Há 70 anos, Alberto Ascari tornava-se no primeiro italiano a triunfar na Ferrari como campeão do mundo. Um dos grandes pilotos a levar o nome da Scuderia aos quarto cantos do mundo, conseguiu dar dois títulos mundiais em 1952 e 53, num domínio que só voltou a repetir-se uma década depois. Contudo, ele não era o primeiro a alcançar o feito, nem em Itália... nem na família. Não. Na verdade, Alberto era o filho de outro grande piloto de automobilismo: Antonio Ascari. Um dos grandes pilotos dos anos 20 do século XX, um dos Quatrofoglio originais, a par de Ugo Sivocci e Enzo Ferrari, que mais tarde... iria dar uma oportunidade ao filho. E teve uma carreira do qual o seu trágico fim iria deixar marcas no seu filho, anos depois, e de forma arrepiante, para os supersticiosos. DE VENDEDOR A PILOTO Nascido a 15 de setembro de 1888 em Bonefarro, perto de Mântua, e filho de um comerciante de trigo, saiu cedo da escola para trabalhar como ajudante de ferreiro, antes de se mudar para Milão e começar a observar os automóveis. Em 1911, teve a chance de guiar um e ficou apaixonado. A sua primeira corrida foi uma prova em Modena, a bordo de um Di Vecchi, e passou os anos seguintes a trabalhar como mecânico, quer em automóveis, quer em aviões, algo que iria continuar durante a I Guerra Mundial. O seu filho Alberto nascerá quase no final dela, a 13 de julho de 1918. Com o final do conflito, tem dinheiro o suficiente para abrir um concessionário da Alfa Romeo, mas quando a Fiat decide retirar-se da subida Parma–Poggio di Berceto, adquire um dos seus Fiat Grand Prix 4500 e o pilota, acabando por triunfar. O gosto ficou e tempos depois, inscreveu-se para a Targa Florio desse ano. Correu entre os da frente até se despistar e acabar fora da estrada, felizmente sem ferimentos. Contudo, a sua performance foi suficiente para que a Alfa Romeo ficar interessada nele, bem como outro piloto que dera nas vistas: Enzo Ferrari. Como Ascari trabalhava para eles nas vendas dos carros, a negócio foi fácil: seria seu piloto em troca das vendas dos carros em toda a região da Lombardia. Tudo isto em 1920. Na equipa de Arese, não limitou a ser piloto, pois ajudou na testagem e desenvolvimento dos carros, com o grande objetivo de triunfar na Targa Florio. Apenas em 1922 é que conseguiu o seu melhor resultado até então, com um quarto lugar. Mas em 1923, ele teve uma chance de vitória, pois liderou por boa parte da corrida... até que o motor falhou, perto da meta. Apesar de ter conseguido funcionar de novo, acabou por ser passado por Ugo Sivocci, acabando com um 1-2 para a Alfa. Mas não ficou muito tempo a lamentar-se. Um mês depois, triunfou em Cremona, e a equipa estava forte para o segundo objetivo da temporada: o GP de Itália, em Monza. A equipa estava muito forte, com Ascari, Sivocci e Giuseppe Campari. Os três corriam com o modelo P1, mas nos treinos, a tragédia: Sivocci perdeu o controlo do seu carro e bateu, causando a morte do piloto. Em sinal de luto, a Alfa Romeo decidiu abandonar a prova. FRUSTRAÇÕES E TRIUNFOS Em 1924, o projetista da marca, o lendário Vittorio Jano, projetou o P2, sucessor do P1. A ideia nesse ano era de triunfar na Targa Florio, e as coisas pareciam que corriam bem para ele, mas na última volta, o carro falhou de novo. Ele e o seu mecânico, Giulio Ramponi, saíram para o empurrar, mas teve a ajuda de alguns espectadores, e os regulamentos não permitiam isso. A seguir, a Alfa Romeo colocou quatro carros para o GP de França, em Lyon. Ao lado de Ascari estava Ferrari, Campari e o francês Louis Wagner. Campari acabou por vencer, enquanto a Ascari, uma falha no motor o deixou num frustrante nono lugar final. No final do