A vista aérea do que existe hoje em Crystal Palace ainda mostra, pelo menos do alto, as linhas do último traçado do circuito. Em um ensolarado sábado, no dia 6 ou 13 de maio de 1899 (existe um conflito entre os historiadores e não sou eu quem vai tomar partido), um grupo de entusiastas reuniu-se na margem do Rio Tâmisa para desfrutar de sua nova paixão: o esporte a motor. Estes entusiastas seguiram em carreata desde o encontro, ao meio dia, próximo a ponte de Westminster, até o a região do parque onde ficava o “Crystal Palace”, em Upper Norwood. Pela primeira vez na Grã Bretanha, seria realizada uma corrida de automóveis em um circuito fechado. Um palácio que originalmente fora construído em outro lugar e com outro propósito. Assim como um dia ergueram a Torre Eifel, para uma exposição, em Londres foi construída uma estrutura de aço e vidro... Em 1849, o príncipe Albert, marido da rainha Vitória, anunciou uma “Grande Exposição” no Hyde Park de Londres como uma celebração magnífica do Império Britânico. O arquiteto Joseph Paxton, desenhou o que na verdade era uma enorme estufa préfabricada em aço e vidro, com 108 metros de altura, 1.848 metros de comprimento e 136 metros de largura. A revista Punch logo apelidou a obra de “Palácio de Cristal”. A Rainha Victoria abriu a exposição em Maio de 1851, tendo ficado esta aberta até outubro, com o encerramento sendo feito exatamente no mesmo dia do calendário e hora da abertura. Cerca de 6.000.000 pessoas visitaram a exposição e os lucros foram revertidos para o museu que levava o nome do casal real – Victoria and Albert – que fica em South Kensington. O Automóvel Clube Britânico (The Motor Car Club foi a primeira designação da associação) havia sido fundado havia pouco tempo, após algumas reformulações desde a primeira tentativa de estruturação, que datou de 1851, ano onde foi organizada a grande exposição, veio realmente ganhar força na última década do século. Em 1854 a estrutura foi toda transferida do hoje muito famoso Hyde Park para um novo parque, localizado na região sudeste Londres, o Parque Penge Place. Um aprazível local com alguns lagos onde se podia pescar, jardins e até um pequeno zoológico. ... que um periódico local logo apelidou de "Palácio de Cristal". O apelido pegou e, mesmo sem mais existir, ficou para a história. Joseph Paxton (agora Sir Joseph) comprou de volta a estrutura por 70 mil libras esterlinas e o “palácio de cristal” foi desmontado e transportado para Sydenham, região sudeste de Londres, onde foi reconstruído em uma propriedade de 200 hectares. Os motivos para a existência deste local em particular foram paisagísticos, mas a imponente construção se tornou uma atração muito popular entre os vitorianos e logo passou a ser a referência da região, batizando também a estação ferroviária e o time de futebol das redondezas, que mantém este nome até hoje. O parque não era um local construído para corridas, mas acabou sendo onde as primeiras provas de disputas de automóveis acabaram acontecendo, ainda no século XIX, contudo, o conjunto arquitetônico era um espaço multicultural. Em termos de circuito, era possível se elaborar algumas opções de traçados, uma delas, inclusive, contando com uma curva inclinada, tipo “banking”, no circuito oval. Apesar de Brooklands ter sido o primeiro autódromo realmente construído para competições e Shelsley Walsh ter recebido corridas, as primeiras provas automobilísticas do país. O comboio chamou a atenção não apenas das pessoas nas ruas, mas de outros motoristas... e muitos se juntaram ao grupo que iniciara o trajeto. Entre eles, C.S. Rolls (é... Rolls de Rolls Royce mesmo!). Na chegada ao parque, eram cerca de 40 veículos e algumas centenas de pessoas. Os veículos passaram em frente a parte onde havia uma especie de mirante de arquitetura italiana como terraços e estes eram voltados para o parque, o que acabou por batizar a “reta do terraço”. Talvez esta seja uma das imagens mais antigas já registradas de uma corrida de automóveis... o ano era 1899. A prova inaugural foi algo bem diferente do que se vê nas corridas de hoje em dia. O parque permitia que se criassem uma infinidade