Ser o primeiro, aquele capaz de quebrar uma barreira e avançar sobre o desconhecido e de ir até onde ninguém foi é sempre um ato heróico. Em sua época e vindo de onde veio, ainda mais! Este foi o caso do brasileiro chamado Francisco Sacco Landi. Conhecido por todos como Chico Landi, e chamado pelos mais próximos – à uma certa altura da vida – de ‘Seo’ Chico, ele foi o primeiro brasileiro a disputar uma prova de Fórmula 1. Nascido em São Paulo no dia 11 de julho de 1907, filho de uma próspera família, Seu pai – Paschoal Landi – era um comerciante italiano que se dera muito bem quando estes vieram para o Brasil e sua mãe já era de uma segunda geração, sendo uma ítalo-brasileira, Chico Landi, foi um garoto que teve a oportunidade rara de estudar, pois naquela época, isto era privilégio de poucos. Pequeno, acompanhava o pai nas corridas dos carroceiros de Santana, que era disputada neste bairro paulistano. Após o falecimento do pai, a vida de Chico deu uma reviravolta e o então garoto, teve de começar a trabalhar. Sua vida mudaria completamente e o sonho de conseguir um diploma universitário e um ‘título’ acabou tendo que ser deixado de lado. Algum tempo depois, junto com o irmão Quirino, Chico começou a se interessar pelo automobilismo, disputando rachas pelas então vazias ruas de São Paulo. Em 1928, Chico Landi comprou um Chevrolet 28, conhecido como “Cabeça de Cavalo”: Por anos a fio – décadas, na verdade – ‘Seo’ Chico repetia: “Aprendi a correr naquele Chevrolet 28. No início tirava rachas que valiam 5 mil réis ao vencedor, numa época em que a lata de gasolina com 18 litros, custava 2 mil réis”. Esta chamada do ter aprendido a correr em um Chevrolet rendeu-lhe, décadas depois, o convite para ser garoto propaganda (sênior) da marca para promoção do Opala. Foi um passo para começar a disputar corridas em São Paulo e no Rio de Janeiro, incluindo-se também, o temível circuito da Gávea, apelidado de “trampolim do diabo”. A sua primeira corrida importante foi na Gávea, no ano de 1934, quando abandonou a prova. O abandono da estreia ‘oficial’ em 1934 não foi um desalento, mas um estímulo. A primeira vitória foi em 1935, na corrida do ‘Chapadão’. A pista tinha mais buracos que asfalto, em vez de guard-rails, usavam fardos de alfafa, a roupa protetora era uma camisa de mangas curtas, um blusão de couro e um par de óculos escuros. Nesta prova, Chico Landi venceu com uma média de 135 km/h”. Corridas como as disputadas no histórico circuito da Gávea, o "trampolim do diabo" foram palco para alguns 'shows' de Landi. Os anos 40 foram o auge da forma para Chico Landi. O seu grande azar foi a II Guerra Mundial, que paralisou as competições na Europa e esvaziou as competições nacionais, que deixaram de ter a vinda dos pilotos estrangeiros para o Grande Prêmio do Brasil, que era disputado no circuito da Gávea. Foi justamente neste período da guerra que ele conquistou a primeira de suas três vitórias neta prova, em 1941. Mas para que ninguém diga que ele não venceu os europeus, ele conquistou também as provas nos anos de 1947 e 1948. A mais bela e emocionante dessas vitórias foi em 1947, quando venceu os italianos Luigi Villoresi e Achille Varzi, que competiam com carros Maserati, iguais ao seu. Na primeira metade dos anos 40, com carros movidos a gasogênio, Chico Landi superou adversários e venceu diversas provas. No período da guerra, numa época que o Brasil importava todo o combustível que consumia, os aficcionados por automobilismo encontraram um jeito de não ficar parados: com o início do uso do gasogênio nos veículos, logo se passou a realizar corridas, especialmente em São Paulo e no Rio Grande do Sul. Chico Landi sagrou-se campeão correndo com estes carros também! O automobilismo mundial começava a se reestruturar e era a hora de lançar-se no desafio de enfrentar os melhores do mundo ‘na casa deles’. Ainda em 1947, Chico resolveu ir para a Europa, para assistir ao I Grande Prêmio de Bari. Porém, com o auxílio do amigo Achille Varzi, conseguiu uma Maserati e participou da prova. Com a belíssima atuação, foi convidado pelo Automóvel Clube de Bari para correr no ano seguinte. Chico Landi, ao fundo, antes da largada do GP de Bari, prova que venceu duas vezes e o projetou como piloto na Europa. Recebeu uma Ferrari, com o número de fabricação 004. De forma