Ludovino Perez Junior nasceu em São Paulo – SP, em 28 de março de 1942, em meio a segunda grande guerra e com um destino pré-traçado: seria um jovem na faixa dos 20 anos na efervescente década de 60. A geração de pilotos que destacaram-se naqueles anos nas pistas brasileiras parecia ser uma fonte inesgotável de talentos e a cidade de São Paulo mudava o centro geográfico do sucesso nas pistas do Rio Grande do Sul, berço da equipe Galgos Brancos e de uma poderosa geração de pilotos e suas fantásticas carreteras. O jovem Ludovino certamente não pensava (ainda) em ser piloto ainda em seus tempos de aluno do Colégio Stafford Rio Branco e Colégio São Luis, apesar de viver em um bairro – o Jardim Paulistano – onde a “incidência do velocitococus” era altíssima. Mesmo com a pouca informação que chegava ao Brasil vinda da Europa, ele era fã de carteirinha (linguagem da época) do escocês Jim Clark. Ludovino é o mais velho dos dois filhos (a irmã mais nova, Neusa, faleceu recentemente), criados com extremo cuidado por parte dos pais, o Empresário Ludovino Perez e D. Zoé Falcone Perez. O nosso piloto confessa que pode até dizer que foi bastante mimado. Ludovino em um evento de kart em Santos. No início dos anos 60 o kart entusiasmou muitos jovens da época. Como boa parte dos jovens que termina o hoje chamado ensino médio (naquela época era chamado científico e depois passou a ser chamado de 2º grau), prestou vestibular e entrou para a faculdade, contudo, a convivência com Maneco Combacau, Joaquim Carlos Teles de Matos – o Cacaio – e José Carlos Pace – o Moco – foi o que acabou levando Ludovino para o mundo da velocidade com os karts. O curso universitário acabou ficando no esquecimento... uma força maior já havia tomado o seu espaço! Ludovino e amigos foram alguns dos precursores desta nova modalidade de automobilismo que chegava ao país e com o kart participou das suas primeiras provas, tanto em São Paulo como em cidades do interior no ano de 1962, com os karts da equipe Mario Kart. Por ser um piloto grande em termos de porte físico, Ludovino (65) levava alguma desvantagem, mas na chuva, era a hora da forra! Sua primeira corrida foi em 1962, com um Rois Kart daquela leva trazida para o Brasil pelo Claudio Daniel Rodrigues. O único que ele comprou, pois foi com a sua geração que começou o profissionalismo. No kart, Ludovino correu também com os “Pernalonga” e com os Silpo. Como a grande maioria dos jovens pilotos da época, seus pais não aprovavam o rumo na vida que o filho decidira tomar e não ajudaram em nada, nem um tostão, para que ele pudesse correr. Em 1963, veio a estréia com um carro. Um carro que era um sucesso nas pistas brasileiras, o DKW! Foi com um dos fabulosos carros de 3 cilindros que Ludovino, logo de início, mostrou o quanto era veloz, chegando em quinto lugar com um N4. A relação de Ludovino com o grande carro esporte nacional - o Karmann Ghia - era forte, e tornou-se ainda maior com a Dacon. Ainda no mesmo ano, correu com um Volkswagen, estampando um número que, posteriormente, viria a tornar-se uma marca em sua carreira – o 77 – disputou as 3 horas de Interlagos, tendo sido o sétimo na geral e vencendo na sua categoria. Antes de assumir o número 77 como marca, consolidada nos tempos da Equipe Dacon, Ludovino corria com o número 31 e foi com um Renault 1093 que ele disputou, ao lado de Affonso Giaffone, os 500 Km de Interlagos, chegando em oitavo na geral e em terceiro na sua categoria. Com o Ranault 1093, Ludovino mostrou serviço e chamava a atenção pelo seu desempenho incomodando carros mais potentes. Nas 12 horas de Interlagos, mais uma vitória na categoria correndo com o Renault 1093 ao lado do parceiro Affonso Giaffone (foram quarto na geral). Naquela altura, Ludovino era um piloto respeitado por sua velocidade e sensibilidade no acerto dos seus carros. No início dos anos 60 o Brasil deu um passo importante no caminho dos monopostos, inicialmente com os Fórmula Jr, como o Landi-Bianco. Depois com os Fórmula Vê e Fórmula 3. Ludovino foi um dos pilotos que logo pilotou estes leves e velozes carros que acabariam sendo a escola nacional para os pilotos que poucos anos depois seguiriam para a Europa. Foi assim também correndo com um Fórmula Junior com motor Renault. Ludovino tinha uma grande sensibilidade para acertos. Em 1965 Ludovino era um dos pilotos mais respeitados de sua geração e na corrida comemorativa do aniversário da APVC – Associação Paulista dos Volantes de Competição – com um Landi-Bianco equipado com um motor Renault foi o quinto colocado no geral, vencendo na categoria correspondente à sua cilindrada. No mesmo