de circuitos, mas os organizadores prepararam um circuito de duas milhas, com curvas de diversos graus de dificuldade e inclinações e os carros teriam que fazer o trajeto no menor tempo possível e, para dificultar, em 6 pontos foram colocadas duas bandeiras separadas por 7 metros de distância onde os competidores eram obrigados a parar entre as mesmas e arrancar novamente. Algumas motocicletas também participaram do evento, que iniciou-se às duas horas da tarde, indo praticamente até o por do sol. O terminou com a vitória de Charles Jarrott, que foi o primeiro grande protagonista do circuito, vencendo diversas provas e, posteriormente, escrevendo um livro sobre aqueles anos magníficos. Aconteceram corridas nos circuitos montados no parque durante quatro anos, fazendo do evento esportivo também um acontecimento social. A média de velocidade de uma volta no circuito mais utilizado era de 36 milhas por hora. Contudo, devido a lei que limitou a velocidade de veículos motorizados na Inglaterra em no máximo 12 milhas por hora, as corridas foram suspensas, retornando apenas em 1927. Na verdade, em 21 maio de 1927, a prova de reabertura do circuito de Crystal Palace aconteceu apenas com a participação de motocicletas. Foi o resultado de um movimento de motociclistas liderados Fred Mockford e Cecil Smith, que formaram o London Motor Sports Ltd. Depois de muita negociação junto aos curadores do parque, o clube conseguiu seu intuito: um evento motociclístico pelos caminhos do parque e assumiu a responsabilidade por toda a organização do evento, incluindo a limpeza do local após o término. Antes que se limitassem a velocidade máxima dos veículos a motor em 12 mph, as corridas aconteciam em Crystal Palace. O “Crystal Palace Road Racing” foi um sucesso! Mais de 10.000 espectadores, cada um pagando cerca de 6 pences (o centavo dos ingleses) chegou a assistir a muitos dos melhores pilotos do dia competir em um percurso de uma milha. O evento foi considerado um grande sucesso, apesar de alguns espectadores terem saído feridos quando uma combinação de side-car (aquela moto com um ‘passageiro agregado no carrinho do lado’) deixou a pista, e uma segunda reunião com diversas melhorias foi planejado. 16 mil pessoas pagaram 25 pences compareceram para assistir mais um festival de velocidade. Foi em 1928, com a construção de uma nova pista, um oval de um quarto de milha (pouco mais de 402 metros) em torno do perímetro do campo de esportes. Na inauguração, cerca de 30 mil pessoas vieram presenciar o evento de motocicletas, contudo, não demoraria muito para os carros voltarem ao local e utilizar também este pequeno oval, mas com carros pequenos. Infelizmente o retorno das atividades foi às vésperas da grande depressão do final da década. Mesmo assim, algumas corridas ainda aconteciam, incluindo carros também. Nos anos 20, as provas no oval de 1/4 de milha com carros pequenos faziam sucesso após o retorno das corridas. As trilhas originais do parque, usadas nas primeiras corridas tornaram-se cada vez mais degradados e com o dinheiro mais difícil os frequentadores do circuito foram rareando, também em face do aumento das taxas para usar a pista tornou-a quase proibitiva. Então, em 1935, começaram a surgir rumores de que um "Donington para Londres" iria ser construído. Os curadores do Palácio de Cristal, liderados por Sir Henry Buckland, decidiram que, antes que pudessem perder o atrativo que tinham na década de 20, um circuito apropriado deveria ser construído e começaram a planejar uma via permanente, num um esforço para trazer visitantes de volta. Afinal, alguns eventos chegaram a reunir cerca de 70 mil pessoas. No intervalo de um ano os planos para a nova pista foram elaborados. O primeiro projeto foi um circuito de 2,25 milhas (3,6 Km) que seria praticamente uma delimitação do parque. Contudo, algumas adaptações e alterações acabaram sendo feitas e o projeto final ficou com Duas milhas de comprimento (3,21 Km) com uma largura de 30 pés (9,14 metros), exceto para a linha de chegada, onde a largura foi aumentada para 50 pés (15,24 metros), a pista foi projetada para ser uma mistura desafiante de