Thiago Meneghel é o exemplo de uma pessoa e um profissional que encontrou caminhos para construir uma realidade a partir de seus sonhos. Paulista da cidade de Araras, como muitos meninos que acompanhavam automobilismo, tinha o sonho de ser piloto e por alguns anos perseguiu este sonho, como kartista e em corridas de monopostos, mas a descoberta de duas coisas mudaria sua vida. A primeira, que certamente foi dura como o é para muitos dos jovens que querem um dia chegar na Fórmula 1, é que não basta ter talento, tem que ter dinheiro... muito dinheiro. A segunda, trabalhando muito próximo das equipes, com os mecânicos e engenheiros, descobriu que seu talento ia além das pistas e isso o levou para a faculdade de engenharia na Mackenzie, em São Paulo, onde formou-se enquanto trabalhava em paralelo com equipes de automobilismo. Atualmente Thiago Meneghel é um dos mais jovens e mais respeitados proprietários de equipe da Stock Car, que já conseguiu diversas vitórias e pódios ao longo de sua existência, mas que nos últimos tempos decidiu expandir seus horizontes e enfrentar desafios em outras duas grandes categorias nacionais e com elementos completamente distintos, estando à frente da equipe IVECO na Copa Truck, tendo como pilotos Felipe Giaffone e Djalma Pivetta e como engenheiro chefe da Via Itália, equipe que disputa o Brasileiro de Endurance com uma Ferrari 488, pilotada por Chico Longo e Daniel Serra. No encerramento das atividades do automobilismo de 2019 Thiago fez um pit stop e concedeu uma entrevista para o site dos Nobres do Grid. NdG: Como foi que nasceu essa tua relação com o automobilismo? Thiago Meneghel: É uma coisa que vem desde a minha infância lá em Araras. Sempre apaixonado por carros e automobilismo. Aos 11 anos eu arranjei trabalho em uma oficina mecânica da minha cidade em meio período, trabalhando pela manhã e estudando na parte da tarde. No início eu mais varria a oficina do que fazia outra coisa, mas no começo é difícil e com o tempo eu fui começando a aprender. Fiz muito serviço de freio... arrebentei lona de Fusca até cansar (risos), depois aprendi a limpar carburador e foi indo e pouco depois disso eu fui correr de kart. No início, mais como uma brincadeira, mas a coisa foi ficando séria e fui tomando o caminho da profissionalização. Com 13 pra 14 anos fui pra São Paulo, morar em Interlagos, porque só queria saber de corridas 24 horas por dia e minha família achando que meus pais eram malucos. Eu aluguei um apartamento pequenininho aqui do lado da pista e vivia no meio o tempo todo. Ou na pista ou nas fábricas, equipes, que tinham várias em volta do circuito. Ficava de segunda a sexta com o pessoal das equipes e das oficinas e no final da semana ia pra casa. NdG: Mas você já estava voltado para a parte de trabalho das equipes ou o sonho de pilotar continuava? Thiago Meneghel: Ah, continuava, né? Eu continuei correndo de kart e depois cheguei a correr de monopostos. Eu viajei para algumas corridas na época. Andei de kart até onde deu. Fui vice campeão brasileiro, campeão paulista e depois com 16 anos eu tinha que tentar ir para os fórmula. Comecei a treinar de F. Ford com o velho Darci de Medeiros, que foi um professor para muita gente. A ideia era correr o campeonato de F.Ford em 1997, mas aí a categoria acabou como campeonato brasileiro, a Ford saiu como montadora e passaram a fazer um campeonato lá no Rio. Mas eu queria andar no Brasil inteiro e então fui correr de F. Chevrolet. Era uma categoria mais rápida, com alguns pilotos bem experientes, Eu tinha feito amizade com o Augusto Cesário, dono de uma equipe de Fórmula 3, e ele disse que precisava de alguém que começasse a aprender essa parte de telemetria, de analisar o que os pilotos estão fazendo na pista e nessa época eu já dava umas aulinhas de kart pra quem estava começando a correr e era uma oportunidade. Eu aceitei e comecei a trabalhar com ele. Não ganhava nada, é verdade, mas ia para as