No intervalo de menos de uma década perdemos o Autódromo de Jacarepaguá (municipal), no Rio de Janeiro, o Autódromo de Brasília (estadual) foi semidestruído numa reforma que não se sabe onde vai parar e agora temos o Autódromo de Curitiba (privado), às portas do seu fechamento. O que pode ser feito, quem pode fazer algo e como isso poderia ocorrer para que paremos de perder autódromos no Brasil? Cacá Bueno – Piloto da Equipe A.Mattheis/Redbull da Stock Car. Além destes citados vamos incluir o lindíssimo Autódromo de Guaporé, onde a gente não pode correr mais, os Autódromos de Caruaru onde não há condições de termos uma corrida da Stock Car, Fortaleza onde o autódromo não tem condições de receber corridas, a não ser os regionais e um lugar onde as pessoas gostam muito de automobilismo e vão nas corridas. No caso de Curitiba é algo que faz todo sentido. A especulação chegou e o dono entende que vai ser muito mais lucrativo para sua empresa vender do que manter. O autódromo, como praça de esportes tem que ser de alguma esfera de governo. Seja municipal ou estadual e é um espaço que pode ser utilizados de diversas formas. Podem acontecer shows, eventos diversos, podem ser feitas parcerias técnicas, track days... há como movimentar o espaço o ano inteiro. Veja o que é um evento como esse: os hotéis da cidade estão lotados, as locadoras de veículos locaram toda a sua frota, os aviões vieram pra cá cheios, os restaurantes e bares estão cheios, contratam 100 meninas para promoção, uma galera pra montar e desmontar as arquibancadas tubulares, mais equipe de segurança e tudo isso gera receita, imposto, renda, lucro pra cidade. O autódromo recebe um aluguel, o restante é da cidade ganha milhões com um evento de automobilismo. É por isso que no Rio Grande do Sul tem 4 autódromos, sendo 3 municipais. Eles veem que ganham dinheiro e visibilidade com isso. A cidade ganha e pode investir em educação, segurança, urbanização. Essa é a conta que tem que ser mostrada. Paraná e Rio Grande do sul tem cidades investem em autódromos. Santa Catarina não tem autódromo, o Rio de Janeiro também não, o interior de São Paulo idem e todos aqui gostaríamos de ir a Caruaru e Fortaleza, mas é preciso que os administradores municipais e estaduais vejam o autódromo como um grande negócio e quem tem que mostrar isso para eles são as federações e a confederação brasileira de automobilismo. Algumas federações fazem isso bem, infelizmente, a maioria não faz. Franz Shimidt – Chefe da Equipe Mercedes na F. Truck. Na verdade, o maior problema que eu acho que está acontecendo é na parte administrativa. Em termos de quantidade e qualidade de competições, eu acho que o Brasil tem condições suficientes de manter os seus autódromos funcionando e talvez até haja espaço para mais alguns, mas o autódromo feito somente para competição e isso não é o suficiente. A missão de um autódromo tem que ir além disso, tem que atingir uma estrutura de base. Esta estrutura de base vai desde as categorias mais simples, para o piloto que sai do kart e vai para os carros ou mesmo as escolas de pilotagem, para aqueles que não puderam ser pilotos quando mais novos e que depois de adultos puderam realizar o sonho de ir para as pistas. Além disso, os autódromos podem ser alugados para as empresas fazerem testes com seus veículos, para montadoras de pneus testarem seus produtos, e outras possibilidades que se os administradores de autódromo tiverem uma mente aberta para as possibilidades eles podem aumentar a rentabilidade dos autódromos. Como qualquer esporte, o automobilismo precisa ter o incentivo dos governos municipais e estaduais. O automobilismo é um esporte que gera muitos empregos. Uma equipe não é feita só de um chefe de equipe e dois pilotos, tem uma grande estrutura por trás e apenas uma parte dela vai para a pista, com os mecânicos. Muitos ficam na sede, trabalhando. O Brasil tem uma população gigante e certamente tem muitos talentos que não foram e nem serão descobertos para o esporte por falta de políticas de incentivo e de integração. Há quanto tempo o Brasil não vence na Fórmula 1? Quantos pilotos estão correndo nas categorias de acesso? Um esporte que forma atletas de alto nível incentiva seu crescimento. Hoje quem quer ser piloto? A lei de incentivo ao esporte deveria abranger os autódromos como meio de formação de cidadãos, desde os que praticam o esporte aos que trabalham para a formação destes atletas. Se direcionar as ações de forma correta, temos como parar de perder autódromos. Nelson