Mario César Camargo Filho nasceu em Ribeirão Claro, estado do Paraná no dia 15 de janeiro de 1937. Filho caçula entre 6 irmãos, passou a infância em Rancharia (SP) fez parte do curso primário e parte em Campinas (SP), voltando para Rancharia onde continuou os estudos. Seu irmão, 17 anos mais velho, tinha uma revenda dos carros Studebaker, tratores Massey Ferguson e caminhões Scania-Vabis, e em novembro de 1951 foi disputado o “Grande Prêmio Getulio Vargas”, prova de estrada que passava por três estados, SP, MG, RJ e SP. Marinho acompanhou boa parte da etapa paulista, torcendo por Chico Marques, que corria um carro Studebaker. Marques foi o 4º classificado e ali começava a paixão daquele adolescente pela velocidade. Em 1954 foi para São Paulo indo morar na casa de uma irmã. Estudou no Mackenzie e no Colégio Piratininga, conciliando os estudos com o emprego no setor comercial de uma indústria têxtil. Em 1955, Marinho – aos 18 anos – tem seu primeiro contato com um carro veloz. Seu irmão lhe empresta uma caminhonete Studebaker preparada e com ela o rapaz tem seu primeiro contato com a pista de Interlagos (naquela época era possível entrar na pista e participar de “pegas”). Pouco depois comprou seu primeiro carro, um Volkswagem 1200 o qual foi devidamente “preparado” para enfrentar os “rachas”. Como os “Deuses da velocidade” costumam conjuminar para que as coisas aconteçam, foi num destes “pegas” que Marinho conheceu Jorge Lettry. Achando que o garoto guiava muito bem, parou e disse: “Pô, você anda forte, eu sou dono lá da Argos, me procure.” A Argos já era conhecida em São Paulo, bem como o seleto grupo de frequentadores do local (Ciro Cayres, Bino Heins, entre tantos). Marinho foi e virou um freqüentador assíduo da oficina de Lettry e , com o apoio da Argos, Marinho estreou em 1957 com seu Volks, estréio na I Prova de Subida de Montanha realizada na Estrada Velha de Santos organizada pelo Jornal HP. Foi o primeiro a largar, mas, por um erro dos organizadores, ao alcançar a serra colidiu com um jipe da organização. Teve de largar de novo, mesmo assim foi o 3º classificado na categoria até 1,3L. Com o Volks participou de mais duas provas, até que num “pega” de rua perdeu para o DKW de um diretor da Vemag, e como o, agora amigo, Jorge Lettry estava trabalhando na Vemag e já vinha lhe falando muito sobre o DKW. trocou o VW de tração traseira por um DKW de tração dianteira. Uma mudança importante, pois os dois possuíam características de estabilidade bem diferentes. Marinho seguiu o conselho do experiente amigo e optou por trocar de marca e ali começaria uma história de parceria e sucesso com os DKW. Sua estreia em corridas com um DKW foi com um um modelo nacional F91, particular. Marinho venceu na categoria turismo 1,3 litro na inauguração do Circuito da Barra da Tijuca. Já nas primeiras curvas assumiu a liderança, deixando para trás o favorito, Severino Silva, que fez um protesto alegando que o carro estava sem o banco dianteiro original, inteiriço, e conseguiu com que Marinho fosse desclassificado (no modelo alemão os bancos eram separados e no produzido no Brasil era inteiriço). Contudo, ali aflorava o campeão Marinho Camargo. Pouco depois, proporcionou um belo duelo na inauguração de Brasília - “GP Juscelino Kubitscheck” – com outro DKW da Serva Ribeiro, completando a dobradinha na vitória de Eugenio Martins. Foram realizadas três provas e ele participou de duas, Turismo GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística - GEIA. Esta foi a base definitiva para a fabricação de veículos automotores no país. O GEIA na sua resolução n° 01, autoriza a VEMAG a fabricar o seu automóvel tipo caminhoneta DKW em 30 de julho de 1956. Em 