica para preparar uma etapa de mundial? O IRC pode servir como referência? 

 

Paulo Nobre: Esse é o sonho e o grande desejo de todos nós. Condição de fazer a gente tem. Aqui se faz rally de alta qualidade. Se houver organização na parte política, sem disputas, sem brigas, pensando nos benefícios do esporte para todos e com um todo, podemos fazer, sim. O Rally de Erechim, que eu considero a capital do rally no Brasil, é simplesmente impressionante... o rally em Erechim é mais popular que o futebol. Assistir uma etapa do rally naquela cidade como costuma ser no sulamericano é indescritível. O povo lá “respira” rally. Imagina o que seria uma etapa do WRC lá?

Edu Paula: Aqui mesmo, a etapa do IRC no ano passado, Curitiba foi considerada uma das melhores etapas do torneio... e são 16 ou 18 etapas. Condição a gente tem. O Brasil já recebeu etapas do mundial, em 81 e 82... e porque parou? Por questão política! Por brigas internas. Se não tiver briga interna, condição técnica para fazer o Brasil tem. 

 

NdG: O Rally dos Sertões, que vocês já explicaram que não é rally, é cross country, é o mais badalado do país, com especiais na TV e tudo. Como é disputar uma prova dessas e como se pode traçar um parâmetro com o “rally de verdade”? 

 

Paulo Nobre: Aqui no Brasil se chama tudo de rally... e tá errado. Tem gente que faz trilha, faz raid... na Europa nem o rally de regularidade é chamado de rally. Rally para eles é velocidade. O Sertões é um cross country. E é um dos melhores do mundo. É super prazeroso de participar. O Dakar é um desafio, pela coisa do inóspito, mas o sertões exige de você e ainda te dar prazer.  

Edu Paula: Nos dois tipos de competição se tem os trechos cronometrados, as especiais, e os deslocamentos. Nas especiais, quanto mais rápido você for, melhor. No deslocamento, tem um tempo limite, que não se pode “estourar”, que tem punição.Paulo Nobre: No rally, as especiais tem, no máximo 35 Km, no cross country pode ter 600, 700 km. Os deslocamentos num Rally são bem menores também. Outra diferença gritante é que no rally se faz um reconhecimento uns dias antes... no cross country isso é impossível! Como é que se faz um reconhecimento de 600 km? Não dá. Nem quando tem as “super especiais”, que são curtas, com 10, 15 km, não tem como fazer. No rally vc sabe exatamente o que vai encontrar, como é cada curva, você discutiu com o navegador como fazer cada trecho. No cross country você sabe, por exemplo, que tem uma bifurcação daqui mais 5 km e que tem que pegar à direita... até chegar nela, tem curva, subida, descida... e você não sabe nada. Não dá para andar a 99 por cento como no rally. 

 

NdG: Você usou um termo interessantíssimo agora há pouco: “discutir o trajeto com o seu navegador”. Como é esse processo, no levantamento e na prova? 

 

 

Paulo: "Enquanto se faz o levantamento, ainda se discute alguns pontos. Na hora da prova, quem manda no carro é o navegador".

 

Paulo Nobre: No levantamento, quando se está passando pelo trecho mais devagar, a 50, 60 por hora, a gente vai dando uma nomenclatura para cada curva, pelo seu ângulo, etc. Diz que é uma 3, uma 4... daí na prova, quando ele me “cantar” que a curva é uma 3 ou uma 5, ou uma 2, eu sei como é que eu tenho que entrar naquela curva. A discussão acontece durante o levantamento. Durante a prova não se discute. Quem manda no carro é o navegador. O que ele diz, não se discute e se ele errar, a gente bate. Para isso tem que haver um entrosamento muito grande. No cross country o navegador vai te “planilhando” e nesse caso também, ele tem que estar seguro do que está fazendo. Eu sempre falei para os meus navegadores: se errar, erra com convicção! Não dá pra falar “eu acho que é por aqui”... aí o piloto já tira o pé, já fica inseguro...