corridas e estava aprendendo, estava dentro do meio, onde eu queria. Daí alugamos uma garagem vizinha da oficina dele e lá eu tinha um mecânico, um ajudante e eu para fazer o carro da F. Chevrolet. Fiz o campeonato de 1997... e meu vizinho de Box na F. Chevrolet era o Andreas Mattheis... e você vai ver como o mundo dá voltas. Trabalhei com o Cesário até 2003, onde também trabalhei com a F. Renault nesse tempo fui pra faculdade de engenharia mecânica. Nessa altura eu já estava totalmente voltado para o trabalho nos boxes e fui trabalhar com Andreas Mattheis. NdG: E hoje você é um dos maiores adversários do Andreas... Thiago Meneghel: É incrível como o mundo dá voltas, né? Eu estava um dia correndo de kart e o Zequinha Giaffone me falou que tinha uma equipe que estava procurando uma pessoa para trabalhar na parte de aquisição de dados, análise... e perguntou se eu tina interesse. Eu disse que tinha e o Andreas me ligou. Nos acertamos em 5 minutos de conversa e comecei a trabalhar com ele. Ganhamos dois campeonatos, montamos a segunda equipe, fiquei com ele por uns 7 anos para ter minha equipe própria. Anos depois ele falou que lembrava de mim desde a F. Chevrolet. Na época ele tinha uma equipe pequena, de um carro só, mas ele era muito conceituado nos campeonatos de turismo. Nessa época ele já era um dos grandes chefes de equipe do Brasil. Depois ele parou com fórmulas e focou só no turismo. NdG: Você migrou muito cedo do cockpit para os boxes. Outros levaram mais tempo. Hoje você trabalha com pilotos muito experientes, mas nem sempre foi assim. O piloto, de uma forma geral, tem uma visão estratégica do que é o negócio automobilismo? Thiago Meneghel: O piloto tem visão de pista, do que acontece dentro da pista e isso me ajudou muito na minha carreira. Aos 20 e poucos anos de idade eu já estava como chefe de equipe na Stock Car e ganhando corridas. Ter feito o caminho que eu fiz entre a pista e o Box me fez cortar caminho nesse e hoje quando o piloto fala comigo algo que está acontecendo de uma certa forma em um determinado ponto, muitas vezes em pistas que eu andei e que lembro como era, isso ajuda bastante. Agora, a visão de negócio é algo que se adquire com o tempo, com estudo. Eu fiz administração de empresas depois de formado em engenharia. Então, hoje, como dono de equipe e chefe de equipe em três categorias (Stock Car, Copa Truck e Brasileiro de Endurance), eu me vejo mais como um gestor de negócios durante a semana e que no final de semana é que eu acabo ficando mais perto do trabalho na pista e no box. NdG: A gente sempre te vê nesse trabalho do final de semana. Explica melhor o que é esse trabalho que a gente não vê, longe do autódromo, entre uma corrida e outra... Thiago Meneghel: Depois do domingo, já na segunda-feira eu estou lá na oficina fazendo contas, fechando folha de pagamento do pessoal, fazendo pedido de peças para os carros, algumas são importadas dos EUA e Inglaterra, um trabalho que precisa ser feito. Somos pequenas empresas que precisam ter uma estrutura de organização que funcione, mas a gente faz um pouco de tudo, tipo ajudar a carregar o caminhão, a organizar ferramentas, manter tudo limpo... é o normal. NdG: Hoje, trabalhando com três categorias, você tem uma equipe de quantas pessoas trabalhando contigo? Thiago Meneghel: Lá em Americana, onde fica a equipe da Stock Car e o Brasileiro de Endurance, com a Ferrari que participa do campeonato, estamos em 19 pessoas. A estrutura da Copa Truck fica em Laranjal, que é outra cidade, uma oficina específica para os caminhões, temos 5 pessoas e para as corridas contratamos mais 3 freelancers. Eles também ficam “part time” lá, quando precisamos de um reforço de mão de obra, chamamos eles. NdG: O que foi que te moveu para ampliar tua base de negócios? Todos conheciam o Thiago como um bem sucedido dono de equipe da Stock Car. Porque tentar outras categorias? Thiago Meneghel: Eu tive a sorte de trabalhar em