Aylton Varanda sempre foi visto como um piloto do Rio de Janeiro, ‘Petropolitano’ pra ser mais exato. Contudo, ele era mineiro de uma – na época – pequena cidade chamada Bicas, próxima de Juiz de Fora. Nascido a 19 de maio de 1929, o filho mais velho do Sr. José Varanda, teve sorte na vida pois os motores roçaram logo aos seus ouvidos. ‘Seu’ José era um pequeno comerciante em Bicas, com armazém de secos e molhados quando mudou-se para Petrópolis. Lá, prosperou e se tornou um comerciante de sucesso na cidade. Entre outros negócios, teve uma oficina da Ford (onde começou a paixão de Aylton pelos automóveis) e, durante muitos anos, o Cinema Esperanto. Sua mãe, Iracema Costa Varanda, era dona de casa (o comum na época) e que zelava com muito carinho pelos filhos e netos e, enquanto a sua saúde permitiu. Apesar do pouco estudo, José Varanda era um homem empreendedor e filantropo, sempre envolvido em ações de auxilio à população mais necessitada das cidades de Bicas e Petrópolis. Além do período que atuou no negócio com veículos, José nunca teve muito interesse pelo automobilismo, ao contrário, considerava o esporte um ‘hobby’ caro e perigoso, o que provocou muitas divergências entre ele e Aylton, resultando em alguns momentos de estremecimento na relação entre pai e filho. O interesse de Aylton pelo automobilismo surgiu quando, ainda garoto, seu pai comprou o primeiro carro e, em seguida, a oficina da Ford em Petrópolis. Aylton, muito jovem e sem habilitação, dirigia os carros do pai, ajudava na oficina e, apesar da pouca idade, acabou se tornando o “motorista” da família nas viagens pelo interior. Ele contava que, naquela época, precisava carregar galões de combustível no carro e que era comum ter que encher com capim um pneu furado, para continuar a viagem. Parte da infância de Aylton foi passada em Bicas e em Juiz de Fora, onde estudou, em regime de internato, no Colégio Granbery, tendo sido colega de turma do ex-presidente Itamar Franco. Já em Petrópolis, estudou no Colégio Werneck e morou nas ruas Benjamin Constant, 16 de março, nos bairros do Bingen, Piabanha e, nos últimos anos de sua vida, em Correas. Aylton era o filho mais velho do casal, que teve também duas filhas: Leila e Leny, nessa ordem. As irmãs sempre foram muito próximas a ele, mas em respeito ao pai, também não apoiavam sua paixão pelo automobilismo. As primeiras experiências de Aylton com velocidade começaram bem cedo, nas estradas da região, especialmente na antiga serra Rio-Petrópolis. A presença de forte cerração à noite nessas estradas é uma constante, e essa experiência viria a ajudar Aylton, anos mais tarde, nas provas de longa duração em Interlagos. Largada da primeira corrida oficial de Aylton, no Circuito de Petrópolis 1951 com Aylton #25, largando na primeira fila. Em 1952, Aylton casou-se com a carioca Maria Augusta Ferreira Varanda, cuja família passava as férias de verão em Petrópolis. Maria Augusta, hoje com 83 anos, foi sua única esposa. Após o casamento, Aylton, seus pais e irmãs moraram, durante muitos anos, em apartamentos diferentes no mesmo prédio: o Edifício Arcádia, na Rua 16 de março, no centro de Petrópolis. O prazer de José Varanda era ver a família reunida, quer fosse em sua residência, na casa de praia em Saquarema (RJ), ou na fazenda Grão Pará, em Areal (distrito próximo a Petrópolis), onde os filhos e netos costumavam passar com ele as férias e feriados. A esposa, Maria Augusta, acompanhou Aylton em algumas provas do início da carreira, mas a angustia era tão grande que, depois de algum tempo, decidiu que não mais estaria