Há 30 anos, em setembro de 1994, a Lotus abria falência e tentava sobreviver o mais que podia, tentando encontrar um parceiro para poder continuar. Contudo, em janeiro de 1995, todas as tentativas acabaram em nada e esta fechou as portas, depois de 38 temporadas, com sete títulos mundiais de pilotos e outros tantos de construtores. A equipa fundada por Colin Chapman, e que integrou pilotos como Jim Clark, Graham Hill, Emerson Fittipaldi, Ronnie Peterson, Ayrton Senna e Nigel Mansell, entre outros, deixava de existir. Contudo, isto não foi algo abrupto e chocante. O final foi o culminar de uma longa decadência, que começou muito tempo antes e do qual houve muitos mais baixos que altos. A última vitória foi em 1987, e foi um conjunto de más decisões, algumas arriscadas, que colocaram a equipa na beira do precipício. O PRIMEIRO GRANDE SUSTO A Lotus poderia ter acabado no final de 1990. Nessa temporada, desenharam o modelo 102 que tinha o motor Lamborghini de 12 cilindros. A equipa, que tinha o patrocinio da Camel esperava ter uma classificação, mas conseguiram apenas três pontos. Pior: dois acidentes colocaram os seus pilotos à arriscar a sua wida. Derek Warwick sofreu um susto no final da primeira wolta do GP de Itália, escapando ileso, mas o pior aconteceu a Martin Donnelly, nos treinos para o GP de Espanha, despisrou-se a mais de 280 m/hora, e o chassis se desintegrou, com ele a ficar bastante ferido. Ele sobreviveu, mas não voltou a correr. No final dessa temporada, perderam o patrocinio, e a familia chegou a pensar em abandonar de forma definitiva. Contudo, dois antigos funcionários, Peter Collins e Peter Wright, acompanhados pelo alemão , lideravam um consócio que injetava dinheiro para manter a equipa e o seu nome vivo na Formula 1. Depois de uma primeira temporada complicada, que tinham como piloto um estreante chamado Mika Hakkinen, conseguiram estabilizar a coisa, acabando com um bom chassis, o 107, desenhado por Chris Murphy, e a partir de 1993, dois pilotos: o britânico Johnny Herbert e o italiano Alex zanardi. Contudo, nos treinos de sexta-feira para o GP da Bélgica, em Spa-Francochamps, o piloto italiano perdeu o controle do seu carro no Raddilon, embatendo fortemente contra o muro de proteção e destruindo o seu carro. Apesar de ele ter sido tirado do carro sem ferimentos maiores, ele teria de ficar de fora por, pelo menos, duas corridas. O escolhido acabou por ser o português Pedro Lamy, que na altura lutava pela vitória no campeonato de Formula 3000, a par com o francês Olivier Panis e o escocês David Coulthard. Lamy estreou-se no GP de Itália, e as suas prestações são boas, garantindo que fica para além das duas corridas previstas, porque ele correrá até ao final do ano e será piloto para a temporada de 1994, deixando Zanardi na posição de piloto-reserva. Mais ou menos na altura, a marca garante os motores Mugen-Honda de 10 cilindros, que nessa temporada estão na Arrows. O contrato será, em principio, de duas temporadas, e o potencial de os colocar um pouco mais acima do resto do pelotão existe. Mas para isso, é preciso um chassis novo. Mas o 109 só aparecerá em 1994, altura em que o 107 entrará na sua terceira temporada. Logo, uma travessia no deserto terá de acontecer até aparecer o material novo... e por esta altura, apesar da boa vontade dos credores – havia dívidas por pagar desde 1991! – esta não era infinita. E não se podiam dar ao luxo de falhar. Entrada a temporada de 1994, e o 107 na versão C, adaptado ao novo motor, e a dupla Herbert-Lamy a bordo, os pilotos conseguem levar o carro até ao fim quer em Brasil, quer em Aida, mas fora dos