equipes muito boas, com o Cesário, com o Andreas... com isso consegui ser campeão de F3, F3 Light, inclusive sulamericano, de F. Renault, na Stock Car, Fiat Linea, GT3, Endurance... quase não sobrou categoria brasileira que eu não tenha tido sucesso. Daí os caminhões passaram a ser um sonho e um desafio porque é algo diferente de todo o resto. Há um tempo atrás, em 2016, eu comecei a fazer uma consultoria para uma equipe de F3 e isso já é uma diferença se formos colocar lado a lado um F3 e um Stock Car. Vamos colocar assim: o Stock está no meio do caminho entre um F3 e um caminhão. Eu gostei de voltar e queria mexer novamente com aquele carro super sensível nos mínimos detalhes, que uma coisinha que você muda, muda o carro completamente e fizemos um campeonato bacana com uma equipe pequena e fizemos um bom campeonato. Marcamos pole, quase ganhamos corrida, mas aí a categoria parou. Quando o Djalma [Pivetta] me chamou e falou sobre a Copa Truck ele me conquistou com seu jeito simples e humilde de fazer as coisas acontecerem e me levou lá pra Santos para ver os caminhões da IVECO que estavam lá parados e me falou que era uma oportunidade e ele já tinha todo o contato com a IVECO para fazer o projeto andar e me chamou para o desafio. Eu pensei um pouco e decidi aceitar. Pra nossa surpresa a gente teve a chegada do Felipe [Giaffone] no primeiro ano da equipe e, vamos ser francos, a equipe ainda não estava pronta para ter um piloto como ele para disputar campeonato e tivemos muitas dificuldades nesse primeiro ano. Teve etapa que o caminhão praticamente não andou por problemas mecânicos e eu sempre fui muito do tipo que gosta de inovação. As vezes me falam: “ninguém faz isso, porque você vai fazer?”... e é justamente por ninguém ter feito que eu decidi fazer. Nunca tive medo de ousar. Fizemos algumas coisas neste ano. Algumas funcionaram muito bem, outras não, mas foi um ano de descobertas, de muito aprendizado e terminamos o campeonato em terceiro, com o Felipe em quarto entre os pilotos. Encarar o desafio de montar uma equipe nova, do zero, com gente que tinha pouca experiência de corrida, tirando eu e outros 2, os outros nunca tinham entrado num autódromo. Isso é uma realização. NdG: Nestes anos, administrando equipes, mais do que ser o dono, que coloca dinheiro e cobra resultados, quais os maiores desafios que você enfrenta? Thiago Meneghel: Os maiores desafios... tem dois grandes. Acho que o maior deles é lidar com as pessoas em um ambiente extremamente competitivo. A pressão está por todo lado, com os mecânicos, com os pilotos e você acaba tendo que ser um pouco psicólogo no meio disso tudo para dar uma segurança pra todo mundo, pra entender as dificuldades de cada um... esse é o maior desafio. O segundo é o desafio de empreender teu negócio, que hoje, para mim, é relativamente grande, por juntar as duas oficinas a gente tem mais de 3 mil metros quadrados de oficina, com quase 30 funcionários, um negócio grande que vive do automobilismo dentro de um país que tem todas as carências e problemas econômicos que o Brasil tem. Muita gente olha, eu já escutei muitas vezes das pessoas, “ah, você está aí brincando de carrinho, vai trabalhar”... e hoje alguns veem que é um pouco diferente e quem ainda acha isso eu convido para vir na oficina ver o trabalho que a gente faz... e quem vai assusta, fica um pouco impressionado. Então, quem é fã e vem para assistir ou um patrocinador novo que vem e não conhece o que é a nossa realidade, não entende de início como é complexo ter uma carreira voltada para isso, que tem várias famílias dependendo disso, que é um negocio que, quando chegamos no final da temporada, em dezembro tem férias, 13° pra pagar, ir pra casa com segurança de que vamos ter trabalho para o ano seguinte, que vamos estar juntos novamente em janeiro, que os contratos de patrocínio estão sendo assinados, esse também é grande. NdG: Você já mostrou que tem visão e não foge de