presente às corridas. O casal teve três filhos: José Augusto (1953, engenheiro mecânico), Maria Beatriz (1956) e Marcos Luís (1960). Apesar da falta de apoio dos familiares mais diretos (pais, irmãs e esposa), Aylton foi encontrar suporte da família para a participação nas corridas em alguns de seus primos diretos (filhos de irmãos de José Varanda). Primeiramente, Álvaro Varanda Filho foi seu grande parceiro durante boa parte da carreira e com quem dividiu o carro em várias provas importantes, de longa duração. Em seguida, com o afastamento de Álvaro em função de um acidente sofrido fora das pistas, outro primo, João Varanda Filho, o Jiquica, formou com ele uma equipe, onde cada qual comprou um KG Porsche fabricado pela DACON. O pai de Jiquica, João Varanda, era dono da concessionária Chevrolet de Petrópolis, chamada FILPAN (pois pertenceu anteriormente à família Filpo), que funcionava como uma espécie de base logística para a preparação dos carros da equipe. Largada do 1º Circuito de Botafogo, em 1956. Aylton, #82, tinha o único MG da prova com volante do lado direito. Durante os anos em que esteve nas pistas, Aylton trabalhou com seu pai. Foi gerente do Cinema Esperanto, sendo responsável pela programação e negociação dos filmes junto aos distribuidores. Colaborou também em outros negócios e projetos da família. Além de seus primos Álvaro e Jiquica, Aylton teve também, como parceiros, importantes pilotos da época. Entre eles, Victor Levy, Mário Olivetti e, por último, Sérgio Cardoso. A carreira de Aylton Varanda foi marcada pelo mesmo amadorismo que marcou a carreira da maioria dos pilotos da ‘época romântica’ do automobilismo no Brasil. Além disso, pela falta de apoio, pessoal e financeiro, da família, Aylton teve que empreender uma verdadeira cruzada para manter-se nas pistas. Patrocínio era coisa rara. Além disso, como outros pilotos da época, ainda precisou dedicar tempo para ajudar na organização de algumas corridas da qual participou, e de outras que não pode participar. Naquela época, a maioria dos pilotos acompanhava pessoalmente toda a preparação dos carros e os trabalhos mecânicos de última hora, que muitas vezes se estendiam até a madrugada do dia da prova. Depois disso, ainda conduziam os próprios carros até o local da competição. Foto tirada durante a realização da corrida "1º Circuito de Botafogo", em 1956. O carro com o volante do lado direito. A primeira corrida de Aylton foi no dia 30 de setembro de 1951, no Circuito de Petrópolis, com um Simca 1949, quando se classificou em 3º lugar. Aylton disputou algumas provas na primeira metade dos anos 50, mas foi na segunda metade que suas atividades na pista ficaram mais constantes. A corrida 1º Circuito de Botafogo, em 1956. Teve uma passagem prosaica, com Aylton tendo que “pilotar” um MG com colante do lado direito depois do casamento da cunhada em Petrópolis para chegar a tempo no Rio de Janeiro. O carro perdeu uma roda próximo a Lagoa Rodrigo de Freitas e Aylton pagou um morador pra mergulhar na lagoa pra recuperá-la! Apesar de todas essas dificuldades, Aylton ainda conseguiu a segunda colocação na prova. Aylton Varanda ao volante da Ferrari 225 S, número 10, faz pouco antes da largada do VI Circuito de Petrópolis, 1958. No dia 16 de março de 1958 (aniversário da cidade), Aylton participou, do VI Circuito de Petrópolis com uma Ferrari 225 S emprestada por um amigo, mas teve que abandonar a prova em função de um vazamento de óleo do motor. Nos dias 3 e 4 de julho de 1960, Aylton e Álvaro disputaram, com o FNM JK 2000 #3, da equipe apoiada pela fábrica, aquela