A Peugeot parte para o Dakar de 2017 como sendo um dos favoritos à vitórias. Graças ao seu modelo 3008 e com pilotos como Sebastien Loeb e Carlos Sainz, entre outros, a marca do leão vai tentar prosseguir uma história de sucesso que alcançará agora 30 anos de vida, onde teve muito de vitória, como de polémica, em máquinas como o 205 e o 405. Contudo, este domínio nas areias dos desertos africanos e sul-americanos começou apenas como um plano de recurso para continuar a atividade do seu departamento desportivo, quando terminou o Grupo B. SOLUÇÃO DE RECURSO Em 1986, a Peugeot, liderada por Jean Todt, estava no Mundial de ralis, onde andava com o seu modelo 205 de Grupo B. Com pilotos como Juha Kankkunen e Timo Salonen, lutava pelo título mundial com os Lancia tripulados por Markku Alen e Massimo Biasion. Contudo, o acidente mortal de outro piloto, o finlandês Henri Toivonen, no Rali da Corsega, fez com que o Grupo B fosse abolido no final dessa temporada. Provavelmente, a Peugeot poderia continuar em 1987 com um modelo para a Classe S (que acabou nati-morta), mas as polémicas com a Lancia no rali de San Remo, onde os seus carros foram desclassificados pelos comissários italianos, fizeram com que a marca francesa decidisse retirar os seus carros dos Ralis, nem sequer alinhando os modelos 205 adaptados aos novos Grupo A. Assim, a alternativa era mais “caseira”: o Rally Paris-Dakar. Até então, o Rali, iniciado em 1979 por Thierry Sabine, era uma prova dura no deserto do norte de África, onde essencialmente uma grande quantidade de amadores entravam em carros preparados especialmente para a ocasião, mas era essencialmente uma aventura. Contudo, em 1986, já começava a haver entradas de pilotos de fábrica nesta aventura, como a Porsche e a Mitsubishi, por exemplo. Só que esse rali ficou marcado pelo acidente mortal do seu fundador, vitima de um acidente de helicóptero no Mali. Com a organização a viver um pouco a crise que costuma existir após o desaparecimento do seu fundador, Eles acolheram de braços abertos a entrada em força da Peugeot, com os seus 205 Rallye, e com um regresso aplaudido: o finlandês Ari Vatanen, que ano e meio antes, na Argentina, tinha tido um grave acidente que o colocou às portas da morte. O vitorioso modelo do Grupo B foi adaptado para as regras do Grupo A e assim,debutou no Dakar em 1987. A equipa era grande: para além de Vatanen – que iria ser navegado por Bernard Giroux, um jornalista francês que meses depois, em agosto, iria morrer no barco “Colibri” guiado por Didier Pironi – também alinhariam o queniano Shekthar Metha e o francês Andrea Zanussi. Se em termos de motos, o rali ficou marcado pelo duelo entre Cyril Neveu e Hubert Auriol, que terminou quando o segundo caiu forte e quebrou ambos os tornozelos (com vitória para Neveu), nos carros, Vatanen conseguiu ser o melhor, batendo o Range Rover de Patrick Zaniroli e o Mitsubishi de Kenjiro Shinozuka. Mas não foi fácil: um acidente no inicio do rali fez com que Vatanen caísse para a posição… 274, tendo de efectuar um percurso de recuperação. Lá conseguiu, mas outro susto na 13ª etapa, em solo mauritano, quase o fez ficar de fora, mas conseguiu levar o carro atè à meta, no Senegal. Era a recuperação que tanto queria, depois de tanto tempo a lutar pela vida. Em 1988 o modelo 405 substituiu o 205, que fora adaptado para o grupo A. No ano seguinte, Vatanen continua na marca, correndo agora com o modelo 405 mas desta vez junta-se o seu compatriota Juha Kankkunen, que faz esta “perninha” enquanto que corre pela Lancia no Mundial de Ralis, a bordo do seu Delta de Grupo A. Para além dele, alinharam os franceses Henri Pescarolo e Alain Ambrosino. Há um recorde de inscritos (603, entre carros, motos e camiões), mas o percurso é duro. Vários acidentes causam ao todo dez mortes, no que se transforma na edição mais mortífera do Dakar, mas nos carros, a Peugeot voltou a ganhar, com Joha Kankkunen a ser o grande vencedor. So que isso aconeceu depois de a meio do rali, o seu