desafios. Há alguns anos tivemos dois brasileiros que montaram uma equipe de GT para correr fora do país. Seja nessa ou em outra categoria, você vê condições de um grupo brasileiro montar uma equipe hoje para disputar campeonatos na Europa ou pelo mundo? Thiago Meneghel: Eu vejo condições para isso, sim. Hoje nós temos uma categoria no Brasil que é a Stock Car que é extremamente difícil e eu não tenho dúvidas que pelos convidados que vem aqui correr conosco nas corridas de duplas, pelos profissionais que vem de outros países trabalhar conosco, é uma categoria de primeiro nível no mundo. É muito difícil? Sim, é, mas eu participei de uma corrida no final de janeiro passado, as 24 horas de Daytona, que podemos colocá-la entre as 4 maiores corridas de 24 horas do mundo, com certeza. E eu estava na categoria mais competitiva entre as categorias da corrida, apesar de ser a menos veloz, mas era a mais competitiva, com muitas fábricas envolvidas como costumam ser as corridas de GT que mesmo com carros de grandes fábricas a maioria das equipes são equipes privadas e o GT tem aquela velha história de “ganhar a corrida no domingo e vender o carro na segunda” e nós fomos com uma equipe brasileira, com apenas um engenheiro de fora, que era da fábrica, dando assistência pra gente e fomos para Daytona sendo o primeiro ano de todo mundo, encarando a dificuldade de um regulamento extremamente complexo e detalhado, montamos toda uma estrutura nos EUA, provisória, alugar oficina, caminhão de transporte, ferramental que levamos uma parte daqui, compramos coisas lá, alugamos também, montar tudo pensando em uma corrida como a preparação que tivemos que começar no início de novembro, quando decidimos participar, com a corrida acontecendo no final de janeiro. Foi algo que deu certo. Fomos lá, com pilotos brasileiros, com um piloto italiano da fábrica, porque a fábrica faz algo tipo uma exigência, mas também é uma ajuda dela e é a meu ver uma política da Ferrari, mas o pole da categoria foi o Marcos Gomes, mas houve um acidente no início, na segunda hora da corrida e nos custou 4 voltas. Foi difícil, teve chuva no meio da noite e com tudo que houve nós descontamos as 4 voltas, entramos na volta do líder, estávamos em 8° quando faltavam umas 4 horas para o fim com um safety car que deram por causa da chuva. Era a hora de ir pra cima, com os melhores pneus, os melhores pilotos, era pra brigar pela vitória, mas aí a direção de prova deu bandeira vermelha porque a chuva apertou demais. Ficamos um pouco frustrados, mas com um orgulho muito grande de ter feito como nós fizemos. Depois disso recebemos uma carta da Ferrari que é coisa de pendurar na parede. Fizemos 21 ou 22 pit stops, todos no limite do tempo, sem perder um segundo, abastecimentos perfeitos, não erramos em nada a estratégia... o acidente nos atrapalhou, mas isso é coisa de corrida. Pra nós foi uma vitória fantástica e fica claro que nós somos capazes de competir e temos totais condições de vencer no automobilismo internacional. A equipe do Washington [Bezerra] e do [Antônio] Hermann venceu corridas, fez pódios, ganharam prêmios de melhores pit stops, tudo com pessoal brasileiro, mostrando que somos de primeiro nível. O que falta é a gente conseguir ter um parceiro forte para que possamos juntos fazer um trabalho de médio e longo prazo. É preciso tempo de desenvolvimento em uma categoria nova, é muito difícil chegar vencendo. NdG: A gente tem visto nesses últimos anos o Brasileiro de Endurance se fortalecendo. Este formato de campeonato é uma melhor plataforma de negócios do que era, por exemplo, o brasileiro de GT que havia até 2012/2013 ou seria melhor ter dois campeonatos distintos: um apenas com protótipos e outro com GT3 e GT4? Thiago Meneghel: Eu penso que hoje é praticamente impossível ter um campeonato separado de GT e protótipos. É uma questão de custos. Você tem carros de GT que custam entre 400 e 600 mil euros e para trazer para o