Eduardo Celidônio pode ser chamado de um predestinado. O porque? Logo o amigo leitor saberá. Nascido em 04 de maio de 1943, na Vila Clementino, bairro da cidade de São Paulo, Eduardo veio de uma família de boa condição financeira. Seu pai, Ruy Celidôonio, era empresário e possuía uma corretora de câmbio, trabalhando também com valores mobiliários na capital paulista. Empreendedor, investia parte dos seus rendimentos no agronegócio, plantando café no norte do estado do Paraná, no município de Maringá. Sua mãe, Maria Stella, cuidava das coisas do lar, como era comum naquela época. A criação rígida imposta por seu pai o levou a trabalhar desde menino na corretora, depois das aulas no Liceu Pasteur, um dos mais tradicionais colégios da cidade. Extremamente responsável, aprendeu a dirigir com o pai ainda menor de idade, com 13 anos apenas. Contudo, foi apenas com 18 anos que ganhou do pai seu primeiro carro. Eduardo era um jovem como qualquer jovem da sua geração. Aqui, na fazenda do pai, "fazendo peripécias" sobre o cavalo. Antes disso, a paixão pelo automobilismo já se manifestara. Ele foi diversas vezes a Interlagos com o pai e, aos 16 anos, tomou iniciativa e procurou o Automóvel Clube Centauro e o Automóvel Clube Paulista para ser, pelo menos, bandeirinha, uma vez que não tinha idade para dirigir. Conseguiu se credenciar como bandeirinha da APVC (Associação Paulista dos Volantes de Competição). A proximidade com o meio automobilístico levou-o a interessar-se por mecânica de automóveis, que foi aprendendo com os amigos que já tinham idade para correr e que também gostavam de corridas. O “passatempo” desta garotada era montar e desmontar os componentes e “inventar” maneiras de melhorar seus carros. Aos 18 anos, o carro que ganhou do pai teve destino certo: O autódromo - que ainda não era internacional - de Interlagos. Ao completar 18 anos, ganhou do pai um Aero-Willys com um “motorzão” de 2.2 litros! Mesmo não sendo um carro de corridas, foi para Interlagos que o carro seguiu seu sonho, em 1962, inscrevendo-se numa prova e homenagem a Victor Losacco (Pai de Vinícius e avô de Giuliano Losacco), que faleceu no ano anterior em uma fatalidade, quando foi atropelado pelo piloto Jaime Guerra. O resultado da corrida, um 18º lugar pode não ter sido aquilo que ele pretendia, mas o primeiro passo estava dado. Diferente do que normalmente ocorreu com vários dos grandes pilotos daquela geração, Os familiares de Eduardo Celidônio sabiam que ele estava correndo e até foram torcer por ele em Interlagos, permitindo que ele não tivesse que fazer uso dos pseudônimos que povoavam o grid. Apesar da torcida, apoio financeiro que é bom, nem pensar! Celidônio era ambicioso... como bandeirinha ele teve chance de ver – de perto – os grande eventos no autódromo de Interlagos e a paixão e desejo pelos carros esporte era algo quase incontrolável: Era ao ver os carros esporte internacionais e as competições com os carros da categoria “Mecânica Nacional” que o coração de Eduardo acelerava mais forte. Por conta deste sonho – e de uma oportunidade daquelas – Eduardo Celidônio vendeu seu Aero Willys e, colocando as economias de anos de trabalho com seu pai, conseguiu comprar a Ferrari 500 Monza, que pertencia ao piloto Alberto Carrara, e que estava exposta na loja “Speed”, de propriedade de Agnaldo Góes Filho. Em Maringá, seu pai investiu na cultura do café. Foi em Maringá que Eduardo viria a morar depois de parar de correr. Em Maringá, seu pai investiu na cultura do café. Foi em Maringá que Eduardo viria a morar depois de parar de correr. A estréia com o seu “cavalinho Rampante” seria naquele mesmo ano, 1962, no Festival Automobilístico da ACESP (Associação Comercial do Estado de São Paulo). A corrida marcou também a suspensão temporária de sua carreira devido ao gravíssimo acidente que terminou por vitimar o piloto Fernando Moreira