retas rápidas com algumas curvas complicadas. A linha de partida ficava em uma curva suave, à direita, que levava a reta do estádio, que passava por sobre a passagem de nível subterrânea para o mesmo. Naquele ponto o relevo do local privilegiava a visão dos espectadores para a rápida curva inclinada à direita, a “Ramp Bend”. Do topo do ponto mais alto da pista se seguia para a passagem de nível de uma das estações de trem (havia duas estações em Crystal Palace), indo em direção a “The Alley” e chegando a curva da torre sul, uma curva de 90º que antecedia a “Reta do Terraço”, onde os carros ultrapassavam a marca de 130 milhas por hora (209 Km/h) antes de chegar a uma suave curva a esquerda antes tomar a direita na torre norte, em um dos pontos mais belos do parque. Antes que construíssem outro autódromo, os clubes e a administração do parque largaram na frente. Fizeram um circuito! Após a curva da torre norte, começa uma descida que leva a uma suave curva à esquerda – a Glade – antes de chegar a Curva dos Pescadores, que na realidade são duas: a primeira uma direita que podia ser feita com velocidade devido a sua inclinação e a segunda, chamada de “esquina”, outra direita, mais fechada e lenta. Após a segunda curva, uma subida leva até a área que fica onde antes estavam a vista italiana – os terraços – e o local onde ficava a construção que deu o nome ao parque. Esta parte é remanescente do traçado dos anos 20, onde após a subida vira-se à esquerda no hairpin de Rockhills, hoje chamado de “Rockhills Pond” ou “Pond Hairpin”, seguindo-se uma sequência com uma direita rápida antes de outra esquerda – esta inclinada – a “Big Tree Bend”. A saída desta curva levava a uma descida – a New Zealand – que terminava na esquerda fechada do estádio. Após esta freada brusca, uma pequena reta levava para a “curva do estádio e de volta para a linha de partida, completando a volta. Em 3 de dezembro de 1936 começaram os trabalhos o novo circuito. Porém três dias antes havia tragédia aconteceu quando um pequeno incêndio, rapidamente evoluiu para uma labareda enorme e toda a estrutura de vidro do Palácio de Cristal estava envolto em chamas que eram visíveis no céu à noite por muitos quilômetros, mais de 60 bombeiros participaram da cena para não vão, toda a estrutura foi arrasada. Desde a grande atração do parque já não existia mais. Apesar da perda “do corpo”, a “alma” do local permaneceu e o trabalho rapidamente avançou sobre o novo circuito, a fim de fornecer uma nova atração para os visitantes, logo que possível e em 24 Abril de 1937, a pista estava completa, com suas linhas praticamente definindo o perímetro do parque. Nos anos 30 Crystal Palace levava multidões ao subúrbio londrino para ver as corridas. Os melhores da Europa correram lá. Uma das razões da decisão da construção do circuito naquele local, que já possuía uma história com o esporte a motor (talvez a maior delas, na verdade), era fugir do chamado “elitismo de Brooklands”, circuito construído no condado de Surrey e que tinha como slogan por parte dos que eram frequentadores do Crystal Palace como “o direito de se ir a um circuito de corridas sem nenhuma exclusão de público”. Em contra partida, defendiam que o Crystal Palace era “o circuito de Londres”. No sábado 24 de abril de 1937 aconteceram as primeiras corridas, em cujo os grids encontravam-se nomes tão notáveis como Raymond Mays (que viria a ser a luz que guia por trás BRM), Reg Parnell (futuro piloto de Fórmula Um e BRM Team Manager) e o ex-motociclista Freddie Dixon. Entre os carros incluídos AREs, MGs, Rileys e Maseratis. A corrida principal, o “Coronation Trophy” foi ganho pó Pat Fairhead, pilotando um ERA. Pat G. Fairfield também estabeleceu o recorde da primeira volta de 2 min 12 seg, a uma velocidade média de 54,59 mph. Mais reuniões seguidas para automóveis, motocicletas e bicicletas. Aconteceram até que fosse marcado o Grande Prêmio de Londres. Richard Seaman, mesmo ao volante de uma Mercedes W125 não consegui vencer Luigi Villoresi e o Príncepe Bira. Em 17 de julho de 1937, o nobre herdeiro da família real da Thailândia – na época chamada de Sião – o Príncipe