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Michael Andretti - 20 anos depois PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Tuesday, 27 August 2013 15:17

No dia 31 de agosto de 1993, Michael Andretti teve uma reunião definitiva na sede da McLaren em Woking.

 

Depois de 12 corridas, 4 acidentes, 2 rodadas, 1 abandono por quebra e apenas 3 pontos, Ron Dennis, o dono da equipe, comunicou ao piloto norte americano que ele estava sendo demitido.

 

 

20 anos depois, trazemos este e outros detalhes da passagem de Michael Andretti pela Fórmula 1 e como ele refez sua vida no automobilismo depois dos meses de dificuldades correndo na categoria em uma entrevista exclusiva para o site dos Nobres do Grid, quando da passagem da Fórmula Indy por São Paulo.

 

NdG: Michael, certamente você já deve ter falado com diversas pessoas este ano sobre este assunto que foi a sua passagem pela Fórmula 1 em 1993. Talvez venhamos a ser repetitivos, mas tentaremos não ser. Você se importa de falar sobre isso mais uma vez?

 

Michael Andretti: É, realmente muitos vieram falar sobre isso. Parece que estas datas com números redondos provocam as pessoas a voltar no tempo e fazer as mesmas perguntas. Não ser repetitivo é um desafio para você, repórter. Vamos lá.

 

NdG: De início, nós sabemos que o automobilismo americano tem um ‘universo próprio’, que vive – e vive bem – independente do que acontece fora de suas fronteiras e que os pilotos de lá, de uma forma geral, não se interessam sobre o que acontece fora de lá. Mas, e para você, era diferente?

 

Nos Estados Unidos não se fala muito sobre F1. Em minha casa se falava porque meu pai nasceu na Itália, correu e venceu na F1. 

 

Michael Andretti: Sim. Somos uma família de descendência italiana. Meu pai nasceu na Itália e depois foi para os Estados Unidos. Ele correu na Fórmula 1, correu na Ferrari, foi campeão do mundo em 1978 pela Lotus... eu tinha o ambiente da Fórmula 1 na memória e em casa, mas um ambiente de uma Fórmula 1 que descobri ser bem diferente do ambiente que eu encontrei quando cheguei lá.

 

NdG: De alguma forma, quando o Emerson Fittipaldi foi para a F. Indy, ele instigou os pilotos americanos a olhar para a Fórmula 1?

 

Michael Andretti: Quando o Emerson chegou lá ele já conhecia meu pai e, vez por outra, falavam sobre isso, sobre um piloto americano na Fórmula 1 e o Emerson dizia que alguns dos pilotos novos como eu e o All [Unser] Jr deveríamos tentar, que éramos bons o suficiente para enfrentar qualquer piloto do mundo. Eu acreditei nisso e acredito que os nossos pilotos podem ir para a Fórmula 1 e vencer, desde que tenha o suporte adequado, esteja no lugar certo e tenha condições de vencer. Do contrário, não conseguirá se manter como eu não consegui.

 

NdG: Mas isso tem a ver com técnica, com orçamento dos times ou com política interna na equipe?

 

Michael Andretti: Uma parte de cada, mas a parte da política, não apenas interna, no time, mas no meio da Fórmula 1 é complicado. Meu pai foi campeão da F1 em 1978 e correu até 1982, quando voltou lá, dez anos depois, viu que tudo estava muito mudado, mas mesmo assim, me incentivou a agarrar com unhas e dentes a oportunidade que eu estava tendo... e eu tentei, tentei tudo.

 

NdG: Mas o que foi mais difícil no processo todo? O que não ‘encaixava’?

 

Michael Andretti: Eu era um estranho! Foi assim que me senti desde a primeira vez. E quando falo isso, falo mesmo antes da primeira corrida. Depois do primeiro teste, eu já tinha uma sensação do tipo: ‘tem alguma coisa que não está dando certo aqui’. Falei com minha esposa, com meu pai e eles me incentivaram a tentar, a continuar... mas no meio da temporada, já na fase europeia eu desconfiava que minha trajetória na F1 não seria longa. Eu estava disposto a investir numa Carreira na F1, tinha programado trazer toda a família para a Europa no meio do ano... mas numa certa altura, comecei a pensar se não seria dispensado antes do fim do ano, como aconteceu.

 

NdG: Você se sentia um estranho na McLaren ou na F1 como um todo?

 

Em momento algum eu me senti à vontade na Fórmula 1. Era um estranho no ninho e, exceto pelo Ayrton Senna, não havia clima na equipe.