pontos. Dois sétimos lugares do lado de Herbert e um oitavo do lado de Lamy foram os melhores resultados com o 107C, com o Mugen-Honda. Mas a fiabilidade vinha com um preço: o 107C era 45 quilos mais pesado que a versão anterior, e isso ressentia-se na grelha: eles ficavam no final, batendo apenas os Pacific, Simtek e um ou outro ocasional Larrousse e Ligier. Mas em Imola, o desastre: na partida para a corrida, o Benetton de J.J. Letho fica parado na grelha e alguns segundos depois, é atingido por um carro no fundo da grelha, a mais de 180 km/hora, em terceira velocidade. Era o carro de Lamy. O piloto português fica sem metade do carro, mas sai miraculosamente dele, ileso. Algo bom numa tarde horrível, das mais negras da história da Formula 1. Contudo, duas semanas mais tarde, não terá essa sorte. Em Silverstone, em testes onde os carros estão a experimentar as novas soluções aerodinâmicas para retirar a carga dos bólidos, a asa traseira voa em plena aceleração, acabando por voar na região da curva Abbey. O carro sai da pista e acaba numa área pedonal, com ele destruído em três pedaços. Lamy é retirado do carro com fraturas nos tornozelos, joelhos e num dos pulsos, acabando por não competir mais na temporada. Dos poucos que assistiram ao acidente, todos afirmam que, se fosse no fim de semana de Grande Prémio, teria acabado com vitimas mortais. O 109 estreia-se em Barcelona, nas mãos de Herbert, e na corrida seguinte, é a vez de Zanardi, que substituíra Lamy depois do seu acidente em Silverstone. Mas com o passar das semanas, vê-se que as sortes não mudam assim muito, e em paralelo, o dinheiro começa a escassear. A aposta em algumas ajudas eletrónicas como a suspensão ativa não tinha acontecido porque a FIA decidiu banir as ajudas eletrónicas no final da temporada anterior, e o pouco dinheiro que a marca tinha para pesquisa e desenvolvimento fora desperdiçada e não foi recuperada. E encontrar novos patrocinadores começava a ser complicada. Assim sendo, a Lotus começou a ceder o lugar a alguns pilotos pagantes. Na Bélgica e Portugal, o lugar foi cedido ao belga Philippe Addams, que tinha sido piloto na Formula 3000, sem grandes resultados. Apesar de ter cumprido, a certa altura, os carros estavam tão no fundo do pelotão que são ultrapassados pelos Simtek! Anos depois, Johnny Herbert disse que esse inesperado resultado o desmotivou. UM FIM DE SEMANA MILAGROSO Ironicamente, se tivessem ficado com os Cosworth de oito cilindros, versão cliente, poderiam ter feito melhor: a Footwork-Arrows acabou por ficar com eles e tiveram uma excelente temporada, conseguindo nove pontos, graças a dois quartos lugares nas mãos de Christian Fittipaldi, e um quinto lugar no lugar de Gianni Morbidelli. E pelo meio, conseguiam performances decentes, entre os primeiros. Porém, quando o pelotão chega e Monza, para o GP de Itália, há um raio de esperança. A Mugen-Honda traz uma nova versão do seu motor de 10 cilindros, e quando o experimentam, num teste antes da corrida, ficam esperançados com o potencial do motor que o trazem para a o fim de semana. E todos ficam desconcertados: no final das qualificações, Herbert é o quarto da grelha, a meio segundo da pole-position, apenas atrás dos Ferrari de Jean Alesi e Gerherd Berger, e o Williams de Damon Hill. Alex Zanardi, o segundo piloto, é 13º na grelha, mas anda com o versão mais velha. Ele afirmou, tempos depois, que baseado nos dados da telemetria, poderia ter feito a pole-position porque estava a ser mais rápido em curva que Herbert. Contudo, a chance de pontuar ou algo mais... acaba na primeira chicane. Herbert larga bem e passa Hill nos