que seria a prova mais importante de suas carreiras: a I 24 Horas de Interlagos para carros de fabricação nacional, organizada pelo Centauro Motor Clube, seguindo os parâmetros de nacionalização estabelecidos pelo GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística). Os JK 2000, da equipe apoiada pela fábrica, passando no retão em frente às arquibancadas e boxes, I 24 Hs de Interlagos, 1960. A Fábrica Nacional de Motores (FNM), havia se implantado na década de 40 mas só em 1959 iniciara, em parceria com a Alfa Romeo, a produção do JK (nome dado em homenagem ao Presidente Juscelino Kubitschek) em sua planta situada no distrito de Xerém (Duque de Caxias), região também conhecida como ‘raiz da serra de Petrópolis’. O FNM JK 2000, cuja mecânica era similar à da Alfa Super 1956, era um carro inovador à época com câmbio de cinco marchas no volante e motor quadricilíndrico de 1975cm3 com dois comandos de válvulas no cabeçote. Seu lançamento oficial, no Brasil, ocorreu no dia da inauguração da nova Capital Federal, 21 de abril de 1960. Aylton e Álvaro tinham uma boa amizade com os engenheiros da fábrica, especialmente com Amilcar Baroni e Carlo Lissoni (foto abaixo com Aylton, nos treinos para as I 24 Horas de Interlagos). Dessa aproximação surgiu a ideia de estruturar uma equipe oficial para disputar as principais corridas da época, que serviriam para comprovar a excelência e resistência dos JK 2000. O apoio foi conseguido com muito custo, pois a FNM àquela altura já enfrentava dificuldades financeiras em função dos insucessos anteriores, e a equipe para as I 24 Horas foi formada com 3 carros: o #2 com Chico Landi e Camilo Christófaro, o #3 com Aylton e Álvaro Varanda e o #4 com Carlo Lissone e Luciano Della Porta. O resultado não poderia ter sido melhor: vitória de Aylton e Álvaro com Chico e Camilo em segundo e Lissoni e Della Porta em terceiro. Álvaro Varanda, que correu em dupla com Aylton, recebe a bandeirada da vitória na I 24 Horas de Interlagos 1960. A dupla poderia ter mais sucesso se não fosse um ‘detalhe’: Álvaro tinha uma deficiência visual importante e, ainda novo, usava óculos ‘fundo de garrafa’! Naquela prova, ao anoitecer, começou a baixar uma forte cerração em Interlagos. Aylton, após uma tocada de umas três horas, parou nos boxes para reabastecimento, troca de pneus e de piloto (possivelmente aquela registrada na foto abaixo). Àquela altura, já estavam em primeiro lugar na prova. Álvaro pegou o carro, deu algumas poucas voltas e entrou novamente nos boxes. A equipe e Aylton foram pegos de surpresa e acharam que havia algum problema mecânico. Álvaro, no entanto, disse que o carro estava ótimo, mas que não conseguia enxergar um palmo à frente do nariz e que, nessas condições, não teria como continuar pilotando. Aylton, que mal havia iniciado seu período de descanso, não se conformou e pegou novamente o volante. Álvaro e Aylton no pódio, ladeados pelos companheiros de equipe, e no dia seguinte, recebendo o troféu do representante do GEIA. Aylton só entregou o carro para Álvaro após o amanhecer, quando o nevoeiro já estava se dissipando... depois de mais de nove horas seguidas de pilotagem! Ele precisou ser retirado do carro nos braços da equipe, em posição sentada, pois não conseguia ficar em pé. Seus olhos lacrimejavam sem parar e, com a ruptura das luvas de pelica fina, suas mãos estavam repletas de bolhas de sangue. Foi levado ao ônibus que servia de hospital e não pode mais voltar a pegar o carro, que foi pilotado até o final da prova, ao meio dia, por Álvaro. O regulamento daquela prova ainda não estabelecia o tempo para que cada piloto conduzisse o carro. Tal providência só foi tomada nas edições posteriores, talvez motivada por esse episódio”. 