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Piero Gancia PDF Print E-mail
Written by Administrator   
Friday, 12 November 2010 02:17

 

 

 

Piero Vallarino Gancia nasceu cidade de Turim, no Piemonte, no norte da Itália, em 30 de agosto de 1922. Filho de uma típica família da região, que se dedicava ao cultivo de uvas e proprietários de uma tradicional vinícola, a Fratelli [Fratelli = Irmãos] Gancia, fundada por seu Bisavô, Carlo, em 1850.  

 

Piero era um digno descendente de uma família sempre muito corajosa. Carlo, o bisavô mudou-se para a região do champanhe — Epernay — para aprender a vinificar uvas brancas e controlar sua fermentação para obter vinhos espumantes com suas tradicionais bolhas.  Voltando para a Itália, após fundar a empresa familiar, junto com um grupo de enólogos amigos criou o primeiro vinho espumante italiano, o Asti, em 1865. Para tal utilizou a uva típica do Piemonte — a moscatel — fermentada em recipientes de grande volume pelo Método Charmat e não como, a mais onerosa, fermentação em garrafa do Método Champenois, utilizado na fabricação do champanhe. 

 

Il bambino Piero cresceu em um estilo de vida totalmente diferente do que o colocou em nossa Galeria de Heróis. Mas como veremos adiante, o ritmo era igual. Foi pelas mãos do motorista da família que, aos 10 anos de idade, Piero aprendeu a dirigir. É claro que não era possível sair ao volante pelas tortuosas estradas da época, mas foi o suficiente para despertar a “taquimania” no jovem italiano, apaixonado pela velocidade e fã incondicional do grande ás da época, Tazio Nuvolari. 

 

Como todo italiano parece já ter o DNA propenso à velocidade (seja em motos, seja em carros e até mesmo nos dois), com Piero não haveria de ser diferente. Tanto que aos 9 anos de idade, levado por seu pai, assistiu sua primeira corrida — em loco — na pista de Alessandria, uma cidade vizinha de onde viviam. Nesta prova, aliás, Piero presenciou o primeiro acidente grave em uma corrida: um cachorro invadiu a pista e provocou um acidente envolvendo diversos carros e que acabou por tirar a vida do piloto da cidade, Ítalo Bordino, cujo o carro mergulhou em um canal que desaguava no Rio Tanaro, ainda nos treinos.  

 

 

Ainda criança, assistindo a sua primeira corrida, Piero viu de perto a morte de um piloto... nem assim sentiu-se intimidado.

 

Aos 13 anos, foi — mais uma vez com seu pai — com o pai assistir uma corrida de motos em Asti. Segundo o próprio Piero contava, com um bom humor já bastante ‘tropicalizado’ seu pai não era lá um grande motorista. Vendo o crescente interesse do filho pelas corridas e pela velocidade, procurou não incentivar o herdeiro da casta a trocar a Vinícola Gancia por um volante ou uma moto. Piero porém acabou participando de uma corrida de motos em Asti mas sem outras consequências pois nessa época, estudava num internato muito rigoroso que deixava pouco espaço para devaneios desse tipo.  

 

Ao terminar o liceu começou a II Guerra Mundial e Piero que havia se alistado no Corpo de Alta Montanha — os assim chamados Alpinos — resolveu, contra o parecer da família, trocar algo que era tradição familiar, pois seu pai Carlo lutou as duas guerras pelos Alpinos, pela mais arriscada Aeronáutica Militar. O que acabou ocorrendo é que o regimento dos Alpinos do qual Piero havia participado por algumas semanas foi enviado para a Rússia na campanha do Rio Don e nenhum de seus antigos camaradas jamais voltou, tendo todos morrido num dos mais rigorosos invernos do século. Já a Força Aérea de Mussolini era uma meia piada, muito carente em equipamentos o que impediu a Piero de voar em combate, o que muito provavelmente lhe salvou a vida.  

 

 

Fotos do álbum de família: à esquerda, Carlo, o bisavô, fundador da vinícola. Camillo, à esquerda, o avô, que a expandiu. 

