No final da tarde de 29 de novembro de 1975, um pequeno avião Piper Aztec, PA 23-250 sem matricula voava para o norte de Londres, vindo de Paul Ricard. Lá dentro, aos comandos do avião, ia Graham Hill, de 46 anos, que meses antes tinha encerrado a sua longa carreira de piloto, e como passageiros estavam Tony Brise, o piloto da marca, e que aos 23 anos tinha-se estreado na Formula 1 e era considerado um dos mais prometedores do pelotão, o projetista Andy Smallman, o diretor técnico Ray Brimble e os mecânicos Tony Alcock e Tery Richards. Smallman tinha desenhado o Hill GH2, que tinha sido testado naquele dia na pista francesa com resultados prometedores, e mais dois mecânicos que faziam parte da equipa. Hill tinha alguma pressa em chegar a Londres, pois nessa noite iria a um jantar com potenciais patrocinadores para a temporada de 1976, apesar de ter o apoio dos cigarros Embassy, o patrocinador principal. Como era costume, aquela zona de Londres estava envolvida em nevoeiro, mas Hill decidira confiar no seu instinto e aterrar numa pista de Elstree, no norte da capital. O britânico receava não ter tempo – e depois se soube, gasolina suficiente… - para contornar o nevoeiro e aterrar numa pista livre de obstáculos. E ainda por cima, o dia estava a chegar ao fim, e a visibilidade era essencial para uma boa aterragem. UMA MANEIRA DE PROLONGAR A SUA CARREIRA No final de 1972, Graham Hill tinha sido dispensado pela Brabham, depois de duas temporadas modestas. Hill tinha 43 anos e corria desde 1958, numa carreira com altos e baixos, dois títulos mundiais e um acidente que quase o matou em Watkins Glen, em 1969, ainda estava ao serviço da Lotus. A sua recuperação tinha sido notável, mas o tempo já fazia as suas mossas, apesar de ter vencido uma corrida extra-campeonato em 1971, o BREC International Trophy, em Silverstone. Por essa altura, tinha ido para a Brabham, mas apenas conseguiu cinco pontos nas duas temporadas seguintes. Por essa altura já tinha chegado Bernie Ecclestone à Brabham e achou por bem apostar no argentino Carlos Reutemann. Depois de uma carreira com dois títulos mundiais, Graham Hill decidiu apostar em uma equipe própria. Sem carro mas com vontade de correr, ele decidiu que seria melhor ter a sua própria equipa. Arranjando o patrocinio dos cigarros Embassy, adquiriu um Shadow DN1 na temporada de 1973, ano em que a equipa americana tinha-se estreado na Formula 1. Contudo, os resultados tinham sido decepcionantes, com apenas um nono lugar como melhor resultado. Hill mudou de chassis no ano seguinte, para um Lola, e as coisas foram um pouco melhores, com um sexto lugar na Suécia, a última vez que pontuou na sua longa carreira e o mais velho a pontuar desde Juan Manuel Fangio. Nessa temporada de 1974, decidiu fazer um segundo chassis para pilotos pagantes, primeiro o alemão Rolf Stommelen, e depois ao britânico Guy Edwards, todos com resultados modestos. Em 1975, Hill decidira continuar a correr, apesar de já ter 46 anos, e convidara o projetista do Lola, Andy Smallman, desenhar um carro com nome próprio. Tendo como base o chassis anterior, apareceu o GH1, e a sua estreia aconteceu na terceira prova do ano, no GP da África do Sul. Mas antes disso, a equipa andaria com o Lola, com Hill e Stommelen ao volante, nas duas primeiras provas do ano, na Argentina e no Brasil, com resultados modestos. Quando o carro estreou (ainda se chamando Lola T371), nas mãos de Stommelen, o alemão fez uma boa corrida, chegando ao sétimo posto, a pouco menos de dez segundos do McLaren de Jochen Mass, o último piloto classificado. Tudo isto em contraste com Graham Hill, que não tinha conseguido qualificar-se devido a um acidente nos treinos com o chassis antigo. LIDERANÇA E DESASTRE A prova seguinte foi em Espanha, no veloz circuito urbano de Montjuich, no centro de Barcelona. Quando o pelotão da Formula 1 lá chegou, verificou que os procedimentos de segurança eram inaceitáveis para os pilotos, ameaçando greve, contra a ideia dos organizadores de que estavam de acordo com os regulamentos. Entre ameaças de retenção dos seus carros e os gestos dos mecânicos para aparafusar os guard-rails (ficou famosa a imagem de Ken Tyrrell a aparafusar guard-rails nas horas anteriores à corrida…), Rolf Stommelen tinha conseguido levar o carro a um surpreendente nono lugar da grelha, numa qualificação onde os irmãos Fittipaldi decidiram boicotar a corrida. Em 1975, durante algumas voltas, Rolf Stommelen chegou a liderar o GP da Espanha. Stommelen aproveitou a confusão das primeiras voltas para ficar nos lugares da