Como nome de batismo, encontramos o cidadão Robert Amaral Sharp, nome herdado de seu avô, um americano que chegou ao Brasil no final do século XIX, mas para seus amigos e seus fãs, ele sempre será o grande Bob Sharp, piloto de múltiplas habilidades e extrema capacidade em todas elas. Bob nasceu no Rio de Janeiro, em 14 de novembro de 1942. Como morava no bairro da Gávea, teve a oportunidade de assistir de camarote, ao lado de seu pai, que era um entusiasta das corridas, algumas das provas mais emocionantes já realizadas no Brasil. Eram os tempos do Grande Prêmio Internacional do Rio de Janeiro, no circuito que tinha por apelido “trampolim do diabo”, tamanho eram as dificuldades e os perigos a se enfrentar nos seus 11 quilômetros. Nesta foto em que Luiz Antônio Greco está com os irmãos Fittipaldi, ao fundo temos o nosso Bob, bem jovem. Apesar da paixão despertada naquele desafiador circuito, Bob Sharp não teve oportunidade disputar uma corrida naquelas ruas... em 1954 a prova do Rio de Janeiro ganhava um outro palco: o recém criado circuito da Barra da Tijuca. Foi neste novo palco, com 19 anos de idade, ao volante de um Fusca 1200cc que ele disputava sua primeira corrida: as 6 horas da Barra da Tijuca, em 1962. Ele não conseguiu concluir a prova, o motor não resistiu... mas isto não seria motivo para desistir, e sim para continuar! Naquele ano, Bob entrava na Escola Técnica Federal do Rio de Janeiro, no curso de construção de motores e máquinas. É claro que, desta formação teórica, muitas idéias e projetos viriam a ser colocados em prática. A indústria automobilística nacional estava em momento de efervescência e era um campo fértil e vasto para mentes como a de Bob Sharp. O engenhoso Bob e seu DKW com a traseira modificada. As primeiras provas terminaram em abandono, mas Bob não desistiu. Nas pistas, Bob continuava tentando se aprimorar e em 1963 participou das 12 horas de Interlagos com um “DKW especialmente modificado”. Bob trocou correspondência com a fábrica na Alemanha e com os novos conhecimentos obtidos, prepararam um escapamento que proporcionaria um ganho de potência. Esta prova Bob disputou ao lado do seu primo – Billy – para enfrentar a maratona paulista. A traseira do DKW foi modificada para um melhor aproveitamento do conjunto, mas um problema na bomba de gasolina e posteriormente no próprio escapamento acabou por forçar um novo abandono. Mais uma tentativa – frustrada – aconteceu também em Interlagos, nos 500 Km, mas a parceria com Gilberto Correia Filho também terminou em abandono do DKW nº95 foi – provavelmente – um sinal para Bob voltar-se para os estudos e preparar-se melhor para os desafios que se seguiriam nas pistas. Em 1964 Bob participou da segunda etapa do campeonato carioca de turismo no circuito da Ilha do Fundão... onde colecionou mais um abandono. Era realmente hora de repensar estratégias e o tempo trabalhou a favor. Na Formula Vê, Bob Sharp cpnseguiu concluir suas primeiras provas e obteve bons resultados em 3 anos na categoria. A indústria nacional estava refreando sua participação no meio de competição com a Vemag, a Willys e a Simca passando por grandes transformações, fusões e negociações. Além disso, algumas equipes e pilotos começaram a investir mais na vinda de carros importados, mas foi no surgimento de um novo seguimento – a Fórmula Vê – que Bob Sharp se estabeleceu como piloto no cenário nacional. Criada na Alemanha, a Fórmula Vê era uma modalidade em que os carros eram montados com base na mecânica Volkswagen comum, equipados com um motor de 1.200 cilindradas. O conceito de corridas de monopostos começaria a ser retomada depois de um hiato de alguns anos quando caíram no ostracismo os Fórmula Junior e os carros de Mecânica Nacional e Continental. As disputas da Fórmula Vê eram ferozes e o grid repleto de excelentes pilotos. Destacar-se era difícil e Bob destacou-se. Bob Sharp estreou na nova categoria logo com um terceiro lugar, na primeira etapa do campeonato carioca de 1967, ao volante de um Aranae-Vê, um dos chassi disponíveis para os pilotos... para sua infelicidade, o chassi que mostrou-se mais competitivo foi o da concorrência, o Fitti-Vê, produzido pelos irmãos Fittipaldi. Bob fez grandes provas, mas ao longo dos seus anos de Fórmula Vê, sua melhores colocações foram alguns terceiros lugares. Em paralelo as provas com os Fórmula Vê, Bob chegou a ser sócio de uma revenda Vemag e