 

Após o Armistício em setembro de 1943 Piero foi feito prisioneiro dos Alemães os quais estava prontos para enviá-lo a um campo de trabalhos forçados na Alemanha, quando numa noite de bombardeio Piero e mais seis de seus camaradas conseguiram fugir. Piero voltou para casa tendo em pleno inverno que viajar à noite pois, além de careca, vestia o macacão típico dos prisioneiros de guerra. Para fazer pouco mais de 100 Kms demorou mais de 10 dias fazendo o percurso a pé, atravessando campos e arrozais encharcados. 

 

Após a guerra Piero cursou e se formou em Ciências Econômicas pela Universidade de Turim. Uma vez terminada a faculdade como era de praxe, foi se inteirando e assumindo funções na empresa familiar, chegando a ser responsável por parte da administração da mesma, o que o levou a fazer diversas viagens para conhecimento além das técnicas de enologia, plantio, produção, envase, transporte e distribuição de produtos, também de finanças e contabilidade. 

 

Ao final da guerra o negócio da família não ia bem. Durante a contenda, por seis anos, não foi produzida uma garrafa sequer na fábrica dos Gancia. Não havia matéria prima e o dinheiro no bolso das pessoas era escasso além dos racionamentos típicos em períodos de guerra. Por outro lado o pai de Piero, Carlo e seu irmão Lamberto, resolveram pagar o salário de 600 funcionários da empresa. A cidade aonde a empresa está sediada tinha na época pouco mais de 8 mil habitantes e um em cada 12 habitantes trabalhava para a Gancia, portanto para Carlo e seu irmão Lamberto era um dever social e humanitário manter a cidade coesa e viva na espera de dias melhores. Não é necessário dizer que ao final da guerra as finanças da família estavam arrasadas. Em 1946 Carlo resolveu partir para a rica Argentina aonde em 1938 havia aberto uma fábrica que ia razoavelmente bem e seu irmão Lamberto ficou na Itália para recomeçar tudo de novo. 

 

 

Imagens da fábrica e do vinhedo da família Gancia no século XIX e início do século XX. Gancia era um sinônimo de qualidade.  

 

Na segunda metade dos anos quarenta, após a guerra, enquanto cursava a universidade Piero dedicou-se ao atletismo e chegou a ser vice-campeão italiano de decatlo e a formar uma equipe de atletas, a Gancia Atletica, a qual sucedeu o grupo desportivo Dopolavoro Ferroviario de Turim, das quais participou Primo Nebiolo que viria a ser o presidente da IAAF, a entidade máxima do atletismo mundial.  

 

Em 1947 aos 25 anos, casou com Lulla Salvadori di Wiesenhoff, com quem ficou casado 63 anos. Na Itália, teve o primeiro de seus três filhos – Carlo – mas as viagens de negócios, que aumentaram consideravelmente nos anos 50 e a busca da Europa em recuperar-se economicamente acabaram trazendo Piero Gancia à América do Sul.  

 

Em 1951, Piero mudou-se com Lulla e Carlo para o Uruguai. Lá, em 1951, nasceu Eleonora — que todos chamam carinhosamente de 'Kika' — mas foi quase um ‘acidente geográfico’. Depois de viajar muito pela Argentina e pelo sul do Brasil, foi no nosso país, em 1952, que o empresário Piero Gancia vislumbrou as boas perspectivas de negócios que o Brasil - onde nasceu a caçula da família, Barbara -  proporcionava e uma divisão da Gancia instalou-se em São Roque, no interior de São Paulo. Uma multinacional cujo acionista se mudou para o país que veio desbravar e acabou se tornando um brasileiro convicto. 

 

 

Acima, o rótulo de um dos primeiros produtos da vinícola Gancia e um outdoor dos vermouths colocado nos anos 50 na Itália. 

 

Contudo, se no interior era o local para se produzir o que seria distribuído e vendido no Brasil, era na capital do estado, São Paulo, que eram fechados os negócios. Piero criava sua rede de negócios no Brasil e, sempre que podia, entre as viagens e os compromissos profissionais, assistia uma ou outra corrida em Interlagos. 

