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Terramar: o super oval espanhol PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Friday, 08 January 2021 08:18

No início das corridas de automóveis pelo mundo, ainda no século XIX, as primeiras competições costumavam ocorrer em estradas. Foi apenas no início do século XX que começaram a surgir os primeiros autódromos, tanto nos Estados Unidos como Na Europa.

 

Na Inglaterra foi construído o desafiador circuito de Brooklands, que acabou destruído durante a II Guerra Mundial. Na Alemanha, fazendo uso de estradas, mas com uma condição de circuito semipermanente, surgia Avus. Nos Estados Unidos, ainda na primeira década do século, foi construído o Indianapolis Motor Speedway e na Itália, Monza começava a nascer em meio a uma plantação de oliveiras, apenas alguns anos antes daquele que seria o maior desafio para pilotos de todo mundo: Nurburgring!

 

Mas junto com estes autódromos e palcos muito conhecidos de todos os admiradores do automobilismo, um outro circuito, fruto de um sonho, foi construído na Europa com uma característica comum a Brooklands e Monza e um traçado a assemelhar-se com eles e Indianapolis. Um circuito no estilo “oval de alta velocidade”, com curvas extremamente inclinadas e desafiadoras... na Espanha!

 

 Vista aérea do circuito de Terramar (Google) feita este ano, mostrando o uso do terreno para fins agropecuários.

 

No final de 1922 começava a nascer o Autódromo de Sitges-Terramar, distante cerca de 35 km do centro de Barcelona, próximo da cidade balneária de Sitges, às margens do mar mediterrâneo, sonho de um investidor, tomou a frente da construção daquele monstro de concreto com 2 quilômetros de extensão para se tornar um dos grandes palcos do esporte que começava alargar suas fronteiras: o automobilismo.

 

Autódromo de Sitges-Terramar foi inaugurado em 1923, localizado no município de San Pedro de Ribas (vizinho à urbanização Rocamar) embora a proximidade de Sitges – uma cidade maior – tenha “roubado” o nome do circuito para si. Desafiador, o oval tem em determinados pontos de suas curvas inclinadas quase 60 graus, algo notável e simplesmente impensável nos dias de hoje.

 

 Imagem do que é a entrada do autódromo de Terramar hoge: Google.

 

Ele pode ser visto em partes da auto estrada C-246a entre Sitges e Villanova, atrás da Urbanização Rocamar e também das colinas circundantes e das trilhas que as pessoas costumam fazer a pé. O terreno está bastante coberto de vegetação, mas o concreto das curvas em ‘banking’, apesar de algumas rachaduras, estão relativamente limpas e, para os mais incautos, lembram represas que há muito racharam e deslocaram sua água.

 

História.

Desenhado por Jaume Mestres i Fossas, o autódromo foi construído em apenas 300 dias ao custo de 4 milhões de pesetas (peço desculpas aos leitores por não conseguir fazer o câmbio da época para os dias atuais, em Euros, mas certamente tratava-se de uma quantia de dinheiro no mínimo considerável. A inauguração, que contou com a presença dos monarcas, o Rei da Espanha Alfonso XIII e Miguel Primo de Rivera, foi liderada por Francesc Armengol de Sabadell, promotor da urbanização Terramar de Sitges e um dos principais investidores do circuito.

 

 Imagens feitas por uma empresa local que filmou a corrida de inauguração do autódromo de Terramar.

 

O Primeiro Grande Prêmio da Espanha foi realizado neste circuito, realizado em 1923 como parte dos eventos de abertura do circuito. Esta corrida foi vencida por Alberto Divo ao volante de um Sumbeam. No entanto, com o passar dos anos, a rica classe de Barcelona logo parou de frequentar a pista de corrida, o que definitivamente marcaria seu futuro.

 

O elevado investimento para a construção do circuito, somado ao limitado público que compareceu às provas, fez com que não pudessem atribuir aos pilotos prêmios monetários pelas suas vitórias. A falta de pagamento aos operários da construção por um aumento imprevisto nos custos da obra, levou-os a apreender o dinheiro que foi arrecadado nas bilheterias do portão e deixou os organizadores sem dinheiro para pagar os pilotos.

 

 O público tomou as depedências do circuito de Terramar na corrida de inauguração, mas com o tempo, rareou.

 

Isso afetou seriamente a reputação do circuito e se somou às reclamações dos pilotos sobre as inclinações de seus ‘bankings’ com 60 graus de inclinação, que afetavam a segurança da direção, embora alguns clubes automobilísticos locais realizassem algumas corridas. Assim, em 1925 não havia mais corridas os proprietários não conseguiram mais realizar corridas naquela pista.