ano, nos 500 Km de Interlagos, com o mesmo carro e sempre o número 31, foi novamente o vencedor na sua categoria, terminando em sétimo na geral. A parceria com Pedro Victos Delamare rendeu grandes alegrias, como o Pódio dos 1000 quilômetros de Brasilia. Aquele ano ainda reservaria grandes emoções. A parceria com Pedro Victor Delamare nas 500 Milhas de Curitiba ao volante da Berlineta Interlagos Nº 84 (o “número” do Pedro), conquistaram a vitória na categoria com um quinto lugar na geral. Nos 1000 Km de Brasília, com o mesmo carro, foram ao pódio com o terceiro lugar na geral. Contudo, foi em Piracicaba, quando fora apenas assistir os Karmann Guia-Porsche 90 correr que ele foi convidado pelo diretor de prova, ninguém menos que Francisco Landi (o ‘Seo’ Chico) a participar da prova. Ludovino até hesitou um pouco, uma vez que não conhecia o circuito, mas um convite desses era, além de uma honra, quase uma ordem (na verdade, foi mesmo uma ordem. Acima, na corrida em Piracicaba. Sem conhecer a pista, sem "Santo Antônio" e correndo "por ordem" de 'seo' Chico Landi. Ludovino argumentou que o carro não tinha “santo antônio” nem nada, mas seu Chico não quis saber: “vai no supermercado, compra uma vassoura que a gente enrola o cabo com esparadrapo, calibra o pneu e você corre!”) e lá foi ele com o Guache número 31 para o fundo do grid, largando em último uma vez que sequer havia treinado. Ludovino foi o quarto colocado na geral e venceu na categoria. Com o Volkswagen número 12, a estreia na equipe Dacon. O retrospecto de Ludovino e possivelmente a performance de Piracicaba no ano anterior renderam um convite para a Equipe Dacon, que marcou época nas nossas pistas. A estreia na nova equipe foi na prova na prova de aniversário da APVC, ao volante do Volkswagen Nº 12. Ludovino liderou uma boa parte da prova, mas um problema de freio o fez ter que abdicar das chances de vitória, terminando apenas em sexto lugar na geral. Nas Mil Milhas Brasileiras de 1966, já com o Karmann Ghia - Porsche, chegou a liderar por 3 horas, mas teve que abandonar. Naquele ano de 1966 a Dacon apresentaria o carro que seria um dos maiores vencedores de corridas em território nacional: o Karmann Ghia equipado com motor Porsche, tendo à frente o engenheiro Paulo Goulart e o piloto, designer e artista plástico Anísio Campos. A equipe começou com dois carros, o Nº 2, com José Carlos Pace e Antonio Carlos Porto – o Totó – e o Nº 77, com Ludovino Perez e Wilson Fittipaldi Jr. Depois vieram os carros equipados com o com o motor do Porsche 904, de 2000cc. Além desses, 02 Karmann Ghia S 90, com motor de 1600cc também faziam parte da equipe. Foto de Família: Todos os integrantes da equipe Dacon. Ludovino está de pé, ao lado de Wilsinho Fittipaldi Jr. Os testes para definição das duplas forão feitos com um Karmann Ghia 2000cc em Interlagos, sob os cuidados do próprio Paulo Goulart. Ficou então definido que as duplas seriam: Moco e Totó; Ludovino e Wilsinho nos KG2000 e Anisio Campos com Chiquinho Lameirão; e Rodolpho Olival Costa com Lian Duarte nos S 90. Nas famosas Mil Milhas brasileiras de 1966, já com o Karmann Ghia-Porsche, Ludovino e Wilsinho chegaram a liderar a prova durante 3 horas, mas uma quebra na pedaleira e na ponta de eixo acabaram com as chances de vitória da dupla, que terminou apenas em oitavo. Nos 1000 Km da Guanabara, vitória de ponta a ponta... mas sem moleza. O outro KG 2000 tinha Moco e Totó. Grandes pegas! Contudo, a equipe, seus pilotos e o carro estavam fadados ao sucesso e naquele mesmo ano, nos 1000 Km da Guanabara, no autódromo de Jacarepaguá (o da época, não o Internacional que foi mutilado) Ludovino e Wilsinho conquistaram uma incontestável vitória, liderando de ponta a ponta. Em 1967 o prestigio de Ludovino era tamanho que ele foi convidado pela montadora Volkswagen e pela fabricante Aranae para ser o primeiro piloto a testar o projeto da nova categoria que seria lançada no Brasil: a Fórmula Vê. Um sucesso na Europa, particularmente na Alemanha e nos Estados Unidos que viria a consolidar uma categoria apenas feita de monopostos, algo que, após o desestímulo dos Mecânica Nacional e Mecânica Continental, simplesmente não existia no Brasil. A chegada dos Fórmula Vê no Brasil foi manchete de primeira página nos jornais... e era Ludovino o piloto da foto e da vez! Foi o paulista Alexandre Freitas Guimarães quem viu nos Estados Unidos uma corrida da categoria. Ele procurou saber mais sobre a categoria e achou que era um projeto viável para o automobilismo brasileiro. Quando retornou ao país, procurou em São Paulo Silvano Dalle Molle e Eduardo Estefano. Munido