Bira (Birabongse Bhanutej Bhanubandh) foi a estrela do show, pilotando seu ERA R2B com arrojo e técnica para vencer aquela que seria a prova que marcava em definitivo a volta do circuito de Crystal Palace ao cenário europeu. Em 9 de outubro do mesmo ano, o Príncipe Bira retornaria ao lugar mais alto do pódio, desta vez no “International Trophy”, derrotando Luigi Villoresi com a Maserati e Richard Seaman, com uma Mercedes W125. Esta prova marcou a primeira transmissão da BBC. As corridas no Crystal Palace foram se tornando mais e mais populares e atraindo um público cada vez maior. Contudo, um fator que nada tinha a ver com o esporte voltou a paralisar as atividades do esporte a motor: era a segunda guerra mundial. A última corrida oficial ocorreu em 26 de agosto de 1939, apenas oito dias antes da declaração de guerra entre Alemanha e Inglaterra. Em 1940 chegou a acontecer uma prova para entretenimento das tropas. Em 1939, assim como em toda a Europa, as corridas foram interrompidas devido a guerra. Apenas nos anos 50 retornaram. Após a guerra, como toda Londres, o circuito precisou ser reconstruído por conta dos efeitos dos bombardeios alemães. A área do circuito havia sido utilizada como local de armazenamento de armas e blindados por parte dos ingleses. As torres norte e sul do antigo “Crystal Palace” que ainda resistiram de pé foram demolidas para evitar que servissem de referência para os bombardeios da força aérea alemã como pontos de navegação. Refeito o autódrom, a emoção voltou à Crystal Palace. Com carros de F2, muitos ases da F1 como P. Collis voaram lá. Em 1951, com a economia em melhores condições e com os novos tempos, inclusive a Fórmula 1, que começara no ano anterior, motivava os amantes do circuito a reconstruí-lo. Contudo, um novo adversário surgiria no caminho dos automobilistas: os moradores locais! Como era uma região residencial, os moradores pareciam não estar dispostos a ter motores roncando nos finais de semana ao longo de meses. Eles não conseguiram impedir a reconstrução, mas obtiveram uma liminar limitando o número de eventos para 5 por ano. O novo circuito, também ficou diferente: A primeira coisa que se decidiu foi o traçado anterior a guerra era demasiado lento e que era preciso fazer uma pista mais rápida. Para tal, um novo trecho foi feito, ligando a curva do pescador, que era uma curva inclinada à reta de partida e chegada, na curva do estádio. Com isso, a extensão do circuito foi reduzida de 1,39 milhas (2.236,5 metros). A reabertura aconteceu em 23 de maio de 1953, a segunda-feira que representava o feriado de Pentecostes, e a prova – chamada “Coronation Trophy” – foi disputada com carros monopostos, que eram os Fórmula 2. Com o número de eventos limitados a 5 por ano, a administração tentava atender a mais de uma categoria no autódromo. A reabertura levou nada menos que 42.500 expectadores ao circuito e o grid estava repleto de nomes que viriam a ser os ases do futuro da coroa britânica nas corridas, dentro e fora de seus domínios: Roy Salvadori estava ao volante de um Connaught, Peter Collins em um HWM e Stirling Moss em um Cooper-Bristol, embora a vitória final foi para a Cooper Ken Wharton-Bristol, um nome que não ficou muito famoso, os historiadores tem motivos para se deleitar com tais referências. O evento anual de maio em Londres passou a ser uma das provas regulares do calendário e diversas categorias vieram a correr em Crystal Palace, inclusive como o circuito tendo recebido provas oficiais e extraoficiais com carros de diversas categorias. Em 27 de junho, as motos – quem realmente começaram o período mais regular de eventos de competição, se formos ser bem sinceros – finalmente retornaram para o Palácio e entre os participantes daquela corrida havia um jovem de 19 anos foi inscrito. Se naquele dia ele era apenas mais um, anos depois e 31 vitórias conquistadas naquele circuito – entre provas com motos e carros – seu nome seria não apenas uma lenda do local, mas tratava-se tão somente do único homem a ganhar um Campeonato do Mundo em duas e quatro rodas: John Surtees. A reforma dos anos 60 transformou Crystal Palace quase em um