1960 foi um ano “ímpar”. Em articulação com companheiros da Câmara Júnior de Petrópolis, da qual era membro, iniciara um projeto de recuperação do Circuito de Petrópolis, entendendo que a corrida era um grande evento para a cidade, apesar da oposição entre jornalistas e políticos, que eram contrários à continuidade das corridas de rua por questões de segurança. Largada da II 24 Horas de Interlagos 1961. Nesta a vitória ficou com Chico Landi e Christian Heins. Aylton e Álvaro foram 2º. Aylton recorreu então ao seu tio, Cordolino José Ambrósio (casado com uma irmã de seu pai) que já havia sido prefeito da cidade e que, naquela época, era presidente da Assembleia Legislativa Estadual, e conseguiu uma audiência com o então Governador Roberto da Silveira para pedir o apoio do Governador para a manutenção do Circuito de Petrópolis, mediante o compromisso de que seriam tomadas todas as medidas possíveis para conferir maior segurança aos pilotos e aos espectadores. No dia 27 de novembro, a dupla Aylton e Álvaro voltou a Interlagos, com o mesmo JK 2000, para participar das Mil Milhas Brasileiras. Terminaram a prova na 3ª colocação, que foi vencida pela dupla Chico Landi e Christian Heins. Nessa mesma prova o piloto petropolitano Mário Olivetti, em dupla com Joluan Oliveira, ficou com a quinta colocação também pilotando um JK. Aylton e companheiros da Câmara Júnior de Petrópolis são recebidos em audiência pelo Governador Roberto da Silveira, 1960. Apesar do grande sucesso da equipe, no ano seguinte a FNM, em função das dificuldades financeiras, não manteve o mesmo suporte que havia dado em 1960. Mesmo assim, os pilotos se organizaram e, com um apoio mais reduzido da fábrica, formaram novas duplas para participar da II 24 de Interlagos, disputada em 4 de junho de 1961. Os JK repetiram o sucesso de 1960 e arrebataram as quatro primeiras posições na II 24 Horas de Interlagos. Aylton, que pela primeira vez formou dupla com Mário Olivetti, ficou em 4º lugar. Chico Landi e Christian Heins repetiram a dose das Mil Milhas do ano anterior e ganharam a prova, com Álvaro Varanda e Eugenio Martins em segundo e Camilo Christófaro e Jean Loius Lacerda em terceiro. A partir dessa prova, mesmo diante dos brilhantes resultados obtidos nas pistas, a FNM não mais manteve seu apoio à equipe de competição, obrigando Aylton a procurar outras alternativas para continuar no esporte. Talvez tenha sido essa a primeira grande frustração de sua carreira, pois quando, pela primeira vez, o futuro parecia promissor, Aylton teve que recomeçar do zero. Então, ele e Mário Olivetti, resolveram construir um protótipo, utilizando a mecânica de um JK 2000 acidentado, que tivesse melhores condições aerodinâmicas e menor peso do que o carro de fabricação em série. Confiaram a responsabilidade pela ‘obra’ a Renato Peixoto, o ‘Peixotinho’. Daí surgiu o ‘Farufa’, que ficou mais conhecido como ‘Tanto Faz’, pois era difícil distinguir a sua parte frontal da traseira. A parte traseira do ‘Tanto Faz’, na foto já com a pintura das marcas de patrocinadores, pronto para correr em Interlagos, 1961. Aylton e Mário partiram então, com o ‘Tanto Faz’, para as Mil Milhas Brasileiras de 1961, prova disputada no dia 26 de novembro daquele ano. Conseguiram levar o protótipo a um honroso terceiro lugar, mas tiveram muitas dificuldades com a dirigibilidade do carro. Com a trágica morte do Governador Roberto da Silveira, em acidente de