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A história do primeiro turbo: O CAN-AM Killer PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Saturday, 25 February 2023 10:35

Muitos podem não achar muita graça aos motores turbocomprimidos, especialmente no quesito “barulho” – mais grave que os aspirados – mas eles são, definitivamente, mais potentes que estes últimos devido à compressão de ar que passa pelo motor e que lhes dá esse aumento de potência. Aliás, são eles que nos deram os mais potentes da história do automobilismo. 

 

E se acham que eles surgiram com os Renault na Formula 1 em 1977, enganam-se redondamente. Surgiu algum tempo antes, numa das categorias mais selvagens da história do automobilismo, onde os regulamentos eram os mínimos, e os domínios, grandes: a Can-Am. E tudo por causa de um carro que tinha sido abandonado por causa do final de uma regra.

 

UM PROTÓTIPO PARADO NA GARAGEM

 

Tudo começa em 1971. O Porsche 917, apresentado no Salão de Genebra dois anos antes, fica fora de pista por causa da alteração na Endurance das regras em termos de motores, deixando os 5 litros de fora a favos dos de 3 litros, iguais aos da Formula 1. Não querendo construir um motor desses, a marca alemã decide retirar os carros do Mundial de Endurance e os carros ficam abandonados à sua sorte. Contudo, havia os que queriam levar esses chassis para outras categorias, como a Interserie, na Europa, e a Can-Am, nos Estados Unidos. A Porsche aceita, e quem fica com alguns desses chassis é a Penske, de um ex-piloto e com experiência como diretor de equipa, então com 37 anos e com paixão pelo automobilismo: Roger Penske.

 

Tendo montado a sua equipa no final da década anterior, tinha carros em quase todas as categorias, desde a Indycar até ao Trans-Am, uma categoria onde os “muscle cars” corriam livres. E no ano de 1972, Penske era um homem contente. Tinha ganho pela primeira vez  as 500 Milhas de Indianápolis, com Mark Donohue, que no ano anterior, tinha sido o campeão da Trans-Am, a bordo de um AMC Javelin. Outro dos pilotos que estava nessa equipa de campeões era George Follmer, que também corria quer na USAC, quer na Can-Am, quer na Trans-Am. E quando a Porsche propôs a Penske que os acolhesse para testar o seu programa de aumento de potência, eles aceitaram.

 

 

Donohue – chamado de “Capitain Nice” pelos amigos e fãs – já tinha alguma experiência no automobilismo. Tinha corrido em tudo com quatro rodas e um volante, desde a Formula 1 às 24 Horas de Le Mans – num dos GT40 oficiais da Ford – então com 35 anos, era sabido o suficiente para ter publicado um livro sobre o automobilismo, ao que deu o título de “Unfair Advantage”, traduzido por vantagem injusta, que basicamente é quando alguém aparece com algo inovador, ao ponto de esmagar a concorrência. E basicamente, era isso que iriam fazer, com a arma que tinham em mãos: um motor de 5.4 litros, com um turbocompressor. Dos 540 cavalos iniciais, sabiam que poderiam acabar com o dobro. Mas antes de lá chegar, houve precalços.

 

TURBOPANZER

 

Em 1972, a Can-Am tinha sido dominada pela McLaren, pelo menos desde 1967. Era uma competição com prémios bem chorudos: o campeão recebia meio milhão de dólares de prémio, e a McLaren usou essa competição para financiar o seu programa na Formula 1, e claro os seus pilotos, os neozelandeses Bruce McLaren e Dennis Hulme, dominavam ao ponto dos jornalistas chamaram à competição  de “The Bruce and Denny Show”.

 

 

Mesmo quando Bruce morreu de forma trágica em junho de 1970 a testar um McLaren M8D, a poucos dias da nova temporada da competição, as coisas não se modificaram muito. McLaren foi substituido por Peter Revson, membro da familia Revlon, um dos gigantes mundiais dos cosméticos, e os triunfos continuaram.

 

Contudo, em 1972, tinham concorrência. Penske tinha inscrito os Porsche, com Donohue e Follmer como pilotos, e o motor Turbo começava a ser testado fortemente. Sessões constantes em circuitos como Road America, perto de Atlanta, na Georgia, faziam com que o turbocompressor ficasse cada vez mais forte, potente e sobretudo, fiável. A primeira corrida foi em Mosport, no Canadá, e se Revson ganhou, Donohue não andou longe, com o seu Porsche. Mas alguns dias depois, ele sofreu um acidente durante uma sessão de testes, fraturando ambas as pernas e ficando quase toda a temporada de fora da competição. Follmer ficou com o encargo de desenvolver o carro, algo que deixou Donohue amargudado. A um amigo, disse que era o equivaente a “ver a minha mulher fazer amor com outra pessoa”. Aqui, entrou outra das suas alcunhas que ele era conhecido: “Dark Monahue”, um jogo de palavras com o seu nome, mostrando a sua face sombria.