 

Michael Andretti: Na F1 como um todo, mas o mais estranho e desanimador foi me sentir um estranho e uma pessoa não quista na equipe onde eu estava. Era como um ovo fora do ninho. Ninguém parecia me querer lá... e aquilo não parecia ter a ver com a F1, tinha a ver com as circunstâncias e comigo estando naquele time. A McLaren passava por um momento difícil e ia entrar em um campeonato sabendo que não poderia ser campeã. Isso é algo muito estranho e ruim. Eu sentia o ar pesado lá dentro. A única pessoa que se aproximava de mim, que me mostrava as coisas e com quem muito aprendi foi o Ayrton Senna.

 

NdG: O Ayrton tinha a fama de ser um centralizador nas equipes onde passava, um piloto que não dividia nada, que queria tudo e todos trabalhando para o seu sucesso. Ele chegou a barrar a contratação de um piloto [Derek Warwick, para a temporada de 1986] quando estava na Lotus. O que você fez para conseguir esta atenção do Ayrton?

 

Michael Andretti: Bem, eu não sabia sobre esta passagem do piloto na Lotus, mas sabia, fui avisado, que o Ayrton era um piloto que trabalhava muito dentro do time, que era muito dedicado e que queria tudo de melhor para poder vencer e ser campeão, mas comigo ele foi sensacional como pessoa e como companheiro de equipe. Tivemos uma relação muito boa. Quando retornei para a Fórmula Indy, a abertura do campeonato foi em Surfers Paradise, na Austrália e eu venci a prova. Ayrton foi a primeira pessoa a me ligar para me dar os parabéns. Ele passou a noite acordado no Brasil assistindo à corrida e disse que estava feliz por mim. Quando fui dispensado pela McLaren, ele deu uma entrevista coletiva para contar a todos o quão injustamente eu fui tratado. Não sei o que os outros pilotos viveram com ele na F1, mas eu só tenho coisas boas do nosso convívio. Fiquei muito triste quando ele morreu.

 

NdG: No ano que você foi para a F1, o Nigel Mansell foi para a F. Indy, entrando na equipe em que você corria, e foi campeão. Se você tivesse ido para a Williams, correr naquele carro que era todo eletrônico, que quase andava sozinho, você acha que sua vida teria sido diferente?

 

Michael Andretti: É possível que sim. O Nigel [Mansell] chegou numa equipe bem acertada, com um carro muito bom, que era o mais constante da categoria há dois anos e conseguiu se adaptar rápido aos ovais. Caso eu tivesse ido para a Williams... bom, eu acho que eu teria o Alain Prost como companheiro de equipe e tenho certeza que ia ser duro – mas não impossível – superá-lo. Talvez eu conseguisse melhores resultados correndo lá do que os que tive na McLaren e isso me desse condições de permanecer ali, na F1.

 

NdG: Foi na sua última corrida que você fez a melhor prova. Deu um show em Monza! Teve um problema, foi para o ‘fim da fila’, passou todo mundo e chegou em 3º, conquistando seu primeiro pódio... para ser dispensado em seguida?

 

Talvez, se eu tivesse corrido na Williams, a melhor equipe na época, talvez eu tivesse conseguido melhores resultados e ficado na F1. 

 

Michael Andretti: Na verdade eu já estava demitido. Logo depois do GP da Bélgica eu fui chamado à sede da equipe e foi comunicado da minha dispensa. Toda aquela pompa e formalidade inglesa, de ‘muito obrigado, boa sorte, etc’. A corrida seguinte era em Monza, na Itália e eu não tive vergonha nenhuma de pedir, de implorar ao Ron Dennis para correr aquela última corrida. Eu disse pra ele: “deixe-me correr mais este GP... é a corrida na terra da minha família. Isso seria muito importante para mim”. Ele pensou um pouco e disse que concordava. Que deixaria eu me despedir da F1 na corrida de Monza.

 

NdG: Mas o anúncio da sua saída só foi feito na semana seguinte ao GP de Monza. Tem até imagem da entrevista do Ron Dennis com você, bem desconfortável ao lado dele...

 

Michael Andretti: Este foi um dos momentos mais desagradáveis da minha vida. Não precisava fazer aquela cena diante da imprensa. Emitia uma nota e pronto. Foi muito constrangedor, principalmente depois da corrida que tinha feito em Monza. Ele [Ron Dennis] fazia questão de mostrar para todo mundo quem é que mandava ali na McLaren.

 

NdG: Você falou que uma coisa que você estranhou muito na Fórmula 1 foi a política, mas na Fórmula Indy também teve muitas questões políticas, como o rompimento entre a CART e a IRL, que enfraqueceu ambas as categorias, as brigas com alguns dirigentes, até a recente saída do Randy Bernard. O que seria diferente então?

