Com 2500 metros quadrados, a "tenda dos beduínos do planalto" destaca-se pela arquitetura clean (por fora) e pelo que tem dentro! Quem vai para o Autódromo Internacional Nelson Piquet, em Brasília, seguindo pelo portão B, que é o acesso aos boxes, o kartódromo e a parte de serviços, vai encontrar, antes de virar a esquerda no portão, uma construção imaculadamente branca e bem cuidada. Ali, sob um sol escaldante (quando estivemos na capital federal estava assim), fica armada a “tenda dos beduínos do planalto”. Sejam bem vindos as instalações da Amir Nasr Racing! A sede da equipe fica a cerca de 2 minutos – de carro – do setor hoteleiro (dá pra ir caminhando) e para chegar no aeroporto é quase uma linha reta. Com mais de 2.500 m² de área construída, a equipe é um verdadeiro pólo automobilístico, desenvolvendo várias atividades ligadas a este esporte e inéditas no Brasil. Sabe aquele estereótipo de que uma "garagem" é um lugar sujo e bagunçado? As instalações da equipe parece uma sala cirúrgica. Mas para se chegar a este estágio, foram praticamente três décadas de trabalho... fora o aprendizado! A história dos Nasr em Brasília se mistura com o nascimento da cidade. O pai dos quatro irmãos que hoje ‘tocam’ a equipe – Amir, Samir, Munir e Riad – cresceram vendo as corridas de rua na cidade recém construída. O prédio construído pela família, o primeiro da asa norte, era cercado por barracões que eram oficinas mecânicas e todas elas tinham um carro de corrida. A mais famosa, ficava na quadra ao lado: a Camber! Assim, os irmãos Nasr, levados pelo pai, assistiam as provas disputadas ainda nas largas avenidas da cidade e se enturmar com o pessoal das oficinas das redondezas e aprender sobre mecânica era um seguimento natural. As provas de kart aconteciam no estacionamento do autódromo ou atrás da torre de televisão. O Samir acabou comprando um kart no início dos anos 70 e, entre quem pilotaria o kart, se ele ou Amir, Samir acabou abrindo mão do cockpit e ficou na retaguarda, fazendo o papel de mecânico. Depois de uma carreira no kart, Amir Nasr partiu para a Europa. Não voltou campeão, mas conquistou algo muito mais importante. No final dos anos 70 Amir seguiu o “caminho natural” de todo piloto após alguns anos de kart e seguiu para a Europa para correr de Fórmula Ford e no início dos anos 80 nascia a Amir Nasr Racing. Enquanto Amir Corria e acumulava experiência na Europa, Samir tocava os negócios da família no Brasil. Em 1987, Amir retornou ao país com uma grande bagagem acumulada e propôs a montagem de uma equipe de Fórmula Ford para a disputa do campeonato nacional. Com a experiência acumulada e a quantidade de contatos feitos na Europa ao longo de quase uma década, os irmãos Nasr construíram um carro muito superior ao da concorrência. O projeto fez tanto sucesso que passou a ser cobiçado pelos competidores da categoria e, mediante uma oferta de um amigo (Bruno Minelli, patrocinador do piloto André Ribeiro) o carro foi vendido. Mas o projeto dos irmãos Nasr era mais ambicioso que a quase artesanal Fórmula Ford. Eles tinham como meta a entrada na Fórmula 3 e levaram o projeto adiante. Constantino Jr foi um dos primeiros a pilotar para os Nasr, como equipe estruturada. Em pouco tempo, era a equipe a ser batida. Os primeiros pilotos a guiar para a equipe, depois do Amir, foram Marcio Lobão (filho do atual ministro, Edson Lobão) e Constantino Junior (que ainda não era proprietário de companhia aérea – a Gol – mas que já pensava em voar baixo). Nesta época a sede da equipe era uma oficina com não mais que 300 metros quadrados de área construída. Foi na Fórmula 3 que os Nasr conseguiram destaque como equipe no início dos anos 90. Contudo, tiveram que passar por enormes privações quando o plano Collor, um dos vários “miraculosos” planos para