compatriota Vatanen abandonou à conta de… um roubo. O incidente aconteceu durante uma paragem no Mali, e o carro foi encontrado dois quilómetros mais tarde, mas o incidente foi mais do que suficiente para baralhar a vitória para a marca francesa. DUELO DE… MOEDA AO AR. Em 1989, a juntar-se a Vatanen veio o belga Jacky Ickx, que já tinha ganho o rali em 1981, a bordo de um Range Rover. A marca alinhou quer com os 205, quer com os 405, com o finlandês e o belga a alionhar com os carros mais recentes, enquanto que os franceses Guy Frequin e Philippe Wambergue alinharam com os 205. Todos os carros vinham com sistemas de orientação inovadores, que seguiam o GPS, o que daria uma vantagem sobre as outras marcas, especialmente os Mitsubishi. O duelo foi forte e duro entre ambos, apesar de Vatanen se ter atrasado de inicio. Contudo, mais ou menos a meio do percurso, os Peugeot tinha os três primeiros lugares, e nenhum dos dois queria ceder. Ickx vinha na frente, mas Vatanen queria ganhar pela terceira vez o Rali, e da maneira como via as coisas, Jean Todt temia que nenhum deles terminaria este percurso, logo, tinha de fazer algo. Uma decisão administrativa que joga contra a natureza do desporto. A solução foi simples: convocou ambos os pilotos e lhes pediu que lado escolhesse um duelo de moeda ao ar. Vatanen escolheu coroa… e ganhou. Contudo, essa decisão perigou quando na véspera de chegaram a Dakar, Vatanen comete um erro de navegação e Ickx passa para a frente. As coisas resolvem-se no dia da consagração, quando o belga para na praia, esperando o tempo suficiente para que Vatanen recuperasse o posto e comemorasse pela segunda vez a vitória nesse rali. E repetiu o feito em 1990, vencendo com folga sobre a concorrência. Contudo, no final desse ano, a Peugeot decidiu investir as suas fichas na Endurance, com o modelo 905, pois já tinha alcançado os seus objetivos no Dakar. UM REGESSO DURO Depois, a Peugeot foi para a Endurance, voltou aos ralis, com o 206 e o 307, andaria em Le Mans com o 908 e em 2014, quase 25 anos depois, decidira regressar ao Dakar com o 3008. Por essa altura, o Dakar já percorria terras sul-americanas, e a marca decidira alinhar com Carlos Sainz, e os franceses Cyril Després e Stephane Peterhensel. Este último, um veterano, tinha começado a andar nas dunas do Dakar por alturas dos 205, em 1987. A concorrência era forte, pois tinha os Mini como os maiores obstáculos à vitória, e para lá chegar, iria ser complicado, apesar do anuncio ter sido feito em abril de 2014, muitos meses antes da edição de 2015. O 3008 em configuração de Rali mais parece um tanque de guerra. Bem diferente do modelo urbano. O 3008 era um carro bastante inovador, de duas rodas motrizes e um bloco turbodiesel V6 de três litros, que debitava 340 cavalos de potência. O carro era bom, mas a edição de 2015 foi bem dura. Apesar de andar entre os da frente, apenas um dos carros chegou ao fim, e foi o de Peterhansel, que terminou apenas… na 11ª posição da geral. No ano seguinte, acrescentou mais dois nomes sonantes à sua equipa, os franceses Sebastien Loeb e Romain Dumas. Ambos com imensa experiência em ralis, as coisas em termos de todo-o-terreno eram mais complicadas, mas a marca queria mais. Loeb começou o rali de 2016 a “voar”, acabando por ser o líder ao fim de quatro etapas, e na sexta especial, os carros da marca do leão dominavam, com os três primeiros lugares. Parecia que o nove vezes campeão de ralis ia a caminho de mais um título na sua recheada carreira, mas ele capotou na oitava especial e acabavam ali as suas chances. Sainz, outro ex-campeão de ralis, herdou a liderança, mas duas etapas depois, abandonou com um problema elétrico. Peterhansel e a difícil vitória em 2016. Restava Peterhansel para salvar a honra francesa contra os Mini. E ele resistiu, contra tudo e todos, para chegar ao final no lugar mais alto do pódio, 26 anos depois da última vitória. Saudações d’além mar, Paulo Alexandre Teixeira
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