helicóptero, no início de 1961, Aylton e seus companheiros continuaram a manter contato com o novo governador, Badger da Silveira, irmão de Roberto. Após as Mil Milhas do final de 1961, Aylton teve outro período de dificuldades que o obrigou a se afastar das pistas durante o ano de 1962. Mário Olivetti, com seus dois filhos, e Aylton Varanda posam para foto com o Tanto Faz, em 1961. Em 1963, Aylton finalmente pode colocar em prática o projeto que havia idealizado com seus companheiros de Câmara Júnior, realizando o VIII Circuito de Petrópolis, no dia 28 de julho daquele ano. Em função das iniciativas antes mencionadas, Aylton acabou assumindo dupla responsabilidade, de incrementar a segurança da prova, e de promover o evento como um todo. Para aumentar a segurança, tiveram a ideia de dividir a prova em duas, com categorias distintas. Isso diminuiria o número de concorrentes em cada prova e também evitaria que carros com potencia diferentes dividissem o circuito. Da esquerda para a direita Emerson, ainda um garoto, Álvaro, Wilsinho, Wilson Fittipaldi e Aylton, em Petrópolis, 1963. Naquele ano, Aylton e Álvaro haviam comprado, em sociedade, um Willys Interlagos Berlineta (azul metálico) sendo que, pouco antes, Álvaro também havia adquirido, para seu uso particular, outro Willys Interlagos na versão coupe (branco). Para promover o evento, Wilsinho Fittipaldi foi convidado a participar da prova e Aylton convenceu Álvaro a emprestarem a Berlineta de ambos para Wilsinho, para competir na prova principal (Grupo III). Também conseguiu convencer Álvaro a colocar na outra prova (Grupo I) seu coupe de passeio, para que pudessem correr em dupla, combinando que Álvaro ficaria com o direito à largada e parar, para troca de pilotos, quando bem entendesse. Resultado: as duas provas foram disputadas sem qualquer acidente sério, sendo que Wilsinho venceu a prova principal e Álvaro e Aylton faturaram o Grupo I. Pelas fotos, em preto e branco, é difícil distinguir os dois carros, pois ambos correram com o #2 (o preferido de Aylton e Álvaro). A diferença é sutil entre os dois modelos, mas percebe-se a diferença na cor do círculo que envolvia o número, na Berlineta em branco e no coupe em preto. Aylton e Álvaro Varanda no Interlagos coupe 2, vencedores do Grupo I, Circuito de Petrópolis, 1963. Wilsinho ganhou na geral. Ainda em 1963, Aylton e Álvaro correram os 1600 km de Interlagos, disputado no dia 24 de novembro, com o mesmo Willys Interlagos Berlineta que haviam emprestado a Wilson Fittipaldi Jr. no Circuito de Petrópolis. Como retribuição, a Equipe Willys, que não participaria oficialmente da prova, teria emprestado alguns componentes para melhorar o desempenho do carro. Tiveram alguns problemas mecânicos, possivelmente devido ao ‘up grade’ de última hora, mas ainda conseguiram terminar a prova em quarto lugar. 1965 foi outro ano em que Aylton ficou afastado das pistas, retornando apenas em 1966, com um Brasinca Uirapuru que não lhe trouxe sorte nas pistas. Nessa época o então jovem mecânico Carlos Alberto ‘Passarinho’, começou a trabalhar na preparação do carro. Essa parceria durou muitos anos e Passarinho passou a ser o homem de confiança de Aylton. Aylton ao volante de um Brasinca Uirapuru em prova disputada em Juiz de Fora, em 1966. Em julho do mesmo ano, após trocar o câmbio que havia sido destruído em Brasília, Aylton fez sua última tentativa com o Brasinca Uirapuru, na inauguração do Autódromo do Rio de Janeiro, mas também não conseguiu terminar a prova. Após a primeira prova com o Brasinca Uirapuru, em Juiz de Fora, Aylton