Mafra, conhecido como “Rio Negro”, que perdeu o controle do carro, uma Ferrari 250TR, na curva 1 e foi chocar-se contra os eucaliptos (É... eucaliptos, aquelas árvores enormes com as quais se faz papel tomavam a área externa das curvas 1 e 2). Eduardo Celidônio viu de perto o acidente e automaticamente associou o carro com o dele... após a prova, a qual terminou com um excelente 3º lugar afastou-se das competições e vendeu a Ferrari para Antônio Versa. Contudo, como sempre dizemos, não há cura para o “velocitocócus” (ele pode até ficar encubado, mas não morre) e em 1964, Eduardo Celidonio estava de volta às pistas, ao volante de uma Ferrari 250TR (o mesmo modelo com o qual corria Rio Negro), onde disputou o GP Rogê Ferreira, chegando em 3º lugar na categoria Sport. O DKW "pé na bunda", apelido pouco glorioso que o possante recebeu mas que marcou uma época na vida de Eduardo. A prova seguinte foi ao volante e uma Maserati 300S, o Grande Prêmio “Vitória da Democracia” (o mesmo onde estreou o Águia). Nesta, Eduardo Celidônio conquistou sua primeira vitória, na categoria Sport. Ainda em 1964, disputou sua primeira prova de longa duração e, ao invés dos velozes e possantes carros esporte, o bólido era um DKW, preparado pelo piloto Nilo de Barros Vinhaes. O carro sofrera adaptações feitas pelo proprietário, entre elas, teve a traseira cortada. O design do carro rendeu-lhe o hilário apelido de “DKW Pé na Bunda”. Engraçado ou não, quem riu por último foi a dupla de pilotos, que venceu na categoria PT e foi 3º na geral. Naquele ano de 1964, Eduardo ainda disputou mais duas provas com o DKW de Nilo Vinhaes: Os 500 e os 1000 quilômetros de Interlagos, sempre alcançando o pódio. Com a Maserati 300S também foram duas provas: As 250 milhas de Interlagos, a primeira de poucas, e a prova J.F. Kennedy, onde conquistou o segundo lugar em ambas. Eduardo (na ponta à esquerda) e o time de bandeirinhas da APVC (Associação Paulista dos Volantes de Competição). Em 1965 foi que Eduardo Celidônio correu pela primeira vez em uma Carretera, uma Carretera Corvette, nos 1600 quilômetros de Interlagos, em dupla com Caetano Damiani, terminando em 8º lugar. Além desta prova, outras duas com os carrões adaptados tiveram sua participação. Uma delas teve um “episódio” daqueles “de fundo de garagem”: O Simca Tufão com o qual correram Eduardo Celidônio e Lauro Soares tinha originalmente três marchar para frente e uma para ré... a ré foi retirada e foi colocada uma quarta marcha (que, claro, feria o regulamento). Junto com o 2º lugar veio uma enxurrada de protestos. Como a equipe se negou a abrir o carro para inspeção, foram desclassificados. Eduardo Celidônio e Camilo Christófaro alguns momentos antes da largada das Mil Milhas brasileiras de 1966. Uma Corrida épica. A terceira corrida foram as Mil Milhas, onde, com uma Carretera Gordini, em parceria com Filinto Brito, e Adão Daher, terminou em 9º. 1965 foi o ano em que Eduardo Celidônio casou-se. Do seu casamento vieram três filhos, duas moças (que mora no confortável “clube” onde vive o nosso ás). O ano de 1966 viria a reservar para Eduardo Celidônio um lugar perpétuo na história do nosso automobilismo. Nas 24 horas de Interlagos, correndo ao lado de Zoroastro Avon, com um Simca Rallye, 2.6L, foi apenas o nono colocado, mas, duas semanas depois, com uma Carretera Ferrari, equipada com um motor Corvette, alugada junto a Camilo Christófaro, Eduardo Celidônio não só conquistou um brilhante 2º lugar, como chamou a atenção do experiente piloto. A performance rendeu um convite para correr, ao lado do Lobo do Canindé, as VII Mil Milhas brasileiras, na famosa Carretera número 18. A corrida é um capítulo à parte na história, tendo sido a mais emocionante das provas de longa distância já realizadas no Brasil e com um final simplesmente épico. Ao volante da mítica carretera número 18, Eduardo Celidônio