Brasil tem os impostos, o frete, some a isso uma manutenção alta, todas as peças de reserva que você tem que ter e o somatório de tudo isso é um valor enorme. São poucas as pessoas que conseguem fazer um investimento deste tamanho no Brasil. Então você ter uma categoria onde você abraça quatro realidades distintas dentro dela e correndo junto é algo que existe em outros campeonatos, inclusive. É lógico que tem suas dificuldades. Carros que quebram com mais frequência, diferenças de velocidade grande o que obriga o piloto a tomar um cuidado maior, mas tudo isso tem possibilitado, tanto que está crescendo, ter um evento de sucesso e vamos observar que está cada vez mais difícil termos grids cheios de uma categoria apenas correndo. Você olha até na categoria promocional de maior sucesso do mundo que é a NASCAR, a gente vê muitos pilotos que não fazem o campeonato todo. É difícil a gente vê um grid cheio, com 30 carros com todos os pilotos fazendo a temporada. O Brasileiro de Endurance é um campeonato de sucesso, mas eu não acredito que vamos ter um campeonato com 20 carros de GT e 20 protótipos P1 fazendo o grid, mas o evento está em crescimento e é muito competitivo. Está dando certo e tem tudo para continuar dando certo. NdG: Você recebeu um convite e aceitou o desafio de encarar a Copa Truck, mas é preciso reconhecer que, de certa forma, o meio do automobilismo sempre olhou para a categoria de caminhões com alguma ressalva, como se fosse uma espécie de “patinho feio”. Vendo por dentro, como parte integrante, o que você viu? Thiago Meneghel: Na, verdade esse comentário é engraçado. Quando eu corria de F. Chevrolet em 1997, a gente corria dentro do evento da Stock Car e eu via aqueles pilotos da Stock Car andando com aqueles Ômegas e eu falava: “que coisa horrível isso aí”... eu não gostava. O tempo passou e poucos anos depois eu estava trabalhando na categoria e hoje a categoria é o que é. Penso que com os caminhões teve um pouco disso, mas me encantou o desafio de estar nas principais categorias do automobilismo brasileiro e eu queria fazer isso. Em uma temporada eu aprendi muita coisa. O regulamento da categoria é muito livre, usa-se muitas peças dos caminhões de rua e estrada nos caminhões de corrida e tem muito daquele trabalho de construção feito dentro da oficina que nas outras categorias não tem mais. Então, é um pouco daquela coisa do “automobilismo raiz” que a tecnologia está deixando cada vez mais distante em outras categorias. NdG: Você já estava bem estabelecido na Stock Car 10/11 anos atrás quando veio a crise, quando patrocinadores, montadoras e – literalmente – dinheiro sumiu da categoria. Há 5 anos o país entrou em recessão e tudo ficou difícil no país. Neste último ano temos um dólar alto, um desemprego alto, uma economia que não decolou como muitos esperavam. Como tem sido enfrentar este grau de desafio fora da pista? Thiago Meneghel: Dentro da nossa economia você viver de automobilismo é um desafio enorme. O automobilismo é um esporte, mas é preciso entender que também é um entretenimento, um show dentro de uma disputa desportiva. E aí o que acontece: a gente vê tantas empresas com dificuldades, em recuperação judicial, e você começa a ver isso, sabe que vai ter consequências. Em um cenário difícil, a primeira coisa que o empresário corta é o marketing. Não precisa dispensar funcionário, não vai mexer na produção, e com isso fazer com que esse empresário pense em investir em patrocínio é um desafio. A parte mais complexa é você fazer um trabalho para que a marca que te patrocina tenha uma exposição, uma visibilidade e um retorno que mesmo numa situação difícil de mercado, com muitas dificuldades, o patrocinador veja o retorno acontecendo e reconheça a importância de expor sua marca naquele modelo e continue investindo. A gente tem uma série de ferramentas, estratégias, eu vejo na Stock Car que os custos são altos, mas, por exemplo, quando a Shell, que