formou dupla com seu primo Jiquica, para disputar os 1.000 km no circuito de rua de Brasília, com o mesmo carro. Nessa prova, realizada no feriado de 1º de maio de 1966, Aylton deu a largada e logo se posicionou entre os primeiros colocados. O Uirapuru rendia muito bem no circuito da Capital Federal, compensando a dificuldade nas curvas de baixa com um bom desempenho nas curvas de alta e nos retões do Eixo Monumental. Quando parou nos boxes, que ficavam localizados embaixo do viaduto da rodoviária da cidade, para a primeira troca de pilotos, Aylton já estava em segundo lugar. Jiquica pegou o carro, animado com a possibilidade de uma boa corrida, mas poucas voltas depois, numa redução de marchas mais forte, a caixa de câmbio de 3 marchas não aguentou e quebrou de tal maneira que algumas engrenagens ficaram espalhadas na pista. Em 1967, sabedor de que a equipe DACON estava se desfazendo e vendendo os KG Porsche, Aylton conseguiu, com a intermediação de seu grande amigo Chico Landi, comprar o carro que havia sido utilizado por José Carlos Pace, o Moco e, logo em seguida, conseguiu outro KG, da mesma equipe, para Jiquica. Os dois carros inicialmente vieram equipados com motores de 1600cc. Com o encerramento das atividades da equipe DACON, Aylton Varanda comprou dois do KG Porsche da equipe paulista. A estreia dos novos carros, já nas cores branca e vermelha da equipe J.VARANDA (patrocinada pelo tio João Varanda, pai de Jiquica), ocorreu no X Circuito de Petrópolis, no dia 30 de julho de 1967. A corrida, que mais uma vez contou com o empenho de Aylton, para a sua realização, mereceu grande destaque na revista ‘Autoesporte’, edição de setembro daquele ano. A revista enfatizou que, “depois de três anos sem se realizar o Circuito de Petrópolis foi novamente aberto para as vitórias de Hélvio Zanata e Paulo César Newlands, respectivamente nas provas para estreantes e pilotos”. Essa foi uma outra divisão de categorias proposta por Aylton, visando aumentar a segurança da prova. A revista também destacou a presença do maior público já registrado naquela prova. Capa edição de setembro de 1967 da Revista Autoesporte, com o Circuito de Petrópolis em destaque e Aylton na capa. O X Circuito de Petrópolis, em 1967 terminou com a vitória bastante tranquila, de Paulo César Newlands, com a Ferrari 250 GTO #11, com Aylton em segundo e Jiquica em terceiro. Portanto, a estreia da Equipe J.Varanda, com os KG Porsche, havia sido bem sucedida. Poucos dias depois, no início do mês de agosto de 1967, Aylton e Jiquica participaram, com os mesmos KG Porsche 1600cc, da III Etapa do Campeonato Carioca, terminando a prova em 3º e 5º lugares, respectivamente. Aylton Varanda, KG Porsche # 2, em perseguição a Norman Casari, DKW Malzoni 96, X Circuito de Petrópolis, 1967. Naquele mesmo mês, Aylton levou o KG para São Paulo, para trocar o motor 1600cc por um de 2000cc. Ele nem esperou a finalização do serviço e inscreveu o carro nas Três Horas de Velocidade de Interlagos, disputada no dia 27 de agosto de 1967. Foi um grande sufoco a montagem e o acerto do novo motor que só ficou pronto após o encerramento dos treinos e tomada de tempos. Aylton, que teve rodar durante a noite para ‘amaciar’ o motor, precisou acertar o carro durante a madrugada do dia da prova e acabou largando no último lugar do grid. Apesar de todos esses esforços, o carro apresentou problemas mecânicos e não terminou a prova, mas Aylton ainda conseguiu a volta mais rápida. Após o insucesso nas Três Horas de Interlagos, Aylton retornou ao Rio, para disputar a IV Etapa do Campeonato Carioca no