Ângelo Piquet – Piloto da Fórmula-E e Rally Cross. Bom, eu sou piloto, não sou empresário. Se tem ou não autódromo, vai ter ou não corrida ou local pra correr é algo sobre o que eu posso falar no ponto de vista de piloto. Como piloto eu penso que quanto mais autódromos e bons autódromos, melhor e que quando um autódromo fecha, que perde é o público que deixa de ver corridas e isso acaba levando este público, com o tempo, a deixar de ver corridas na TV, também. É algo que os dirigentes deveriam pensar. Não é todo mundo que pode sair daqui de Curitiba, por exemplo, e ir assistir a corrida em Interlagos, ou sair de Brasília e ir assistir a corrida em Goiânia, que a distância é até menor. Há alguns anos eu moro nos Estados Unidos e não há nem como comparar as condições de lá com as daqui para o automobilismo bem como para qualquer esporte. Lá existe uma outra cultura de incentivo ao esporte que o Brasil está muito longe de atingir. Carlos Alves – Chefe da Equipe C.Alves/Eisenbahn da Stock Car. Infelizmente, nós, chefes e donos de equipe, apaixonados pelo automobilismo, não podemos fazer nada. Isso é algo que os administradores públicos, prefeitos, vereadores, governadores, deputados enxergarem que os autódromos são uma excelente maneira de se divulgar seu estado, sua cidade, sua região, não apenas com o automobilismo, mas também com o motociclismo. Todas as cidades que perderam autódromos, certamente perderam receitas com impostos que deixaram de ser arrecadados e mesmo no caso daqui de Curitiba, que é um autódromo privado, que o governo não colocou dinheiro na construção, mas que ganhava com a vinda dos eventos para a cidade, vai deixar de ganhar este dinheiro. Infelizmente, só nos resta esperar que os gestores públicos abram os olhos e vejam que o automobilismo é um esporte que gera empregos, que gera desenvolvimento, que gera impostos com turismo e consumo e que como atração turística, ter um autódromo e bons eventos é algo bom para as cidades. Lucas Di Grassi – Piloto da Audi no WEC e da Fórmula-E. Pra mim isso é um reflexo da má gestão do automobilismo brasileiro. O descaso das autoridades competentes e a falta de credibilidade de algumas entidades. O automobilismo brasileiro precisa de uma reestruturação geral. Desde o modelo de gestão, passando pelas categorias de base até as categorias profissionais. É preciso que haja uma união de forças em torno de um propósito comum. Se o automobilismo não está bem, o que podemos fazer para ele melhorar. Não é o caso de se dividir, mas de se unir. Isso é mais uma função macro do que um caso específico. Com a situação atual, o risco é que percamos ainda mais autódromos. Autódromos antigos tem o problema de as cidades terem chegado perto deles, alguns estão hoje em áreas nobres e uma construção mais antiga é sempre mais caro pra fazer a manutenção. Manter um autódromo assim funcionando não faz sentido se ele não for bem gerido. O automobilismo brasileiro, por outro lado, também impõe limites. Não dá pra ter trinta autódromos se não há categorias correndo para ocupar estes autódromos todos e torná-los economicamente viáveis. Ninguém vai investir em construir um autódromo para ter uma ou dias corridas no ano. Curitiba e Interlagos são autódromos que são locados todos os finais de semana o ano inteiro e em algumas regiões há espaço para crescimento, mas aí já entramos na questão da situação econômica do pais. O Brasil está vivendo uma crise e isso está afetando todos os seguimentos. O automobilismo não ficaria livre das consequências, especialmente se compararmos com as necessidades de investimento em saúde e educação, investir em automobilismo é algo que podemos chamar até de supérfulo e isso serve também para estádios de futebol, não só para autódromos. Antes de querer que os governos pensem em construir novos autódromos, é preciso que haja investimento em áreas que o país está carente. Mas isso não impede que a iniciativa privada faça este tipo de investimento. Uma Parceria-Público-Privada pode fazer autódromos pequenos e eficientes, que atendam as necessidades do automobilismo local. José Cordova – Proprietário e Chefe de Equipe no Mercedes Challenge. É uma coisa muito difícil você evitar hoje que um espaço amplo, de boas condições estruturais e na maioria dos casos bem localizado não seja fruto de especulação imobiliária como foi Jacarepaguá e como está sendo o autódromo aqui de Pinhais. No caso daqui de Pinhais não vamos perder só o autódromo. Vamos perder o kartódromo que é um dos