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A "calça justa" de Ayrton Senna PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Tuesday, 29 March 2011 09:15

 

Quando nos vemos em uma situação desconfortável, muitas vezes esta que nos apresenta é chamada de “saia justa”. Pois bem, a narrativa que se segue fica mais adequada se batizada de “calça justa”. Afinal, o sujeito deve ter se sentido sem elas diante da vexatória situação. 

 

Ayrton Senna da Silva era um kartista de sucesso, mas neste meio do automobilismo, fazer sucesso precisa vir acompanhado de um suporte financeiro considerável, e isso o pai de Ayrton, Sr. Milton Silva, tratava de prover, inclusive disponibi-lizando um motorista e um carro – uma perua Caravan – para os “serviços automobilísticos” do seu rebento. 

 

Empresário e fazendeiro, como quase todos os pais, Sr. Milton devia ver no filho mais velho aquela coisa de continuidade dos negócios de família e devia pensar que aquela coisa de kart e de corredor ficaria no passado da adolescência... ledo engano. 

 

O mundo de Ayrton, no entanto, tinha quatro rodas, um volante, um motor e ele ao comando. Sendo ele um verdadeiro fenômeno nas pistas, conquistou por seus próprios méritos o respeito e a admiração de pilotos, pais e patrocinadores. Sim, Ayrton começou a conquistar patrocinadores desde aqueles tempos. 

 

 

Nos tempos do kart, Senna tinha alguns patrocinadores, mas o 'seu' Milton também entrava com o famoso "paitrocínio". 

 

Ele tinha sua pasta de recortes de jornal, revistas, panfletos e etc. Com ela, peregrinava de empresa em empresa, pedindo para ser recebido por empresários, diretores, marqueteiros... qualquer um que ele fosse capaz de convencer a “por um dinheirinho” no negócio e expor sua marca na carenagem do seu DAP. 

 

Assim como na pista, era impossível ganhar todas e não foram raras as vezes que o nosso futuro tricampeão do mundo de Fórmula 1 “pastou” na sala de espera de alguns destes empresários que não viam (e, na verdade, quem veria com tanta antecedência) naquele menino franzinho, o futuro “mártir” do automobilismo brasileiro e, porque não, mundial? 

 

O início da vida nos monopostos na Inglaterra. Naquele tempo, ela ainda era conhecido por lá como "Ayrton da Silva". 

 

Quando Ayrton Senna decidiu partir para a Europa para correr de carros, seu pai viu que a coisa estava ficando séria... e que seguia num rumo que ele não planejara. De pronto, tratou de dificultar a vida do filho, cortando o “paitrocínio”. Só que Ayrton já tinha feito sua própria rede de contatos. Alguns dos quais, apresentados pelo pai, outros, por sua iniciativa. E assim conseguira o mínimo para dar partida na carreira nos monopostos da Fórmula Ford. 

 

Acontece que este mundo é pequeno... e como ele dá voltas. Ayrton destacou-se nas pistas inglesas, ganhou todos os campeonatos que disputou e chegou à Fórmula 1. Depois de um ano em uma equipe média – a Toleman – conseguiu um lugar numa equipe de nome, mas que já não tinha a glória do passado.  

 

Contudo, o destino corroborou para o seu sucesso e na segunda prova disputada pela mítica equipe na qual Emerson Fittipaldi consagrou-se, Ayrton Senna vencia o seu primeiro Grande Prêmio de Fórmula 1 , no autódromo de Estoril, em Portugal. 

 

 

Em 1983, um ano antes de chegar à Fórmula 1, com suas conquistas, já conseguia conquistar patrocínios para se manter.

 

A corrida, certamente, todos se lembram. Uma chuva desgraçada (para uns), e abençoada para Ayrton Senna, que mostrou toda a sua habilidade durante sessenta e sete voltas em um asfalto completamente coberto de água, onde o trilho nem ao menos dava mostras de se formar e Ayrton superou a todos – adversários, diretores de prova e pingos d’água – para vencer a primeira de suas 41 conquistas ao longo da carreira. 

 

Bem, a nossa estória propriamente dita começa depois da prova. Para quem ouviu falar ou conhece o autódromo e a região de Estoril, o trânsito que, normalmente já é complicado, naquele dia, com quase 100 mil pessoas indo assistir o GP de F1 e mais a chuva virou um verdadeiro caos! Nesta época, Ayrton Senna ainda não tinha helicóptero, jatinho ou outros “brinquedinhos do tipo”... e encarou o engarrafamento com qualquer cidadão comum que ali estava. 

 

Feliz da vida, com os vidros fechados, Senna comemorava e não parava de falar. Quem o via e reconhecia cumprimentava até que, no “para e anda” do engarrafamento, um carro emparelhou com o que Ayrton estava e o motorista – eufórico – gritava: “Senna, Senna. Aqui, aqui. A gente é do Brasil!”  

 

Quem estava falando era um senhor, com o carro cheio de amigos e Ayrton Senna abriu o vidro do carro para atendê-los. O senhor, sem caber em si, falava. “Eu sou seu fã. Nós somos seus fãs. Dá um autógrafo para a gente”... 

 

Ayrton reconheceu aquela pessoa e perguntou: “o senhor não é o Johann Gordon, dono da Jeans Staroup (uma famosa marca de jeans aqui no Brasil nos anos 80)?” 

 

 

A épica vitória de 1985, sob intensa chuva, Ayrton Senna deu mostras de que sua habilidade natural era fora do comum. 

 

Surpreso, o empresário respondeu: “sim, sou eu mesmo. Nossa, como você sabe quem eu sou?” 

 

Ayrton respondeu: “eu sei quem o senhor é... quando eu era piloto de kart, lá no Brasil, fiquei uma tarde inteira na sua sala de espera para lhe pedir patrocínio e o senhor não me recebeu...” 

 

Atônito, o empresário balbuceou: “nossa... eu não lembro disso...” 

 

Seco, Ayrton respondeu: “é, mas eu lembro. E por isso não vou te dar autógrafo nenhum!” E fechou o vidro. 

 

Esta estória também poderia se chamar: Vingança é um prato que se come frio... ou molhado! 

 

Felicidades e velocidade, 

 

Paulo Alencar

 

Last Updated ( Wednesday, 30 March 2011 09:25 )