19 de novembro deste mesmo ano, a VEMAG lança o DKW no Brasil com uma nacionalização de 60% de seu peso final. Este foi realmente o primeiro automóvel de passeio fabricado no Brasil), que compreendia os carros nacionais sem preparo e os de Turismo Preparado. Quando trocou o F91 pelo modelo F93, mais atualizado, Marinho decidiu instalar um motor preparado pelo seu amigo Sergio "Cabeleira" Gomes. Em outubro de 1959, Poços de Caldas (MG) Marinho chega com o DKW, carrinho pequeno, motor três cilindros, dois tempos, e alinhou contra os carros da época, possantes carreteras com mais que o dobro de sua cilindrada e potência, Marinho não se intimidou, foi à luta e venceu a corrida na geral. Começou aí sua fama de "Rei das Corridas de Rua". Na semana seguinte, o piloto enfrentou uma prova na Subida de Montanha na Serra Velha de Santos. Logo na primeira curva, o DKW do Marinho perdeu a correia do ventilador e mesmo com a temperatura subindo ele ficou apenas dois segundos atrás de um Porsche Spyder RSK de 1,5 litro e de uma Ferrari esporte de 2,0 litros, surpreendendo com o 3o lugar geral - e o 1° entre os carros de turismo.
Da Esq. p/ Dir: Marinho Camargo, Eduardo Escuracchio, Jorge Lettry, Chiquinho Lameirão, Roberto Dal Pont e Anisio Campos. O sucesso da parceria de Marinho com o DKW fez com que o fabricante preparasse três DKWs modelo F94 para as Mil Milhas Brasileiras em Interlagos. A estreia da equipe oficial aconteceu em 1959 e foi cercada de muita expectativa. Fazendo dupla com Eduardo Scuracchio no principal carro da equipe. Na largada Marinho toma a ponta e passa liderando a primeira volta: “ É, foi emocionante. O povo quando viu aquele carrinho passar liderando, eu me lembro daquele povo todo levantando e ovacionando, ficou marcado para o resto da minha vida. Mal podia acreditar que aquele carrinho com um ruidoso motor de dois tempos estava na frente ”. Em 1961 se casou-se com Suzana, e desse casamento nasceram 4 filhos. No final do ano, participa das Mil Milhas Brasileiras ao lado de Bird Clemente, que substituía Christian Heins – que largou a equipe após uma discussão com Jorge Lettry. Lideraram a corrida por mais de cinco horas, mas, com problemas de distribuidor e bomba de gasolina, terminaram em 6º lugar. Segundo o próprio Marinho, foi a melhor Mil Milhas que disputou. De Interlagos, a equipe DKW foi para as ruas de Salvador, em uma corrida de curta duração, na qual Marinho não teve adversários. Foi uma vitória brilhante. Em 1962 a fábrica resolveu montar um departamento exclusivo de competições, antes vinculadas ao departamento de testes. Foi o ano de afirmação do DKW, pois o piloto conquistou mais três vitórias em corridas curtas em Interlagos e nas ruas de Petrópolis (RJ) e Araraquara (SP). Com o sucesso nas corridas, Marinho largou a área têxtil e montou, em sociedade com Milton Masteguim, a revenda MM (iniciais de Marinho e Milton) especializada em DKW. Marinho Camargo (à esquerda), ao lado de Bird Clemente. Na prova “500 Milhas de Interlagos”, em dezembro de 1962, foi convidado por Chico Landi para correr em dupla ao volante de um Porsche 356-S90. ‘Seo’ Chico, nos treinos deixou o cabo do acelerador sem o curso total do pedal e Marinho tentava baixar o tempo e o tempo não melhorava: “Não sei guiar esse troço aqui, esse negócio aqui não vai, o tempo não vem.” E quando chegou a hora da classificação pensou em desistir, mas Chico Landi foi atrás do carro, abriu o capô e esticou o cabo. Marinho foi para a pista e fez a pole. Liderou boa parte da corrida, até que quebrou a roda traseira direita na Curva 3, e com isso caíram para o último lugar, aí foi andar o que dava e o que não dava, com duas horas de prova, o freio a tambor já