com o acesso aos carros criou um fantástico protótipo, idêntico ao DKW... feito em plástico e fibra de vidro!!! O carro era um DKW-Vemag ano 64, que pertencia a Eduardo Ribeiro, sócio de Bob na revenda, originalmente preto com teto branco (o popular saia e blusa). Portas, pára-lamas, tampas, extremidade traseira, tudo serviu de molde. Da carroceria original em aço estampado, ficaram apenas assoalho, colunas e parede de fogo. Até a folha do teto passou para plástico. A engenhosidade de Bob Sharp extrapolou no projeto do DKW de fibra de vidro e plástico. Além de piloto Bob ia além! O conjunto dianteiro de pára-lamas e capô tornou-se peça única e removível por inteiro, o que facilitava bastante a manutenção. As portas traseiras deixaram de abrir na carroceria de plástico. O carro ficou bem leve: 630 kg, grande redução ante os 945 kg originais. Embora não tivesse sido feita nenhuma modificação de aerodinâmica, o desempenho melhorou muito devido à relação peso-potência mais favorável. Mas, de início, havia um sério problema: ao fazer a frente inteiriça, Bob optou por simplificar a parte interna, eliminando as saias internas que compunham as caixas de roda. Com isso, as três cornetas dos carburadores (Webber 45 DCOE horizontais), em que um dos corpos foi eliminado. Essas cornetas – no carro original – ficavam visíveis, voltadas para a roda dianteira direita. Nos primeiros testes com o carro, a velocidade máxima não passava dos 130 km/h. Achando que era falta de potência, trocaram o motor... e nada! O carro simplesmente não andava. Os treinos eram feitos no Autódromo de Jacarepaguá e em um deles, Bob foi para a pista sem a frente do carro... e o carro virou um canhão, chegando aos 160-170 km/h! Foi aí que “caiu a ficha”: estava faltando ar”! A solução para o problema foi um tanto esdrúxula, mas perfeitamente funcional... eliminaram a caixa do farol direito, passando a haver o buraco, como se o carro fosse caolho! Na grade, na direita e em cima, foi feito um desenho diferente do resto. É que devido à frente ter abaixado e ficado ligeiramente mais curta, a grade pegava no carburador do cilindro 1 (o tal Webber cortado). Foi preciso fazer outro “buraco”, eliminando algumas lâminas da grade. Durante duas temporadas Bob correu na equipe Casari-Brahma, com o protótipo A1, idealizado por Norman Casari. Foram só três provas. Na foto acima, com Jan Balder ao volante, uma das aparições do belo carro. Havia também uma pequena saliência abaulada bem no centro do capô, perto da grade: também pelo motivo da frente ter ficado mais baixa, foi preciso criar espaço para a polia do ventilador. O carro era bem rápido, Bob e Eduardo correram em dupla algumas provas, dentre elas a 1.000 Quilômetros de Brasília de 1969, ainda no circuito de rua. Chegaram em 10º na geral. Bob fez mais algumas provas solo de campeonato carioca, sempre terminando muito bem. No final do ano o carro foi desmanchado (a fibra era muito fraca e estava cheia de remendos já), foi colocada uma carroceria nova e vendido. A de plástico foi-se embora num caminhão de sucata. Uma pena, mais uma relíquia da história do nosso automobilismo que deixou de ser preservada. Em 1970 uma nova realidade começava a se consolidar: as grandes equipes patrocinadas. Bob Sharp foi convidado a fazer parte da equipe Casari-Brahma, em dupla com Milton Amaral. A estréia foi nos 1.000 km de Brasília o protótipo Casari A-1 Ford, um modelo inspirado nos veículos da série Can-Am, famosa na época. O protótipo idealizado por Norman Casari foi concebido com partes mecânicas do Carcará (carro com o qual Norman bateu o recorde de velocidade para carros 1.0 e que permanece até hoje), mas equipado com um potente motor Ford V-8, que eram utilizados nos Galaxie, acoplado a um transeixo ZF, o mesmo que equipava os modelos Lola T70, carro europeu de maior cilindrada e um verdadeiro objeto de desejo das pistas. Apesar de todo o potencial do equipamento, diversos problemas em corridas impediram Bob Sharp de conquistar um triunfo com este bólido nos anos de 1970 e 1971. Foram 3 provas de longa duração com dois abandonos e uma inscrição mas sem participar efetivamente da prova. Com apoio da Mesbla, Bob correu durante vários anos com Opalas. As disputas contra os Mavericks eram acirradas. Dois anos depois, em 1973, uma concessionária Chevrolet (a extinta Mesbla, loja que vendeu nos anos 70/80 de pratos e toalhas a carros e