Entrevista: Chico Serra Print
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Thursday, 05 January 2017 21:35

Um dos maiores kartistas já formados no Brasil, Francisco Adolpho Serra, o nosso Chico Serra, está completando 60 anos no próximo mês de fevereiro.

 

Dono de um estilo de pilotagem limpo e refinado, saiu do Brasil, tetra campeão brasileiro de kart, na segunda metade dos anos 70 e trilhou o caminho dos campeões até chegar à Fórmula 1, conquistando os campeonatos inglês de Fórmula Ford 2000 (em 1977) e de Fórmula 3 (em 1979), esta última conquista, pela equipe Project Four, de Ron Dennis, que viria, no ano seguinte, adquirir a McLaren, equipe de Fórmula 1.

 

Depois de um ano difícil (1980) na Fórmula 2, Chico Serra assinou contrato com a equipe Fittipaldi, onde correu até esta fechar as portas em 1982. Em 1983, começou o ano correndo pela equipe Arrows, mas sem patrocinadores fortes, acabou perdendo o lugar no time para o belga Thierry Boutsen.

 

Depois de tentar o que podia para ficar no automobilismo internacional, até mesmo fazendo uma corrida na Fórmula Indy, Chico Serra estabeleceu-se aqui no Brasil e retomou a carreira de sucesso, sagrando-se tricampeão brasileiro de Stock Car em 1999/2000/2001.

 

Fora das pistas – como piloto – desde 2011, Chico Serra ainda trabalha no automobilismo, como membro de uma equipe do campeonato brasileiro de turismo. Paulista, vegetariano, pai de três filhos, sendo um deles o piloto Daniel Serra, Chico nos recebeu no showroom da Av. Europa em São Paulo para essa entrevista.

 

NdG: A gente gostaria de conhecer um pouco mais do Francisco pessoa, não só o Chico piloto. O que você pode contar pra gente?

 

Chico Serra: Olha, eu raramente falo de mim fora das pistas. É muito difícil dissociar minha vida do automobilismo, afinal, comecei muito cedo, ainda na adolescência e estou ligado a ele até hoje, mas o que posso dizer é que sou um cara calmo, sempre gostei de uma vida tranquila, exceto pela hora de ir para a pista. Ali é pra acelerar mesmo. Aos 14 anos eu mudei meus hábitos alimentares e parei de comer carne numa época em que pouco se falava nisso e vivo bem sem carnes até hoje. Isso é algo que acho que nunca falei para um jornalista.

 

NdG: Você falou que começou no automobilismo na adolescência, no kart. Foi por influência de alguém da família?

 

Um amigo da minha irmã andava de kart. Um dia fui vê-lo andar e, no final do dia ele perguntou se eu queria andar... e aí...

 

Chico Serra: De certa forma sim. Minha irmã mais velha tinha um amigo que andava de kart. Eu tinha uns 13 anos na época e um dia eu fui vê-lo correr. Eu não era ligado em automobilismo nem nada, mas eu fui. Nem lembro se era corrida ou treino e no fim ele perguntou se eu queria dar uma volta... e depois dessa volta eu nunca mais desci do kart (risos). Depois deste dia eu fiquei 100% ligado e tanto insisti que comecei a pilotar e nem dois anos depois disso, acho, com 15 anos ganhei meu primeiro título brasileiro de kart... e foram quatro, além de dois paulistas.

 

NdG: Desde este primeiro título já se vão mais de 40 anos e até hoje você é lembrado como um dos maiores kartistas do Brasil. O que faz um piloto conseguir se destacar tanto no kart?