havia acabado, mas mesmo com todos esses problemas ainda assim chegaram em 2º lugar. Em 1962 ainda, ganha o direito de usar um carro DKW igual ao que usava nas pistas, só que em versão original, além de desconto na compra de outros veículos e ajuda de custos, foi, junto com Bird Clemente que fez a reivindicação, um dos primeiros pilotos a receber para correr. Em 1963, a equipe DKW colocou dois carros para as 12 Horas de Interlagos com apenas três pilotos se revezando. O regulamento liberava - não impunha descanso obrigatório - e Marinho completou o trio com Bird Clemente e Flavio Del Mese. "Foi um sufoco, a gente saía de um carro e entrava em outro, mas foi fantástico. Vínhamos sempre entre os cinco primeiros colocados com nossos dois DKWs. O número 10 disputava a liderança quando na última volta perdeu uma roda e arrastou-se em três rodas até a chegada. O outro carro da equipe – o com o número 11 – terminou em 3º lugar. A inda na quele ano, Marinho participou de duas provas com o Fórmula Junior com um “Landi/Bianco/DKW”. Em Araraquara (SP) bateu o recorde absoluto do circuito e menos de um mês depois, no “500 Quilômetros", bateu o recorde de velocidade da categoria. Estas atuações lhe valeram o Prêmio Victor da categoria, oferecido pela revista Quatro Rodas da Editora Abril, recebido no início de 1964. Com a chegada dos Willys Interlagos, Marinho que conhecia o projetista Rino Malzoni, de Matão (SP) e que já tinha feito um protótipo com mecânica DKW, ajuda a Vemag a convencê-lo a fazer um carro esportivo para que a equipe pudesse fazer frente às Berlinetas da Willys. Desta união surgiu o primeiro o GT Malzoni, ainda em chapa, esse primeiro carro Marinho comprou, em 1964, e passou a correr com ele. Com o DKW Malzoni, os pilotos da Wemag passaram a ter condições de enfrentar os SIMCA e Willys. Aprovado o modelo, foi constituída uma empresa para sua produção em série, em fibra de vidro para ficar mais leve, a Lumimari Ltda. Iniciada a produção, em 1965, a equipe Vemag comprou as três primeiras carrocerias que foram preparadas por Jorge Lettry e Crispim. Além da versão espartana vendida para competições existia uma versão "de rua" com acabamento melhorado, produzida até 1966, quando reestilizada passou a se chamar Puma DKW. Na “12 Horas de Brasília” de 1964 correu com seu sobrinho “Cacaio” em um Fiat/Abarth 850TC e estavam indo muito bem, só que carro não estava adequadamente preparado para uma prova noturna, apenas foram colocados dois faróis fortes, de milha. Então numa das paradas para troca de pneus e reabastecimento, “Cacaio” desligou o carro que depois não pegava, não tinha mais bateria e a equipe empurrou, o que não era permitido, por isso foram desclassificados da prova. A última corrida pela equipe oficial foi em Interlagos, com oito Malzonis reunidos. A prova foi vencida por Marinho, que deixou para trás o Alpine da Willys. Apesar do sucesso, a equipe DKW Vemag estava com os dias contados com a venda da fábrica para a Volkswagen. A última empreitada da equipe foi a construção do “streamlined” Carcará. Um carro criado especificamente para tentar bater o recorde de velocidade em linha reta. A dupla Rino Malzoni e Anísio Campos desenhou a máquina, confeccionada na fazenda do Rino, em Matão. Marinho era a escolha natural para pilotá-lo, fez os testes iniciais em Interlagos, e foi ao Rio de Janeiro para o recorde, mas no teste realizado na véspera, 28 de junho de 1966, Marinho reclamou que o carro não tinha estabilidade suficiente e que era perigoso. Jorge Lettry e Marinho Camargo em Interlagos durante os testes do Carcará, recordista até hoje de velocidade. Jorge constatou que como não havia colocado uma barra estabilizadora o carro