oval... na época foi bom, depois, passou a ser um problema. Apesar da limitação do número de eventos permitidos para o autódromo de Crystal Palace, a cada ano que passava maior era o crescimento dos públicos e do interesse nos eventos ali realizados e a internacionalização destes no final da década de 50, início da década de 60. No inicio de 1960 uma alteração técnica foi realizada no circuito: o ponto de partida saiu da entrada da curva inclinada e passou exatamente para o lado oposto, ficando no meio da “reta do terraço”. Uma reforma foi executada, criando uma nova área de pits e novos boxes, além de um paddock mais espaçoso. Também foi feito o recapeamento de diversos pontos do traçado e o alargamento de alguns pontos. Além disso, o desenvolvimento do local como centro esportivo e de lazer atraía o público ao local mesmo sem que houvesse corridas, fazendo do local um ponto de encontro naquela região da cidade. Os grandes nomes do automobilismo mundial se apresentaram aqui. Muitos saltaram para a fama como J. Surtees e J. Rindt. Entre os eventos internacionais que aconteciam no autódromo, o mais concorrido era sem dúvidas o “London Trophy With Monday” (que era como a festa de Pentecostes, um feriado nacional naquele tempo), certamente por ter sido neste dia que o circuito voltou às atividades. Dentre as edições em que a prova aconteceu, a ocorrida em 1964 teve um fato que chamou a atenção da mídia especializada da época. A prova que contava com grandes nomes da Fórmula 1 como Jim Clark, Graham Hill, Denny Hulme, além de outros pilotos da categoria que disputavam regularmente o europeu. Contudo, todos seriam surpreendidos por um jovem e desconhecido piloto de 22 anos incompletos que, ao volante de um Brabham F2, comprado por ele mesmo para iniciar seu caminho no automobilismo europeu, derrotaria a todos, chegando 1,5s à frente de Graham Hill. No dia seguinte, todos os jornais estampavam manchetes do tipo: “Austríaco desconhecido derrota Hill e Clark em Crystal Palace”. Assim surgia para todos Jochen Rindt! Nos anos seguintes, as provas de Fórmula 2 em Crystal Palace continuaram a levar multidões ao autódromo e nomes como Jack Brabham e Denny Hulme, Graham Hill e Trevor Taylor, Jim Clark, Peter Revson e Mike Spence, Chris Amon, John Surtees, Jackie Stewart e Jochen Rindt continuaram a brilhar fora da principal categoria, mas fazendo das provas londrinas uma atração à parte para o público da capital inglesa. Rindt parecia ter uma afinidade a mais com Crystal Palace. Na corrida de 1970 o austríaco, que viria a falecer antes de ser consagrado campeão mundial de Fórmula 1, foi o primeiro piloto a conseguir virar uma volta com média acima de 100 milhas por hora. Nos anos 60/70, como os pilotos de Fórmula 1 também corriam na Fórmula 2, para ganhar algum dinheiro a mais, as corridas com Fórmula 2 em Crystal Palace era um verdadeiro desfile dos melhores pilotos do mundo. Jackie Stewart, Emerson Fittipaldi e Jody Scheckter (acima, liderando) venceram em Crystal Palace antes do seu fechamento. Tudo parecia apontar para um sucesso a longo prazo para Crystal Palace, mas a velocidade dos carros estava aumentando rápido demais e as áreas de escape eram praticamente inexistentes. Foi então feito um plano de reformas, mas o orçamento das mesmas bateu na casa de 250 mil libras, um valor demasiadamente alto para ser bancado pelo conselho de curadores do parque. Quando em 1972 Mike Hailwood estabeleceu a melhor volta do circuito com uma média de 103,39 milhas por hora (166,35 Km/h) com um Surtees-Ford F2, o conselho da Grande Londres determinou que as atividades automobilísticas fossem encerradas ao final daquele ano. Os acontecimentos apontavam para que o circuito de Crystal Palace acabasse fazendo parte do hall dos “ex circuitos”, desaparecendo para sempre. Contudo, em 1997 o Sevenoaks Motor Club conseguiu trazer de volta o antigo circuito à atividade. Em um dia de feriado bancário em maio daquele ano foi feita uma prova de subida de montanha (se bem que era uma colina apenas) usando partes do circuito que fora abandonado antes da reforma de 1951/53. O percurso começava na base da subida dos