 

Chico Serra: Acho que não tem outro jeito diferente do que ser pelos resultados (encabulado). Eu tive uma carreira muito legal no kart. Foram cinco anos competindo para valer, entre 1972 e 1976 e em todos estes anos eu ganhei pelo menos um título importante. Foram quatro brasileiros e dois paulistas, mas apenas em 1976 que eu venci o paulista e o brasileiro... pra você ver como era difícil o campeonato paulista. Na maioria das vezes eu ganhei o brasileiro e perdi o paulista, que era tão difícil quanto o brasileiro. Era uma época muito boa. O kart é uma competição muito boa, ainda mais quando você é garoto, adolescente como a gente era.

 

NdG: Quando você começou a correr na Fórmula Vê aqui no Brasil ainda continuou correndo de kart. Como você tratou essa transição? Como foi a adaptação?

 

Chico Serra: A primeira sensação que eu tive quando andei pela primeira vez num Fórmula Vê é que ele era muito lento. O kart é muito mais rápido, exige reações muito mais rápidas. Eu achei a transição fácil e eu nem fiz a temporada inteira da Fórmula Vê de 76. Como eu precisava conseguir patrocinadores, só entrei na terceira ou quarta corrida daquele ano. No final da temporada eu já busquei o caminho da Europa onde fui correr de Fórmula Ford na Inglaterra e 1977 foi um ano fantástico. Eu larguei em 38 corridas e venci 22! Ganhei o campeonato inglês e ganhei também o campeonato mundial, quando correram os campeões da Fórmula Ford de todo o mundo.

 

NdG: Uma supremacia desta magnitude atraiu os olhares de diversos chefes de equipe das categorias acima. Deu pra escolher a equipe em 1978?

 

A primeira sensação que tive quando andei em um Fórmula Vê era a de que o carro era muito lento comparado ao kart.

 

Chico Serra: Tudo foi positivo. Ficou mais fácil pra conseguir patrocínios, a exposição foi muito boa e eu fui correr com o Ron Dennis, na sua equipe, a Project Four, e foram dois anos na Fórmula 3. Em 1978 disputei o campeonato até o final e em 1979 conquistamos o título...

 

NdG: Correr com Ron Dennis. Ele criou uma fama de linha dura pelo menos pela imprensa. Mas como era lidar com ele no dia a dia? Trabalhar com ele?

 

Chico Serra: Eu posso dizer que tive duas fases com ele. Uma muito boa e outra muito ruim. O Ron é um cara de raciocínio muito rápido, muito inteligente, um visionário. Ele era um mecânico que rapidamente cresceu no automobilismo, fez uma aposta certa na compra de uma equipe de Fórmula 1 que era a McLaren e chegou onde ele chegou. Bom, eu nem sei como falar isso, mas o Ron era e é aquele tipo de pessoa que faz tudo que estiver a seu alcance para atingir seus objetivos... e ele conseguiu. A primeira foi a fase boa, quando corri na equipe de Fórmula 3, andávamos na frente, ganhamos o campeonato de 1979, mas ele já estava pensando adiante. Ele tinha uma equipe de Fórmula 2 e eu fui para lá no ano seguinte, só que ele já estava mirando a Fórmula 1 e comprou a McLaren. Ele concentrou seus esforços na equipe e a equipe de Fórmula 2 ficou em segundo plano. Quando ele comprou a McLaren ele pegou também o patrocínio da Marlboro e meu companheiro de equipe na Fórmula 2, o Andrea de Cesaris, que foi vice na Fórmula 3 também na Project Four, tinha a seu favor o fato de seu pai ser o maior distribuidor de tabaco na Europa... e a Marlboro estava com ele. E aí os interesses comerciais pesaram na decisão de quem poderia ter continuidade nos planos para a equipe de Fórmula 1 e a gente começou a não se entender mais como era na época da Fórmula 3. Quando ele fechou a compra da McLaren, um piloto era o John Watson e o outro ia ser o Andrea por causa da Marlboro e eu sabia disso (Nota do NdG: Ron Dennis abriu mão do Prost, a quem contrataria para 1984). Daí era procurar uma alternativa.

 

NdG: Você tinha alguma outra alternativa além da Fittipaldi para entrar na Fórmula 1 em 1981?

