Foi no litoral paulista, na cidade de Santos, no dia 15 de junho de 1936 que nasceu Pedro Victor De Lamare e lá viveu tranquilamente até a adolescência. Como todo garoto naquela época e com aquela idade, tinha interesse por corridas e por velocidade, tendo “feito das suas” ao dirigir em 1950, sem habilitação e escondido da família. Contudo, o automobilismo só veio entrar realmente em sua vida quando no verão de 1953 ele conheceu Luiz Pereira Bueno. O Peroba ainda não era o piloto que conhecemos, mas tinha muitas ligações com o meio e foi assim que introduziu Pedro Victor neste meio, apresentando-o um MG, que estava sendo preparado na oficina do Claudio Daniel Rodrigues (o mesmo que trouxe os karts para o Brasil e que era seu cunhado)... e assim tínhamos mais um jovem daquela geração “infectado pelo velocitococus”, o vírus da velocidade. Naquele ano ele ganhara do pai, Eduardo Victor, um VW novo em folha por ter passado no vestibular da faculdade de direito em Santos e assim, foi levando a vida um tanto quanto dividido entre a faculdade e a velocidade... mas o VW passou por um processo de “alívio de peso” para poder ter mais desempenho. Não satisfeito com o resultado e tendo conhecido um MG, Pedro Victor trocou-o por um MG-TC 1949, que foi logo levado para a oficina do Claudio Manoel Rodrigues para “receber adaptações”. O teste foi feito na estrada velha de Santos (a mesma da música do Roberto Carlos) e com o parceiro Luiz Pereira Bueno. O resultado não podia ser melhor, já as primeiras consequências... A primeira disputa em velocidade foi um dos famosos “rachas da Rua Augusta”, centro de São Paulo, contra outro MG, de Pascoal Nastromagario, que tinha carroceria de alumínio e um melhor perfil aerodinâmico. A disputa foi no “tradicional circuito” que subia a rua Augusta até a Avenida Paulista e descia pela rua Pe. João Manoel... em quatro voltas. O resultado diante de um piloto que já corria em Interlagos, levou Pedro Victor a inscrever-se com seu carro para uma corrida oficial naquele mesmo ano de 1957. Ele tinha 20 anos de idade quando alinhou para a disputa da segunda prova do evento Cinqüentenário do Automóvel Clube do Brasil, em Interlagos. Chegou em 15º lugar na geral e foi o quarto colocado, na categoria-esporte até 2000 cc. Paschoal Nastromagario, com quem fez sua primeira disputa, finalizou na sua frente com um MG TD. Já nesta corrida Pedro Victor adotava uma de suas marcas da trajetória nas pistas: o número 84! Nos boxes, com a esposa Gigi ao fundo. Uma companheira de toda a vida e uma relação de amor e cumplicidade. No ano seguinte, disputou os 500 Km de Interlagos em dupla com Marivaldo Fernandes, abandonando por quebra mecânica. Foi aqui que começou a aparecer um problema muito conhecido da maioria dos pilotos de ontem e de hoje: a falta de dinheiro. Por conta dela e da pressão familiar para que concluísse a faculdade de direito De Lamare ficou um bom tempo longe das disputas. No período em que esteve afastado, Pedro Victor conheceu a mulher de sua vida: Marlene Kampmann. Casaram-se em 1964. Gigi, como era conhecida, era uma mulher deslumbrante. Modelo e uma mulher muito desenvolta, abraçou a paixão do marido e passou não só a acompanhá-lo nas pistas como assumiu a gestão da carreira do piloto quando ele retornou as disputas, após a conclusão do curso de direito no final daquele ano. Com o apoio da esposa, passou a dedicar-se integralmente a carreira, sendo até sua cronometrista. O problema da falta de dinheiro persistia, mas ele não desistia. Naquele ano de 1965 ele possuía um Renault 1093, devidamente preparado na oficina Torke, que era do amigo Luiz Pereira Bueno. Com pouco dinheiro, era difícil preparar um carro vencedor, mas o talento do bom piloto sempre aparece e com aquele Renault 1093, Pedro Victor virou a volta de Interlagos em 4’30”. Era um ótimo tempo para o padrão de seu carro e isso chamou a atenção do chefe da equipe oficial da Willys, Luiz Antônio Greco. Após uma conversa com o “manager”, veio o convite a participar oficialmente da escuderia, que na época, já pagava salários aos seus pilotos. Com um