frente e à nona volta, era terceiro classificado, atrás de Mário Andretti e John Watson. Mas na volta 17, com a desistência do americano e os problemas mecânicos do piloto inglês, Stommelen ficou com a liderança, a primeira vez que tal acontecia na Formula 1. Contudo, era pressionado pelo Brabham de Carlos Pace até à volta 25, quando a sua asa traseira cedeu e ele sofreu um despiste a alta velocidade, matando cinco pessoas e ferindo-se gravemente. UMA DESPEDIDA APOTEÓTICA Graham Hill voltou à ativa no Mónaco, mas depois de falhar a qualificação na corrida que mais gostava, decidiu que iria abandonar o volante de vez para ser o gerente da equipa. Sem Stommelen, convalescente no hospital, virou-se para um jovem britênico de 23 anos, de seu nome Tony Brise, para ser o seu piloto. A sua estreia tinha acontecido em Barcelona, pela Williams, mas tinha sido como substituto de Jacques Laffite. Brise estreou-se na Bélgica e deu-se bem com o carro, sendo sétimo na grelha, mas desistiu cedo, com problemas de motor. Na corrida seguinte, na Suécia, chegou ao sexto posto e conseguiu dar a Graham Hill o seu primeiro ponto como construtor. Mas a grande aposta de Graham Hill na equipe era um jovem inglês: Tony Brise. Na corrida seguinte, na Holanda, contratou o seu segundo piloto, um jovem australiano de 28 anos chamado Alan Jones, que tinha começado o ano num Hesketh privado, e a ideia era que ficasse até que Stommelen recuperasse das suas feridas. No final, foram apenas quatro corridas, mas rendeu, pois deu à equipa mais dois pontos, com um quinto lugar no GP da Alemanha. Stommelen regressou na corrida seguinte, na Austria, e correrá também em Itália, antes de Hill mandar apenas Brise para Watkins Glen, palco na última corrida do ano, onde acabou por desistir na quinta volta, vitima de um despiste. No final da temporada, as coisas tinham corrido bem: três pontos e a descoberta de um talento como Brise fez com que Graham Hill apostasse nele para a temporada seguinte, num só carro, o GH2, de novo desenhado por Smallman. No GP da Inglaterra, uma despedida para o seu público sob aplausos. Contudo, meses antes, em Silverstone, momentos antes da largada do GP da Grã-Bretanha, Graham Hill entrou num dos seus carros e deu uma emocionada volta à pista para se despedir do público como piloto. Hill era popular e carismático e uma personalidade que aparecia frequentemente na televisão, graças ao seu bom humor, e naquele dia de julho, em Silverstone, o piloto de 47 anos mal conseguia conter as lágrimas por ter sobrevivido a 18 anos e enganado a morte por muitas vezes, sobrevivido para contar a sua história. O TRÁGICO FINAL A menos de dois meses da nova temporada, os espíritos estavam animados na equipa Hill, depois de ver que o GH2 poderia ser um chassis bem conseguido. A confiança era grande, e todos pensavam que em 1976, os resultados poderiam ser melhores. Na tarde de 29 de novembro, depois de um dia de testes, Hill leva parte da sua equipa para Londres para um jantar com potenciais patrocinadores. Já se faz tarde naquele final de outono e tinha-se assentado nevoeiro na zona de Londres, mas Hill tinha decidido desafiar o tempo, pois não queria perder esta oportunidade. Em sua segunda corrida, Brise marcou 1 ponto com o 6º lugar na Suécia. Hill procurava passar seus ensinamentos. Depois de algum tempo de voo, por volta das seis da tarde, estavam perto do aeródromo de Elstree, mais concretamente em Arkley, mas o que não sabiam era que estavam a voar baixo demais. Foi por isso que não viram uma árvore que estava no limite do campo de golfe local e o avião bateu fortemente, sem pegar fogo, contudo. Hill, Brise, Smallman, Brimble, Alcock e Ricards tiveram morte imediata. O desastre foi um choque na Grã-Bretanha e no mundo. Anos depois, Damon Hill contou que souberam do acidente quando a BBC interrompeu a emissão para informar que tinha caído um avião, que na altura não sabia que era do seu pai. O funeral de Graham Hill foi discreto e comovente, bem ao estilo inglês. O funeral aconteceu alguns dias depois, na abadia de St. Albans, e ele foi enterrado na igreja de St. Botolphs. Isto foi também o final da equipa Hill, pois descobriu-se que nenhum dos elementos da equipa tinha seguros de vida, e a viúva foi obrigada a pagar indemnizações às famílias. Logo, a equipa foi desfeita e o GH2 nunca correu na realidade. Foi assim o final triste de uma lenda do automobilismo e a história da sua curta carreira como construtor. Saudações D’além Mar, Paulo Alexandre Teixeira
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