foi protagonista da mais incrível edição das Mil Milhas Brasileiras. Camilo Christófaro e Eduardo Celidônio venceram a prova, com Eduardo ao volante no momento da bandeirada e Camilo Christófaro, quase à la Colin Chapmann, invadindo a pista para ver mais de perto o parceiro cruzar a linha de chegada. Tal feito além de render os louros daquela vitória, consagrou o rapaz que começara como bandeirinha e o alçava ao círculo dos grandes vencedores. Além disso, o reconhecimento veio no ano seguinte, quando recebeu o Prêmio Victor, concedido ao piloto de maior destaque no automobilismo. Uma grande honraria. A parceria com Camilo Christófaro continuou e outras corridas foram disputadas pela dupla, com mais uma corrida marcada por um final inverossímil: na conquista, das 12 horas de Interlagos de 1967, numa disputa acirradíssima com um Karmann-Ghia, equipado com motor Porsche e pilotado por Anísio Campos e José Carlos Pace. Um momento que ficou marcado na história: Celidônio sorria, ao lado de Christófaro, que consolava Emerson Fittipaldi. No final da prova, o carro de Moco e Anísio conquistara uma boa vantagem, mas parou pouco antes da linha de chagada, com problemas de embreagem. O carro foi empurrado pelo Renault 4CV de Élvio Rangel até a bandeirada, numa clara infração do regulamento, que não permitia a para a dupla do Karmann-Ghia-Porsche. ajuda externa aos competidores. Camilo protestou e já estava sendo, ao lado de Eduardo Celidonio, consagrado vencedor, sendo carregado nos ombros. Camilo decidiu retirar o protesto e a vitória acabou com a dupla do Karmann Ghia-Porsche. As Mil Milhas daquele ano não foram tão boas quanto a do ano anterior e a dupla acabou por abandonar a prova. Vendo o sucesso do novo astro das pistas brasileiras, o Harmann-Ghia, Eduardo acabou por adquirir um, equipado com um motor Corvair, com 6 cilindros. Ele abriu mão de estrear este carro para correr novamente ao lado de Camilo Christófaro, mas não se arrepende disso. O rei Roberto Carlos era frequentador assíduo da oficina de Camilo Christófaro no bairro do Canindé. Aqui, com os dois. Em 1968, com o Karmann Ghia-Corvair, foi 3º colocado nos 500 Km do Rio de janeiro, correndo ao lado do parceiro desde os tempos de bandeirinha, Carlos Alberto Sgarbi. Naquele ano, Eduardo Celidônio assumiu a presidência da APVC (Associação Paulista dos Volantes de Competição), em uma gestão marcada pela preocupação com a segurança dos circuitos. Em 1969, Eduardo enveredou por um outro caminho, abrindo o “Snob’s”, em sociedade com Adilson Brunharo. O Snob’s era um cinema Drive-in, na Avenida Santo Amaro e foi o primeiro empreendimento do gênero no país. Foi com este mesmo nome que batizaram um protótipo: o Snob’ MK I, Divisão 5. Um dos mais belos carros já construídos no país, com assinatura de Ricardo Divila e construção de Francisco Piccuito e Anésio Hernandez. Celidônio comprou um Karmann Ghia, equipado com motor Corvair. Um carro extremamente competitivo... mas que durou pouco. A base deste carro foi o Karmann Ghia com motor Corvair, acidentado por Carlos Alberto Sgarbi no ano anterior e que não tinha mais como ser recuperado. Como uma fênix, o carro renasceu ainda melhor e com ele vieram bons resultados nos anos seguintes. Contudo, em 1971, o piloto Jorge Mascarenhas sofre um acidente com o Snob's em Interlagos, durante a primeira volta da Corrida dos Campeões. Era o fim do belo protótipo, que ficou totalmente destruído. Sem carro para correr, mas com muita vontade de disputar os 500 km de Interlagos, em 1971, Celidônio procurou Emílio Zambello e terminou por acertar sua participação nos 500 Km de Interlagos com um Royale Inglês que estava encostado na equipe Jolly. Piero Gancia, Emílio Zambello e Marivaldo Fernandes consideravam o carro simplesmente inguiável! Eduardo Celidônio logo percebeu que o carro era realmente muito “arisco” e precisava ser