ano, em Monza, com quatro carros para Campari, Ascari, Wagner e Fernando Minoia, Ascari teve aquilo que pretendia: uma vitória. Dominando do principio até ao final, foi o comandante da equipa, que ficou com os quatro primeiros lugares. Era uma grande temporada para os Alfas, e com os novos regulamentos, onde os pilotos iriam guiar sozinhos, sem mecânicos. TRIUNFO E TRAGÉDIA A AIACR (Association Internationale des Automobile Clubs Reconnus, em francês), antecessora da FIA, decidiu novos regulamentos para a temporada de 1925, que iriam ser aplicados pela CSI, Commission Sportive Internationale, a antecessora da FISA. Introduziu-se um campeonato do mundo de Construtores, onde a Alfa Romeo era uma das favoritas. Continuavam com o P2, que tinha 155 cavalos, e um peso de 750 quilos, e Ascari correria ao lado de Campari e Gastone Brilli-Peri. Havia cinco corridas, e a primeira eram as 500 Milhas de Indianápolis. A Alfa Romeo não iria participar na corrida americana, mas apareceria na primeira prova europeia, o GP da Bélgica, em Spa-Francochamps. Foi um duelo entre Alfa e Delage, que tinha Albert Divo, Robert Benoist, René Thomas e Paul Torchy. A corrida foi uma de resistência, e no final das 54 voltas, Ascari levava a melhor sobre Campari, numa dobradinha dos italianos. Ascari estava no topo do mundo e a Alfa era a favorita para o campeonato. A 26 de julho de 1925, a Alfa Romeo estava no circuito de Montlhéry, para o GP de França. A corrida teria oitenta voltas, num circuito de 12 quilómetros de extensão, e a Alfa Romeo tinha a concorrência de Delage, Sunbeam e Bugatti. A marca italiana tinha os três pilotos, Ascari, Brilli-Peri e Campari, e entre a concorrência, estava Henry Segrave, piloto da Sunbeam, Jules Goux, em Bugatti, e Robert Benoist, em Delage. A corrida começou com Ascari na frente, no final da primeira volta, seguido por Divo e Segrave. Campari subiu até segundo, no final da segunda passagem pela meta, e os carros italianos cedo começaram a se afastar da concorrência. Tudo indicava que os Alfas iriam triunfar, e com dobradinha, mas Campari fez uma paragem demorada, caindo para terceiro, atrás de Benoist. A partir da 18ª passagem pela meta, uma ligeira chuva começou a cair na pista e esta ficou complicada para os pilotos. Ascari acelerava e baixava os tempos, mas isso iria ter consequências trágicas. Na volta 25, tocou numa das bermas, o carro levantou as rodas e capotou, com o piloto a ficar por baixo do carro. Foi socorrido de imediato e levado de ambulância para o hospital, mas os seus ferimentos eram muito graves, acabando por morrer no final do dia. Tinha 36 anos. Quando se soube da noticia, os restantes Alfas retiraram-se, pois Campari liderava a corrida quando recebeu a ordem. A prova acabou por ser ganha por Benoist, mas isso tinha pouca importância, porque provavelmente um dos melhores pilotos italianos da altura tinha morrido. Benoist pegou no ramo de flores que tinha recebido como vencedor e levou-os ao local do acidente mortal de Ascari. O corpo de Ascari foi para Montlhéry, onde uma multidão o homenageou, antes de seguir para Milão, onde mais de 70 mil pessoas o seguiram no cortejo fúnebre até ao Cimitério Monumentale, no jazigo de família. Alberto, então com sete anos e apesar do arrepiante exemplo paterno, também seguiu a carreira do automobilismo, especialmente ao serviço da Ferrari, cujo patrão fora amigo e colega do seu pai. E em 1955, 30 anos depois do acidente mortal do seu pai, e num dia 26, mas de maio, sofria o seu acidente mortal. E como o pai, tinha 36 anos quando isso aconteceu. Saudações D’além Mar, Paulo Alexandre Teixeira
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