 

Chico Serra: Além da Fittipaldi eu vinha conversando com a Tyrrell, a Shadow e a Arrows. A Fittipaldi, como estrutura, era a melhor delas. Vendo os profissionais que ali estavam, tinha muita gente boa, competente, em termos de quadro de pessoal. Eles tinham comprado a Wolf no ano anterior e era uma equipe com potencial. Tinha o Harvey Postlethwaite como projetista junto com o Ricardo Divila. Tinha o Peter Warr como chefe de equipe, tinha o Keke Rosberg como primeiro piloto... ali tinha todos os ingredientes para o trabalho dar certo. A equipe Fittipaldi estava com um patrocínio quase acertado com a Avia, uma companhia de petróleo alemã, mas acabou não dando certo e foram dois anos de grana curta e muito sacrifício. O carro era bom, andou bem no início da temporada, mas sem dinheiro não tinha como desenvolver. Se com dinheiro já é difícil, imagina sem...

 

NdG: Quanto “custava” um lugar na F1 naquela época?

 

Minha Relação com Ron Dennis teve um período muito bom e um outro muito ruim. Ele é um visionário. 

 

Chico Serra: Eu não sei. Piloto pagante sempre teve. Era normal piloto pagar pra correr no início da carreira. Até o Niki Lauda fez isso, mas os tempos eram outros. Estamos falando de 30 ou 40 anos atrás. Não chegava nem perto de um milhão de dólares. Os custos eram outros também. O orçamento de uma grande equipe naquela época se chegasse a 10 milhões de dólares era muito dinheiro. Hoje está em quanto? 300 milhões? Nem sei... talvez mais. Eu digo ainda que não é só uma questão de atualizar dinheiro, valores. O mundo da Fórmula 1 mudou muito. A tecnologia, os investimentos... sem montadoras por trás não tem como funcionar.

 

NdG: Forma como você saiu da F1 foi algo que chateou o torcedor brasileiro... pela forma como foi noticiada: perdendo o lugar para outro piloto porque este tinha mais dinheiro para colocar na equipe... algo que hoje em dia é até banal. Como foi que se deu este processo na tua cabeça?

 

Chico Serra: Eu tinha um contrato de três anos com a Fittipaldi, Quando a equipe fechou e não ia mais disputar a temporada de 1983 eu já estava atrás na corrida por patrocínios que outros pilotos já buscavam. Eu conversei com o Jackie Oliver, que era o dono da Arrows na época, e ele também estava numa situação difícil, sem patrocínios e aí combinamos de começar a temporada e continuar correndo atrás de dinheiro. Iríamos até onde desse... eu e eles. Aí apareceu alguém com dinheiro e eu não tinha conseguido patrocínios. Fiquei de fora. Se o Boutsen não chegasse, provavelmente aconteceria com a Arrows o que aconteceu com a Fittipaldi no ano anterior... nem terminaria o campeonato. Eu continuei acompanhando a temporada indo para as corridas junto com a Arrows. Fiz algumas corridas de turismo lá pela Europa, mas o ciclo estava encerrado. Em 1984 eu estava de volta no Brasil.

 

NdG: Você tentou mesmo dar continuidade em uma carreira internacional indo para a F. Indy nos EUA ou foi só uma “experiência”? O que você achou da categoria?

 

Chico Serra: Quem me convidou foi o Morris Nunn, que tinha sido dono da Ensign. Foi em 1984, eu já estava no Brasil, e ele fechou a Ensign e foi para os EUA. Ele transformou o carro da Ensign num F. Indy. Eu primeiro fiz um treino, um teste, no circuito de Laguna Seca e fiquei lá três dias treinando. Fizemos esse treino 3 semanas depois da corrida que teve lá e andamos super bem, ficamos bem empolgados. Quando chegamos em Portland, o carro não passou na vistoria. Tinham coisas que estavam erradas e quando mexemos o carro ficou um horror! Acabei correndo aquela prova em Portland e foi bem complicada, com muitos problemas. Mais uma vez era preciso patrocínio... e eu não tinha. Ele fechou o negócio e foi trabalhar na Penske e foi engenheiro do Emerson [Fittipaldi]. Correr nos EUA nunca foi um projeto meu. Se acontecesse eu ia, mas meu negócio mesmo era a Fórmula 1. Anos depois ele montou outra equipe.

