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Um pouco mais sobre telemetria... PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Wednesday, 02 February 2011 13:07

 

 

Recentemente fui “descoberto” como colunista do Site dos Nobres do Grid por alunos aqui na universidade que gostam de Fórmula 1 e, entre os artigos que já foram publicados, muitos vieram com perguntas bastante interessantes sobre telemetria... ao ponto de me fazer voltar ao assunto. 

 

Vamos começar pelo conceito puramente dito. A palavra telemetria (telemetry em inglês) vem do grego: tele = à distância, remota; metron = medição.  

 

Com a velocidade que a ciência avança nos dias de hoje, podemos até dizer que o uso da telemetria na vida da humanidade é proporcionalmente tão antiga quanto o seu tempo de uso na Fórmula 1. O que quero dizer com isso é que a telemetria não é algo novo, na verdade, tem praticamente meio século de aplicações práticas! 

 

Como abordei no artigo anterior, a telemetria pode ser usada em um sentido ou dois. Neste caso, é comum ouvirmos o termo “telemetria de duas vias”, que é um termo tecnicamente errado. 

 

A telemetria costuma se referir a um pacote de dados que pode ser transferidos (transmitidos) por algum tipo de sinal onda eletromagnética de radiofrequência (telefone, rádio, etc). Graças à telemetria é possível se usar desta tecnologia em uma larga gama de sistemas que vai desde foguetes e satélites até a operação de plataformas de petróleo e plantas de indústrias, possibilitando seus operadores monitorarem tudo o que se passa nestes sistemas, alertando e registrando todos os dados para uma operação segura e eficiente. 

 

Quando afirmei sobre a telemetria ser uma “senhora de meia idade”, não exagerei. Desde a corrida espacial, no auge da guerra fria, quando Estados Unidos e União Soviética lançavam seus satélites ao espaço e corriam desesperadamente em direção a lua, a telemetria já era utilizada para fazer funcionar dispositivos a bordo das naves não tripuladas.  

 

 

A telemetria, quando chegou à Fórmula 1, não era nenhuma novidade... desde os anos 60 Russos e Americanos já usavam. 

 

Com o tempo, passou-se a utilizar esta tecnologia para a precisão dos mísseis balísticos que os países da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) apontavam contra o bloco da “cortina de ferro” – e viceversa! 

 

Atualmente, com as coisas “mais calmas”, a NASA faz valia da telemetria para monitorar inclusive a saúde dos seus tripulantes nas naves espaciais que circulam a terra, não apenas as naves como os ônibus espaciais e a estação espacial internacional, que está em construção. 

 

Na Fórmula 1, da mesma forma que foi se buscando na indústria aeroespacial, materiais mais leves e tecnologias mais avançadas, os engenheiros e donos de equipes encontraram na telemetria uma forma de conhecer melhor o que se passava com seus carros durante treinos e corridas. 

 

No início, apenas alguns sensores, atualmente, pode ser coletar praticamente tudo de um carro de corridas, com mais de dois mil sensores espalhados por praticamente todos os pontos e monitorados por uma equipe de engenheiros e técnicos quase tão numerosa – ou mais – quanto a equipe de mecânicos. 

 

 

GP de Monaco de 2002: um marco, um divisor de águas, uma explosão de polêmica... seria ético interferir no carro dos boxes? 

 

Dentre as primeiras equipes que avançaram neste campo, a McLaren foi uma privilegiada, devido a parceria estabelecida com a TAG (Techniques D’avant Garde), grupo de tecnologia de propriedade do milionário do Bahrein, Mansour Ojjeh com quem estabeleceu parceria em 1981. 

 

Desde que a parceria foi estabelecida, a McLaren deu um grande salto de qualidade em seus carros, passando a ser uma das mais vitoriosas equipes da Fórmula 1. Antes disso, apenas dois títulos, com Emerson Fittipaldi e James Hunt em 1974 e 1976, respectivamente. 

 

No final dos anos 80, a telemetria já era uma ferramenta extremamente útil para a categoria, reduzindo o tempo que poderia se perder entre a prancheta (esqueçam AutoCAD... isso não existia) e o primeiro teste na pista. Programas mais complexos nos dias de hoje levam as equipes a simular completamente uma corrida no computador e definir qual a melhor estratégia a ser adotada. Contudo, um episódio envolvendo a telemetria dividiu opiniões dentro e fora do circo da Fórmula 1. 

 

 

Depois da providencial ação nos boxes da McLaren, David Coulthard conseguiu manter-se na pista e vencer a corrida. 

 

Durante o Grande Prêmio de Mônaco de 2002, a McLaren de David Coulthard apresentou um problema no motor.  Eram passadas 34 voltas, pouco menos da metade da prova, quando uma leve fumaça branca começou a aparecer em alguns pontos da pista onde o McLaren... que parou algum tempo depois. David Coulthard venceu a prova (sua única na temporada), quebrando uma sequência de vitòrias de Michael Schumacher. 

 

A equipe de Ron Dennis valeu-se da telemetria, após coletar os dados do carro que liderava a prova e enviar para este, informações de alteração do mapeamento do motor e câmbio, além de desativar alguns sensores que poderiam, “por medida de segurança”, desligar o motor do carro. Na época, esta ação foi chamada de “telemetria de duas vias”, como já afirmei, um conceito tecnicamente errado, uma vez que o carro não coletou sozinho os dados que precisava. 