 

Roberto, o irmão de Piero, quando cursava a Universidade da Califórnia em Berkeley em meados dos anos 50 ficou amigo do inglês Ken Miles — que mais tarde viria vencer as 24 Horas de Daytona e as 12 Horas de Sebring com Ford — e do americano Phil Hill — que se tornaria campeão do mundo de F1 em 1961 com Ferrari. Roberto correu algumas corridas contra Miles e Hill nos simpáticos mas lentos  MGs TF. Quando Hill foi à Europa no final dos anos 50 Roberto foi a sua referência. Por conta de sua amizade com Phil Hill, Roberto conheceu Enzo Ferrari. Roberto também foi muito amigo de Wolfgang “Taffy” von Trips quando cursou a escola de pilotagem em Nürburgring juntamente com o brasileiro Christian Heins, da qual Trips era o instrutor. Trips viria a morrer em Monza no GP da Itália de 1961 quando disputava o campeonato com Phil Hill. Christian faleceu em Le Mans durante as 24 Horas em 1963. Roberto, que havia morado na Argentina no final dos anos 40 e início dos anos 50, tornou-se muito amigo do pentacampeão do mundo J M Fangio. Todas essas amizades do irmão fizeram Piero se aproximar do automobilismo sem que contudo se tornasse um participante. 

 

Durante os anos 50 no Brasil seus carros foram uma perua Dodge e um Chevrolet BelAir 1956, com motor Rocket V8, sem coluna trazido ao Brasil por seu irmão Roberto ao voltar para Argentina após terminar a Universidade da Califórnia em Berkeley. Em 1961 após o advento do início da produção nacional de automóveis Piero comprou uma Kombi para os serviços de casa e um Renault Dauphine para Lulla. Faltava comprar um carro para o próprio uso até o dia que encontrou uma Alfa Romeo Giulietta TI 1300cc usada. Piero não teve dúvidas e fez a “extravagância” e acabou levando o carro para a Europa para dar uma ajeitada. Além de detalhes cosméticos como grades e lanternas colocou um motor mais forte de 1600cc e dupla carburação. 

 

 

Já no Brasil, Carlo continuou fiel aos seus princípios e as cores do seu país natal. Só correu com carros italianos! 

 

O carro voltou para o Brasil e um dia ao levar Carlo e Kika ao dentista o motorista da casa bateu o cárter numa valeta na Rua Bela Cintra em São Paulo. Piero não sabia o que fazer para consertar o carro mas havia ouvido que existia um “mago” no Brás na Rua José Monteiro esquina com a Celso Garcia que preparava os carros da Escuderia Tubularte de José Gimenez Lopez, um rico empresário, diretor do Corinthians. 

 

O mecânico da Tubularte era Giuseppe Perego, um milanês genial e genioso que antes de chegar no Brasil em 1950 havia trabalhado antes da guerra na Isotta Fraschini e após a guerra na Maserati. Nesta última, com ninguém menos que o pentacampeão mundial de F1, Juan Manuel Fangio.  

 

Reparo feito e ‘velocitococus’ devidamente despertado, Piero tornou-se frequentador assíduo da Tubularte. Das conversas nas oficinas de José Gimenez Lopes e Giuseppe para as pistas foi uma questão de semanas. 

 

 

Alguns podem dizer que, estreando como piloto aos 38 anos, Piero não teria uma carreira muito longa... ledo engano! 

 

No dia 25 de janeiro de 1962, aos 39 anos de idade, Piero Gancia fazia sua estréia como piloto nas 12 horas de Interlagos, em grande estilo: em dupla com um dos maiores pilotos da época – Celso Lara Barberis – ao volante de uma Alfa Romeo Giulietta. O 5° lugar na geral animou o ‘calouro’ e Piero decidiu que aquilo, definitivamente, iria fazer parte da sua vida. Nessa mesma prova estreou Wilson Fittipaldi Jr. num DKW em dupla com Lauro Roberto Soares. 

 

Nas 12 Horas a dupla Celso e Piero chega em 5º lugar na geral tendo corrido 11 horas e meia das 12 com os amortecedores quebrados o que prejudicava a performance do carro. Certo de que o carro com os amortecedores certos pudesse ser competitivo Piero resolveu tentar novamente e, desta vez prepararam o carro a contento. Na prova seguinte uma corrida de 10 voltas, outro 5° lugar na geral, no I Prêmio Aniversário ACESP. Desde esse dia não mais parou seu envolvimento com o automobilismo. 

