Norman Barbosa Casari nasceu em São Paulo, no dia dois de março de 1936, ano da famosa prova de rua ocorrida na cidade... será que de alguma forma isso influenciou? Pergunta para os astrólogos de plantão! Filho de família de posses (seu pai, Antonio Casari, era industrial... Italiano radicado no Brasil e casado com Sílvia Barbosa, a quem incumbia cuidar da casa como era normal naqueles tempos. O pequeno Norman foi um “motorista precoce”. Com incentivo do pai, aprendeu a dirigir ainda criança... com cerca de 10 anos. Como todo garoto que se preza – até nos dias de hoje – com 12 convidou um amigo para dar umas voltas pelo bairro! Apesar de nada ter acontecido, a bronca dos pais foi inevitável. No final dos anos 40 a família mudou-se para o Rio de Janeiro e Norman teve a sua primeira experiência em duas rodas, participando de uma corrida com bicicletas motorizadas. Contudo, não sentiu-se à vontade. Algo o empurrava para as quatro rodas desde cedo. Foi apenas em 1960, com 24 anos, que Casari estreou como piloto... mas ainda não nas pistas. Ao volante de um Volkswagen, participou de uma prova em 1960 em Brasília. A sua estréia nas pistas deu-se na III edição das 24 horas de Interlagos, em parceria com Carlos Erimá. Foi 24º na geral e 13º em sua categoria, pilotando um DKW-Vemag. Participando de outras provas com este carro, chamou a atenção do chefe do Departamento de Competição da fábrica, Jorge Lettry, tendo sido convidado para integrar a seleta equipe que contava com pilotos do gabarito de Marinho Camargo, Anísio Campos, Bird Clemente, entre outros. Sua marca registrada era o número do carro, 96, que Casari dizia ser seu número de sorte. A primeira vitória só veio em 1965, na Segunda Etapa do Campeonato Carioca de Automobilismo, ao volante do seu já famoso DKW 96. Naquele ano, Casari também competiu ao volante de um DKW Malzoni, de Rino Malzoni, ao lado de Anísio Campos... mas a corrida de sua vida ainda estava por vir... Em 1965, começou a trabalhar a idéia de criar um carro com formas aerodinâmicas para ser capaz de bater o recorde de velocidade para carros abaixo de 1000cc. com carroceria de alumínio desenhada por Anísio Campos sobre um chassi de F-Júnior e motor DKW dois tempos e 1L (na verdade, exatos 1089cc). Um negócio meio fora de propósito para a época, fruto da ousadia e capacidade inventiva de Jorge Lettry, diretor de competições da Vemag (que àquela altura já estava sendo comprada pela Volkswagen no final de 1966) e tendo como Mecânico-Chefe o respeitadíssimo Miguel Crispim. O assunto foi tratado como segredo de estado... e oito meses de segredo na fábrica que teve sua linha de automóveis fechada em 1967. Contudo a marca histórica e até hoje não superada ocorreria ainda em 1966. Na manhã do dia 29 de junho, na Rio-Santos, todos estavam a postos. O piloto escolhido para bater o recorde era Mário César de Camargo – o Marinho – que era o piloto número 1 da equipe Vemag. Contudo, Marinho não sentiu muita confiança naquele bólido e desistiu. Que ninguém pense ter sido um ato de covardia... segundo Miguel Crispim, era uma coisa que parecia fugir ao bom senso. “A gente se escondia atrás de um Candango (carro da época) quando ele passava, de medo que o Norman fosse perder o controle”. Exatamente! Diante da recusa de Marinho, que considerou o carro instável demais, Jorge Lettry convidou Norman Casari, que era piloto da equipe e que estava presente para assumir o volante. Norman aceitou o desafio e assim, entrou definitivamente para a história do automobilismo Brasileiro, estabelecendo em 2 passagens cronometradas