melhores kartódromos que temos no Brasil para treinamento, para competições, em termos de instalações, de localização, que é perto de tudo e fácil de se chegar, mas não há mais o que fazer. No caso aqui do nosso autódromo, é uma propriedade privada e se o dono quer vender, precisa vender, ele vai vender e outra coisa vai tomar o lugar do autódromo como eles já disseram que vai ser. Tem pessoas tentando mudar a situação, mas o negócio já foi fechado e não tem mais o que fazer. No caso dos autódromos públicos, o problema são os governantes, de quem a gente nunca sabe o que pode esperar. Veja o que aconteceu no Rio de Janeiro: um prefeito era a favor, o outro era contra e os dois eram brigados e quando um que não queria o autódromo o autódromo acabou. Vem um que gosta e faz algo, aí o seguinte, por não gostar do sucesso do outro vai e desfaz. Mas se o AIC fosse municipal ou estadual, ele não fecharia, não seria vendido, tenho certeza. Ricardo Mauricio – Piloto da Equipe RC/Eurofarma da Stock Car. O que nós, os pilotos, podemos fazer é quase nada, ainda mais no caso de um autódromo privado como é Curitiba. Mas algo realmente precisa ser feito e tenho certeza que os pilotos aceitariam participar de qualquer ação no sentido de salvar outros autódromos de um fechamento. A CBA deveria ter um papel de importância, de liderança, para buscar meios, buscar recursos para buscar um incentivo de algum seguimento para conseguirmos pelo menos terminar a reforma do autódromo de Brasília, isso já seria um ganho muito grande para o nosso automobilismo, mas no caso daqui e do Rio de Janeiro, infelizmente não vejo mais o que fazer. Além desta questão, temos outros autódromos que precisam de reformas e que precisariam ser feitas. Trazer de volta Guaporé para o calendário, fazer uma reforma em Caruaru, que eu não conheço, mas ouço falar bem do traçado e este ano, graças a Deus, estamos ganhando Curvelo, em Minas Gerais, mas a gente precisava ter pelo menos mais dois autódromos no Brasil em condições de receber categorias grandes para não termos que ficar repetindo autódromos no calendário. Pedro Muffato – Piloto da Equipe Muffato na F. Truck. É verdade, mas tem alguns autódromos que deram uma melhorada, como foi o Autódromo de Cascavel, mas eu vejo esta coisa como sendo um pouco do reflexo da nossa falta de pilotos na Fórmula 1 que esteja ganhando corridas, ganhando campeonatos. O brasileiro é muito acabou ficando mal acostumado porque sempre tinha lá um piloto ganhando corridas, sendo campeão do mundo e faz muito tempo que isso não acontece e isso influencia tanto o dirigente público quanto o particular de que o automobilismo está perdendo a força que tinha. A gente precisava de alguém para dar uma motivada no meio. Quando foi o último campeonato de Fórmula 1 que um piloto brasileiro esteve perto de ganhar? Foi em 2008 com o Felipe Massa. Depois disso, tivemos ainda umas vitórias do Rubinho em 2009 e hoje mal temos colocado um piloto no pódio. Eu penso que este seja o grande problema para o automobilismo brasileiro voltar a ganhar impulso. Wilson Fittipaldi Jr. – Nobre do Grid. O que está acontecendo com os autódromos aqui do Brasil é uma tristeza, não tenho outro termo para descrever. Eu acho que falta um trabalho muito, muito grande da Confederação Brasileira de Automobilismo junto aos meios dirigentes, ao meio político para que praças de esporte não desapareçam. Acho que a CBA trabalhou muito pouco neste sentido. Ninguém lê notícia de estádio de futebol, de ginásio de vôlei, de parque aquático de natação sendo demolido ou fechado. A gente ouve e vê isso de autódromo. E poderia ter ido mais um nesta conta: o Autódromo de Goiânia esteve perto de fechar e foi o governador que decidiu fazer uma reforma grande e hoje Goiânia é um autódromo revitalizado. A Confederação precisa agregar a comunidade do automobilismo em torno de uma causa comum. Reunir os pilotos, os chefes de equipe, os promotores de categoria e buscar junto ao poder público, instrumentos para que autódromos como este em Curitiba, que é um autódromo excelente, seguro, bem construído e que não poderia estar passando por esta situação. Rosinei Campos (Meinha) – Chefe e Proprietário da Equipe RC/Eurofarma na Stock Car. É com muita pena que eu vejo como isto está acontecendo, ainda mais com este autódromo, que é um dos melhores que temos no país e uma referência de boa forma de como se cuidar de um autódromo. O Brasil não tem tantos autódromos bons com este e isso é muito ruim para o nosso esporte, que