 

Numa de suas idas até o Brás Piero teve a oportunidade de conhecer outros conterrâneos,  e, entre eles, um que seria uma amizade que durou meio século: Emilio Zambello. Além de Zambello, foi também apresentado ao sócio e parceiro deste, o mecânico e também piloto Ruggero Peruzzo. Nesta época, os dois já participavam de competições utilizando uma possante Maserati 450S. Com o ‘patrício’ Emílio Zambello e Giuseppe Perego estava consolidada a equipe Jolly, a  Jolly-Gancia como muitos chamam até hoje. Como bons filhos da terra, o trio, manteve a fidelidade aos carros italianos, à marca Alfa Romeo em especial. Quando as competições não permitiam carros importados, era utilizado um o FNM JK 2000cc, o 'Alfa Romeo made in Brazil'.  Piero nunca correu em outro carro que não fosse da marca Alfa Romeo. 

 

 

Dono de uma técnica refinada, Piero conduzia seus carros com maestria e galhardia. Era considerado um Gletleman driver. 

 

A primeira vitória, veio na prova de velocidade I 100 milhas de Interlagos, em 1963, com uma Alfa Romeo Giulietta TI, de 1570cc, na categoria T-2.0. Foi o 3° na geral. Nas provas mais longas disputadas naquele ano, dividiu o volante com Emilio Zambello e Ruggero Peruzzo. Naquele ano, além desta prova, Piero participou de outras quatro corridas.  

 

A esposa, Lulla, não estava presente nas 12 Horas por se encontrar na Europa pois falecera seu pai. Ao saber que Piero participara das 12 Horas de Interlagos pensou que o marido havia enlouquecido. Foi aí que Piero levou Lulla a Interlagos. Naquela época entrava-se pelo portão do autódromo comandado com braço de ferro pelo Sr. Orozimbo e para chegar aos box tinha que se passar pela pista. Curva 1, Curva 2, retão, a freada da 3 e seu bacião, a subida dos box e finalmente a entrada dos box que ficava antes da atual Curva do Café. Um trecho curto que proporcionava grande emoção. Foi o bastante para que Piero convencesse Lulla e criasse mais uma adepta. Lulla viria a estrear na Corrida do Batom em 1965. Em uma das provas que disputou, os 1000kms de Brasília de 1966, Lulla correu em dupla com o motorista da família aquele mesmo que havia quebrado o cárter da Giulietta nas ruas de São Paulo, Felice Albertini, ao volante de um Fiat Abarth 1000cc. chegando em 5º lugar na geral. 

 

Em 1964, foram seis provas disputadas por Piero, entre Brasília e Interlagos, com uma Alfa Romeo Giulietta TI, só ou em dupla com o amigo Emilio Zambello, estiveram sempre andando no grupo da frente e frequentando o pódio. 

 

 

Com a equipe "Italo-Brasileira", na companhia do amigo de sempre - Emillio Zambello - chegaram a ter a hegemonia no país. 

 

A primeira vitória na geral, veio só em 1º de maio de 1965 com a Alfa Romeo Giulia TI nas 3 horas da Barra da Tijuca no Rio de Janeiro. Em 1965, foram 10 corridas, algumas com a Alfa Romeo SZ, a famosa Zagato, de 1.290cc, outras com a Alfa Romeo TI, de 1570cc. Na prova do Café — o I GP Prova do Café de Curitiba a Apucarana e volta — veio a segunda vitória, na categoria até 1.300cc.  

 

Por conta de sua visão empresarial, aliada ao amor pela velocidade, Piero Gancia candidatou-se e foi eleito presidente da APVC (Associação Paulista dos Volantes de Competição) naquele ano. 

 

Em 1966, Piero Gancia e Emilio Zambello tinham conseguido a concessão da Alfa Romeo para representá-la no Brasil e passaram a importar os principais modelos da marca. A equipe ‘Ítalo-brasileira’ dava trabalho para a concorrência e o sucesso nas pistas contribuíram para o aumento das vendas de carros da marca italiana. 

 

 

Em 1966, a consagração veio com a conquista do Campeonato Brasileiro de Automobilismo, após os 1000 Km da Guanabara. 

 

Naquele ano correu 11 provas, sempre com a Alfa Romeo TI Super vencendo cinco provas. Naquele ano teve a sua consagração definitiva após o somatório dos resultados dos 1000 Km de Brasília, dos 500 Km de Interlagos e dos 1000 Km da Guanabara, onde venceu a primeira, foi terceiro na segunda (vencendo na categoria de 1301cc a 1999cc), com o sexto lugar na geral no Rio de Janeiro (outra vitória nos carros abaixo de 2 litros), sagrou-se campeão brasileiro daquele ano. Incrivelmente o primeiro campeão brasileiro de automobilismo era um italiano, mas com coração bem brasileiro. 