e medidas com sensores – na época – de alta precisão 214,477 km/h na primeira passagem e na segunda 211,329 km/h, obtendo a média de 212,903 km/h. Feito jamais repetido até os dias de hoje no Brasil. Alguns detalhes interessantes marcaram este feito da indústria nacional. Primeiro, Norman pediu que fosse instalado um grande volante de madeira, para sentir melhor e corrigir se necessário qualquer reação do carro. Segundo, para melhorar a performance dos pneus, que com excesso de aderência devido ao calor, os mesmos foram montados e colocados propositadamente dentro d’água... na lagoa de Marapendi para serem usados abaixo da temperatura ambiente e por fim, optaram pelo uso de pneus diagonais ao invés do modernos radiais que causavam um excessivo grip na dianteira. Após o recorde, o Carcará voltou para a fábrica Vemag e depois foi doado a Norman Casari, ficando em exposição na sua concessionária a “Cota”, em Botafogo. O carro lhe foi doado e ele fez do chassi vitorioso a base da construção do protótipo Casari A1, alguns anos depois. Os anos de 1966 a 1971 foram os melhores anos para Norman Casari. Em 1966 conquistou o título carioca depois de ganhar quatro das cinco corridas válidas, três delas com o DKW Malzoni, e a outra com um DKW Vemag. Campeão do ano anterior, Norman Casari era o franco favorito à conquista das vitórias já nas corridas iniciais do Campeonato Carioca de 1967, título que ele confirmou no final da temporada. Naquele ano os monopostos começavam a ocupar casa vez mais espaço nas pistas e as Fórmulas Ford e Vê reunia a nata do nosso automobilismo da qual Norman fazia parte. Foi graças a este reconhecimento que ele foi um dos convidados a participar do famoso teste na equipe de Fórmula Ford de Stirling Moss, do qual participaram também Marinho Camargo, Ricardo Achcar e Luiz Pereira Bueno em 1968, que colocaria dois deles na equipe em 1969. Em 1970 ele ainda voltou à Inglaterra, correndo três provas com um Titan, alugado. Apesar dos bons resultados (2 terceiros e 1 sexto lugar), o retorno para o Brasil foi inevitável dado os custos de se correr na Europa, mesmo naquele tempo. Foi naquele ano de 1970 que Norman Casari, morando em Petrópolis, conseguiu estabelecer uma parceria com a cervejaria brahma, criando a equipe Casari-Brahma, que contava também com os pilotos Jan Balder, Milton Amaral e Renato Peixoto e tinha como carros uma Lola T70 Mk3A/Chevy, 4999cc e 430 cv nas X Mil Milhas Brasileiras, e como sempre com usando o nº 96. e o protótipo Casari A1, que fez sua estréia pouco antes, nas 2 Horas de Velocidade do Paraná, em Pinhais, mas que obteve sua primeira vitória pelas mãos de Renato Peixoto, em 1971, no Torneio União e Disciplina. No ano seguinte a equipe teve uma grande perda material... o acidente e o incêndio do Lola T70. Treinando para os 500 Km de Interlagos de 1971, Norman Casari sofreu um acidente na antiga Curva Três. Ao sair do carro, esqueceu a bomba de combustível elétrica ligada, o que deu início a um incêndio no carro. Com tanques ainda cheios e grande parte do carro feito em magnésio, o fogo logo se tornou incontrolável (metais inflamáveis como o Magnésio necessitam de produtos especiais para a extinção do incêndio. Na época havia o Halon, hoje proibido pelo alto nível de agressão à camada de ozônio, tendo sido substituído há cerca de 1 década pelos compostos em pó AF200 e Met-A-Ex), apesar dos esforços dos que o acudiram nesta hora. Para piorar a situação, os bombeiros, quando chegaram ainda jogaram água sobre o magnésio, promovendo mais fogo sobre os restos do Lola T-70.