 

Eu precisei implorar para o Ron Dennis para me deixar correr em Monza. Eu fui dispensado logo após a corrida na Bélgica.

 

Michael Andretti: As coisas na Indy são mais claras. Você vê o que está acontecendo e o que pode e precisa ser mudado. O caso do Randy [Bernard] foi algo bem emblemático. Neste caso específico, ele, o Randy, começou a achar que seu papel era mais importante do que a corrida na pista e este tipo de pensamento é muito negativo, é algo que não pode acontecer. Nada mais importante do que a competição e a segurança dos pilotos. Felizmente houve esta mudança e eu estou feliz com o que está acontecendo aqui. Ainda há alguns pontos incertos, mas, nos bastidores, o [Mark] Miles está trabalhando bastante e todos acreditam que as coisas irão caminhar numa boa direção. Em contraponto, vejamos a Fórmula 1. Ela está sob o controle do Bernie Ecclestone há quantas décadas? Estão todos satisfeitos por lá? Eu não sei.

 

NdG: Você falou da gestão do Bernie Ecclestone. Ele está, mais uma vez, tentando conquistar espaço para a F1 nos Estados Unidos. Quer fazer duas corridas aqui. Outra coisa que ele gostaria de ter é um piloto americano fazendo sucesso na categoria. Este piloto poderia ser o Marco, não?

 

Michael Andretti: A Fórmula 1 está sempre procurando mercado e os Estados Unidos é um grande mercado consumidor para peças, carros, produtos que os carros anunciam... mas a Fórmula 1 ficou bem desacreditada depois daqueles episódios em Indianápolis, com aquela corrida de seis carros e aquela vitória do [Rubens] Barrichello em que o [Michael] Schumacher praticamente parou o carro para ele vencer. São coisas que o povo dos Estados Unidos não aceita. Ele pode conquistar sim um espaço e fazer uma corrida com um bom público todos os anos, mesmo duas por ano, mas eu não acredito que ele queira mesmo ter um piloto americano na categoria. Caso contrário, já o teríamos.

 

NdG: Ele já conversou com você ou com o Bobby Rahal sobre os filhos de vocês, sobre fazer um teste?

 

Michael Andretti: Comigo ou com o Marco, não. Com o Bobby eu não sei. Mas, que fosse fazer um teste e fosse correr. Não adianta colocar o piloto na Marussia, por exemplo. Ele vai fazer o que? Se não for para uma equipe de ponta e não for dado um tempo de adaptação para o piloto, ele não vai conseguir se adaptar. Na Fórmula Indy todas as equipes ainda tem alguma chance de vencer, na Fórmula 1, no máximo 3 equipes, atualmente, conseguem vencer. As outras, só se acontecer um milagre.

 

NdG: Você estabeleceu-se como chefe de equipe há mais de uma década e hoje comanda a maior equipe da categoria,com quatro carros. Como foi esta passagem para “o outro lado do muro”?

 

Tanto na F1 como na Fórmula Indy como em qualquer esporte há política. A diferença é que na F1 as coisas não são claras, são estranhas. 

 

Michael Andretti: Foi tranquila. Nos tempos da Newmann-Haas eu já procurava entender como funcionava a equipe. Depois, sempre tive no meu pai uma base muito forte e de muita experiência. Aprendi a me cercar de pessoas boas, não apenas profissionalmente, mas de caráter e com isso conseguimos ir montando uma grande equipe, não apenas em número de pessoas trabalhando, mas em termos de competitividade para enfrentar nossos adversários.

 

NdG: Ao longo desta sua trajetória no automobilismo, teve algo que você lamenta ter feito ou deixado de fazer?

 

Michael Andretti: Duas coisas eu lamento. A primeira, foi ter ido para a Fórmula 1. Eu estava no auge da carreira e poderia ter ganho muito mais do que ganhei na CART e na INDY, mas ficaram as lições.  Aprendi muito, então, pela experiência e por aprender sobre a vida e as coisas, foi bom, mas, quase arruinou a minha carreira. Na F1, a questão era que as coisas eram manipuladas por outras pessoas e não era sobre corridas, era política. Outra coisa que lamento foi o fato de nunca ter ganho as 500 Milhas de Indianápolis. Eu poderia ter vencido lá seis vezes, mas sempre tive algo que deu errado. Em 1992, quando liderei toda a corrida e quebrei faltando dez voltas para o fim, tinha tudo para vencer, mais do que em todos os outros anos. Mas foi uma corrida complicada meu irmão e meu pai foram parar no hospital. Aquela foi a pior de todas.

 

Last Updated ( Tuesday, 27 August 2013 16:36 )