Na etapa de Guaporé, em 2012, o piloto Diumar Bueno sofreu um dos mais graves acidentes da história destes 18 anos de Fórmula Truck, tendo sobrevivido milagrosamente. Atenta a todos os aspectos que envolvem a categoria, a área técnica da Fórmula Truck tratou de buscar uma solução que evitasse problemas como o ocorrido com o caminhão de Diumar Bueno e, após diversas reuniões com pilotos, chefes de equipe e engenheiros, chegaram a um sistema que, ao longo de toda a temporada de 2013, não apresentou um problema sequer! Como havíamos feito uma matéria sobre o sistema anterior, em 2012, voltamos a procurar pessoas diretamente envolvidas com a categoria para saber exatamente o que foi feito e como foi feito. Afinal, o sistema está funcionando. Altair Felix – Responsável Técnico da Fórmula Truck. Depois do acidente do Diumar nós fizemos um estudo junto com nosso fornecedor de freios, a Knorr-Bremse e também com a FIA e desenvolvemos um desenvolvemos um sistema que pode ser considerado como um freio de extrema segurança. Depois de montado a própria FIA veio ver o resultado e acredito que o trabalho desenvolvido aqui no Brasil foi levado para a Europa como referência. O que foi feito: fizemos uma divisão do sistema de freios por eixo. O caminhão tem dois eixos e existe um sistema de freios, com um cilindro pressurizado de ar comprimido para cada um deles, diferente do sistema anterior, que tinha o sistema integrado. Estes cilindros ficam localizados a ré da cabine, bem protegido pela estrutura do chassi para, em caso de colisão, ele sofrer o mínimo de risco de ser atingido. Além dos dois, existe um cilindro pressurizado de ar comprimido de reserva, dentro da cabine, ainda mais protegido, por estar dentro da estrutura do ‘santantônio’ do veículo. Além disso, nós temos uma única ‘cuíca’ estacionária. Ela funciona de tal forma que, mesmo que tudo dê errado, o sistema fique despressurizado, ela irá travar o caminhão e impedir que ele “role” livremente como aconteceu em outros acidentes. Além disso, existe uma indicação de falha no sistema de freio. O piloto tem no painel, uma luz de indicação de baixa pressão no sistema de freios e mesmo que ele por estar envolvido numa disputa e não perceba o acendimento desta luz no painel, há um outro sistema de identificação que é um estrobo, no parabrisa do caminhão, voltado para fora. Caso este estrobo acenda, o diretor de prova e os comissários verão a indicação e o piloto deverá ser avisado pelo rádio, pelos bandeirinhas para parar o caminhão ou, caso seja possível, trazê-lo de volta aos boxes para evitar um acidente. Juntamente com o novo sistema de freios, fizemos um reforço no ‘santantônio’ do caminhão aumentando a resistência do mesmo na altura das pernas e pés do piloto. O Diumar sofreu muitas lesões nesta região e isso nos levou a fazer esta nova estrutura, deixando a região mais protegida. Geraldo Piquet – Piloto da equipe Mercedes Benz. Realmente, o sistema evoluiu com a organização criando um sistema paralelo e que, mesmo que os dois sistemas venham a falhar, tem um terceiro sistema, que é acionado pelo piloto, puxando uma alavanca e agora ficou praticamente impossível termos um problema. No sistema que era usado até 2012 tínhamos um sistema único, integrado e que se, por qualquer motivo, tivéssemos um vazamento e perdêssemos a pressão de ar, o sistema de freios ficava comprometido. Agora, não. Temos os sistemas independentes dos eixos e u cilindro de reserva que dá esta tranquilidade para todos nós, além de uma indicação bem visível no painel, com uma luz vermelha, caso seja identificado algum problema no sistema de pressão de ar. Quando esta luz acende, não quer dizer que o sistema esteja totalmente despressurizado. Indica que a pressão baixou a um nível em que os freios irão perder eficiência e isso é a indicação de que o piloto precisa parar, levar o caminhão para os boxes. Com uma baixa na pressão o piloto pode ter ainda tempo de completar a volta e tentar resolver o problema com a equipe. Se o problema for muito sério e o piloto pisar no pedal do freio e nada acontecer, ou seja, toda a pressão sumiu, o que é praticamente impossível de acontecer, ainda tem a alternativa da alavanca, que é quase como um freio de mão. O piloto puxa e trava o eixo traseiro. Com quatro pneus para fazer o atrito, vai parar rápido. Foi um grande ganho de segurança para todos nós e foi uma alteração que não interferiu na performance dos caminhões. Camilo Christofaro Jr. – Chefe de equipe da IVECO. Apesar dos caminhões serem diferentes, as equipes serem diferentes, o sistema é basicamente o mesmo para todos os caminhões, com uma