 

Em 1929 o Autódromo passou para as mãos do empresário e apaixonado por velocidade, o tcheco Edgar Morawitz.  Graças ao investimento de Morawitz, as corridas foram realizadas novamente a partir de 1932 com um teste do Campeonato Espanhol de Motociclismo. O problema foi que Morawitz posicionou-se contra Francisco Franco e isso o fez abandonar a gestão do circuito por medo de represálias da ditadura.

 

 Imagens das corrida de inauguração do circuito em 1923, que contou com a presença do Rei da Espanha, D. Alfonso XIII.

 

O novo proprietário mandou construir os galinheiros, montou uma fábrica de ração nas arquibancadas, conduziu ovelhas pela pista e não deu a mínima para carros de corrida. Em 29 de maio de 1955, os carros correram no circuito pela última vez, um ano depois a Vuelta a Catalunya fez um percurso de 60 km que foi a última prova disputada. Desde então o circuito ficou abandonado, tendo o ronco dos motores sido substituído pelos ruídos de uma propriedade agrícola.

 

 Desde que as corridas não tiveram mais lugar, os proprietários do terreno construiram galinheiros e passaram a criar cabras.

 

O circuito ficou abandonado por praticamente seis décadas, embora muitos sejam os fãs que se deslocam ao circuito para o ver ou percorrem a pista antiga, cujas curvas ainda se encontram em perfeitas condições. As retas do circuito estavam parcialmente cobertas de vegetação até que foi efetuada uma operação de limpeza no início de 2009, o que permite que o circuito seja completado com acompanhamento e com autorização do proprietário.

 

No desconhecido e icônico palco.

Nos registros que encontrei do meu tio-avô, Willy Möller, autor original desta coluna, ele relatou sua visita à Sitges-Terramar em 2011, onde conheceu o atual proprietário do circuito, o Sr. Salvador Mora, que se referia ao seu autódromo como “trem fantasma”. Procurei contato com ele no ano passado, mas não tive retorno. Acabei por limitar-me a narrar o que encontrei nos registros da minha herança.

 

 O acesso que era feito por estradas de terra nos anos 30 pode ser realizado atualmente por estradas asfaltadas.

 

Depois de chegar ao autódromo, Sr. Mora conta que foram usadas 350.000 toneladas de concreto. A arquibancada que esteve lotada na inauguração ainda está de pé e vazia, assim como o prédio que seriam os boxes da época. Arbustos crescem no meio do oval, cercando alguns galinheiros; com as aves que os proprietários do sítio mantém ainda hoje.

 

 Visões gerais dos trechos da pista, com os dois 'bankings' e dos trechos planos do oval de Terramar, fotos tiradas em 2011.

 

Não há corridas na volta de dois quilômetros há décadas. Mas desde que Mora raspou a camada de um metro de espessura de lixo, estrume e composto da pista de concreto e limpou a floresta nela há cerca de dez anos, a instalação pelo menos pode ser usada novamente, mas só quando ele permite. O rico empresário ocasionalmente deixa uma caravana vintage adentrar por seu histórico jardim em ralis clássicos e aluga a pista para sessões de fotos como a nova Mercedes AMG GT ou inovações da fábrica Seat na vizinha Martorell.

 

 Marcas de pneus de corridas antigas ainda resistem ao tempo e em 2012, em um evento da Red Bull, Carlos Sainz acelerou em Terramar.

 

O recorde oficial de 157,2 km/h de 1923 foi estabelecido no Grande Prêmio da Espanha, na inauguração do circuito. Este tempo cronometrado só foi superado pelo espanhol Carlos Sainz ao dirigir seu Audi R8 GT3 a 175 km/h sobre o “trem fantasma”, fazendo a volta em 42,6 segundos para uma filmagem é como se fosse um passeio de domingo. O Autódromo não viu nenhuma intervenção estrutural nos últimos 90 anos, mas manteve-se incrivelmente bem, prova da qualidade da sua construção original. Na verdade, apesar de sua degradação, a Red Bull patrocinou um circuito como uma peça-chave em 2012.

 

 Eventos de apaixonados por velocidade e conhecedores do oval de Terramar aconteceram graças ao Sr. Mora.

 

Em meados da década passada correram rumores de que o Sr. Mora estava buscando financiamento para reparar e reinstalar o Autódromo, mas o tempo passou e nada aconteceu. Terramar continua a receber, eventualmente, visitantes e curiosos que passam alguns finais de semana a se aventurar nos impiedosos ‘bankings’ de concreto que ainda guarda algumas marcas de pneus dos carros que percorreram suas elevações nos anos 20 e 30.

 

Abraços a todos,

 

Ian Möller

 

Fotos do arquivo pessoal de Willy Möller e cortesias do Sr. Salvador Mora. 

Last Updated ( Friday, 08 January 2021 09:08 )