 

Nos anos seguintes as vitórias se sucederam e o crescimento do nome da equipe atraiu vários dos principais pilotos do país a defender os carros, quase sempre brancos, vez por outra vermelhos, mas sempre com a faixa das três cores da bandeira do país natal dos bravos italianos que conquistaram mais esta fronteira no Brasil. 

 

 

A grande reportagem sobre este feito nas principais revistas do país ficarão para sempre. Os patrocinadores também vieram nessa. 

 

Em 1967 Piero foi a Miami comprar pneus para a recém chegada Alfa GTA, lá chegando comprou dois jogos de pneus Goodyear Blue Streakes pois uma quantidade maior não passaria pela alfândega ao retornar ao Brasil. Como tinha algum tempo livre antes de retornar ao Brasil resolveu dar um pulo em Nassau, nas Bahamas e jogar na roleta. Resolveu apostar no número 23 — apesar de correr com o 25 — e acertou três vezes em cheio. Estava paga a viagem e os Goodyears. Voltou ao Brasil, venceu as 3 Horas de Interlagos e, após esse dia não mais abandonou o seu tradicional número 23, exceto em ocasiões que correu com o carro de outros membros da equipe, como o 94 do piloto conhecido como a Flecha de Limeira, Tite Catapani, o 'Tite Frecha'. 

 

A equipe 'Ítalo-brasileira' teve como pilotos: Ubaldo Cesar Lolli, Ruggero Peruzzo, Marivaldo Fernandes, José Carlos Pace, Ciro Cayres, Affonso Giaffone, Cacaio, Wilson Fittipaldi Jr., Emerson Fittipaldi, Totó Porto, Francisco Lameirão, os irmãos Abílio e Alcides Diniz, Pedro Victor de Lamare, Tite Catapani, Mario Olivetti, Raffaele Rosito, e mais tarde em 1978 com os Fiats da Equipe Jolly Vasp: José Rubens “Coelho” Romano, Luis Otávio Paternostro e Bob Sharp. 

 

 

Não era apenas em autódromos que Piero mostrava sua categoria. Ele também venceu provas de rua, como em Piracicaba. 

 

Nos anos em que foi piloto, teve também uma ativa participação na política do esporte. Foi presidente da Associação Paulista dos Volantes de Competição (APVC), que tinha como conduta a priorização do esporte e não a política. Como era um piloto, buscava ouvir as reivindicações dos colegas e sabia tinha consciência de quais eram as principais e mais urgentes necessidades do automobilismo nacional.  

 

Preocupado especialmente com a área de segurança dos autódromos, Piero conseguiu a aprovação para melhorar as condições do Autódromo de Interlagos, que ele criticara tantas vezes e foi, com sua importante ajuda e muito esforço, junto ao então prefeito da cidade de São Paulo — o carioca de Vila Isabel, fundador do Correio Aéreo Brasileiro, o Brigadeiro Faria Lima — que o autódromo de Interlagos passou pela primeira e, seguramente, a mais importante reforma de sua existência. 

 

 

Talvez uma das pocas provas que Piero tenha tentado vencer e não conseguiu foram as Mil Milhas Brasileiras.  

 

Inaugurado em 1940, na segunda metade dos anos 1960 estava num estado quase calamitoso. O mato alto, o asfalto se soltando, pedriscos fora do traçado, buracos nas trajetórias... barreiras de proteção simplesmente não existiam. Ou se fazia algo ou Interlagos iria acabar morrendo. Como não havia quem capitaneasse a reforma de Interlagos o Brigadeiro Faria Lima nomeou Lulla para tocar a obra. Lulla, às próprias custas, foi para a Itália levando consigo o arquiteto Giancarlo Gasperini para falar com o Eng. Bacigalupi, presidente do Autódromo de Monza. Voltou trazendo o know-how de tipologias de asfalto, medidas dos box, pit-lane, torre de cronometragem, trouxe também a inovação do guardrail. Foram quase dois anos de reformas, mas que, graças a elas e ao dinamismo das pessoas que faziam o automobilismo no país, entre elas, o casal Gancia, que começou-se a ter-se, em Interlagos, o futuro palco das etapas brasileiras da Fórmula 1. 