dos desenhos do carro que vira nos Estados Unidos, partiram para a fabricação da primeira “gaiola” de um Fórmula Vê brasileiro, toda feita com tubos de aço sem costura. O resultado final foi um chassi muito resistente e que daria grande segurança ao piloto. Todo o trabalho de desenvolvimento do carro que começou a ser produzido no Brasil ficou ao encargo de Ludovino Perez. Ludovino Perez foi o piloto convidado para fazer os primeiros testes com o novo protótipo e percorreu algumas centenas de quilômetros em testes com o “sprint-wagen”, alcançando tempos altamente promissores. O resultado prático do sucesso deste projeto foi a conquistada da vitória nos 500 Km de Interlagos. Com um Fórmula Vê Ludovino cravou a pole position. Contudo, no dia da prova teve uma crise de cólica renal e foi substituído às pressas por Totó Porto num episódio ímpar na história do nosso automobilismo. O carro que seria a grande escola de monopostos dos pilotos nacionais também foi capa da revista Autoesporte em 1967. Ludovino participou de diversas provas e campeonatos de Fórmula Vê, com um Aranae. Mas os carros que tinham mais destaque e uma estrutura melhor eram os produzidos pelos irmãos Fittipaldi e quem corria com a outra marca acabou por ter seu desempenho um tanto ofuscado. Os pilotos da geração mais nova dos que correram nos anos 60 como Fritz Jordan, Ricardo Aschar, José Carlos Pace, Emerson e Wilsinho Fittipaldi fizeram da Fórmula Vê um trampolim para as suas idas para a Europa, da qual Ludovino abriu mão. Empreendedor, Ludovino sabia que o automobilismo não era pra sempre. Entre seus negócios, o Deck Bar marcou época. Àquela altura da vida, havia uma outra razão para o coração do piloto bater mais forte: a namorada tornara-se a noiva e posteriormente esposa. Ludovino e Teresa Martins Perez estavam esperando o primeiro filho e ele considerou que seria muito difícil conciliar a vida nas pistas e a vida de esposo e pai de família, assim, abdicou de dar prosseguimento a carreira. Jovem e dinâmico, Ludovino montou seu primeiro negócio, um bar que ficou famoso no final dos anos 60: o Deck. Investiu suas economias, tomou empréstimos, mas apostava no sucesso do empreendimento, o que veio a acontecer de fato, com o Deck tornando-se não apenas um ponto de encontro para os seus amigos dos tempos de pistas e corridas de rua, mas um local de referência pelo conforto, localização e serviço. Funcionou de 1967 a 1971. Uma ala do confortável apartamento de Ludovino Perez em São Paulo é dedicada à sua rápida e brilhante trajetória nas pistas. Além do Deck, posteriormente Ludovino investiu no mercado imobiliário, criando a sua própria imobiliária – a Quartier – que, graças a sua competência e visão empresarial, prosperou ao longo de décadas. Ludovino tem ainda um bom material referente a sua história e a das equipes, karts e carros onde correu e alguns troféus. As lembranças estão bem vivas em sua mente mas foi graças a D. Zoe que os registros ficaram. A zeloza mãe foi quem cuidou de guardar as fotos de toda uma vitoriosa carreira. Na garagem do prédio, uma homenagem do amigo Anísio Campos (há outro igual no apartamento) e uma "joia"... Dentre os fatos que Ludovino mais guarda com orgulho, foi a cerimônia onde ele recebeu o Troféu Brahma, para os pilotos que fizeram o automobilismo da América do Sul pelas mãos de Juan Manuel Fangio, em 1993, quando o pentacampeão de Fórmula 1 esteve no Brasil, na época do GP. Hoje Ludovino Perez Junior tem uma vida tranquila, vivendo em um confortável apartamento na cidade de São Paulo. Isto é, dentro do que é possível sendo pai de quatro filhos (dois casais) que já lhe deram três netas, com a quarta por chegar! Como ele mesmo diz, não é fácil agradar todo mundo. Esta maravilha deve fazer todos os vizinhos babar ao saber que este carro foi um dos maiores sucessos das pistas brasileiras. Na garagem do apartamento, Ludovino tem uma preciosidade: uma réplica perfeita do Karmann Ghia-Porsche Nº 77 com que Ele e Wilsinho pulverizaram a concorrência. O motor não é o mesmo do Porsche 904 boxer. Ludovino até procurou um para deixar o carro o mais realista possível, mas o preço era proibitivo. Contudo, equipou-o com um motor 1.8 turbo que, em suas próprias palavras, “dá pra brincar um pouquinho”. Nos últimos anos nosso Nobre do Grid vinha lutando contra problemas de saúde, entre eles um câncer e na terça-feira, 27 de novembro de 2018, depois de muita luta, nosso estimado Nobre do Grid deixou seu nome para a história e a imortalidade. Fontes: Revista Autoesporte; Revista Quatro Rodas; Depoimentos do Piloto. Fotos do arquivo pessoal do Piloto. |