dia 3 de setembro de 1967. A prova estava bem disputada, como mostra a foto da largada abaixo, com Norman Casari, Heitor Peixoto de Castro, Aylton e Celso Gerbassi na primeira fila. Foto na entrada da Ferradura durante as Três Horas de Interlagos, 27 de agosto de 1967. O KG é seguido de uma Alfa da Jolly. Dessa feita, já havia dado tempo suficiente para o acerto do novo motor de 2000cc do KG Porsche e Aylton não teve dificuldades para vencer a corrida, com Norman Casari em segundo e Mário Olivetti em terceiro. Logo em seguida, Aylton levou o KG Porsche à Brasília, para disputar os 500 km da cidade, no dia 17 de setembro de 1967, fazendo dupla com o petropolitano Aloísio Renato Kreicher. O carro estava muito bem acertado e Aylton tinha esperança de, finalmente, superar a má sorte que tivera no ano anterior, com o Brasinca Uirapuru. Só que na largada o motor do carro apagou e Aylton acabou ficando em último lugar, bem atrás dos demais concorrentes. Ele deu início a uma corrida de recuperação e após algumas voltas já estava disputando as primeiras colocações. Esse esforço cobrou alto preço do motor, que não resistiu e quebrou antes que seu copiloto pudesse assumir o volante. Mais uma vez Aylton teve frustrado seu objetivo de fazer uma boa corrida em Brasília. Largada para a IV Etapa do Campeonato Carioca no dia 3 de setembro de 1967. Nesse meio tempo, entre setembro e outubro de 1967, Aylton também esteve presente em duas provas de Fórmula Vê. Na primeira, os 500 km de Interlagos, no dia 10 de setembro de 1967, fez dupla com José Fernando Lopes Martins, o Toco, mas não chegou a pegar o carro em função de um acidente em que Toco se envolveu. Na segunda prova, a II etapa do Campeonato Carioca de Fórmula Vê, disputada no dia 29 de outubro de 1967, em Niterói, depois de superar alguns problemas mecânicos, e até mesmo uma sabotagem em seu monoposto, que teve açúcar jogado no tanque de gasolina, terminou em 7º lugar. Como ainda não conseguira recuperar o motor do carro, quebrado em Brasília, Aylton foi convidado por Sérgio Cardoso, que havia adquirido outro KG Porsche 2000cc, para disputarem juntos aquela que viria a ser a sua penúltima corrida, as Mil Milhas Brasileiras, em Interlagos, no dia 3 de dezembro de 1967. Sérgio, que ainda não havia corrido em Interlagos, teve muito pouco tempo para se adaptar à pista e, gentilmente, cedeu o carro a Aylton, que havia feito o quinto melhor tempo na classificação, para a largada (foto abaixo). Nas Mil Milhas de 67, alegria e tristeza: o KG de Aylton, acidentado, precisou de "escolta" pra não ser depenado. João foi o 4º. Já nas primeiras voltas da corrida o pelotão da frente, imprimindo um ritmo muito forte, começou a abrir uma boa distância dos demais concorrentes. Aylton, acompanhava esse trem, mas com muita dificuldade pois logo no início da prova o pedal de freio, nas pisadas mais fortes, se soltava e ficava sem função, fazendo com que ele, após as curvas, tivesse que se abaixar para prender novamente o pedal. Ele achou que, dessa maneira, conseguiria levar o carro até a parada para a troca de piloto. Mas não foi isso que aconteceu, pois na 16ª volta, na saída da curva da ferradura, ao se abaixar, perdeu a traseira do carro e umas das rodas, ao sair da pista, passou sobre uma pequena elevação no terreno que fez com que o carro ‘decolasse’, capotando, segundo ele, umas quatro ou cinco vezes. Felizmente, Aylton sofreu apenas pequenas escoriações no único acidente sério de toda a sua carreira. Joaquim, que trabalhava com Sérgio Cardoso, teve que passar toda a madrugada e manhã da