 

Na época houve uma grande celeuma em relação ao que seria certo ou errado, afirmou Ton Gruich, um profissional com mais de 40 anos de experiência em sistemas de análise, projetos e aplicações de softwares de bancos de dados. Contudo, o regulamento permitia que isso fosse feito... quando fizeram, vieram os protestos. 

 

 

Alheio à polêmica que envolveu o resultado, o piloto escocês comemorou aquela que acabaria por ser sua única vitória no ano.

 

Andreas Nicolaus Lauda, o austríaco tricampeão do mundo da categoria, foi uma das vozes mais duras contra o que havia acontecido, afirmando que os carros da época poderiam ser pilotados por macacos, que os pilotos eram uma figura decorativa e completou: “quanto tempo mais seria necessário para que os carros passassem a ser controlados por joysticks, de dentro dos boxes?” Será que Lauda estava fazendo uma “profecia apocalíptica” sobre os destinos da Fórmula 1? 

 

Ron Dennis, por outro lado, comemorava o feito e – como o regulamento daquele ano, especificamente, permitia – esnobava a concorrência por ter sido ele e sua equipe capaz de fazer um carro vencer: “Entendo que não existam muitas pessoas conhecedoras de tecnologia, mas quando você tem esta tecnologia e consegue tirar proveito deste conhecimento, é maravilhoso e extremamente satisfatório conseguir, nos dias de hoje, ‘conversar’ com o carro e influenciar na sua performance, ajustando-o perante qualquer adversidade.” 

 

A FIA, preocupada com a repercussão do acontecido, proibiu a comunicação “Box-Carro” para a temporada de 2003. A comunicação “Carro-Box” continuava permitida. O grande mistério deste período em que se passou a usar telemetria até a – para alguns – controversa vitória de David Coulthard foi o período em que o regulamento era completamente omisso em relação ao uso da telemetria... em qualquer que fosse a direção. 

 

 

Em 1991, a McLaren já tinha uma parceria de 10 anos estabelecida com a TAG... e o sistema de telemetria já era bem avançado.

 

A TAG desenvolveu os primeiros sistemas de telemetria para McLaren ainda na segunda metade dos anos 80, chegando a um programa de grande qualidade no início dos anos 90... o amigo leitor deve estar se perguntando aonde eu quero chegar, não? 

 

Interlagos, 1991. Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1. A McLaren de Ayrton Senna perde 4 a 7s por volta perante o avanço da William de Ricardo Patrese. Nas curvas mais lentas, o motor Honda de 10 cilindros ronca grave... definitivamente alguma coisa estava errada. 

 

Volta após volta, a distância diminui e se não fosse uma providencial garoa tipicamente paulistana para deixar a pista úmida o suficiente para que o piloto italiano precisasse ser mais cauteloso e o brasileiro mostrasse o quanto sua capacidade de pilotar em condições adversas era superior a de seus adversários, havia uma possibilidade de que aquele final épico, com tudo que o torcedor tem direito, não tivesse acontecido. 

 

 

Durante o GP Brasil daquele ano, Jo Ramirez e Ron Dennis conversam e monitoram o carro de Ayrton Senna... a telemetria agiu! 

 

Nas declarações do piloto e da equipe, veio a resposta para todos que acompanharam aquela prova, a primeira vitória de Ayrton Senna correndo no Brasil com a Fórmula 1: Durante as voltas finais, em que Ricardo Patrese se aproximava perigosamente, a McLaren do piloto brasileiro estava apenas com a 6ª marcha! 

 

Ron Dennis declarou que era um feito fantástico, que só um piloto como Senna poderia fazer. Nelson Piquet, tricampeão mundial da categoria disse que aquilo era inacreditável, no sentido de que não seria possível se conseguir tal façanha. A vitória ficou marcada para sempre e para todos como uma das mais grandiosas de suas 41 conquistas. 

 

Anos depois, numa conversa de amigos, no II Encontro dos Nobres do Grid, o decano piloto Francisco Lameirão fez uma revelação surpreendente: conversando com Ayrton Senna sobre o grande feito, de 1991, o tricampeão contou o que aconteceu... após começar a perder as marchas e vendo que acabaria sem nenhuma, falou com os boxes. Então, através da telemetria, a equipe mudou o mapeamento do motor e permitiu que ele continuasse trabalhando com um regime de rotação diferente, tornando possível o contorno e retomadas, mesmo que suaves, das curvas mais lentas.  

 

 

Esgotado, Senna mal consegue erguer o trofeu... o "segredo" nunca foi oficialmente revelado. Receio ou hipocrisia generalizada? 

 

Nada sobre este assunto foi publicado na imprensa ou sequer assumido pela equipe. O regulamento da época não tratava do assunto, como foi com outros pontos que veio a abordar depois, quando alguma equipe valeu-se de algum ponto não esclarecido para tirar algum proveito. 

 

A questão mais importante não é medir o mérito ou não de Senna como muito já foi feito em relação a este episódio, mas o fato do uso da telemetria no sentido Box-carro e a inevitável pergunta: ao longo dos anos 90, quantas vezes as equipes, não só a McLaren, mas todas as demais, valeram-se deste recurso para retificar problemas em seus carros? 

 

Um abraço, 

 

Luiz Mariano 

 

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Last Updated ( Saturday, 09 April 2011 15:58 )