ou outra pequena alteração de posição dos cilindros de ar comprimido que ficam protegidos pelo chassi, por conta da disposição dos equipamentos que cada caminhão tem que tem diferença de posição. A única coisa rigorosamente igual é o cilindro de ar de reserva, que fica na cabine e o sistema de bloqueio com a cuíca no eixo traseiro. Foi um investimento muito importante que a categoria fez em segurança depois do acidente do Diumar Bueno e não houve um aumento de custo que pesasse no orçamento de nenhuma equipe. Segurança é uma necessidade e a gente não pode brincar com ela. E outra coisa importante é a indicação no parabrisa que permite que a torre veja se um caminhão está com problema e pelo sistema de som e de rádio, todas as equipes ficam sabendo que um caminhão está com problemas. Outra coisa importante foi que o fornecedor de freios da categoria entrou no projeto e como ele fornece para todas as equipes, o sistema foi construído pelas equipes inteiramente padronizado, com as garrafas de ar comprimido todas do mesmo tamanho, o bloqueador do eixo traseiro igual pra todos e assim o custo foi apenas dividido e ficou tranquilo e seguro para todos da mesma forma. Adalberto Jardim – Piloto da equipe RM Competições Depois do acidente do Diumar [Bueno] todos nós conversamos muito sobre o que aconteceu e como a gente podia tentar prevenir que acontecesse outro caso assim. Eu tinha uma ideia, outros tiveram outras, algumas reuniões aconteceram, a Knorr-Bremse, que é a fabricante de freios dos caminhões da categoria também trabalhou nisso e acabamos chegando a este sistema que tem se mostrado muito seguro e eficiente. Se formos comparar o sistema de freio de 2012 para o que usamos ao longo de toda a temporada de 2014 e que continua agora em 2014, em termos de performance o sistema era eficiente e continuou eficiente. A diferença foi a questão de segurança, uma vez que deixamos de ter um sistema de ar comprimido único e passamos a ter um, independente, para cada eixo, além de uma garrafa de reserva e um sistema de travamento da cuíca do eixo traseiro. Mas em termos de eficiência e performance, não mudou nada. Continua bom e agora, bom e mais seguro. Outra coisa que foi bem implementado foi que o sistema de ar, dos cilindros de ar comprimido até os freios passou a ser de ‘tecalon’, que é uma mangueira com uma trama de aço trançada que é flexível, leve e resistente, o que também diminui o risco de vazamentos e aumenta toda a segurança do sistema. O sistema que fizemos aqui foi tão bem montado que a FIA ficou surpresa com o que fizemos. Não sei se eles levaram a ideia e estão usando lá, mas fica o orgulho para todos nós que trabalhamos nesse projeto de que foi feito um trabalho de referência. Carlos Átila – Comissário Técnico da CBA Eu acompanho a categoria em todas as etapas desde 1999 e o trabalho que as pessoas que fazem a Fórmula Truck é simplesmente exemplar. Vamos ao que aconteceu em Guaporé e o que era o sistema de freios do caminhão daquela temporada. O caminhão tinha dois sistemas de freio. Se houvesse um problema no sistema das rodas dianteiras haveria freio para as rodas traseiras e vice versa. Quando havia uma redução do sistema de ar do freio, acendia uma luz no painel para o piloto. Só que quando acende uma luz de advertência no painel do piloto, muitas vezes ele pensa: “dá pra fazer mais uma”... isso num treino. Ou numa corrida, faltando três voltas ele pensa: “se eu paro agora, acabou a corrida, tenho que dar um jeito de me segurar... acho que dá pra ficar na pista”... O piloto é um ser competitivo ao extremo, é algo que, na cabeça dele, é normal. No caso do acidente do Diumar, ele perdeu o freio dianteiro na passagem do radar. Quando ele foi pra grama, só com o freio traseiro, a eficiência deste, que já é menor, diminuiu mais ainda, ainda por cima que a grama e o terreno estavam um pouco molhados. Tudo comprometeu para que aquele acidente acontecesse. Para 2013, a categoria refez o sistema de freio com duas garrafas de ar comprimido, independentes para cada um dos eixos, e uma garrafa de ar comprimido extra, para suprir uma perda de uma destas garrafas, mas não termina aí a alteração. Ele tem uma alavanca onde pode travar a cuíca do eixo traseiro do caminhão. Com relação à indicação de perda de ar no sistema de freios, além da luz no painel, o caminhão tem agora uma luz no parabrisa, que vai indicar para a direção de prova que ele tem problema e assim a direção de prova vai poder determinar que o piloto entre nos boxes. Mas o sistema mostrou-se eficiente ao ponto de não termos precisado agir com relação a isto ao longo de toda a temporada. |