salvar a economia nacional segurou a poupança de todos os brasileiros. Ainda assim, a equipe estreou no GP do Uruguai, disputado nas ruas do balneário de Punta del Leste. Vários dos melhores pilotos formados nos anos 80/90 e 2000 passaram pela equipe ANR. Fossem como pilotos, fossem como alunos. Ao longo de sua passagem pela categoria, contou com alguns dos melhores pilotos do país, como Hélio Castroneves, Vitor Meira, Juliano Moro, Constantino Júnior, Rodrigo e Ricardo Sperafico, Tarso Marques, Thago Medeiros, entre outros. Mais uma vez, os contatos estabelecidos na Europa por Amir frutificavam no Brasil e a equipe de F3 foi, enquanto existiu, uma das mais fortes do campeonato. Um dos grandes “segredos do sucesso” da equipe dos irmãos Nasr era o estreito contato que eles mantinham com quem detinha aquela que era a tecnologia de ponta, especialmente em um novo ramo que se faria mais e mais presente no automobilismo: a aquisição de dados e a telemetria. Automobilismo é tecnologia, estudo e desenvolvimento. Nada como uma vitória nas Mil milhas (2003) para provar isso! A equipe estabeleceu uma parceria com a PI, a maior empresa de aquisição de dados da época e que trabalhava com as principais equipes de Fórmula 1. A Universidade de Brasília entrou como parceira neste projeto e houve um intercâmbio de profissionais da PI e pesquisadores da UNB, além dos membros da equipe, com cursos na sede da empresa, na Inglaterra. O resultado disso foi uma rápida evolução dos monopostos da equipe, com a transmissão de dados em tempo real através de sinal de rádio e a consequente superação das equipes argentinas, que eram as dominantes da categoria. Quando a equipe vai se deslocar para uma corrida em outro estado, tudo é embarcado e controlado meticulosamente. Além de se tornarem a equipe top da Fórmula 3, a Amir Nasr Racing acabou tornando-se uma verdadeira escola de formação de pilotos, inclusive para pilotos estrangeiros que vinham para o Brasil treinar nas instalações da equipe e usar o Autódromo Internacional Nelson Piquet como campo de teste para aquilo que eles aprendiam em “sala de aula”. O autódromo era utilizado praticamente todos os dias, de manhã e a tarde. O “curso de aprimoramento de pilotos” durou alguns anos, até que as autoridades britânicas proibiram os pilotos que participavam do campeonato inglês de Fórmula 3 de treinar em outros países. Contudo, este sistema implementado em Brasília em muito ajudou na formação de toda uma geração de pilotos, que foi para a Europa e, quando não chegou à Fórmula 1, estabeleceu-se nos Estados Unidos, na Fórmula Indy. Neste período estabeleceu-se uma outra parceria, que durou bons anos: o piloto Helio Castro Neves (que mudou a grafia para Castroneves por melhor aceitação desta nos Estados Unidos) associou-se aos Nasr, e por várias temporadas as carenagens dos carros estampavam “NasrCastroneves” em suas laterais. Foi um período de sucesso. A sala de troféus da equipe mostra o tamanho do sucesso da equipe. Os simuladores que eles possuem treinaram vários pilotos. Segundo a filosofia da equipe, automobilismo é desenvolvimento, estudo, investimento e formação. Tudo isso começou a ficar comprometido com a decadência da Fórmula 3 no continente. Primeiro com o rompimento com os argentinos, posteriormente, com a elevação de custos da categoria que criou um “fenômeno”, que eram as equipes de pais, com os pais tocando equipes onde corriam seus filhos. Este modelo ainda sobreviveu por um tempo, mas com a chegada de Nelson Ângelo Piquet à categoria, houve um grande desequilíbrio de forças, dada a estrutura montada pelo tricampeão de F1 para seu filho, segundo Samir Nasr, um dos sócios da equipe e irmão de Amir. Quando a Amir Nasr Racing decidiu entrar na Stock Car, a categoria de maior projeção no cenário