 

NdG: E o carro...

 

A estrutura da Fittipaldi era muito boa. Tinha tudo para dar certo. Os profissionais que lá trabalhavam eram de 1ª linha.

 

Chico Serra: Depois que você pilota um F1 é difícil gostar de alguma outra coisa, ainda mais num monoposto. Os carros da F. Indy não tem nada a ver com os carros da F1. Em termos de reação o carro era muito mais lento, menos evoluído... era como “F1 dos Flinstones” (risos). Lógico, o carro anda muito em oval, a curva de aceleração era muito grande. Eu não tinha pilotado carro com motor turbo na F1 e a aceleração do carro era muito forte, mas era um carro grande, pesado, lento de curva, que precisava frear bem antes, isso comparado com um F1.

 

NdG: Mas quem tem automobilismo nas veias dificilmente consegue ficar parado e você deu seguimento a uma carreira no Brasil em uma coisa diferente, que eram os carros de turismo. Outra adaptação?

 

Chico Serra: Eu dei muita sorte na minha volta para o Brasil. Era uma época que as montadoras. Assinei contrato com a FIAT de três anos. Não era meu projeto de automobilismo, mas deu uma acalmada na vida, mostrou uma perspectiva de ter uma carreira profissional, ser remunerado aqui no Brasil e eu corri o campeonato de marcas e pilotos da época, a Fórmula Uno até que veio a chance de ir para a Stock Car.

 

NdG:Com que olhos você via o automobilismo brasileiro naquela época onde as montadoras investiam e a gente não vê mais isso hoje. Onde foi que se perdeu o fio da meada?

 

Chico Serra: No campeonato brasileiro de marcas e pilotos tinha uma super participação das montadoras, com suporte, dinheiro, tudo que devia ser, mas ali todo mundo errou um pouco. Os promotores erraram, os pilotos erraram, as equipes erraram. Foram todos com sede demais ao pote. Os contratos eram algo assim, muito desproporcionais ao que era o campeonato e o retorno, logicamente não era proporcional aos valores investidos. Funcionou por três anos e as montadoras, não vendo o retorno que esperavam, perderam o interesse. Acho que todos aprenderam lições naquela época e se fosse possível retomarmos um projeto como aquele do Marcas, as coisas seriam melhor estabelecidas, estruturadas de outra forma, com mais pé no chão, partindo até mesmo da própria montadora.

 

NdG: Na Stock Car você foi tricampeão e o esquema vencedor, o sucesso, com Washington Bezerra à frente, incomodava muita gente. Quando conversamos com ele mostrou uma mágoa sobre isso e outras coisas. Você acumulou mágoas das coisas que não aconteceram como você queria no automobilismo?

 

Quando vim pra correr no Brasil, no Marcas e Pilotos, era uma estrutura muito boa, mas pecou em planejamento.

 

Chico Serra: (Pausa em silêncio) Esse é um mundo extremamente competitivo e é assim dentro e fora da pista. É competição na freada mais dentro, na busca do patrocínio, no espaço na mídia, na estrutura na equipe, em tudo. Se fazia muito folclore das coisas na minha época na Fórmula 1, mas veja hoje em dia como é. Ninguém se fala, mal se cumprimenta, todo mundo de cara fechada, ninguém anda no grid na pista... no GP Brasil de 81, na véspera da corrida, o Keke [Rosberg] com quem corria na Fittipaldi estava sobrevoando o Rio de ultraleve. Imagina hoje um piloto falar para o pessoal na equipe que vai voar de ultraleve depois da classificação... trancam ele no Box! (risos). Esse é o mundo da competição hoje e o Washington [Bezerra] saiu muito magoado por coisas que ele não aceitava e não aceita até hoje.