 

Piero continuou correndo até o ano de 1971. Sua última prova disputada foram as 6 horas de Interlagos, em 4 de julho de 1971, com uma Alfa Romeo GTA em dupla com Alcides Diniz. No ano anterior, ele vencera, em dupla com Tite Catapani a primeira etapa do Torneio Sul-Americano de Turismo tornando-se Campeão do Torneio. Durante as X Mil Milhas Brasileiras, o atropelamento de um mecânico em meio ao nevoeiro da madrugada na saída da Curva do Laranja tirara o um tanto da empolgação pelas corridas.  

 

 

Nos anos 60, uma imagem da família Gancia lá na Itália, celebrando mais uma boa colheita e safra de vinhos espumantes. 

 

Os anos 70 ainda reservariam mudanças em sua vida. Com a crise deflagrada pela disparada dos preços do petróleo, o país entrou em brutal recessão. As autoridades econômicas da época numa derrapada da razão resolveram achar que produtos de alto valor eram “supérfluos” esquecendo-se de que os mesmos não o eram, especialmente para quem os produziam.  O mundo estava em crise e, como tal, medidas drásticas eram tomadas algumas vezes ao arrepio do bom senso.  

 

Em 1974, após a primeira Crise do Petróleo, foram proibidas as importações de carros no Brasil. A equipe Jolly teve que abandonar os Alfa Romeo que tão forte marcaram a história de nossas provas e que tantas corridas venceu. Naquela altura, além das Alfa Romeo, a Jolly era representante exclusiva da Ferrari, com a marca do cavalinho rampante tendo chegado a ter, no mercado brasileiro, seu segundo maior mercado no mundo, atrás apenas da Inglaterra.  

 

A família Gancia havia decidido de fundir suas operações no Brasil e na Argentina com o grupo Martini & Rossi. Na Argentina a Gancia, além dos próprios produtos, produziria os produtos Martini que fossem complementares. No Brasil, ocorreria o inverso a Martini passaria a produzir, além dos próprios produtos, produziria os produtos Gancia. Piero tornou-se o presidente da operação brasileira, cargo que ocupou até aposentar-se em 1992.   

 

Fora das pistas, Piero foi ainda mais importante, como presidente da APVC e depois da CBA. Um exemplo para todos. 

 

Com as raízes fincadas nas pistas, Piero Gancia ainda teve como propiciar a entrada de um dos antigos pilotos da Jolly na Fórmula 1. Enquanto esteve na Brabham, que era de Bernie Ecclestone, José Carlos Pace tinha o patrocínio do grupo Martini e o carro estampava o logo da marca de bebidas. 

 

Nos anos 80, a presença de Piero Gancia no automobilismo brasileiro foi ainda mais marcante. Diante da degradada situação em que se encontrava o automobilismo brasileiro em meados da década, um movimento liderado por um grupo de pilotos decidiu interferir diretamente na política do esporte e buscaram o apoio das federações - Luiz Evandro 'Águia', na época vice presidente da FASP, onde o movimento começou, viajou todo o país. Conquistado o apoio, faltava escolher quem seria o representante. Carmine Maida, Fernando Calmon e Luiz Evandro 'Águia' ligaram do Automóvel Clube Paulista para a Suiça, onde Piero se encontrava naquele momento e o convidaram para ser o candidato dos pilotos à presidência da CBA. Com a fidalguia de sempre, Piero respondeu que seria uma honra. Os pilotos e Piero ganharam a eleição!

 

Eleito no final de 1986, Piero e o grupo de trabalho encontraram uma entidade sucateada. No Brasil havia apenas três categorias em atividade (Fórmula Ford; Stock Cars e a Fórmula Shell, que era o brasileiro de marcas). No continente, o Brasil sofria com o regulamento mal feito da F3 Sul-Americana. 

 

Em 1989, o Presidente Gancia conseguiu convencer a Prefeita Erundina a salvar Interlagos de se tornar um conjunto residencial. 