nacional, segundo Samir, houve quem não quisesse tê-los como adversários. Afinal, o histórico de excelência da equipe apontava para uma concorrência muito dura por parte dos “turquinhos”, como os irmãos Nasr eram chamados, apesar da origem libanesa. Logo de início a equipe mostrou ao que veio, construindo um carro com 100 Kg abaixo do peso mínimo estabelecido para a categoria, enquanto as demais equipes chegavam a ter carros bem acima deste mínimo. Eles também foram os primeiros a introduzir a fibra de carbono como revestimento dos carros, ao invés do alumínio e o resultado foram dois vice campeonatos e um terceiro lugar logo depois que entraram. Quando chegaram na Stock Car, os "turquinhos" como eram chamados pelos seus concorrentes "incomodaram" muito. As mudanças na categoria desestimularam os irmãos Nasr. Com a construção de um carro único, com as limitações de materiais, equipamentos e até mesmo o impedimento de se fazer reparos nos carros dentro da própria oficina, destoavam da ideia do que era “automobilismo de competição” para eles. Com a crise pós estouro da “bolha” imobiliária nos Estados Unidos e o abalo provocado no mercado financeiro, fez com que muitos patrocinadores, fornecedores, montadoras e com eles o dinheiro se esvaísse da categoria. Os anos de 2009 e 2010 foram difíceis para todos, especialmente para quem trabalhava com a filosofia dos Nasr, que era a de ter a equipe e seus patrocinadores, com os pilotos sendo contratados. Os Nasr resistiram enquanto puderam ao modelo dos pilotos trazendo patrocínios para sustentar a si próprios e as suas respectivas equipes, mas acabaram tendo que ceder ao modelo em voga. Outro problema neste sentido é que, sendo Brasília um polo político e não industrial, isso foi um contratempo extra que os irmãos Nasr tiveram que enfrentar. Em 2010, o último ano da equipe na Stock Cars. As dificuldades de conseguir patrocínios redirecionou os esforços da equipe. Atualmente a equipe investe seus esforços na Copa Petrobras de Marcas, uma categoria em crescimento e com um orçamento cerca de um terço menor que o da Stock Car e com uma filosofia mais próxima do que pensam os irmãos Nasr sobre automobilismo. Dos 36 funcionários que um dia fizeram parte da equipe, hoje a estrutura mais “enxuta” da Amir Nasr Racing comporta 20 profissionais, todos trabalhando dentro da filosofia que há 30 anos vem sendo a marca registrada dos 4 irmãos. O próximo passo natural, então, seria a internacionalização que, porém, ainda está longe de acontecer. É que o Automobilismo Brasileiro ainda tem um longo caminho a percorrer um sem-número de oportunidades e capítulos que devem ser mais bem tratados, antes de se aventurar em outros campos. Mas, quem sabe este salto não consegue ser dado? Atualmente, contando com dois carros no Campeonato Brasileiro de Marcas, os irmãos Nasr mantem seu nome nas pistas do Brasil. Nada que não comece, no entanto, a ser planejado com rigor e feito de forma aparentemente tímida, mas muito segura. Como em tudo o que a Amir Nasr Racing faz, respeitando limites, brigando sempre por condições mais justas, pensando na responsabilidade que tem como parte do espetáculo e propondo permanentemente maneiras de melhorar o ramo de negócios que escolheu para participar. Atualmente, um representante da família Nasr encontra-se na Europa, dando aquele que pode ser o último passo para chegar na categoria máxima do automobilismo mundial. Felipe Nasr, filho de Samir, conquistou em 2011 o campeonato inglês de Fórmula 3 de forma incontestável. Tendo como manager Steve Robertson, o mesmo de Jenson Button e Kimi Raikkonen e que tem como filosofia trabalhar focado em um piloto por geração, faz de Felipe a grande aposta – dele e talvez do Brasil – de ser próximo grande representante brasileiro na Fórmula 1. |