Pouca coisa se salvou daquele carro, tendo o que restou ficado guardado com em sua casa, em Petrópolis (após a morte do piloto, o carro foi para os Estados Unidos e foi completamente restaurado, aproveitando-se parte do monocoque original de alumínio e poucas peças da suspensão, a fim de manter sua autenticidade. O restante do carro foi completado com peças e carroceria originais da Lola Cars, através de seu programa Lola Heritage – que constrói Lolas T-70 com certificação e numeração de fábrica, inclusive com a pintura original da equipe Casari-Brahma). Como já mencionamos, O Casari A1 tinha chassis herdado do Carcará. Nele foi instalado um motor Ford V8, de Galaxie, com coletor de admissão e a tampa da corrente do comando sendo feitos em alumínio pelo próprio Norman em Petrópolis/RJ. A carenagem frontal era a do AC – projeto de Anísio Campos – que Norman considerou ser mais fácil e econômico fazer uma adaptação do que criar uma frente totalmente nova. Anísio Campos contribuiu de bom grado para o sucesso do projeto do amigo, cedendo a peça. A construção deste carro começou em 1968. Ou seja, foram mais de 2 anos de trabalho árduo.
Apesar de todo seu potencial, o protótipo Casari teve relativamente pouca atividade durante sua vida. Por razões que nunca serão explicadas (Norman guardou com as razões que o levaram a isso). No início de 1972 estava programada uma corrida chamada Copa Paraná, que seria realizada no Autódromo de Pinhais. A prova seria disputada por protótipos nacionais, e Casari resolveu que valia a pena alinhar o Casari A1 novamente. Ele já havia corrido naquela pista com o Casari, em 1970, abandonando. Desta feita, estaria concorrendo contra carros da classe “Esporte Nacional”. Entre outro, estavam inscritos Newton Pereira com o protótipo Amato com motor Chevrolet Opala 2500, Vicente Domingues com Heve VW, e Luis Moura Brito, com um protótipo feito no Paraná, o Manta-VW. Além disso, Pumas, muitos Pumas com Jan Balder, Antonio Meirelles, Pedro Muffato, Heraldo Lopes e Ney Faustini. A corrida de duas baterias de 25 voltas acabou sendo ganha com certa facilidade por Casari, sob chuva. No início, Luiz Moura Brito perturbou um pouco, para felicidade da torcida local, cerca de 4 mil presentes que encararam o mal humor meteorológico, contudo, o Manta não suportou o ritmo de prova imposto pelo A1 ( um carro com um motor de 300 cv). Casari venceu a prova fazendo as 50 voltas com média de 144 km/h, e uma volta à frente de Antônio Meirelles, o 2º colocado. Norman finalmente conseguira vencer ao volante de sua criação. A categoria “Esporte Nacional” foi ganhando ímpeto com o passar do ano, e de fato, se organizou o primeiro campeonato da categoria, com a participação de diversos Avallone e Heves. E no ano seguinte, foi realizado em excelente campeonato da Divisão 4. Com os protótipos estrangeiros banidos das corridas no Brasil. Era possível que o Casari A1 viesse a ser um forte concorrente. Entretanto, aquela vitória no Paraná, com Norman a bordo, foi a última corrida do carro, que acabou aposentado. Casari ainda treinou para as 3 horas de Interlagos naquele ano, mas não largou. O Casari A1 foi posteriormente desmontado. Anos depois, o que sobrara do protótipo foi encontrado no interior do Rio de Janeiro, sendo levando (e com ele o chassis original do Carcará) para Passo Fundo-RS, onde foi restaurado e encontra-se exposto no Museu do Automobilismo Brasileiro. Uma outra passagem interessantíssima da carreira de Norman Casari foram as suas corridas em Angola! Para quem lembrava-se apenas de Kayalami, na África do Sul como referência de automobilismo no início da década, Angola também realizava corridas, feitas em circuitos de rua. Em Agosto de 1971 Casari chegou à Nova Lisboa, em plena lua de mel, acompanhado da atriz Tânia Scher, para disputar as “6 Horas de Nova Lisboa, tendo como companheiro Jan Balder.