magnífica, conquistou a prova e recebeu uma taça enorme, com a base toda em mármore de carrara. Na alfândega italiana, porém, quase ficou sem a taça, pois os italianos disseram que a mesma era uma relíquia. Todavia, o governo brasileiro interveio e Chico trouxe seu prêmio. Como curiosidade dessa prova, o fato de os organizadores da prova de Bari, não terem o hino nacional brasileiro e no pódio, Landi teve de ouvir o Guarani de Carlos Gomes. Este dia entrava para a história do automobilismo brasileiro e o Brasil, para a história do automobilismo internacional. Nesse mesmo ano, disputou uma prova em Silverstone. O brasileiro liderava a prova, quando teve de parar nos boxes para trocar seus pneus. De volta a pista, com muito tempo perdido, recuperou-se espetacularmente e ainda conseguiu o segundo posto.Nesta época, convenceu o "Comendatore" Enzo Ferrari a lhe vender uma de suas "Macchinas"... contudo, teve um enorme desgosto ao abrir o capô e constatar tratar-se de uma Ferrari já usada. Ele chorava e as pessoas pensavam que era emoção. Baixinho, confidenciou a um amigo sua triste constatação. Amigo que é amigo, não se faz de rogado: “Não fala nada... ninguém precisa ficar sabendo”. Esta Ferrari foi pintada com as cores nacionais, com o amarelo predominando. Com ajuda de Getúlio Vargas, Chico Landi conseguiu comprar uma Ferrari junto ao 'Comendatore'... mas amargou uma decepção. Com início da Fórmula 1, em 1950, a categoria, feita para reunir os melhores carros e pilotos do mundo passava a ser a grande ambição de todo piloto. Contudo, Chico Landi só começou a disputar provas da Fórmula 1 em 1951. Foram seis corridas no seu currículo. Conquistou um excelente 4º lugar, no GP da Argentina de 1956, dividindo a condução do carro com o italiano Gerino Gerini, num Maserati 250 F.
Em 1951, a F1!
'Seo' Chico ficou na Europa por oito anos. Disputou provas contra todos os grandes pilotos da época e é notório o fato, de que se tivesse um incentivo maior, como por exemplo, o que Juan Manuel Fangio recebeu do governo argentino, poderia ter conquistado, possivelmente, várias façanhas. Chico Landi voltou a vencer o GP de Bari em 1952, mas este não fazia parte do calendário da Fórmula 1, apesar de contar com a maioria dos pilotos que a disputavam. Chico Landi disputou apenas seis etapas do mundial de Fórmula 1 entre 1951 e 1956. Infelizmente a Guerra atrapalhou sua carreira. As vitórias de Fangio foram muito importantes como propaganda do seu país. Enquanto o argentino tinha apoio oficial, Chico Landi é quem carregava a bandeira brasileira na mala para ser hasteada nos autódromos, passando pelo absurdo de ter que explicar que aquela não era a bandeira da Argentina, mas sim do Brasil. Chico Landi afirmava que para um piloto vencer, era necessário sorte, não apenas sua capacidade de pilotar ou o fato de ter um bom carro. Certa vez, reunido em um bar com Juan Manuel Fangio, Luigi Villoresi, Alberto Ascari, Tazio Nuvolari e outros, conversando, quando um jornalista italiano perguntou a cada um de nós, o que era preciso para vencer uma corrida. Quase todos afirmaram que era preciso 50 % do carro e 50 % do piloto. Chico Landi foi o último a responder, e disse que eram preciso três coisas: “sorte, depois, mais sorte; e, finalmente, muita sorte”. Aqui no Brasil, a Ferrari ganhou as cores da bandeira brasileira, com o amarelo predominando. Foi o primeiro "piloto patriota". No começo dos anos 50, os Alfa Romeo eram os grandes carros do automobilismo mundial, só que Chico nunca aceitou fazer testes com os Alfetta: Apesar da ‘sacanagem’ de vender um carro usado pra ele, Chico Landi gostava muito do Enzo Ferrari, que, na Europa, o orientou e confiou nele como piloto, dando toda a assistência possível. Por isso preferia correr com os carros Ferrari e Maserati, mesmo sabendo que não tinha nenhuma chance contra os Alfetta. Em seis corridas válidas pelo Campeonato Mundial de F1, teve como seu melhor resultado uma quarta colocação no GP da Argentina de 1956, quando dividiu a Maserati com Gerino Gerini. O GP da Argentina de 1956 foi sua última corrida na Fórmula 1, justamente a que conquistou seu melhor resultado. Sem ter condições de disputar temporadas completas na Fórmula 1, Chico Landi continuou correndo no Brasil nos anos 50, tanto em Interlagos como no recém criado circuito