 

 

Follmer triunfou em cinco corridas, acabando por ser campeão, enquanto Donohue regressou para as últimas três corridas do ano e ganhou em Edmonton, no Canada, acabando na quarta posição. A McLaren leu os sinais e decidiu abandonar a competição, concentrando-se na Formula 1 e na IndyCar. E para melhorar as coisas, para 1973, Follmer aceitou o convite para correr na Formula 1 ao serviço da Shadow, que iria experimentar o automobilismo na Europa. Ou seja, não estaria em todas as corridas dessa temporada.

 

Sem McLarens, a Porsche era o carro a ter em conta. Por esta altura, a versão 917/10 tinha uma potência de 750 cavalos, e equipas como a Brumos, a Vasek Polak Racing, que tinha contratado um jovem sul-africano chamado Jody Scheckter para correr num dos seus carros, e a Rinzler Motorracing tinham esses chassis. Mas Penske estava com outra carta na manga: o 917/30, um carro bem mais potente, e que se preparava para ser dominador.

 

Com o mesmo motor de 5.4 litros, dos 750 cavalos iniciais, passava para uma potencia de 1100, às 7800 rotações por minuto, o carro mais potente de sempre da história do automobilismo... até então. E era na corrida, porque nas qualificações, o carro estava preparado para chegar até aos 1580 cavalos. Um monstro! Daí a alcunha de “Turbopanzer”, inalcançável para a concorrência.

 

 

Donohue acabou por ser campeão em 1973, triunfando em seis das oito corridas, um triunfo tranquilizante, dominador. Mas os bons tempos estavam prestes a acabar. O choque petrolifero do final do ano foi mesmo isso, e a SCCA, Sports Car Championship of America, decidiu colocar restrições de consumo para a temporada de 1974, para salvar a competição. A Porsche achou que tinha cumprido a sua missão e decidiu retirar os seus carros. Penske concentrou-se na Formula 1, e Donohue achou por bem pendurar o capacete.

 

Mas este carro iria ter um último capitulo para escrever. Com honra, melancolia e alguma tragédia.

 

O RECORDISTA

 

A Porsche aproveitou bem a tecnologia desenvolvida para colocar nos seus motores de 2,5 litros, especialmente os 911 Carrera Turbo – até lançou modelos de estrada – e outras marcas seguiram-o, mas sempre na Endurance. A meio de 1975, porém, o 917/30 foi retirado do museu para uma tarefa: establecer um recorde de velocidade num circuito fechado. O local foi o circuito oval – super speedway - de Talladega, no Alabama, uma pista que existia desde 1969 e muito usada pela NASCAR para as suas corridas. E o piloto? Um velho conhecido: Mark Donohue.

 

 

Ele tinha decidido pendurar o capacete no inicio de 1974, julgando que tinha alcançado os seus objetivos. Penske lhe deu um lugar como diretor desportivo, mas cedo ressurgiu a sua fome de correr. E no final do ano, Penske estava a montar uma equipa na Formula 1 e achou que seria o lugar ideal para ele fazer o seu regresso. Tinha conseguido um pódio logo na sua primeira corrida, em 1971, guiando um McLaren à chuva em Mosport, no GP do Canadá. E em 1975, tentava fazer funcionar um Penske PC-1, sem grandes resultados, ao ponto de, após o GP de França, terem arranjado um March, enquanto o PC-2 não fica pronto.

 

O recorde pertencia a A.J. Foyt, que tinha ido a Talladega no ano anterior, com o seu carro da USAC, e tinha marcado 350,597 km/hora (217,851 milhas por hora, na medida imperial), e a 9 de agosto de 1975, a Penske tinha chegado a Talladega para fazer as voltas necessárias para establecer uma marca. E o carro tinha sido modificado para a ocasião. O motor tinha dois intercoolers, fazendo um total de 1230 cavalos.

 

Mal entrou no carro, Donohue alcançou a velocidade ideal. Depois de algumas tentativas (uma delas deu num pequeno incêndio, quando ele não faz uma volta de arrefecimento), no final dessa tarde, Penske e Donohue marcavam uma média de 355,923 km/hora (ou 221,160 milhas por hora), batendo o recorde de Foyt por pouco mais de 3,3 milhas. Nas retas, o Porsche alcançava 240 milhas por hora (386 km/hora)  O recorde durou até 1987, quando Foyt estableceu 413,8 km/hora na oval do Texas num Oldsmobile modificado. Mas hoje em dia, ainda é o recorde de Talladega.

 

 

Depois disso, o Porsche regressou ao museu, e a marca usou a tecnologia dos Turbo para outros carros, como o 935 e 936, no seu regresso, em 1976, dominando a Endurance até ao final da década.

 

O recorde de Talladega foi o derradeiro momento de glória de Donohue. Uma semana depois, no regresso à Europa, despistou-se no seu March no warm-up do GP da Áustria, quando um dos pneus rebentou e bateu a sua cabeça contra um poste, causando uma lesão cerebral fatal, a 19 de agosto.

 

Contudo, se a cortina correu sobre este Porsche na América, a existência do 917, bem pelo contrário, ainda tinha mais uns capitulos a serem escritos. Mas isso fica para outra altura.

 

Saudações D’Alem Mar,

 

Paulo Alexandre Teixeira

 

 

Nota NdG: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site Nobres do Grid.