Renault 1093, Pedro Victor De Lamare impressionou Luiz Antônio Greco, quem o conduziu à equipe Willys. A carreira de De Lamare tomava novos rumos. Ainda em 1965, De Lamare chegou em quinto lugar nas 12 Horas de Interlagos e sexto nos 1000 Km de Interlagos, ambas disputadas em parceria com Luiz Fernando Terra Smith. Com Ludovico Perez e pilotando o Willys Interlagos, De Lamare ficou em quinto lugar nas 6 Horas de Curitiba e mais uma vez, com Ludovico Perez, desta feita com uma Berlinetta Interlagos, Conquistou seu primeiro pódio ao terminar na terceira posição nos 1000 Km de Brasília de 1966. Naquele mesmo ano, ao lado de Waldemar Costa, conquistou o sétimo lugar com o Renault 1093 nas 24 Horas de Interlagos. Pedro Victor e os Fittipaldi tinham uma visão muito além do asfalto... em parceria e com patrocínio, criaram uma escola para pilotos. Em 1967 surgia a Fórmula Vê no Brasil e De Lamare conquistou o terceiro lugar no Rio de Janeiro, com um Fitti-Vê preparado pela concessionária Mecanova, pertencente aos irmãos Otto e Fritz Jordan. Naquele ano surgiu a idéia – inovadora na época, pelo menos a nível de Brasil – de criar uma escola de pilotagem. A proposta foi feita para os irmãos Fittipaldi e em sociedade com Wilsinho e com o patrocínio da Bardahl, surgia a Escola de Pilotagem Bardahl. O sucesso foi imediato. A Escola ficava em frente ao autódromo de Interlagos e era administrada por Gigi tendo Pedro Victor como principal instrutor. No primeiro ano de funcionamento, a escola formou 400 pilotos. Tamanho sucesso levou o casal a abrir uma filial em Porto Alegre. Pilotos de renome como José Renato Catapani, Sérgio Mattos, Carlos Quartim Barbosa, Ricardo Di Loreto, os irmãos Abílio e Alcides Diniz, José Pedro Chateaubriand e Arthur Bragantini freqüentaram a escola Bardhal. A garagem dos carros em frente ao autódromo de Interlagos e, na Pista, Pedro Victor com os alunos.
Ainda naquele ano de 1967, com os 500 Km de Interlagos aceitando inscrições dos carros da nova categoria, participando em dupla com Ricardo Achcar e pilotando o Aranae nº100, De Lamare não terminou a prova. Nas 12 Horas de Interlagos pilotou a carretera Gordini, chegando na sexta posição.
Em 1968, já sem a Willys – que abandonara as competições e fora vendida - De Lamare foi convidado para integrar a nova equipe da BMW, comandada por ninguém menos que Eugenio Martins e Chico Landi. A bordo de um BMW Alpina 2000 cc da CEBEM (nome da equipe por conta do patrocínio), ele conseguiu – finalmente – conquistar sua primeira vitória na carreira. Foi na disputa das 500 milhas da Guanabara, em parceria com Jan Balder. Detalhe interessante: o carro não carregava o tradicional número 84 e sim o nº 3.
Em 1969 ele foi para a equipe Jolly-Gancia, que também contava com José Carlos Pace e Marivaldo Fernandes. Ao lado de Mario Olivetti conquistou o 2º lugar nos 1000 Km de Brasília. No mesmo ano correu com um AC-VW os 1000 Km da Guanabara, da equipe de Olavo Pires. Nos anos 70 Pedro conseguiu ser um dos poucos a receber benesses de uma montadora... foi até "piloto-propaganda" da GM. Com o sucesso de Emerson Fittipaldi fora do país, ganhando os campeonatos de FFord e F3 em 69, estreando na F1 em 1970 e conquistando uma vitória no seu 4º GP, o automobilismo tomou conta das manchetes esportivas do país do futebol. Havíamos “descoberto” uma nova vocação e as empresas passaram a ver o automobilismo como um excelente veículo de comunicação. Atento as oportunidades, o casal De Lamare “abriu uma nova frente de batalha”, criando a equipe De Lamare Competições, que funcionava no mesmo endereço da escola de pilotos. Contando com o experiente Manoel de Jesus Ferreira (Manelão) e com seu motor preparado por Caio Luis Queiroz Telles de Mattos (Caito, primo de Marinho Camargo), o Opala de De Lamare virou uma referencia. Era um carro a ser batido... difícil era conseguir. Na inauguração do autódromo de Tarumã, em Viamão-RS, no dia 8 de novembro de 1970, Pedro Victor De Lamare “fez barba cabelo e bigode”, marcando a pole, fazendo a melhor volta e vencendo de ponta a ponta diante de um público de 120 mil