 

NdG: Você é pai de piloto e tem hoje um monte de filho de piloto que andou na F1 e um monte de filho que tentou chegar lá e não conseguiu. Como foi lidar com o fato de ser pai de piloto e as pessoas em volta chamando-o de “Serrinha” ou de “filho do Chico”?

 

Chico Serra: Eu levava o Daniel comigo para as corridas desde pequeno e é lógico que uma influência teve e lá pelos 10 anos ele já me enchia o saco querendo um kart e eu sou totalmente contra essa coisa que fazem com os meninos de colocar pra correr com 8 anos de idade. O menino não tem estrutura, nem física nem psicológica pra competir. Pra andar, pra brincar, tudo bem. Quando ele tinha 12anos eu comprei o kart pás para ele andar, não pra competir. Daí quando ele fez 13 ele começou a correr na Granja Viana. Montamos uma equipe eu e o Xandy (Negrão) pra ele e para o Xandinho e ele começou ali. Sem peso. Deixando ele dazer por ele gostar e sem cobrança. Eu nunca encorajei o Daniel a ser piloo, mas também nunca desencorajei. Ele foi neste caminho porque quis e hoje é um piloto profissional, estabelecido, respeitado. Quanto aos outros, no começo sempre tinha aqueles comentários, “ah, vamos ver se vai dar certo” e ele pegou o caminho dele e se estabeleceu. Hoje não é mais ele que é o filho do Chico, eu que sou o pai do Daniel.

 

NdG: De 2008 pra cá muita coisa mudou no mundo e o automobilismo foi bastante atingido, no mundo e no Brasil. Como você vê o cenário para o automobilismo brasileiro hoje?

 

Chico Serra: O automobilismo no Brasil tinha duas categorias muito fortes: a Stock Car e a F. Truck. Eu não tenho acompanhado a F. Truck tão de perto hoje, mas soube que as coisas estão meio complicadas por lá. A Stock, apesar de tudo, está conseguindo se manter. Tem sempre a questão da Rede Globo que fala que vai sair, mas que é algo que está mudando não só para a Stock, é geral na emissora que está passando por uma reestruturação. Algumas equipes saíram, é verdade, mas a F1 passa por isso também. As principais equipes estão firmes. Alguns patrocinadores saíram, mas o pessoal tem encontrado alternativas. Tá complicado para alguns? Sim, está, mas a maioria tem pago as contas. Lógico que tem coisa pra melhorar, que precisa melhorar, mas tem caminho, tem como buscar.

 

NdG: E pra crescer? Tem espaço para se criar novos nichos, novas categorias?

 

Chico Serra: (Pausa longa em silêncio) Tem. Falta uma categoria de base no Brasil. Não dá pra chamar a F3 Brasil de base. É uma categoria cara e que seja um degrau entre a F3 e o kart. Hoje eu vi na televisão que o Wilsinho Fittipaldi está montando uma categoria e o Ricardo Divila está trabalhando nisso junto com ele e é algo que precisa ter: uma categoria barata para o piloto sair do kart e ir aprender o que é carro. Daí sim pensar em ir para a Europa. Eu fiz a Fórmula Vê aqui e não fiz a Super Vê. Fui pra Europa. Se eu tivesse feito a Super Vê aqui, teria ido direto pra F3 na Inglaterra. O que vejo hoje é que o piloto depois do kart não tem para onde ir. Ou arruma de cara a mala e vai pra Europa ou investe no turismo pra chegar na Stock Car. E nisso a gente não vê perspectiva para o futuro no automobilismo internacional. Podemos até não ter piloto na categoria depois da parada do Felipe [Massa]. O piloto que eu vejo com potencial pra chegar na F1 hoje é o Caio Collet, mas ele ainda é muito menino, tem uns 14 anos. Ainda está correndo de kart. Está na Europa, está indo bem. O Felipe Massa falou isso também esses dias. Os garotos estão saindo daqui sem base.