sempre foi um formador de talentos, que conquistou oito campeonatos mundiais de Fórmula 1 e tantos outros títulos internacionais, levando o nome do Brasil para o mundo. Me incomoda, me entristece ver que nossos esporte não recebe um décimo da atenção que é dada ao futebol. Eu gosto de futebol e acho que deve se dar ênfase ao esporte que é o mais popular do país, mas veja que para a copa do mundo construíram estádios ao custo de um bilhão, um bilhão e meio, dois bilhões de reais e muitos ficam sem atividade alguma por semanas e semanas. O autódromo aqui de Pinhais está sendo vendido por cem, cento e vinte milhões. Construir um é ainda mais barato. Deveriam dar atenção a esta parte. O esporte a motor não poderia ser tão desvalorizado. O estado poderia comprar e investir nele como um centro de formação, com atividades diárias, com locações como é feito e gerar retorno, além de manter a praça esportiva como algo útil para o Paraná. Mas a gente sabe que o cenário econômico e principalmente político do país, que tem nos deixado indignado, não permite que isso aconteça. Fabio Greco – Chefe e Proprietário da Equipe Greco/Renault no Br. de Marcas. O maior inimigo dos autódromos aqui no Brasil é a especulação imobiliária. Quando foi construído o autódromo de Pinhais – e eu me lembro bem disso, era um menino e vim na inauguração com meu pai – aquilo lá era longe pra burro. Longe de tudo, um matagal, dava trabalho para chegar lá. Não demorou muito para a cidade crescer, tanto Curitiba como Pinhais, e cercarem o autódromo. No Rio de Janeiro foi a mesma coisa, aquela parte ali em Jacarepaguá tinha umas áreas alagadas, que foram aterradas para fazer o autódromo novo e já tinha feito umas coisas no antigo autódromo, dos anos 60/70, de antes de receber a Fórmula 1. Era muito longe, mas a cidade cresceu naquela direção e cercou o autódromo. Aquela parte de onde era a pista virou Barra da Tijuca, para aumentar os impostos, e alimentar a especulação imobiliária. Em Goiânia os “Alphaville” cresceram na direção do autódromo. Um autódromo toma uma área muito grande, onde podem ser feitas várias coisas, vários projetos, e isso sempre vai provocar especulação sobre o local, mais cedo ou mais tarde. Acho que livre deste tipo de problema a gente só tem o Velocittá, que fica dentro de uma fazenda, e os autódromos do Rio Grande do Sul, como Tarumã, Santa Cruz e os outros. O nosso país é puramente político é preciso se fazer política para se conseguir qualquer coisa que se busque e se não tivermos uma entidade que trabalhe, politicamente, para o esporte, fica muito difícil. As pessoas que não conhecem o meio não sabem o que é o automobilismo e falta gente para expor o que é o nosso esporte para o meio político para que ele seja mais valorizado. Neusa Navarro Felix – Presidente da Fórmula Truck. No caso específico de Curitiba é uma pena muito grande. Eu considero o autódromo de lá simplesmente perfeito. Ele é compacto, tem o tamanho certo, costumo dizer que ele é uma miniatura de São Paulo. Eu não consigo entender como é que os governantes vão permitir que se destrua um autódromo que é um bem para a população local, mesmo ele sendo privado. Um bem que gera recursos para a região todas as vezes que acontece um grande evento, que tem uma geração de empregos para várias equipes que tem sede ali perto e não apenas das categorias nacionais, mas do regional. Eu acho que como é uma propriedade particular, os seus donos devem ter o direito de fazer aquilo que acharem poder fazer de melhor para eles, mas o governo estadual deveria pensar em comprar este autódromo e tomar a frente para não se perder algo que já está pronto. Eu acho que precisamos unir nossas forças e trabalhar juntos. Reunir os promotores das categorias e a direção da CBA para ir a Brasília e falar com as pessoas que governam este país para olhar para o automobilismo como se olha para outros esportes por que desta maneira não podemos continuar. Pela televisão nós podemos assistir as corridas que estão acontecendo pelo mundo e sempre vemos autódromos com muito público, com eventos bem organizados e que dão retorno porque eles tem bons autódromos, eles tem autódromos bonitos e nós temos que nos virar para fazer corridas em autódromos que muitas vezes nós é que temos que consertar, quanto mais esperar que sejam construídos novos autódromos. Estão construindo agora o autódromo em Curvelo, Minas Gerais, que é um investimento privado, mas é o ganho de um para a perda de três e somos nós que sofremos com isso. |