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O caso do automobilismo em TV aberta PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Tuesday, 25 May 2021 13:19

Saudações a todos, vindos deste lado d'Alem Mar!

 

Automobilismo em sinal aberto é algo cada vez mais raro. A tendência que começou no inicio desde século é agora imparável e praticamente nenhum país da Europa transmite a Formula 1 em sinal aberto. É tudo através de sinal fechado, onde mesmo tendo TV por cabo, a pessoa paga mais um extra para poder ver manifestações desportivas, sejam elas futebol, automobilismo ou outras modalidades. Dinheiro manda, e os clubes estão muito dependentes desse dinheiro vindo das televisões para manter plantéis cada vez mais caros, numa obsessão para ultrapassar a concorrência.

 

E ironicamente, quanto mais dinheiro entra, mais endividados estes clubes estão. 

 

Mas sobre futebol, essas coisas podem ser deixadas para outro dia, e este não é o local adequado.

 

Eu abordo isto por causa do automobilismo. Como já falei em cima, há poucos locais onde o automobilismo é transmitido em sinal aberto. E um deles e o Brasil, que até ao final do ano passado, a Formula 1 passava na Rede Globo e a IndyCar era algo da Rede Bandeirantes, enquanto a Fox Sports tinha os direitos da Formula E. No defeso, as coisas mudaram bastante: quando muitos pensavam que a transferência para os sinais fechados era inevitável, a Rede Bandeirantes fez um esforço para ter a Formula 1 e conseguiu, mantendo muitos dos que trabalhavam na transmissão, como Reginaldo Leme e Mariana Becker. 

 

 Com vários ex-integrantes nas transmissões da TV Globo, a Band assumiu os direitos televisivos da F1 no Brasil em TV aberta.

 

A Band, para ter isso, abdicou da IndyCar, que por sua vez, ficou nas mãos da TV Cultura. Era mais barato, é verdade, mas nas mãos de gente competente como Geffreson Kern e Rodrigo Mattar, eles conseguem fazer as coisas bem feitas, e a sua narração é alvo de elogios. E também ficaram com a Formula E, onde Fábio Seixas é quem faz as honras da casa. E pelos vistos, as pessoas gostam: a Band consegue ser a segunda emissora mais vista nos domingos de manhã, quando há Formula 1 no ar, e em menor número, a TV Cultura também regista um aumento de visualizações quando transmite as suas provas.

 

Mas pode-se dizer "no Brasil tem público, na Europa não", ou "os europeus ricos podem pagar isto".

 

Contudo, subitamente, por estes dias, dei por mim a ler um artigo no site racefans.net, da autoria do Dieter Rencken, um dos mais respeitados jornalistas de automobilismo da atualidade, em que defende o regresso da Formula 1 em TV aberta. Ou seja, Grã-Bretanha, França, Alemanha e Itália deveriam voltar a transmitir a modalidade para o público em geral. O artigo, publicado no passado dia 5, fala sobre a crescente "afunilação" da audiência, no sentido de captar aqueles que são realmente fãs e estão dispostas a pagar por isso, e por causa disso, desde 2018, quando tiveram 490 milhões de visualizações, as audiências no Reino Unido desceram para metade do que tinham antes. Agora, em 2020, foram 433 milhões, ao que não é alheio a temporada parcialmente cancelada devido à CoVid-19. E noutros lados, foi ainda pior: em Espanha, por exemplo, durante esse mesmo período de tempo, caíram 75 por cento, ao que não é alheio a saída temporária de Fernando Alonso da Formula 1.

 

 Para Dieter Renken, o retorno da Fórmula 1 à TV aberta é fundamental para aumentar o número de fãs e telespectadores.

 

E sem audiência, os patrocinadores não estão muito interessados em colocar o seu nome em algo que é visto por uma elite, ou como disse certo dia Bernie Ecclestone, "os velhos de 70 anos com Rolexs no pulso". 

 

No inicio de 2020, Scott Young, então o diretor da Sky UK, falava que o contrato assinado entre eles e a Liberty Media iria custar nos próximos a exuberante quantia de 1,18 biliões de libras (1,53 biliões de dólares) até 2024, ou se quiserem, 255 milhões de libras por temporada. Isso representa um terço das receitas televisivas que a Liberty Media recebe por ano, cerca de 750 milhões, dos quais 450 milhões vão para as equipas, que distribuídas por dez, calham 45 milhões cada uma. O resto, 300 milhões, vão para os cofres da Liberty.

 

  

A ideia do "free-to-air" que Rencken defende passa nem tanto para a devolução desses direitos para os canais de televisão, como acontecia até ao final do século passado - e ele reconhece que não há muito que possa ser feito antes de 2025, sem que se quebre contratos - mas mais para plataformas digitais como o Youtube, que fez um acordo no ano passado para a transmissão do GP de Eifel através do seu "streaming", em alguns países europeus.

 

É verdade que hoje em dia, pode-se pagar um pequeno valor mensal, através da F1TV, para poder ver as corridas nas plataformas digitais - celular, PC portátil, note book e plataformas semelhantes - e numa altura em que as equipas concordaram em reduzir as suas despesas, colocando um teto salarial em termos de orçamentos e salários dos pilotos, alguns dos mais caros da modalidade, com a Liberty Media a ter mais lucros que o esperado, poderia ser mais ousada e menos gananciosa, abdicar de parte dos lucros em troca de maior visibilidade, e assim teria mais publicidade e uma renovação da audiência.