tocado “na ponta das unhas”. No final da prova, Ele terminou os 500 km de Interlagos em terceiro lugar, atrás apenas de dois Porsches. O protótipo Snob tinha o motor e a base do Karmann Ghia, acidentado e sem recuperação. Era um dos mais belos carros do grid. Em 1972, Eduardo Celidônio disputou apenas uma corrida, com o Fúria-Chrysler onde terminou em sexto. Em 1973, voltou ao pódio ao lado de Camilo Christófaro nas Mil Milhas brasileiras, desta feita com um 2º lugar, ao volante de um Maverick. Em 1974, com o início da Fórmula super V, muitos dos pilotos que corriam em turismo migraram para a nova categoria, mesclando-se a jovem geração que surgia, no vácuo do sucesso de Emerson Fittipaldi na Fórmula 1. Assim, nomes como o seu e o de Chiquinho Lameirão, dividiam grids com os promissores Alfredo Guaraná Meneses (seu companheiro na equipe “Marcas Famosas”), Ingo Hoffmann, Marcos Troncon e Nelson Piquet, entre outros. Foi vice campeão em 1975. O nome "Snob" veio do empreendimento pioneiro de fazer um cine drive'in em São Paulo. Um sucesso na época. Eduardo Celidônio disputou ainda algumas provas no campeonato de 1976, assim como participou de outras, correndo de carros de turismo, conquistando um segundo lugar na segunda etapa do campeonato brasileiro da divisão 1, ao lado de Bob Sharp. Mas foi em 1977 que um sonho quase tornou-se realidade. O Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1 era realizado em janeiro e, naquele ano de 1977 ainda era uma prática razoavelmente comum o aluguel de carros para pilotos locais. Assim, Eduardo Celidônio conseguiu uma verba para alugar um F1 da equipe Shadow, que trouxe ao País três carros - dois deles garantidos para os pilotos titulares, Tom Pryce e Renzo Zorzi. O terceiro, um carro reserva, estava disponível para pilotos locais interessados em desembolsar entre US$ 50.000 e US$ 60.000 para ter o privilégio de participar da categoria máxima do automobilismo mundial. Nos anos 70, Eduardo Celidônio disputou duas temporadas da Fórmula Super Vê. Uma categoria que revelou grandes pilotos. Após receber autorização da Federação Internacional de Automobilismo (FIA), Eduardo Celidônio iniciou sua preparação para tentar uma vaga no grid (haviam 22 inscritos para a corrida e a regra permitia que até 24 carros participassem da prova em Interlagos). Ele seria o 23º integrante. Contudo, Celidônio tinha de torcer para não haver nenhuma quebra nos dois carros titulares. Desta vez os Deuses da velocidade não sorriram para ele e o motor de um dos carros da Shadow quebrou. Sem possibilidade de reparos, o sonho foi frustrado e mesmo restando ao piloto o consolo de receber de volta o dinheiro do investimento, certamente isso não compensou a perda da oportunidade. Na casa de Eduardo Celidônio, um quadro com dedicatória de um colega e adversário das pistas que foi mais longe: Piquet! Depois disso, Eduardo passou a competir esporadicamente em provas de longa duração. Sua despedida das pistas foi nas Mil Milhas de 2003 a bordo de um Volkswagen Voyage, quase 60 anos de idade, no mutilado traçado de Interlagos, que – para ele – foi uma estreia em nova pista. Ao lado do filho, Ruy, Eduardo Celidônio e um dos investimentos da família: a escola de tênis na cidade de Maringá-PR. Eduardo Celidônio mudou-se para Maringá, no estado do Paraná no início dos anos 80 e é hoje um empresário na cidade que escolheu para viver, onde possui um cemitério o Cemitério Parque) e uma escola de tênis em parceria com o filho, Ruy. Alguns anos depois Eduardo Celidônio sofreu um AVC que o deixou bastante debilitado e, algum tempo depois, em 21 de novembro de 2021, ele recebeu a graça de entrar para a eternidade. Foi com imenso prazer que pudemos estar com este senhor que, mesmo sendo tão nobre, é de uma humildade indescritível. Fontes: Revistas Autoesporte, Quatro Rodas, Brasileiros, Depoimentos do piloto, CDO. |