prova, tomando conta do KG Porsche destruído após o acidente, pois haviam pessoas saqueando peças e componentes dos carros que ficaram pela pista. Mil Milhas Brasileiras, 1967. Em 16 de dezembro de 1967, Aylton, mas uma vez contando com a parceria e o apoio de Sérgio Cardoso, disputou sua última corrida. Foi a Prova Luso-Brasileira Almirante Tamandaré, no Autódromo de Jacarepaguá, no Rio de Janeiro. Aylton, com o KG Porsche, seguido de perto pela Alfa Giulia de Wilson M. Teixeira Prova Luso-Brasileira Alte. Tamandaré, 1967. Sérgio, que havia feito o 4º tempo nos treinos oficiais, largou para a primeira bateria com grandes chances na prova, mas uma rodada acabou prejudicando sua performance e o levou ao 7º lugar. Aylton teve pior sorte, pois na segunda bateria, como se pode constatar na foto abaixo, choveu muito e com os pneus lisos teve muita dificuldade para segurar o carro na pista e terminar a prova. Aylton, amargurado com a falta de apoio financeiro, e também muito ressentido com a organização do Circuito de Petrópolis de 1968 que, contra a sua vontade, resolveu inverter a mão da corrida, sempre disputada no sentido horário, resultando em vários acidentes e provocando a morte de seu grande amigo Sérgio Cardoso, ainda nos treinos oficiais, e do companheiro Joaquim Carlos Matos, o Cacaio, além dos ferimentos graves de Carol Figueiredo, resolveu ceder aos insistentes pedidos da família e deixar o automobilismo. Ele, que sempre se empenhara na realização do Circuito de Petrópolis, ficou arrasado com o banimento da prova pela qual tanto havia lutado, após a desastrada edição de 1968. Depois que abandonou as pistas, Aylton montou, com a ajuda do pai, um posto de gasolina em Petrópolis, que também abrigava uma pequena agência de automóveis e oficina mecânica, onde o fiel escudeiro Passarinho continuava atuando na preparação de carros de amigos. Em 1974, já havia vendido o posto quando surgiu a oportunidade de ir para Brasília, juntamente com Carlinhos Bravo (outro piloto petropolitano), para a implantação da primeira concessionária Alfa Romeo (pouco tempo depois incorporada pela Fiat) da cidade, pertencente ao Grupo Cascão (hoje, Gasol). Carlinhos cuidava da área técnica e Aylton das vendas. Ainda em 1974, contribuiu com a Federação de Automobilismo de Brasília e com a CBA na organização da prova de Fórmula 1 que inaugurou o autódromo da cidade (hoje, Nelson Piquet), vencida por Emerson Fittipaldi. Brasília sempre exerceu um certo fascínio sobre Aylton, tanto que ele fez questão de participar da primeira caravana de carros que, em 1960, foi à inauguração da cidade e depois correu lá duas vezes no circuito de rua, a primeira em 1966, com o Brasinca Uirapuru e a segunda, em 1967, com o KG Porsche. Mas a cidade, infelizmente, não lhe retribuiu com sorte nas pistas, pelo contrário, nas duas ocasiões estava bem colocado quando teve que abandonar por problemas mecânicos. Em novembro de 1985, Aylton ainda trabalhava em Brasília quando sofreu um infarto no coração e foi diagnosticado um sério problema numa das válvulas. Foi removido de emergência para São Paulo e operado no Hospital do Coração, pela equipe do Dr. Camilo Abulmassih, recebendo um implante de uma válvula artificial. A partir daí não teve mais condições de trabalhar. Em janeiro de 1991, já morando novamente em Petrópolis, teve um segundo infarto e, após uma internação de cerca de duas semanas no Hospital Silvestre, no Rio, não resistiu. Morreu aos 61 anos de idade. Créditos: Fotos cedidas por José Augusto Varanda e Sidney Cardoso. Texto original de José Augusto Varanda. |