pescadores e seguia até a curva inclinada da árvore grande, que fora modificada, com um hairpin bem fechado, feito para a direita, ligando esta nova parte com a reta do terraço, agora bem mais curta e levando até outra nova curva, a “Parfitts chicane”, uma chicane feita no lado externo do “Pond/Rockhills” hairpin e daí indo ligar-se a “Glade”. Era um traçado pequeno, mas feito para a diversão. No final de 1972, uma prova do campeonato britânico de carros de turismo foi a última competição oficial de Crystal Palace. O evento passou a ocorrer anualmente, sempre naquele feriado bancário e foi crescendo em sucesso até a sua última edição, em 29 de maio de 2000, uma segunda-feira. Em 2001, com todos esperando pelo evento e tudo praticamente organizado para mais um encontro, poucos meses antes o Conselho do Distrito informou ao automóvel clube do distrito de que o evento não poderia ser realizado. O periódico do automóvel clube estampou em sua primeira página uma foto do local e os dizeres: “Crystal Palace RIP” ou seja, “descanse em paz”, sigla normalmente escrita nas lápides dos cemitérios. Como automobilista é um ser persistente, refeitos do choque de 2011 eles ainda voltaram a tentar retomar alguma atividade no antigo local que tantas páginas escreveu para o automobilismo britânico e europeu. O parque em Crystal Palace tornou-se um espaço multicultural com seus jardins, banquinhos em torno de passeios que outrora foram partes do circuito, com pubs em volta do parque e movimento constante de pessoas indo e vindo pela estação de trens. Nas imagens de hoje, o parque onde localizava-se o circuito ainda tem seus trechos onde a pista em nada mudou. A partir de 2003 os mesmos entusiastas voltaram à carga, buscando pela memória daqueles que viviam na região há mais de 30 anos. Um jornal de circulação local, o “the News Shopper” fez uma grande matéria sobre os eventos e a história do circuito e, no final, conclamava a comunidade a “reviver aqueles bons tempos”. A matéria, entitulada “Crystal Balls” foi a primeira de uma série de ações do Sevenoaks Motor Club para tentar conseguir retomar as pequenas provas de subida da colina que fizeram nos anos 90. Com o passar dos anos uma parte da área foi se degradando por completo abandono. Se próximo ao estádio trechos da antiga pista servem de estacionamento em dias de jogos de futebol, do outro lado via-se uma ares onde acumulavam-se escombros e lixo. Um trabalho grande e árduo seria necessário para recuperar a área e foi com isso que o Sevenoaks Motor Club contou para fazer mais uma tentativa: “se é para deixar se degradar, porque não nos deixar cuidar?” Essa era a pergunta. Depois de muito lutarem, os automobilistas conseguiram fazer com que Crystal Palace, de alguma forma permanecesse. Finalmente, em 2010, eles conseguiram! Com o apoio de um patrocinador – o Grupo Ancaster, uma rede de revenda de carros usados – eles realizaram um festival que reuniu pilotos, expilotos e carros de todos os tipos e todas as épocas, alguns que, inclusive, correram no circuito em seus tempos de atividade. O “Motorsports at the Palace” reuniu mais de 5 mil espectadores no feriado bancário no final de maio, com os “competidores” tentando fazer, o mais rápido possível, um percurso de 700 metros em subida, um de cada vez, como foi no primeiro evento realizado no local (só não colocaram as bandeiras para as paradas obrigatórias). Além disso foi criado um fundo social para caridade. Em 2011 a data do evento já está confirmada e espera-se que o público seja ainda maior. O número de inscritos ainda neste inverno, já superou em muito o número do ano passado e além dos carros antigos, o festival de 2011 trará carros híbridos e alguns clubes e museus de automóveis já confirmaram participação. Hoje, as "corridas em Crystal Palace" são muito mais uma exibição e um festival para preservar a história e fazer caridade. Se não foi possível salvar o circuito como um todo e mantê-lo em atividade, ao menos os bravos membros do Sevenoaks Motor Club fizeram com que a essência do local fosse preservada. Um exemplo para tantos pelo mundo. Till förhandsmöte (Até breve) Willy Möller |