Edu Paula: Quando a gente sai para fazer um levantamento, junta a experiência dos dois. Quando se passa num trecho, uma curva, por exemplo, e eu digo que é uma 3, ele pode achar que pode ir mais rápido, aí passa de novo, daí pode ponderar, dizer que é uma 3+... ou uma 3-... esse é o tipo de discussão que a gente tem durante o levantamento. Depois que o levantamento está pronto, na hora de largar, não tem mais assunto.  

 

NdG: Em termo de novos valores aqui no Brasil, como é que anda o rally? Está havendo uma renovação de nível como são vocês? 

 

Edu Paula: Está sendo muito legal e o melhor é que tem muitos que são filhos da geração atual. Eu mesmo já andei pilotando e colocando meu filho de 21 e minha filha de 16 para fazer a navegação... e assim como os meus, muitos dos filhos do pessoal está correndo e vem vindo bem, num nível muito bom. 

 

NdG: As pessoas que dirigem o rally no Brasil tem a visão e a abertura necessária para ouvir e buscar atender os pleitos dos pilotos e navegadores? Como é essa relação dos que organizam o rally com os protagonistas do Rally? 

 

Paulo Nobre: Isso o Edu pode falar melhor que eu... (gargalhadas)

Edu Paula: Você quer que eu saia metendo o pau em tudo e em todos? 

 

NdG: (risos) Não, não é isso... queremos mesmo uma análise. 

 

Edu Paula: É que eu sou um cara conhecido pela polêmica... eu solto os cachorros e não tenho papas na língua. Mas vamos lá: Tem um pessoal antigo e um pessoal novo na organização.  

Paulo Nobre: A gente tem que dar um pouco de crédito para o pessoal novo, claro, que está começando, que viu as coisas boas e ruins do passado e que a gente tem que dar tempo para ver o que eles serão capazes de fazer, agora que é uma gestão nova...

Edu Paula: É, vamos ver o que eles vão fazer... porque a gestão anterior a gente não gostou muito, não... e a anterior da anterior foi pior ainda!  

 

NdG: Se olharmos por um lado, a coisa vem melhorando... 

 

Edu Paula: Ficando menos pior. O problema é que aqui no Brasil só se pensa em pista. Em F1... de pouco tempo pra cá que se começou a pensar na Stock, agora que tem um promotor, que pegou e fez! O que está faltando no rally é um promotor que pegue e faça. Se a gente for esperar dirigente fazer, esquece. A gente não vai fazer nada! 

 

 

Tino Viana. Parceiro por anos a fio com o primo, Edu Paula, foi uma companhia ilustre durante toda a entrevista.

 

NdG: Um promotor que conseguiu fazer uma categoria e hoje ela ser popularíssima e fez isso praticamente do nada foi o Aurélio Batista Felix... seria um Aurélio que precisaria o rally? 

 

Paulo Nobre: Exatamente. Ou um de nós assumir este papel. 

 

NdG: O Edu vai completar 30 anos de Rally, você, Paulo, 10, no ano que vem... fazer rally do jeito que são as coisas no Brasil é ser uma espécie de Dom Quixote? 

 

Edu Paula: Com certeza. Aqui é todo mundo abnegado, apaixonado, fanático. Se não for assim, não segue adiante.

Paulo Nobre: O Edu disse tudo. É preciso renunciar muito e a muita coisa para continuar nessa batalha. 

 

NdG: Não há palavras para agradecer por esta entrevista, Paulo e Edu. E agora, claro, está na hora do presente, que todo entrevistado recebe, que é uma camisa dos Nobres do Grid, que são vendidas e renda destinada ao nosso Padrinho, o Luiz Pereira Bueno. 

 

 

Como já é de praxe com nossos entrevistados, um presente e o agradecimento dos Nobres do Grid a Paulo e Edu.

 

Paulo e Edu: Opa, presente é sempre bom... e a gente também agradece aí pelo espaço aberto. 

 

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Last Updated ( Sunday, 10 October 2010 10:40 )