 

 O Grupo Liberty Media avançou na forma de "vender" a Fórmula 1 como produto em diversas plataformas de mídia além da TV convencional.

 

Contudo, os que defendem as coisas tal como estão, justificam com o tratamento que os canais fazem ao produto que têm, ao darem muitas horas de visibilidade, de sexta-feira até domingo, em programas especializados, transformando um espetáculo dentro de um espetáculo. E é por isso que há gente, como Ian Holmes, o diretor de media da Formula 1, acha que as plataformas fechadas vieram para ficar e é irreversível.

 

"Não há ponto em comparar [sinal] aberto com [sinal] fechado", disse, numa entrevista recente à Motorsport.com. "O que descobrimos, e isso não acontece apenas com a Sky porque pode se aplicar a outros como o Canal+ na França, uma plataforma madura de TV paga, é a quantidade de marketing que eles colocam junto dos seus direitos, como eles entregam o conteúdo. É algo que vai muito além das suas audiências".

 

 Com uma equipe liderada por Martin Brundle, ex-piloto e rival de Senna, a Sky Sports faz uma das melhores coberturas da F1.

 

"Tivemos mais exposição que nunca antes mesmo do começo da temporada no nosso primeiro ano com a Sky. Lembro de andar por aí e ver outdoors enormes em todos os lugares. Nunca tivemos isso antes. É algo que vai muito além de 'qual é a audiência?'. É como eles apoiam [este] desporto. Como eles vão vender o produto? Quanto tempo [de transmissão] eles darão ao desporto. E, no final, precisamos olhar para a temporada como um todo".

 

"Se você começar com uma comparação de audiência de uma transmissão ao vivo, claro que será menor. Mas aí entra: como que essa audiência crescerá e desenvolverá ao longo do ano? É algo com mais nuances do que apenas TV aberta ou fechada. Vamos encarar a realidade, para além dos eventos como os Jogos Olímpicos, Mundial de Futebol e o Europeu de Futebol, quase não há transmissões desportivas na TV aberta. E há uma razão para isso", concluiu.

 

 

Contudo, há riscos neste caminho. Se a Liberty Media não quiser alterar as coisas como estão, ela arrisca a deixar passar a chance de renovar o seu público. Mesmo que faça - e está a fazer bem - uma campanha para aparecer nas redes sociais, no Facebook, Twitter, Youtube, Instagram, TikTok e outros mais pequenos, mais o acordo com a Netflix para que produzam e transmitam a série documental "Drive to Survive", que se tornou num dos mais populares da plataforma, sem que os fãs possam ver as corridas ao vivo, sem que façam uma ofensiva para garantir mais receitas publicitárias, arrisca a ser passada por outras modalidades que já viram há muito que fechar-se em si mesmos não é boa politica. Afinal de contas, se aqui na Europa, as pessoas vêm as 24 Horas de Le Mans ou o Mundial de Formula E em sinal aberto, porque não a Formula 1? 

 

E pior: a dependência da Liberty Media de dinheiro vindo de certas regiões do mundo começa a ser contraproducente. Já o era antes, no tempo de Bernie Ecclestone, mas com os novos patrões, pouco ou nada mudou. 

 

 Quando fala-se em transmissões da F1, impossível não lembrar - e fazer lembrar - de Murray Walker nas transmissões inglesas.

 

Bem pelo contrário: ficou ainda pior.

 

É público que a Liberty Media pediu no ano passado cerca de 300 milhões de libras ao fundo soberano da Arábia Saudita para fazer face aos prejuízos face ao cancelamento parcial da temporada de 2020 devido à pandemia. Em troca, ficou agora totalmente dependente do dinheiro saudita, do qual a ida este ano a aquele país não é alheia. E num mundo em que cada vez mais há consciencialização dos direitos humanos e se fazem cada vez mais perguntas sobre a razão porque certas modalidades "estão a se vender" para gente com muito dinheiro e cada vez menos escrúpulos, vai haver uma altura em que as pessoas começam a levantar a voz e perguntar porquê vão para paragens menos interessantes.

 

Para fechar: e então, como é aqui em Portugal?

 

 Nuno Pinto, "coach" do canadense Lance Stroll faz parte das transmissões da Eleven, TV por assinatura que transmite a F1 em Portugal.

 

É assim: até 2006, a Formula 1 passava na RTP, a televisão do Estado. Chegou a haver um decreto-lei que colocava a Formula 1 no pacote das transmissões ditos prioritários, a par dos Jogos Olimpicos e dos campeonatos do Mundo e da Europa de futebol (Copas do Mundo e Eurocopas), mas depois desse decreto ter expirado, a cadeia de televisão abdicou de pagar e passou para sinal fechado. Primeiro na Sport TV, onde ficou até 2016, passando para a Eurosport, que criou um canal especial para o efeito, mas durou apenas um ano, para passar nas mãos de outro canal televisivo, a Eleven Sports, onde tem feito um bom trabalho, com uma equipa dedicada que tem como narrador Óscar Gois, como comentador, o João Carlos Costa, acompanhado por Sérgio Veiga, e Nuno Pinto, que é o "driver coach" e conselheiro de Lance Stroll. É uma equipa que faz algo que já não se vê desde os anos 80, ou seja, acompanhado as corridas nas pistas e entrevistando os pilotos nas conferências de imprensa, e comentar nas pistas, especialmente na Europa. 

 

Portanto, já viram como são as coisas por aqui.
Abraço a todos, mês que vêm há mais!

 

Paulo Alexandre Teixeira

 

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Nota NdG: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do site Nobres do Grid.