lanchas), no Rio de Janeiro resolveu apoiar a criação de uma categoria monomarca com modelos Opala cupê 4.100 praticamente originais. Aquilo viria a ser o embrião da Stock Car, que começou em 1979. Pouco tempo depois, Antônio Carlos Avallone – quase lendário piloto, empresário, jornalista, construtor de carros e deputado federal – passou a organizar corridas em que Chevrolet Opalas e Ford Mavericks se confrontavam em belos duelos na classe dos carros grandes, enquanto Chevettes e Dodginhos 1.800 brigavam na classe de menor cilindrada. Foi um novo caminho que Bob tomava, desta feita, inicialmente, ao volante de um Opala. Não era fácil correr contra os Mavericks, principalmente tendo o Luiz Antônio Greco (nos boxes) e Bird Clemente (na pista) como adversários, além de uma diferença de potência de motor que não tinha compensação na época. Apesar disso, a disputa entre as duas marcas era acirrada e, para desempatar, Bob recorreu a um novo motor em desenvolvimento na GM, então sob o comando de Roberto Beccardi, o Chevrolet 250S, que proporcionava ganho de 30 cavalos. Nas 25 horas de Interlagos, em 1973, Bob e Jan lutaram muito, mas não conseguiram superar o Maverick dos Clemente. A maior confusão aconteceu no ano seguinte, 1974, quando foi preciso um mandado de segurança (impetrado pela revenda Chevrolet Itacolomy), do também piloto Reynaldo Campello, para inscrever quatro carros. O Opala de Campello e Wilsinho Fittipaldi venceu, mas o de Bob Sharp e Jan Balder teve o motor quebrado durante a prova. A briga não parou aí, Luiz Antônio Greco, que corria com os Maverick conseguiu homologar uma versão mais potente do Maverick, com componentes importados para o motor V-8 302. As modificações geraram uma absurda diferença de 45 cv entre os carros e o domínio foi absoluto. Foi nesta virada que Greco conseguiu convencer Bob Sharp a mudar de time – ele não tinha vínculos com a equipe Opala – e vir para a sua equipe. Ao volante do Maverick da equipe de Luiz Antônio Greco, Bob Sharp conquistou seu primeiro título Brasileiro. Foi na parceria com Luiz Antônio Greco que Bob conseguiu o título de campeão brasileiro de turismo de série (Grupo 1 FIA), já há tanto tempo merecido, correndo e vencendo diversas provas ao lado de grandes parceiros como Marivaldo Fernandes, José Carlos Pace, Paulo Gomes, Edgar de Melo Filho, Arthur Bragantini e Eduardo Celidônio. Também ganhou o título da Divisão 3, mas este ele nem considera tanto assim, pois considerava não haver concorrente à altura para seu carro. Nos anos de 1977/78 Bob Sharp conquistou mais um título, correndo com os FIATs 147. Ele conhecia os "atalhos" de cada pista. Depois que Greco encerrou a parceria com a Ford, Bob Sharp estreitou laços com a FIAT e correndo com os pequenos 147, colecionou diversas vitórias, mesmo tendo sido contratado para a diretoria comercial, não era raro – pelo contrário – vê-lo trocar o terno pelo macacão. Na década de 80, Bob enveredou pelo campo do jornalismo, assinando diversos artigos e realizando testes com diversos carros para as mais conceituadas publicações do país. Esporadicamente ainda participou de algumas provas, mas foi com o seu conhecimento de mecânica e sua vivência nas pistas que Bob foi sendo uma peça importante em algumas das nossas empresas da indústria automobilística. Nesta década de 80 ele foi durante vários anos diretor de competições da Volkswagen quando esta era a grande fera do campeonato brasileiro de marcas e pilotos. Dos anos 90 em diante, foi no jornalismo especializado que ele se concentrou e chegou a ser, nos anos seguintes, editor técnico da Quatro Rodas e da Autoesporte, pela segunda vez. De editor, passou a gerente de imprensa, cargos que exerceu na GM e na Embraer, consolidando-se como um dos profissionais mais bem conceituados de sua área. Atualmente Bob Sharp, é consultor e colunista das revistas SAE Brasil e Quatro Rodas, além de colaborador nas revistas Carro, Racing e do site automobilístico norte-americano Inside Line. Nas horas vagas, projeta utilitários, como o recentemente patenteado FlexCalc, um calculador que ajuda os donos de carros flex a calcularem as vantagens, em cada momento, de abastecer seus carros com álcool ou gasolina. Residindo atualmente em São Paulo, Bob Sharp é uma presença certa nos grandes eventos automobilísticos do país. Fontes: Revistas Quatro Rodas; Autoesporte; e Brasileiros; Sites Obvio e Yellowpages; CDO. |