Esse brasileiro de marcas tem uma base boa, mas o campeonato acabou saindo caro. Trabalharam errado a questão de custos e o retorno menor do que esperavam. Para quem quer seguir o caminho dos carros de turismo, ter um campeonato com o molde do que era a antiga Divisão 1. Era um campeonato que fazia sucesso, sempre tinha grid cheio. Tem alguns regionais bons, mas precisava ter um campeonato nacional forte. Hoje o garoto se sai do kart pega um carro com 300 cv de potência e caro. O custo é muito alto para um salto do regional para um brasileiro de turismo.

 

NdG: Você que vê o mundo do automobilismo mais de perto que a gente sabe que é um negócio privado, de iniciativa de promotores, de investidores e que é um negócio. Mas tem o lado político e aí q gente fica com aquela desconfiança de até onde ajuda e até onde atrapalha. No caso nosso, Brasil, até onde a CBA ajuda ou atrapalha?

 

Eu sou contra colocar um menino de 8 ou 10 anos pra correr. Ele tem que brincar, não competir não tem estrutura.

 

Chico Serra: Falar assim da CBA, se ela faz um trabalho bom ou ruim, acho que está mais para o ruim. Fazer uma categoria nos moldes da Stock Car, não, mas uma categoria de base ela poderia ao menos participar de alguma coisa. A criação, o apoio, até mesmo financeiro desta categoria... mas sinceramente eu não sei ate onde a CBA poderia ajudar no caso de uma categoria maior. Se a gente for pegar exemplo de grandes categorias, a F1 não foi bancada ou foi pra frente por conta da FIA. Foi por conta do promotor, principalmente nestes anos com o Bernie [Ecclestone], que fez ela chegar aonde ela está hoje. A existência e a presença de uma autoridade é algo necessário em qualquer esporte para se regulamentar, fiscalizar. Pra isso existe a FIA. Pra uma categoria crescer e se estabelecer depende do promotor. Esse tem que trabalhar pra isso. Cada equipe fazer também sua parte, mas na base a CBA deveria participar mais do que ela participa.

 

NdG: Você foi kartista assim como o Daniel. O que você pode dizer hoje para os meninos do kart e para seus pais?

 

Chico Serra: (Pausa em silêncio) O caminho é longo... (risos) Vamos ser realistas: o custo é muito alto. O kart é caro. Já fizeram várias tentativas de baratear o equipamento, mas não tem fugir disso. É caro. Se você entra na Stock Car, você tem o mesmo equipamento do cara do Box do lado. A diferença vai ser a mão de obra. O motor é igual, câmbio é igual, suspensão é igual pneu é igual... tudo é igual. No kart é diferente. Tem chassis diferentes, pneus diferentes, motores diferentes... eu estou longe do kart tem uns anos, mas houve uma época em que esteve ainda mais caro do que está hoje. Depois do Ayrton [Senna] teve a febre, com um monte de pai achando que o filho ia ser o próximo Senninha e o menino de 8 ou 10 anos chegava no autódromo com preparador físico, assessor de imprensa, um caminhão de equipamentos. Assim como foi no Marcas e Pilotos, durou um tempo, mas não se sustentou. Acho que o kart hoje está melhor do que há 5 ou 10 anos, mas ainda assim está precisando de um projeto de acesso e depois de um lugar para os pilotos irem. Não é todo mundo que pode fazer como o Caio Collet, que mora e corre na Europa. Antes mandávamos pilotos as dezenas pra Europa, hoje não vão 10 por ano.


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