 

Piero conseguiu, através de seu relacionamento, organizar um torneio paralelo e conseguiu para o novo torneio de F3 da América do Sul o direito de obtenção da Superlicença — certificação para um piloto poder correr na Fórmula 1 — aos três primeiros colocados no campeonato. Além de fazer uma gestão de extrema clareza, sem que nenhum problema de ordem ética, moral ou administrativa acontecesse, Piero deixou a CBA com o balanço limpo e as dívidas quitadas, além da sede própria da CBA totalmente paga e isenta de quaisquer ônus. 

 

Durante sua gestão, ainda teve que enfrentar uma das mais delicadas situações que poder-se-ia imaginar: a prefeitura da cidade do Rio de Janeiro — sob a gestão de Marcelo Alencar e sob o jugo de Leonel Brizola — passou a não demonstrar ter interesse na continuidade da realização do GP do Brasil de Fórmula 1. Na verdade, a politicagem instalada no estado tentou pressionar a FIA e a Bernie Ecclestone a "colocar dinheiro" para que a corrida continuasse acontecendo. Piero recebeu uma ligação de Bernie Ecclestone que foi direto ao ponto: “Dear Piero, the Brazilian Grand Prix is about to be cancelled”, “caro Piero o GP do Brasil está para ser cancelado”. Em outras palavras: mexa-se ou o seu legado será trágico. 

 

 

Em 2007, em uma fezta no ACP, com Eduardo Celidônio, Graziela Fernandes Santos, Emilio Zambello e Carlos Zghabi. 

 

Piero agradeceu a ligação — na época Bernie era o Presidente da FOCA – a Associação dos Construtores de F1 e, àquela altura,  já era o homem mais forte do automobilismo mundial — e tratou de procurar meios de viabilizar uma alternativa ao Rio de Janeiro. Ninguém parecia querer a F-1 (Piero percorreu o país em busca de alternativas), a única alternativa que havia era Interlagos. Mas havia uma enorme dúvida: a capital paulista estava no início da primeira gestão do Partido dos Trabalhadores (PT) e comandada por uma mulher, a Prefeita Luiza Erundina.  Ninguém acreditava na época que a F-1 tivesse qualquer coisa a ver com o PT e muito menos com uma prefeita mulher. 

 

Com a argumentação de que Interlagos poderia ser uma fonte de receita para o município e de propiciar uma exposição internacional inigualável, além de ser um patrimônio da cidade, Piero Gancia conseguiu convencer a corajosa e visionária Prefeita da viabilidade do projeto. Com o aval da Prefeitura, o suporte financeiro da Shell iniciou-se, para satisfazer as demandas da FIA,  uma grande reforma que alterou em muito o já chamado Autódromo Internacional José Carlos Pace. Interlagos sobreviveu e o Brasil continuou a sediar uma etapa do campeonato mundial de Fórmula 1 e hoje não importa qual matiz tenha o governo municipal ninguém quer perder aquele que se tornou o maior evento da cidade por sua receita. 

 

Ao longo de sua vida esportiva, tanto como piloto ou como dirigente, Piero Gancia foi sempre reconhecido e homenageado por ser o amigo, o parceiro e a figura humana, sempre gentil, educado e acessível que era. Piero sempre manteve-se fiel aos amigos, à sua Juventus — a Juve o time do coração aonde jogou na equipe dos juniores — e à Ferrari. 

 

 

Uma das últimas fotos de Piero Gancia antes da enfermidade se agravar. Pata nós, ele será simplesmente eterno! 

 

Quiseram as curvas do destino que este Nobre do Grid viesse a ser acometido do mal de Alzheimer, doença degenerativa, não contagiosa e — apesar de todos os avanços da medicina moderna — ainda sem cura, onde o tratamento apenas ameniza o sofrimento e prolonga a vida dos que a contraem.  

 

Piero foi para o meio dos que formam a grande equipe montada na eternidade no dia 1º de novembro de 2010. Usando a famosa frase deixada pelo ex-presidente Getúlio Vargas: “deixou a vida para entrar para a história”.

 

 

Fontes: História da vinícola Fratelli Gancia - Italia; Revista Autoesporte; Revista Quatro Rodas; Revista Brasileiros; Obvio; Agência Estado; depoimentos e adendos de Luiz Evandro 'Águia', Carlo e Barbara Gancia.

 

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Last Updated ( Sunday, 24 November 2013 09:53 )