pessoas. Pelo seu desempenho na categoria Turismo naquele ano, Pedro Victor foi eleito pela crônica esportiva especializada em automobilismo para receber o Prêmio Victor, dado ao grande destaque nas pistas a cada ano. Quem lhe entregou o prêmio foi ninguém menos que Colin Chapman, dono da equipe Lotus e convidado especial da cerimônia. Pedro Victor era um duro adversário a ser batido, enfrentando de igual para igual a poderosa equipe Hollywood e Luiz.P.Bueno. Em 1971, Pedro recebeu até o reconhecimento da General Motors (as montadoras andavam distantes do automobilismo, na contramão do que foram nos anos 60): A empresa entregou à equipe um Opala cupê duas portas e zero quilômetro e motor 4100cc. Com esse carro, sempre azul e com o nº 84, Pedro venceu as 12 horas; as 4 Horas e os 500 Km de Tarumã e assim, conquistou facilmente o primeiro Campeonato Brasileiro de Turismo - Divisão 3 (Para quem não conhece ou não lembra, os carros turismo de fabricação nacional e modificados para corrida eram divididos em categorias. A Divisão 3 era subdividida em três classes: Classe A: até 1600 cc; Classe B: de 1601 a 3000 cc e a Classe C de 3001 a 6000 cc), classe C, superando Pedro Carneiro Pereira. Aquele Opala Azul foi até página de várias revistas com o anúncio da Chevrolet, com o piloto ao lado dele. Em 1973, mudou do azul para o amarelo para atender seu patrocinador, mas o mítico nº 84 estava, lá, no capô e laterais. Foi com este carro que ele sagrou-se tricampeão brasileiro da Divisão 3, tendo proporcionado disputas eletrizantes com seu amigo Luiz Pereira Bueno, especialmente no ano de 1972 onde o Peroba defendia a poderosa Equipe Hollywood (apesar de, no ano de 1973, ele ter utilizado a cor predominantemente amarela, devido ao patrocínio da Eletroradiobraz). Completo e versátil, foi um eficiente e extremamente rápido também em monopostos como os FFord e F Vê... O Opala não foi o único carro pilotado por Pedro Victor nos primeiros anos da década de 70. Em 1971 ele ficou com o vice campeonato do brasileiro de FFord, ao volante de um Bino azul (e nº84) ficando atrás apenas do campeão Francisco Lameirão. No Torneio SUDAM (provas disputadas entre brasileiros e argentinos), realizado nos meses de maio a julho de 1971. Pedro Victor De Lamare novamente com um carro azul, desta feita era o protótipo Fúria-Chevrolet 2500 cc 4 cilindros, projeto do brasileiro Toni Bianco. Pensando no torneio SUDAM de 1972, Pedro Victor decidiu investir no protótipo argentino Trueno Sprint, projetado por Horacio Stevens. O motor (Chevrolet) era forte, mas o carro era praticamente inguiável, arisco e instável até em reta. O desenvolvimento ficou comprometido com os poucos recursos de Horatio e precisou ser trabalhado ao longo do tempo em que ficou com De Lamare. Além de ter mostrado seu valor ao volante dos rapidíssimos Fórmula 2 da época. Nessa época, ele ainda participou do Torneio Internacional de Fórmula 2 realizado no Brasil, correndo com um March 722-Ford. No mesmo ano, a De Lamare trocou o protótipo Fúria pelo Avallone, projeto do brasileiro Antônio Carlos Avallone, inspirado no Lola que disputava o CAN-AM. Contando com o confiável motor do Opala de 6 cilindros, Pedro Victor subiu ao pódio ao conquistar o terceiro lugar em Buenos Aires, durante o torneio SUDAM. A vida de Pedro Victor nas pistas não foi fácil. A quantidade e a qualidade dos seus adversários era muito grande. Ele correu contra Luiz Pereira Bueno, com Opala preparado pela Equipe Hollywood, que disputou os certames de 1972 e 1973; contra Ciro Cayres, que disputou provas em Interlagos em 1972; Pedro Carneiro Pereira, radialista gaúcho que um piloto nato, principalmente em provas no Sul; além de Antonio Castro Prado, Luis Landi, Antonio Carlos Avallone, José Pedro Chateaubriand, Celso Frare, Julio Tedesco e Carlos Eduardo Andrade. Isso sem contar que, principalmente em pistas molhadas, Carros com menor cilindrada como os fuscas eram um tormento para os Opalas. Em Tarumã, por exemplo, o recorde de volta da Classe C era de Pedro Victor, 1m20.65s, e a melhor marca da Classe A era de Fernando Esbroglio, 