Poder e Autoridade Print
Written by Administrator   
Wednesday, 09 May 2018 20:47

Caros Amigos, na noite do último sábado, em um jantar de família, em dado momento a conversa voltou-se para o automobilismo e entre os assuntos comentados entrou a questão tão da mudança – ou das mudanças – que a Fórmula 1 deverá passar nos próximos anos e o futuro “Pacto da Concórdia” (se é que terá este nome) a entrar em vigor a partir de 2021.

 

Todos os estimados leitores do site dos Nobres do Grid conhecem o meu primo, Mauricio, que assina a coluna “Pit Wall” todos os meses e a maneira, digamos, incisiva como ele trata os assuntos que aborda. A certa altura ele bradou: “certo estava o Bom Velhinho (a forma com a qual ele se refere ao ex-mandatário da categoria, Bernie Ecclestone) que dizia que a Fórmula 1 tinha que ser uma ditadura”, queixando-se da forma como as equipes – principalmente – e outros integrantes do ‘circo’ passara a ter vez e voto nas decisões da categoria, em especial as equipes e em particular a Ferrari, que detém um “poder de veto” a qualquer decisão da FOM ou da FIA, algo que ficou evidenciado no acordo assinado em 2013.

 

No mundo corporativo, qualquer mudança que se deseja tomar sempre irá provocar questionamentos de algumas ou muitas partes. A intensidade das reações é que irão diferir na forma de como irão se dar estas reações. No caso de como está estruturada a Fórmula 1, hoje, com o conselho de estratégia (formado pela FIA, FOM e seis equipes, onde têm lugar cativo Ferrari, Mercedes, McLaren, RBR e Williams. O melhor time no Mundial de Construtores no ano anterior, fora dos cinco, também. É a Force India) formando 18 votos e há ainda um outro conselho, que é a “Comissão de Fórmula 1”, aonde participam – com voto unitário – as dez equipes, FIA, FOM, alguns promotores de GP, fabricantes de unidade motriz, fornecedor de pneus e patrocinadores, totalizando 26 votos.

 

Conseguir aprovar mudanças em um universo tão distinto e onde os interesses  individuais são – na maioria das vezes – maiores que os interesses da coletividade, as possibilidades de mudanças sempre irão exigir um desprendimento  maior que o realístico para acontecer... a menos que algo de inusitado consiga ser introduzido e que os chamados “deuses da velocidade” provoquem alguns rompantes de bom senso em algumas das partes para que haja uma mudança nos votos, quase sempre muito bem definidos.

 

Depois que o Grupo Liberty Media adquiriu o controle acionário da Fórmula 1 e que Bernie Ecclestone deixou de representar a FOM nas discussões, encontrar as figuras de Ross Brawn e Pat Symonds, com toda a história de trabalho e sucesso que construíram, além dos seus auxiliares diretos, engenheiros como Jason Somerville e Steve Nielsen, ex-Williams, dentre outros, temos um corpo técnico de altíssimo nível de engenheiros contratados por Todt conversando com os engenheiros contratados pelo Liberty Media para a FOM e com os engenheiros e proprietários das equipes.

 

A conversa mudou de platamar e todos sabem que é preciso resolver os problemas da categoria. O mais crítico destes é a falta de ultrapassagens e a solução passa por “limpar o ar” que sai do carro que vai à frente e como este é jogado no carro que o segue. Os aerofólios dianteiros dos carros devem ser inspirados em obras de arte abstrata, dignos da assinatura de um Piet Mondrian, com todos aqueles elementos a direcionas cada filete de ar em uma determinada direção para fazer alguma coisa. Além disso, a forma como o ar sai do carro pelos extratores, tornando impossível o contorno próximo e as vezes mesmo o controle em reta, como foi o caso do efeito de perda de sustentação que contribuiu para o acidente entre os carros da Red Bull em Baku.

 

Mexer na fórmula que para alguns está dando certo irá certamente incomodar estes beneficiados, casos da Ferrari, que investiu milhões (bilhões?) para passar a incomodar a Mercedes, campeã nos últimos 4 anos. Mas esta situação de domínio ou polarização também incomoda as outras partes. Certamente a Renault, que tem feito um investimento de 250 milhões de euros por ano não se vê no papel de coadjuvante eterna em um meio onde se compete para vencer e não para participar.

 

O mesmo caso se aplica às equipes e foi aí que alguma coisa “diferente” aconteceu na última reunião do “Grupo de Estratégia”. Para se aprovar uma modificação, não bastaria FIA e FOM votarem unidas contra as equipes. Por estatuto, são necessários 75% dos votos, ou seja, 14 dos 18 votos. Duas equipes teriam que votar com a FIA e a FOM... e isso aconteceu! E na reunião do dia 30 de abril onde a Comissão de Fórmula 1 necessita de 20 dos 26 votos possíveis, as mudanças foram referendadas.

 

Foi um duro golpe na Ferrari e na Mercedes, que vinham manipulando com a força dos seus motores e respectivo fornecimento de tecnologia para as equipes menores e a dependência destas. Parece que estamos vivendo uma mudança – finalmente – na área técnica da categoria, que agora aguarda apenas a homologação da decisão pelo Conselho Mundial da FIA homologá-lo, o que é apenas uma formalidade, visto que este foi um projeto definido com o apoio e participação direta do seu presidente.

 

Aprovado este projeto, agora, qualquer alteração no que já existe necessitaria da unanimidade dos votos para aprovação, o que seria praticamente impossível de se conseguir neste heterodoxo universo. Contudo, não espremo que os perdedores da contenda fiquem calados diante da perda de influência e espaço. Ameaças virão e não serão pequenas, mas é preciso compreender que o jogo de forças – ao menos por um momento – foi alterado e que, democraticamente, as reais autoridades se fizeram valer no reino do esporte a motor em sua principal categoria. Se as mudanças surtirão o efeito desejado – em todos os seus campos – será algo que veremos ao longo dos próximos anos, mas alguns desdobramentos deste momento histórico vivido longe das pistas serão vistos e comentados ao longo dos próximos meses.

 

Um abraço e até a próxima,

 

Fernando Paiva


Last Updated ( Wednesday, 09 May 2018 21:25 )