primeiros metros e chega à chicane determinado a passar Berger e sair para a Curva Grande em segundo, mas atrás dele vinha o Jordan de Eddie Irvine, que naquela temporada tinha uma reputação de piloto perigoso. Na primeira corrida do ano, em Interlagos, causara uma carambola com mais três carros – o Benetton de Jos Verstappen, o McLaren de Martin Brundle e o Ligier de Eric Bernard – que causou a sua suspensão em uma corrida, agravada em mais duas depois de recurso por parte de Jordan. Não sem razão: ele quase arrancara a cabeça de Brundle! E em Monza, a reputação de Irvine apareceu. Indo atrás de Herbert, os seus travões falharam e ele embateu na traseira de Herbert, obrigando-o a fazer um pião e acabar na gravilha. A corrida é interrompida, o carro, sem grandes estragos, é levado para as boxes, mas ele tem de largar no fim da grelha, e com o velho motor. As chances de brilhar foram pelo cano abaixo. Na nova partida, Herbert correu até à volta 14, quando o seu alternador falhou. Pior ficou Zanardi, que sequer completou a primeira volta, vitima de colisão com o Footwork-Arrows de Gianni Morbidelli. Sabendo que as chances de um milagre tinham esvaído – ao mesmo tempo que desmentia o rumor de uma possível compra por parte de Nigel Mansell, então a correr nos Estados Unidos – Peter Collins pediu proteção da equipa aos credores. Esperava ganhar algum tempo para novos compradores, como em 1990, mas as chances pareciam ser mais ténues. O CANTO DO CISNE Em Jerez, palco do GP de Espanha, Flávio Briatore, diretor da Benetton, decidiu comprar o contrato de Herbert e num acordo com Tom Walkinshaw, que tinha conseguido ficar com os ativos da Ligier, trocou-o com o francês Eric Bernard. O dinheiro deu para ganhar mais algum tempo, mas quando chegaram ao Japão, decidiram pedir a alguém que ajudasse a injetar dinheiro. Depois de alguns contactos, chegaram à fala com o finlandês Mika Salo. Ele disse sim, e tinha os 500 mil dólares que pediam para poder guiar na corrida nipónica. Ele trouxe-o... numa mochila e o entregou na semana anterior à corrida. Esse dinheiro foi o suficiente para andar nas duas corridas finais da temporada, conseguindo um décimo lugar em Suzuka, no meio da chuva. No final da temporada, pela primeira vez na história, a Lotus saía sem conseguir qualquer ponto. E tinham conseguido um novo administrador: o britânico David Hunt, antigo piloto de Formula 3000 e irmão mais novo de James Hunt. Por esta altura, Chris Murphy desenhava o projeto seguinte, que seria chamado de 112. O carro seria uma evolução do 109, e teria o motor Mugen-Honda que tinha dado nas vistas em setembro passado, em Itália. Chegou-se a pensar que poderia acolher um Cosworth semelhante ao que teria na altura os Minardi, caso não pudessem ficar com os motores japoneses, e teria como pilotos Salo e Zanardi. Os testes no inverno mostravam que tinha mais downforce que o 109 e até tinha passado os crash-tests da FIA. Contudo, com o passar das semanas, as chances de arranjar dinheiro eram cada vez mais remotas e no inicio de janeiro de 1995, David Hunt decidiu que iria retirar a sua equipa e fundir com a Pacific, a equipa de Keith Wiggins, que curiosamente, tinha feito um chassis razoável, mas não tinha fundos para continuar nessa temporada. Apesar de haver o símbolo no chassis, toda a gente sabia que aquilo era outra coisa e a equipa que existia desde 1958 e com um enorme palmarés, tinha abandonado de forma definitiva as pistas. Saudações D’além Mar, Paulo Alexandre Teixeira Visite a página do Facebook do nosso colunista Nota NdG: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site Nobres do Grid. |