O seu fino trato, assim como dos restantes componentes da equipe, cativou a todos com a característica simpatia Brasileira. Em uma entrevista à Alexandre Caratão, locutor da Radio Clube de Huambo, Casari fazia suas análises quando foi perguntado sobre algumas detalhes do circuito.
Naquele ano, a organixação da prova havia alterado o traçado da prova o que provocou muitos comentários sobre uma curva muito apertada que, na opinião de uns tantos, poderia ocasionar muitos acidentes.
Quando perguntado sobre o que achava da possibilidade de possíveis desastres que se podiam verificar, Norman respondeu que já tinha ouvido muitos comentários sobre os perigos existentes e que não compreendia, uma vez que tratava-se de um local onde todos os carros tinham de entrar bastante devagar o que eliminava qualquer possibilidade de acidente.
O locutor perguntou-lhe então qual era o ponto que ele considerava mais perigoso e o Norman mencionou uma curva muito pouco acentuada que existia a seguir ao gancho da rotunda do Vicente Ferreira.
Admirado, o Caratão exclamou: “Aquela curvinha?”
E o Norman respondeu: “Pois é! Aquela curvinha feita a duzentos e vinte transforma-se numa senhora curva!” Ele finalizou com um comentário sensacional: “Entrar numa curva à 220 Km/h qualquer um entra... o problema é sair dela!” Frase que ele tornou a repetir poucos dias depois.
Para compensar o percalço que tiveram com a impossibilidade de correr devido à avaria do Lola, o Norman quis compensar a organização dando um pequeno curso de pilotagem.
Aplicando todos os conhecimentos dos cursos que ministrava no Autódromo de Jacarepaguá, realizou um que constava de uma aula teórica e duas práticas realizadas no campo de futebol do Sporting Clube do Huambo com cavalos de pau de 360º e derrapagens controladas, provocando grande entusiasmo em todos os participantes do curso. A simpatia do Casari e do Balder foi tão grande e eles mostraram tanto empenho em arranjar um carro para poderem fazer a corrida (o que só não foi possível porque – para cumprir com os regulamentos) que ambos foram convidados a retornar no ano seguinte, 1972.
O convite foi feito e nem a alegação de Casari e Balder de que não tinham carro para correr foi motivo para que eles não retornassem à Angola: A organização da prova alugou um! Apesar do proprietário do carro não o ter nas condições ideais, o Norman conseguiu, na qualificação, colocá-lo no quinto lugar do grid. O fato provocou uma reação inusitada do proprietário do carro: “Fazendo-se esquecido” de que o aluguel do carro tinha sido à organização da prova, chamou os pilotos e tentou convencê-los a alterar as cláusulas do contrato de forma a que, caso conquistassem algum prêmio, este deveria ser revertido a ele.
Os pilotos responderam que estavam correndo em num carro alugado pelo Sporting Clube do Huambo e, portanto, caso conquistassem qualquer prêmio, esse pertencia aquele clube. Os membros do Sporting Clube do Huambo só souberam deste fato muito mais tarde mas, caso tivessem conquistado alguma premiação, segundo os membros do clube, ela seria inteiramente para eles, assim como as taças.
Norman Casari ainda disputou várias provas com Mavericks na primeira metade dos anos 70 e no final desta década, foi administrador do Autódromo Internacional do Rio de Janeiro. Sua despedida das pistas foi em 1976, nos XII 1000 Km de Brasília, com um Alfa Romeo 2300cc, conquistando um 4º na categoria. Norman Casari morreu dia 31 de dezembro de 2005, aos 69 anos, em Petrópolis, de insuficiência respiratória, provocada por um câncer que fora descoberto três semanas antes. Fontes: Revista Autoesporte; Revista Quatro Rodas; Livro "Nos Bastidores do Automobilismo Brasileiro", de Jan Balder; Jornal Gazeta do Povo; Obvio; CDO. |