"Segunda-feira - que é quando estou a escrever este artigo - é dia de rescaldo, e agora que a Formula 1 já fez o seu trabalho de nos visitar após 24 anos de ausência, desconhecendo se nos irá visitar de novo tão cedo - todos esperamos que sim, dado que ouvi apenas elogios ao circuito por parte de pilotos e responsáveis de equipas - há coisas que queria falar sobre esta visita da Formula 1 ao meu país.
Toda a gente conhece as circunstâncias da sua chegada, e toda a gente sabe que se não fosse uma pandemia mundial a bater-nos à porta, não teríamos Lewis Hamilton, Charles Leclerc, Kimi Raikkonen, Valtteri Bottas, Max Verstappen e outros por estas bandas em 2020. Este governo - e todos os outros que andam nisto desde 2008 - não querem investir o erário público em algo que tem retorno enorme em termos de nome, chegada de turistas, logo, receitas extra para a região do Algarve e claro, para Portugal inteiro. Esse é um tema que é politicamente incorreto, logo, não é muito tocado, porque se alguém quiser dar vinte milhões de euros todos os anos para ter máquinas e pilotos por ali, cem mil espectadores vindos não só de Portugal, como do estrangeiro, a ficar alguns dias nas nossas praias e comer nos nossos restaurantes os nossos pratos típicos da região, haverá quem, de forma demagógica, dizer que isso seria melhor investido noutras coisas. Enfim... Muitos não conheciam o autódromo de Portimão até o final de semana do GP de Portugal de F1... todos ficaram encantados.
Contudo, daquilo que se anda a ouvir nestes dias de rescaldo, é que pode ser provável uma nova visita em 2021 se certos países não poderão resolver este assunto a tempo da nova temporada. É provável que a China decida não receber de novo porque a sua corrida é na primavera, e o Vietname até possa estar mais confortável se adiar a sua estreia por mais um ano, caso esta pandemia do coronavirus não se resolva na primavera, mesmo que se adie para o outono, por exemplo. Mas, com ou sem essa possibilidade, as impressões são positivas: os pilotos adoraram as subidas e descidas da pista, a natureza improvável do asfalto - camada nova, colocada de propósito para esta prova - e as primeiras voltas do Grande Prémio, com chuva fraca a baralhar a hierarquia, pelo menos temporariamente - fizeram com que toda a gente tivesse adorado a estadia da Formula 1 em Portimão. 
Claro que nem tudo foi perfeito. Descobriu-se que não há muitas estradas de acesso ao circuito, que fica nos arredores da cidade - quem ia de carro, a fila demorava em média três horas, evitando os transportes públicos - um pouco como é Paul Ricard, que não tem muitos acessos onde possam circular 60 mil carros à vontade. Talvez isso se possa ser resolvido criando uma espécie de cordão "anti-automóvel" e obrigar todos os que se deslocam ao circuito de irem para Portimão cidade e apanhar os transportes públicos que os levem até ao circuito, numa espécie de "shuttle non-stop" com autocarros (ônibus) que parem de três em três minutos, como se fosse hora de ponta. Para além disso, não havia sítios onde as pessoas poderiam comer, e os que haviam, eram caros; e o limite de 27 mil espectadores fizeram com que algumas pessoas, que tinham bilhete, fossem rechaçados porque a polícia fechou os acessos. Claro, as reclamações foram inevitáveis, mas ainda temos a ideia de que "barracas de comes e bebes" num sítio onde tudo é elitista, e se dá uma concessão onde essa gente põe e dispõe de comida e bebida, de forma arbitrária, tem os inevitáveis detratores. Mas quem já foi ver correr em Interlagos, por exemplo, sabe que isso existe em toda a parte. Desde a largada até o final não faltaram emoções no que se passou a chamar "a montanha russa portuguesa".
De resto, a corrida em si teve um início maravilhoso, com pessoal a comparar o arranque do Kimi Raikkonen ao do Ayrton Senna e de Rubens Barrichello no GP da Europa de 1993, em Donington Park - curiosamente, outro "one off" - e ver Carlos Sainz Jr. na frente de um Grande Prémio por oito voltas, ao volante de um McLaren, deve ter alegrado muitos corações, antes dos Mercedes e de Lewis Hamilton repor a normalidade, mas este tinha de acontecer, porque o resultado foi especial. Afinal de contas, depois dali, ele sairia de Portimão como o piloto mais vencedor de sempre, e se calhar o primeiro a ter cem vitórias na sua carreira. Em jeito de rescaldo, fiquei feliz por ver a Formula 1 por ali. Sempre achei que aquela pista merecia a competição. Foi feita para ela, e na sua primeira experiência, foi aprovada por todos. Também no final, fiquei com a ideia de que é muito melhor que o Estoril. Mas temos de pensar algumas coisas sobre essa comparação.
A primeira é que Estoril foi construída em 1972, um circuito ultra-moderno na altura, comparável com Paul Ricard, num tempo em que a grande maioria das pistas que existiam no calendário da Formula 1 eram estradas aproveitadas de outras infraestruturas existentes, como Silverstone, que tem como origem uma base aérea desativada. Agora, quase meio século depois, e mesmo com as várias remodelações a que foi sujeito, apesar de continuar a acolher corridas, tem uma infraestrutura inferior ao de Portimão. Não "torres vip", camarotes e algumas das curvas desafiantes do projeto original de Ayrton Cornelson foram redesenhadas. Portimão, desenhado e construído em 2008, é uma nova geração de pista, e dos poucos no mundo que não é um tilkódromo, logo, grande maioria das pessoas adorou-a e afirma ser melhor que Estoril. Construído nos anos 70e tendo sofrido modernizações, o autódromo do Estoril guarda muitas lembranças.
Mas independentemente de quem gostar qual - ambas têm Grau 1 da FIA, a propósito - o que se deve agora fazer é trabalhar para o seu regresso mais definitivo, do qual espero que seja em breve. Na minha ótica, isso merece cada tostão investido. Saudações D’além Mar, Paulo Alexandre Teixeira Acompanhe a página do nosso colunista no Facebook.
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