Após a esfuziante conquista do GP do Brasil de Fórmula 1 de 1991, depois de anos “batendo na trave”, “batendo cabeça” e batendo num Japa, Ayrton Senna, recuperado do esgotamento físico que nem o Nuno Cobra foi capaz de explicar, entregou o segredo da sua façanha para um dos Nobres do Grid – que na época já o era, mas ainda não era chamado assim – Chiquinho Lameirão. A McLaren usou um novo recurso eletrônico, chamado telemetria, para alterar o mapeamento do motor do seu carro e assim permitir que o mesmo trabalhasse em baixíssimas rotações com uma marcha alta – a 6ª – sem que o mesmo morresse. Graças a este “coelho da cartola”, Senna conseguiu manter-se na pista e não frustrar, mais uma vez, a torcida brasileira. Naquela época, a McLaren não divulgou – ao menos oficialmente – seu feito tecnológico. Talvez até para preservar o segredo e ter, ela e apenas ela, o recurso que, se uma vez, garantiu uma vitória, poderia vir a fazer isso outras vezes. Contudo, a Fórmula 1 é pior que cidade de interior e segredo é uma coisa que não dura muito tempo.Logo, as demais equipes grandes já possuíam alguma forma de interferir nos carros através de comandos enviados por computador e ondas eletromagnéticas. Era a chamada ‘telemetria de duas vias’! 1991: Ayrton Senna teve a preciosa colaboração dos boxes para remapear o gerenciamento do motor da McLaren. Na época em que Ayrton Senna foi beneficiado, não havia nada contrário – ou a favor – no regulamento, mas isso foi mudando com a evolução dos sistemas. No início dos anos 2000, era permitido o uso livre da chamada ‘telemetria de duas vias’... até que aconteceu o primeiro caso explícito da sua utilização, quando David Couthard liderava o GP de Monaco, em 2002 e informou estar com problemas no motor. A McLaren – novamente ela – investigou, identificou e retificou o problema, permitindo ao escocês permanecer na prova e vencê-la. A gritaria foi geral! As demais equipes correram para o escritório de Bernie Ecclestone para reclamar que “aquilo não era mais corrida”. Chegaram a especular que, em breve, não seriam mais necessários pilotos nos cockpit, uma vez que seria possível controlar o carro inteiramente dos boxes. A Fórmula 1 ia virar “autorama”! Depois de problema que surgiu diante de si, para o ano seguinte – 2003 – e até os dias de hoje, a telemetria “Box – Carro” passou a ser proibida, podendo haver apenas a transmissão de dados no sentido “Carro – Box”. Aliás, o que não falta é informação, com quase 2000 sensores e um batalhão de técnicos e engenheiros “escondidos por trás dos boxes, com um efetivo tão grande ou até maior do que os que aparecem nas transmissões. 2002: David Couthard informa que está com problemas no motor. A equipe encontra o problema e atua, dos boxes, e repara-o. Acontece que, durante a transmissão do GP de Abu Dhabi, Jenson Button ficou sem ter como acionar o KERS. Com uma reta de pouco mais de 1 Km e outra de quase 800 metros, não ter o “impulso extra” proporcionado pelo sistema de recuperação de energia foi algo mortal para as pretensões do inglês na corrida. Além de não ter como alcançar seus adversários diretos nas retas, tornava-se uma presa fácil dos adversários diretos. Não fosse a tática sem noção da Red Bull para Mark Webber (alguém é capaz de explicar – logicamente – as três paradas que apenas eles fizeram?), o australiano tinha como terminar a prova em terceiro lugar e até mesmo o psicologicamente capenga Felipe Massa poderia deixá-lo para trás. O último degrau do pódio pode ser considerado uma vitória, dada as circunstâncias. A “parte interessante” da situação foi a conversa de rádio entre o piloto do carro número 4 e os boxes: Jenson Button: Meu KERS não está funcionando... Boxes: Ok, Jenson, estamos tentando consertar isso por aqui. EPA!!! Consertando dos boxes uma coisa no carro? Se uma ação eletrônica é feita dos boxes para o carro durante a corrida isso é o que? Isso é telemetria de duas vias! Mas isso não é proibido? Se é proibido como é que poderia ser feito? Interessante é que, mais uma vez, a equipe envolvida era a McLaren. O problema, aparentemente, não foi resolvido, tanto que, caso fosse, o piloto da McLaren poderia ter atacado o segundo colocado – Fernando Alonso – e conquistado uma dobradinha para a equipe, especialmente depois dos carros passarem a usar os pneus mais duros. 2011: Jenson Button informa que o KERS não funciona e a equipe avisa que "está tentando resolver o problema". Como? O mais espantoso é que, depois da divulgação desta conversa, nenhuma equipe levantou a voz para protestar... o que me leva a suspeitar que não apenas uma, mas todas as equipes devem possuir alguma forma de modificar o comportamento dos carros durante as corrida, mesmo sem que estes entrem nos boxes. Diga-se de passagem em nenhuma das paradas de boxes para troca de pneus, vemos a presença de nenhum técnico ou engenheiro eletrônico. Mesmo porque, qual computador conseguiria “ressetar e reinicializar” um sistema em menos de 5 segundos? E a gente, que assiste, gosta e torce ainda chama isso de esporte... Abraços, Mauricio Paiva |