1m22.68s. Em Cascavel a diferença também era pequena, só de 4 segundos, 1m17.4s(De Lamare, Classe C) e 1m21.8s (Julio Caio, classe A). Sua equipe era sinônimo de eficiência e competitividade. Fosse com o Opala, fosse com o protótipo Fúria. Em agosto de 1973, Pedro contratou Ricardo Divila para preparar seu Opala e Wilson Fittipaldi para elaborar seu plano de corridas. Ricardo e Wilson estavam projetando o Copersucar F1 e De Lamare reformando sua escola para abrigar o protótipo do F1. Com Divila No final de 1973, Pedro Victor achou que era hora de dar o maior dos passos em sua carreira como piloto: correr na Europa! Apesar de achar que “seu tempo já havia passado para correr de fórmulas”, via no campeonato de protótipos uma interessante possibilidade de desenvolvimento e sucesso. Em 1974 Pedro Victor foi para a Europa, correr de super protótipos. Venceu duas provas e andou bem em outras. Pedro seguiu para Londres com um contrato de dois anos debaixo do braço que fora assinado com o patrocinador SPI (Sociedade Paulista de Investimentos), banco de seu amigo Jayme Levi. Já em solo europeu, montou a própria equipe para correr os campeonatos de protótipo e Interseries com um March 74, equipado com motor BMW de 2 litros e 280 CV (ele conseguiu comprar dois destes motores), além de um caminhão para transporte que pertencera a Graham Hill. A sede da SPI Racing Team ficava em Mourne End, distante cerca de sessenta quilômetros de Londres. O chefe de equipe era Antônio de Souza e os mecânicos Luís Henrique de Almeida e Neal Croft da Surtees F2. Se tivesse melhores condições para continuar no ano seguinte, poderia ter conquistado o título da Interséries. Além destas aquisições, assinou um contrato de três meses com a Firestone, que disponibilizou um técnico da fábrica (John Ward) para orientar na escolha dos tipos de pneus da SPI. O March teve inúmeros problemas de adaptação aos pneus Firestone, uma vez que todo o seu desenvolvimento fora feito com pneus Goodyear, mas mesmo assim De Lamare conquistou dois quartos lugares, em Nogaro e em Magny Cours (não o mesmo circuito em que a F1 correu até uns anos atrás e sim o que havia antes da grande reforma). Outro pro-blema foi a caríssima manutenção dos motores BMW. Depois de seis corridas Pedro trocou pelos moto-res Ford, mais baratos, com menor po-tência e preparados por Alan Smith. O começo de sua carreira internacional não foi nada fácil. Mesmo assim, no total foram treze provas, foram duas vitórias (Thurxton e Oulton Park – na chuva), um segundo, dois quartos, um oitavo, um décimo, um décimo - primeiro e cinco aban-donos, além de uma pole position e uma melhor volta, em Brands Hatch. Assim, Pedro De Lamare terminou o ano como vicecampeão do Grupo 5 GT no euro-peu e no Inglês, a equipe terminou a temporada como vicecampeã inglesa na categoria protótipo 2 litros.
A SPI diminuiu o press-release para o Brasil e o carro da March não ficou pronto para 1975 As dificuldades se acumu-lavam. Com um Lola T-294, emprestado por Roger Hire, para uma prova do Mundial de Marcas, em Mugello, fazendo dupla com o saudoso Antônio Castro Prado eles foram a sensação da primeira parte da corrida. Também participaram juntos de provas de longa duração em Brands Hatch e Dijon (França), chefiado pelo ex-piloto Roger Hevens.
Em Mugello, abando-naram com quebra do motor e em Dijon eles correram com o Lola T-292 que José Maria Juncadella correra em 1974. Foram desclassifi-cados por serem empurra-dos no grid. Depois disso, Pedro Victor De Lamare nunca mais correu. De volta ao Brasil e sem interesse em voltar a correr, foi morar em Campos do Jordão onde encontrou mais uma paixão: os cavalos de raça! Empreendedor, conseguiu até alavancar um novo esporte no país – o hipismo rural. Depois disso mudou-se para o Rio Grande do Sul e até para o Uruguai, em 1996, onde foi administrar uma estância rural, não muito distante de Punta del Leste. Em 2001 retornou ao Brasil, vindo a residir em São Paulo, capital, onde vive até hoje. Fontes: Yellow Pages; Revistas (quatro Rodas; Autoesporte; e Brasileiros); arquivos e depoimentos do piloto; CDO. |