da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. ‘Seo’ Chico foi um dos grandes precursores das categorias ‘Mecânica Nacional’ e ‘Mecânica Continental’. Aqui no Brasil, Chico Landi era às e inspiração para todos os pilotos. Nas Mil Milhas de 1960, Bino Heins venceu com ele. Nos anos 60, fez aquela que ele considerou sua maior corrida: “Em 1960, com um Oldsmobile de passeio, fiz outra das corridas mais emocionantes da minha vida: levei minha mulher às pressas para a maternidade, onde nasceu minha filha”, contou ele por décadas. Esta pode ter sido para ele. Para os seus fãs e fãs do automobilismo, foi a conquista das Mil Milhas Brasileiras, ao lado do jovem e promissor Christian Heins, ao volante de um JK com motor de 2 litros. O Primeiro F1 Brasileiro. Logo após, inspirado numa Ferrari Shark Nose de 1961, Chico Landi e Tony Bianco criaram no início da década de 60, o primeiro Fórmula 1 brasileiro. Era o “Landi-Bianco F1”, Um Fórmula Jr, um dos primeiros “monopostos modernos” no Brasil, mas com motor Alfa Romeo 2000 ou Simca V8 2600, dentro das especificações da F1 daquela época. Este bólido teve uma vida curta: Fez sua estreia em 1962, nos 500 km de Interlagos. Infelizmente, foi pilotando este carro que faleceu Celso Lara Barberis, nos 500 km de Interlagos de 1963. Landi e Bianco desmontaram o que sobrou do carro. Foram construídos dois carros Landi F1. Um com motor Alfa Romeo do JK 2000 e outro com motor do Simca Chambord 2600. Embora a F1 fosse 1,5 litro na época, aqui eram chamados de Fórmula 1, embora tivessem motores maiores. Nos anos 60, talvez de uma forma não intencional, Chico Landi acabou sendo responsável – de alguma forma – pelo ‘empurrão’ que talvez faltasse para que surgissem uma das grandes equipes de competição do Brasil: a DACON! Foi com um Karmann Ghia, equipado com um motor Porsche de 1,6 litros, preparado por Paulo Goulart, que veio a ser o grande comandante da equipe, que Chico Landi venceu as 100 milhas da Guanabara de 1964. Como o DNA da família era forte, um digníssimo ‘herdeiro’ já estava fazendo sucesso nas pistas, mesmo sem usar seu sobrenome. Camilo Christófaro, o Lobo do Canindé honrou o sangue da família e, em alguns momentos, deu ao tio a alegria de pilotar um dos seus carros. No circuito da Barra, no Rio de Janeiro, a primeira vitória de um KG Porsche feito por Paulo Goulart. O início da equipe DACON. Contudo, talvez alguns historiadores possam vir a imputar sobre seus ombros a responsabilidade – mesmo que indireta – da trágica corrida de Petrópolis de 1968. Quando viu o traçado e a direção do circuito (no sentido horário), ‘Seo’ Chico afirmou que “de acordo com as normas da FIA, os circuitos de rua deveriam ser no sentido anti-horário” De onde ele tirou isso, ninguém sabe, afinal, Mônaco e Pau, que recebiam corridas na época, eram e são no sentido horário! Nos anos 70, mesmo com mais de 60 anos, Chico Landi ainda corria, eventualmente. Sua última prova foi em 1974, quando disputou a prova “25 Horas de Interlagos”, com um Maverick V8 Quadrijet nº. 4. Foi 3º colocado, junto com o filho Luiz Landi e Antônio Castro Prado. “Resolvi. Não entro num carro nem para experimentar. Quero completar um ano sem correr e, se isso acontecer, será a primeira vez, desde que comecei. Então posso ter certeza que parei”, disse Landi após a prova. Chico Landi teve em um Chevrolet seu primeiro carro e durante o lançamento do Opala no final dos anos 60. Pilotou alguns. Landi ainda falaria: “Corri de 1934 a 1974, dando mais importância ao esporte do que à vitória. Na época da guerra, faltava gasolina, mas não faltava vontade. Peguei um Chevrolet 41, coloquei um gasogênio e fui campeão três anos seguidos: ganhei a Niterói-Campos, a Rio-Petropólis e a corrida da Pampulha”. Porém, a paixão pela velocidade não conseguiu fazer com que Chico Landi ficasse longe das pistas. Nos anos 80 do século passado, foi administrador do autódromo de Interlagos. Foi um dos responsáveis pela volta da Fórmula 1 a essa pista, mas no entanto, não conseguiu ver a prova de 1990. Em 1974, Chico Landi disputou sua última corrida, com um Maverick, ao lado do filho, na edição das 25 horas de Interlagos. Chico Landi faleceu no dia 07 de junho de 1989, aos 81 anos, vítima de insuficiência cardíaca. Seu corpo foi cremado e suas cinzas, espalhadas pelo autódromo de Interlagos. |