A semana do GP Brasil de Fórmula 1 deveria ser uma semana especial, de muita alegria e comemoração com a vinda da mais importante categoria de automobilismo do mundo, mas nesta sexta-feira – que no calendário é dia 9, mas ficou com cara de dia 13 – perdemos para a eternidade dois personagens emblemáticos do nosso círculo de convívio dos que acompanham de perto o automobilismo: José Roberto Nasser e Eduardo (Du) Cardim. José Roberto Nasser, nascido no Rio de Janeiro, mas brasiliense por escolha, além de colecionador de automóveis raros, ele defendia fortemente a preservação da história da indústria automobilística brasileira. Ele foi o fundador do Museu do Automóvel de Brasília em 2004. O espaço era considerado um dos mais importantes para a história automobilística do país. No museu, foi exposto um acervo com mais de 40 carros de modelos raros, além de milhares de documentos e livros referentes à história do automóvel no Brasil. Jornalista e advogado, Nasser criou o termo antigomobilismo. Ele foi ainda o fundador e primeiro presidente da Federação Brasileira de Veículos Antigos. Em novembro de 2016, o Museu do Automóvel foi lacrado pela Secretaria de Patrimônio da União e deixou de funcionar. O prédio onde funcionava o museu era um espaço cedido pelo Ministério dos Transportes, que pediu para reaver o imóvel. Um abaixo-assinado direcionado à Presidência da República chegou a ser criado, solicitando um novo espaço para o Museu, o que não aconteceu. O site da entidade, contudo, continuou ativo. A dura batalha de buscar encontrar um novo local para o museu, mas não precisaria continuar: esta semana o Ministério dos Transportes lhe permitiu continuar com o prédio para abrigar e expor seu acervo. Mas por estar em São Paulo, no Salão do Automóvel, ele não chegou a saber disso. Seu falecimento aconteceu na madrugada desta terrível sexta-feira e tomou de surpresa todos os colegas do setor automotivo, especialmente aqueles que como nós que o viram no começo da semana caminhando de estande em estande nas apresentações de imprensa do Salão do Automóvel, nos dias 6 e 7 passados. O coração deste ilustre membro do nosso meio parou nas primeiras horas do dia, mas sua paixão continuará a pulsar em todos nós. Eduardo Cardim, o “Du Cardim” como era conhecido por todos os frequentadores de Interlagos, por todos que acompanham os sites de automobilismo, por todos que ouvem as leituras dos twitters durante as transmissões das corridas na televisão já ouviram falar. Alguns de nós, do Projeto dos Nobres do Grid teve a oportunidade de conviver com esse louco e apaixonado por automobilismo. Tão louco que muitos o chamavam de “Doido Cardim”. Quem olhar para as camisas dos nossos integrantes verá no peito, do lado esquerdo, uma das muitas obras fruto de sua criatividade. Dez anos atrás ele nos ofereceu a elaboração do logo para o site e para estampar nossas camisas. No ano seguinte, levou a redação da revista Quatro Rodas para fazer uma entrevista com nosso Padrinho e Patrono, Luiz Pereira Bueno, uma iniciativa nobre, brilhante, que fez e faz parte das homenagens em vida que todo grande piloto merece. Du Cardim era também um profundo conhecedor de automobilismo e dono de um fabuloso acervo de registros automobilísticos, uma parte dele até garimpado no lixo (coisa de doido mesmo). Foi com este arquivo que ele proveu, com quase todos os documentos que usamos para fundamentar a defesa processual, desde que a Comissão Pró-Autódromo de Interlagos começou esta verdadeira guerra contra a sanha privacionista e destrutiva do hoje governador de São Paulo. O presidente da Comissão e nosso colunista tinha com ele que, assim que o autódromo estivesse completamente garantido escreveria um artigo agradecendo as pessoas que nos ajudaram e o Du Cardim teria um lugar de destaque neste agradecimento, mesmo sem que ele, ao longo de todos estes anos de automobilismo, nunca buscou holofotes para si, circulando quase anonimamente pelos boxes, ouvindo e prestando muita atenção no que estava acontecendo longe das salas de imprensa. A imagem de Du Cardim, com uma latinha de cerveja em uma mão e um cigarro na outra vai ficar eternizada ma mente de todos os que conviveram com ele. Nas conversas com os amigos, nas pizzas semanais com os “comparsas”, as colocações sobre fatos históricos eram impressionantes. O homem era quase uma enciclopédia! Uma mente brilhante que parou de funcionar por uma dessas coisas que a gente não consegue acreditar. A morte as vezes tem umas coisas estúpidas. Conversando com alguns amigos comuns, era quase certeza que o Du Cardim um dia iria morrer ou de câncer de pulmão – pelo tanto que fumava – ou de falência hepática, maldade com o fato dele gostar de uma cervejinha. Levar uma queda no quintal de casa e bater a cabeça como foi relatado pela família derrubou a todos nós. Logo ele que, segundo outros relatos, vez por outra subia no telhado de casa para fazer algum reparo. Levado rapidamente para o Hospital das Clínicas, teve a morte cerebral comunicada aos amigos no final da tarde. Sua grandeza foi até depois da bandeirada, quando foi informada sua morte cerebral: seus órgãos foram doados com o apoio da família e, a partir de hoje, ele vai poder reencontrar nosso querido e eterno Luizinho Pereira Bueno. Quem sabe eles conseguem tomar uma cerveja e fumar um cigarro por lá no céu. Flávio Pinheiro |