trabalhou anos comigo, mostrou os resultados de retorno de imagem para a marca com a categoria a gente entende que justifica todo esse esforço e que tudo faz sentido. Além disso, a corrida não fica restrito ao que acontece dentro da pista. É um momento para se investir em relacionamento, em trazer clientes para fazer algo diferente, viver uma nova experiência e por outro lado também tem o crescimento profissional. A gente tem engenheiros da IVECO que fica o final de semana inteiro conosco analisando e assessorando a gente. Todo o tipo de problema que acontece com qualquer componente de um caminhão comercial ele tem como encontrar respostas com o trabalho da pista e isso é importante para nós e para eles. E não é só a IVECO. A engenharia da Frum está na pista, analisando freios para o caminhão que sai da fábrica como a Fras-Le faz na Stock Car, eu falei do freio, mas é tudo. É a parte de suspensão, a eletrônica, são os pneus. É um grande laboratório e se formos olhar, todas são marcas envolvidas com as fábricas e usam a competição para desenvolver seus produtos. NdG: E nessa busca constante de evolução a gente tem um engenheiro, proprietário e chefe de equipe, jovem, no box de um lado tem um outro profissional com uma trajetória e uma faixa etária similar, como o Maurício Ferreira e do outro uma lenda viva da categoria como ‘seu’ Mauro Vogel, e mais uns tantos “cascudos” tipo o Andreas e o Meinha... Como você vê essa disputa de gerações e o que você projeta para o futuro? Thiago Meneghel: Eu vejo assim como uma honra estar dividindo um grid com estes nomes, personagens do automobilismo que eu cresci ouvindo falar deles, assistindo corridas e vitórias que eles e suas equipes conquistaram nas pistas pelo Brasil, eles que sempre foram referência, que eu e tantos buscaram se espelhar neles e hoje eu estou competindo com eles. É um prazer que esta vida que eu escolhi tem m proporcionado. Tem esportes que seus competidores são da sua mesma faixa etária, ou de uma faixa de tamanho ou peso e o automobilismo permite que haja este encontro e este confronto entre gerações e os estilos de trabalhar vairam muito e não se pode medir isso nem pela idade. O Andreas [Mattheis], por exemplo, tem um espírito de jovem, um sistema de trabalho muito moderno, sempre buscando coisas novas, aprender, crescer. E vem mais novidade por aí. Tem gente 20 anos mais nova do que eu trabalhando com automobilismo e crescendo. Na minha época poucos queriam saber de automobilismo. Quando eu entrei na faculdade 20 e poucos anos atrás, eu vinha muita gente falar: “trabalhar com corrida? Não quero. Final de semana não tem folga, não tem horário pra nada. Eu quero é trabalhar numa montadora, ter todos os benefícios, plano de carreira, estar numa multinacional e poder, de repente, ir trabalhar no exterior...” e em um aspecto a crise foi boa, porque o automobilismo tem uma carência muito grande de mão de obra qualificada. Hoje a gente vê jovens com uma base teórica muito boa, com muito mais informação e que não tem conhecimento de pista. Pelo outro lado temos profissionais aqui no automobilismo que tem tanta experiência de pista que eles conseguem encontrar caminhos, soluções e as vezes nem conseguem explicar como chegaram àquelas respostas, mas dentro da cabeça deles, eles sabem exatamente como fazer aquilo. Por isso eu incentivo a esse pessoal novo que quer vir aprender, para vir pra pista, pegar esses “formulinhas” que correm em Interlagos, procura uma equipe pequena numa categoria pequena. Lá você vai ter que fazer tudo. É ali que você vai aprender, não se você entra numa grande fábrica e vai ser engenheiro de pneu, por exemplo. Se o cara começa de baixo, vai aprender muito e pode chegar no estágio que ele quer e tendo os dois conhecimentos. Vai ser um profissional mais completo. É disso que precisamos, de gente jovem, que traga base teórica, que se disponha a aprender o que é o trabalho no meio e como um todo. |