pressionava muito no chão e a resposta de direção era muito grande, Marinho julgou muito arriscado e sugeriu levar o carro de volta à São Paulo para corrigir o problema, como Jorge Lettry já estava saindo da Vemag em função do fechamento da equipe decidiu continuar pois não haveria uma segunda chance para realizar a tentativa, aí Marinho desistiu e voltou para São Paulo. A tentativa acabou sendo feita com Norman Casari, que pediu a colocação de um volante maior para poder “sentir melhor as reações do carro”. Deu certo e o Carcará bateu o recorde de velocidade. Em 1966 Marinho saiu da Lumimari e com o fim da equipe Vemag, Jorge Lettry entrou em seu lugar como sócio e a empresa mudou a razão social para Puma Veículos e Motores Ltda., vendeu também sua parte na sociedade da “Comercial M.M.” e começou de novo com a “Marinho Veículos” na Rua Tabapuã, bairro do Itaim em São Paulo (SP), oficina autorizada Vemag para logo passar para “Posto Volkswagem” e logo em seguida associado à Eugenio Martins conseguiram a concessão de revenda Volkswagem, preparava carros também e pelo menos dois deles fizeram sucesso, o Puma do Paulão Gomes e o Volks 4 portas, “Zé do Caixão” que foi 2º lugar na “24 Horas de Interlagos” de 1970 com Fausto Dabbur e Emerson Maluf. Com o fechamento da equipe Marinho ficou com um Malzoni e correu por conta própria mais duas provas e parou, mas menos de um ano depois participou em dupla com “Cacaio” da prova “500 Quilômetros de Interlagos” de 1967, com um Fitti-Vê, fizeram a pole e foi “Cacaio” que largou, mas antes de completar uma hora de competição foi envolvido num acidente na Curva 3 com diversos carros e teve que ir para os boxes, a participação de Marinho nessa que foi sua última corrida ficou limitada aos treinos. Em 1971 Marinho vende sua parte da sociedade com Eugenio e se muda para Ourinhos (SP). Diz que trabalhava a semana toda, aí, sábado, pista, domingo, pista, não tinha mais tempo para a família, resolveu ir para Ourinhos ser revendedor GM, mas acabou mudando para Chrysler. O desenvolvimento do Polara, versão melhorada do Dodge 1800 foi feita com a ajuda de Marinho, em Ourinhos. Depois trabalhou com caminhões, e novamente ajudou na formulação do caminhão Volkswagem e do motor MWM veicular. Em 2007, Marinho compareceu o ao festival de velocidade em São Paulo com outros pilotos como Luizinho e Bird. Atualmente, ainda morando em Ourinhos, tem um posto de combustíveis e participa assiduamente de encontros de colecionadores da marca DKW. Uma passagem interessante e que poderia ter mudado a vida, não apenas de Marinho Camargo como também a de Bird clemente foi o convite que eles receberam da Auto Union (dona da Wemag) para participar do Rali de Monte Carlo, mas a resposta da CBA, na época em briga com o ACB, foi de que quem fosse correr fora do país teria a licença nacional cassada e não poderia correr mais aqui no Brasil. Eles tentaram de todas as formas, mas não conseguiram reverter a posição da CBA e acabaram por não disputar a famosa prova européia. Era apenas uma corrida e aqui tinham uma carreira pela frente... Será que não poderia ter nascido ali uma vitoriosa carreira internacional? Depois que parou de correr Marinho Camargo estabeleceu-se na cidade de Ourinhos, interior de São Paulo, onde criou seus filhos e estabeleceu-se no comércio local. Seu posto de combustíveis traz sua marca e ele é conhecido na cidade como empresário e piloto. Há alguns anos lutando contra problemas de saúde, nosso Herói das pistas acabou nos deixando no último dia 3 de janeiro de 2020, mas seu legado ficará para sempre. Fontes: Yellowpages; Bandeira Quadriculada, Revista Quatro Rodas, Revista Autoesporte, Revista Brasileiros, CDO. |