Como todos sabemos, o primeiro alemão campeão mundial de Fórmula 1 foi Michael Schumacher, em 1994. Depois disso, não faltaram títulos para a Alemanha. O queixudo ganhou outros seis e, poucos anos depois, um outro queixo avantajado – Sebastian Vettel – outros quatro... e com perspectivas de ganhar mais alguns! Há 20 anos o que mais temos ouvido é o tal do hino alemão no final das corridas, seja pelos já citados, seja por outros alemães vitoriosos, seja para atual supremacia da Mercedes na categoria. Contudo, apesar de não ter conquistado um título considerado “mundial” até os anos 90, o país da cerveja, da salsicha e do chucrute tem um histórico de vitórias, de supremacia técnica e de grandes pilotos desde antes de ser criado o campeonato mundial de Fórmula 1. Os carros prateados da Autounion e da Mercedes voavam pelas pistas e circuitos urbanos da Europa e do Norte da África nas mãos de ases como Bern Rosenmeyer, Joachim Hans Stuck e Rudolf Caracciola, que apesar do italianíssimo sobrenome, era um “tedesco da gema”! O nosso personagem tinha tudo para ser o primeiro alemão campeão do mundo de Fórmula 1. Dono de um nome quilométrico, Wolfgang Alexander Graf Berghe von Trips vinha de berço, era descendente de família nobre, o que o levou a correr com um pseudônimo – Alex Linter – como vários dos pilotos que são os nossos Nobres do Grid a quem homenageamos. Natural da cidade de Kerpen, bom de braço, melhor que os demais compatriotas de sua geração, chamou a atenção do chefão da Mercedes, Herr Alfred Neubauer, que vislumbrou nele um piloto “da casa” para compor a equipe para a temporada da Fórmula 1 de 1956, onde formaria com Juan Manuel Fangio e Stirling Moss ao volante dos W196 um trio poderoso. O problema foi que no meio do ano de 1955, a catástrofe ocorrida nas 24 Horas de Le Mans, quando o carro de Perre Leveigh foi parar nas tribunas matando dezenas de torcedores, fez com que a montadora alemã deixasse oficialmente as competições ao fim da temporada. Sem uma equipe doméstica para correr, mas mostrando que era potencialmente bom, Wolfgang Von Trips – como era chamado – foi correr na Ferrari. Numa época em que as equipes tinham mais do que dois pilotos, na Ferrari as maiores atenções estavam concentradas em Juan Manuel Fangio e Peter Collins, posteriormente, no lugar de Fangio, Mike Hawthorn, com os demais “compondo o time”. Foi apenas a partir de 1960, quando a equipe começou a adotar os motores traseiros, que Wolfgang Von Trips começou a se destacar. Wonfgang Von Trips: em seus primeiros anos na Ferrari, não era a principal aposta da equipe. Em 1961 a Ferrari construiu seu primeiro carro inteiramente projetado para ter um motor traseiro, entreeixos e seus principais pilotos eram o Norte Americano Phill Hill e ele, Wolfgang Von Trips. A equipe simplesmente dominou o campeonato com seu novo modelo 156 “nariz de tubarão” e seus pilotos principais. Uma disputa leal e sem favorecimentos, como gostava Enzo Ferrari. Os dois chegaram para a disputa do GP da Itália com Wolfgang Von Trips à frente na tabela de pontos, com 33, já no limite para começar a fazer os descartes do regulamento. Phill Hill, na mesma condição, tinha 29 pontos. Era a penúltima prova da temporada, que tinha seu encerramento em Sebring, nos Estados Unidos. Nos treinos, Wolfgang Von Trips cravou a “pole-position”, batendo seu companheiro, Phill Hill. Dada a largada, a disputa no velocíssimo circuito, sem as atuais chicanes era roda a roda. No complemento da primeira volta, o alemão tinha sua posição ameaçada por um jovem piloto chamado Jim Clark, ao volante de um Lotus Wolfgang Von Trips (de jaqueta escura) e Phill Hill, numa época em que a Ferrari não dava ordens de equipe. Chegando na curva Parabólica, a Ferrari de Wolfgang Von Trips e o Lotus de Jim Clark se tocam e o bólido vermelho, desgovernado, vai na direção das telas ao lado da pista onde o público se espremia pra ver a corrida mais de perto... o resultado foi trágico! A Ferrari atinge as telas com o público nela amontoado, volta para a pista e acerta o Lotus de Jim Clark novamente, espalhando destroços pela pista e o corpo do próprio Wolfgang Von Trips, lançado para do carro, ficou em meio aos pedaços da Ferrari entre óleo, combustível e ferragens. Nos dias de hoje a corrida teria sido, pelo menos, interrompida com a bandeira vermelha, mas meio século atrás os acidentes e as mortes pareciam ser algo tão “normal” nas corridas que não apenas a corrida continuou como os pilotos não tomaram ciência da gravidade do acidente. Ao final das 43 voltas, Phill Hill venceu a corrida e com os pontos somados superou Wolfgang Von Trips por apenas um ponto, fazendo 34 a 33, considerando 4 pontos de descarte, uma vez que o regulamento previa que apenas os 5 melhores resultados seriam considerados. O piloto alemão, resgatado ainda com vida do asfalto, faleceu a caminho do hospital. Na torcida, 14 vítimas fatais e vários feridos. Com o título decidido, a Ferrari não seguiu para a última prova em Sebring, nos Estados Unidos. Em torno da morte de Wolfgang Von Trips há uma “lenda”, de que ele era um homem “marcado para morrer”. Em muitos locais de pesquisa pude ler que ele, caso tivesse vencido a corrida e se sagrado campeão, viria a morrer em um acidente aéreo no voo que ele tinha marcado para voltar à Alemanha. Pesquisando na internet, achei um site com o registro de todos os acidentes da aviação comercial ocorridos no mundo desde 1908 e não há nenhum registro de acidente ou fatalidades no dias 10 ou 11 de setembro de 1961, além do que, caso a disputa continuasse aberta, os pilotos teriam disputado mais uma corrida naquela temporada. Nas terras pertencentes à Wolfgang Von Trips e sua família, o piloto mandara construir um pequeno kartódromo, que veio a ser vendido depois de sua morte. O morador da cidade de Kerpen que comprou o circuito, além de cuidar do mesmo e ganhar algum dinheiro com seu aluguel, deixou seus filhos crescer “brincando” no traçado e aprendendo a pilotar. Seu nome? Rolf Schumacher! A cidade tem em um de seus jardins uma estátua de Wolfgang Von Trips, mas se foi a sua semente ou um mítico renascer como o da Fênix para que outro morador da região conquistasse as glórias que o acidente em Monza não o deixou concretizar, isso fica por conta do entendimento de cada um. Felicidades e Velocidade, Paulo Alencar |